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Esquadrão Imortal – Porto 2010-2011

Em pé: Helton, Rolando, Sapunaru, Guarin, Otamendi e Hulk. Agachados: João Moutinho, Falcao García, Álvaro Pereira, Fernando e Varela.

 

Grandes feitos: Campeão da Liga Europa da UEFA (2010-2011), Campeão Invicto do Campeonato Português (2010-2011), Campeão da Taça de Portugal (2010-2011) e Campeão da Supercopa de Portugal (2010). Foi o primeiro clube desde 1973 a vencer o Campeonato Português de maneira invicta, registrou o melhor aproveitamento de pontos desde a adoção de três pontos por vitória na história do Campeonato Português (93,3%) e ostentou uma sequência de 25 jogos sem perder na temporada.

Time-base: Helton; Sapunaru (Fucile), Rolando, Otamendi (Maicon) e Álvaro Pereira; Fernando (Rúben Micael), Guarín (Belluschi) e João Moutinho (Cristian Rodríguez); Hulk, Falcao García (Walter) e Varela (James Rodríguez). Técnico: André Villas-Boas.

 

“Dragão Implacável”

 

Por Guilherme Diniz

 

Certas temporadas são tão marcantes para um clube que elas precisam de um capítulo à parte. Um conto próprio. Uma fábula única. Passam-se os anos e sempre o torcedor vai se lembrar daquela época mágica, daqueles títulos, daqueles craques, dos ídolos. Após anos inesquecíveis entre 2002 e 2004, o torcedor do Porto ficou mal acostumado com seu time e sentiu bastante quando as taças começaram a minguar a partir de 2005. Vencer apenas torneios nacionais não satisfazia o fanático adepto portista, que viu na mencionada época seu time vencer a Copa da UEFA e a Liga dos Campeões da UEFA. Foi então que, em 2010-2011, com um elenco equilibrado, um técnico em ascensão e jogadores fundamentais vivendo o auge da forma, o Porto retomou o caminho das grandes glórias de maneira impressionante e com perfeição.

Em casa, venceu dois torneios sem perder. Isso mesmo. Ele venceu o Campeonato Português e a Supercopa de Portugal sem uma derrota sequer. E conquistaram a Taça de Portugal com apenas um revés. Simplesmente devastadores. E, no âmbito continental, a equipe levantou a Liga Europa da UEFA com uma campanha repleta de gols e o melhor desempenho individual de um atacante na história do torneio – Falcao García anotou 17 gols em 14 jogos (!). Com 4 taças, o Porto fez história em uma temporada irrepreensível de um dos maiores esquadrões do clube em todos os tempos. É hora de relembrar.

 

Boas novas

André Villas-Boas: técnico do Porto para a temporada 2010-2011.

 

Depois de quatro títulos seguidos no Campeonato Português entre 2005-2006 e 2008-2009, o Porto perdeu a coroa na temporada 2009-2010 para o eterno rival Benfica, mas viu o alento na Taça de Portugal, conquistada após triunfo por 2 a 1 sobre o GD de Chaves. Comandado por Jesualdo Ferreira desde 2006, o clube azul e branco vinha em uma grande sequência de títulos domésticos, mas não conseguia reverter esse domínio para o território europeu. A diretoria queria mais pelo fato de os nomes do plantel portista serem de peso e capazes de renderem muito além.

O fato de não ter completado o penta na Primeira Liga e passar longe das glórias continentais pesaram para o término do contrato do técnico Ferreira, que deixou o clube em maio de 2010. Para o seu lugar, a diretoria contratou André Villas-Boas, que tinha ampla bagagem como auxiliar técnico de José Mourinho no próprio Porto, no Chelsea e na Inter de Milão, e vinha de uma surpreendente temporada no comando do Académica de Coimbra, semifinalista da Taça de Portugal de 2009-2010. Ao lado dos auxiliares Vítor Pereira e Pedro Emanuel, Villas-Boas tinha em mãos um elenco muito consistente, com destaque para o ataque formado pelo português Varela, o brasileiro Hulk e o colombiano Falcao García.

Villas-Boas e Hulk: dupla afiada.

 

Além de ter uma base pronta, o treinador ganhou mais reforços para a época 2010-2011: o meia colombiano James Rodríguez (ex-Banfield, contratado por pouco mais de 5 milhões de euros), o meia português João Moutinho (ex-Sporting, contratado por 10 milhões de euros), e o zagueiro argentino Otamendi (ex-Vélez Sarsfield, contratado por 4 milhões de euros). Com um estilo de comando parecido com o de José Mourinho, Villas-Boas se caracterizava pela personalidade forte, por ser direto com os jogadores e com a diretoria, além de estar sempre atento ao dia a dia do clube. Por isso, não demorou muito para o Porto ganhar a “cara” do técnico e provar que iria brigar por todos os títulos da temporada.

 

Bons prenúncios

Falcao celebra com Hulk: colombiano foi uma máquina de gols na temporada – em especial na Liga Europa.

 

A temporada do Dragão começou com um troféu importante para embalar a equipe: a Supercopa de Portugal, que veio após vitória por 2 a 0 (gols de Rolando e Falcao García) sobre o rival Benfica, no estádio Municipal de Aveiro. Ainda em agosto, o Porto superou os belgas do Genk na fase preliminar da Liga Europa da UEFA com duas categóricas vitórias: 3 a 0, na Bélgica, e 4 a 2 (com três gols de Hulk), em Portugal. O triunfo classificou o Porto ao Grupo L da fase de grupos da competição continental, ao lado de Besiktas-TUR, Rapid Wien-AUT e CSKA Sofia-BUL, adversários bem tranquilos para o time azul e branco encaminhar sua classificação.

No Campeonato Português, o Porto começou vencendo os seis primeiros jogos e viu sua meta ser vazada apenas duas vezes, no triunfo por 3 a 2 sobre o Braga, em casa, na 4ª rodada. Só na sétima rodada que a equipe perdeu os primeiros pontos – empatou em 1 a 1 com o Vitória de Guimarães -, mas a recuperação veio rápida com a goleada de 5 a 1 sobre o União Leiria, em casa, e vitória por 1 a 0 sobre a Académica, fora. Nesse intervalo, o time ainda venceu os três primeiros jogos da fase de grupos da Liga Europa da UEFA de maneira convincente: 3 a 0 sobre o Rapid, em casa (gols de Rolando, Falcao e Rúben Micael), 1 a 0 sobre o CSKA, fora (gol de Falcao), e 3 a 1 sobre o Besiktas, fora (dois gols de Hulk e um de Falcao). 

Mas foi no dia 07 de novembro de 2010 que o esquadrão azul e branco mostrou mesmo que estava afiado. Jogando em casa, a equipe encarou o rival Benfica pela 10ª rodada do Campeonato Português e simplesmente trucidou o time encarnado por 5 a 0 – três gols só no primeiro tempo -, com dois gols de Hulk, dois gols de Falcao e um de Varela, um passeio inesquecível do Dragão que confirmou a boa fase e o ótimo futebol apresentado pela equipe de André Villas-Boas, que aproveitou a improvisação de David Luiz na lateral-esquerda feita pelo técnico encarnado, Jorge Jesus, e focou os principais ataques do Porto por aquele setor. 

 

 

A vitória embalou ainda mais o Porto para a sequência da temporada e o time não deixou a ponta do campeonato escapar. Pelo contrário: só aumentou a diferença. Os Dragões fecharam o ano com mais três vitórias e um empate e se classificaram em primeiro lugar no Grupo L da Liga Europa da UEFA, após empate em 1 a 1 com o Besiktas (gol de Falcao), vitória por 3 a 1 sobre o Rapid, na Áustria (hat-trick de Falcao) e vitória por 3 a 1 sobre o CSKA Sofia, em casa, gols de Otamendi, James Rodríguez e Rúben Micael. Em seis jogos, o Porto venceu cinco, empatou um, marcou 14 gols e sofreu apenas quatro.

Chamava a atenção naquele time a intensidade ofensiva e a velocidade que Hulk, Falcao e Varela impunham perante as defesas rivais, que tinham sérios problemas para conter aquele tridente goleador. Além disso, todos viviam fases magníficas tanto na parte técnica quanto na física, participando de quase todos os jogos. No meio de campo, Fernando, Guarín, Belluschi e João Moutinho eram os principais nomes que articulavam as jogadas e também protegiam a defesa, que não levava muitos gols mesmo em um esquema tático bastante ofensivo proposto pelo técnico Villas-Boas. A torcida era só alegria. Afinal, se aquele embalo continuasse, as taças viriam aos borbotões no final da temporada.

 

Imparáveis

Só em 02 de janeiro de 2011 que o Porto conheceu a primeira derrota na temporada: 2 a 1 para o Nacional da Ilha da Madeira, que eliminou o time azul e branco da Taça da Liga de Portugal. Foram 25 jogos seguidos sem perder, somatória que chegou a 36 partidas juntando as últimas da temporada 2009-2010, um recorde na história do clube na época. Porém, o time azul e branco emendou naquele começo de ano mais 10 vitórias seguidas no Campeonato Português, sendo sete delas sem levar gols, algo que poderia dar ao clube o troféu por antecipação já na 25ª rodada – cinco antes do término do torneio. Na Liga Europa, o Porto começou a fase eliminatória contra o perigoso Sevilla, que na época ainda era “apenas” bicampeão e não tinha a gana pela competição adquirida entre 2014 e 2016. No primeiro jogo, na Espanha, Rolando e Guarín fizeram os gols da vitória por 2 a 1 que deixou o time portista muito perto da classificação. Só que o Sevilla deu muito trabalho à equipe de André Villas-Boas e fez 1 a 0 com Luís Fabiano na metade do segundo tempo. O Porto teve que se segurar e a derrota magra acabou classificando o time português, que avançou graças ao critério de gols marcados fora de casa – ainda em vigor na época.

Em março, a equipe enfrentou o CSKA Moscou-RUS e mais uma vez mostrou força fora de casa ao vencer por 1 a 0, gol de Guarín. Na volta, o brasileiro Hulk abriu o placar com menos de um minuto de jogo, Guarín fez mais um, e nem o gol de honra dos russos atrapalhou a vitória por 2 a 1 e a classificação às quartas de final. Faltava pouco para a sonhada final. Mas, antes dos jogos decisivos pela Liga Europa, a equipe poderia conquistar a coroa no Campeonato Português da maneira mais saborosa possível: com vitória sobre o Benfica. E na casa encarnada, o Estádio da Luz

 

Apagaram a Luz!

Foto: Reuters.

 

No dia 03 de abril de 2011, o Porto precisava vencer o maior rival para levantar o troféu de campeão com incríveis cinco rodadas de antecedência. Mas, para isso, seria preciso quebrar uma escrita: desde a temporada 1939-1940 que o Dragão não era campeão na casa do rival. Mesmo em um território tão hostil, o Porto contou com a sorte no começo do jogo, quando o goleirão benfiquista Roberto Jiménez falhou feio e empurrou a bola para o próprio gol, aos 9’, em cruzamento de Guarín. Mas o Benfica estava determinado a evitar a festa do rival em sua casa e, oito minutos depois, conseguiu o empate em gol de pênalti anotado por Saviola. Só que o Porto continuou atacando e, aos 25’, Falcao sofreu pênalti que Hulk bateu e fez 2 a 1. 

No segundo tempo, o jogo ficou tenso, teve duas expulsões – Otamendi, do lado portista, e Cardozo, do lado benfiquista – e muitas chances perdidas. A principal foi do Benfica, nos acréscimos, quando Gaitán chutou na trave de Helton e levou ao desespero o torcedor encarnado. Quando o árbitro apitou o final do jogo, a festa foi toda azul e branca em pleno estádio da Luz: Porto campeão português! 

 

E não havia um jogador mais feliz com tudo aquilo do que o brasileiro Hulk, autor do gol do título e que conseguia a vingança contra o rival de um episódio conturbado em sua passagem pelo Porto. É que foi contra o Benfica, em 2009, no Estádio da Luz, que Hulk se envolveu em uma confusão nos túneis da casa encarnada com os seguranças e membros da comissão técnica que terminou ruim para ele: o brasileiro levou quatro meses de suspensão e jamais digeriu o episódio, no qual ele disse que foi totalmente prejudicado. Hulk comentou sobre o título após a partida de 2011.

“Foi maravilhoso. Acho que há mais de 50 ou 70 anos que tinha acontecido isto de o Porto comemorar um título no estádio da Luz e ontem voltamos a realizar esta conquista. Eu fico feliz por isso e também por entrar para a história do clube, e mais feliz ainda em conquistar este título com cinco rodadas de antecedência. Agora o nosso objetivo é terminar os cinco jogos sem derrotas para ficar invicto na competição. […] Consegui superar tudo. Já esqueci tudo. Todos sabem que fui prejudicado. Queria voltar a ser campeão, e conseguir isso aqui é diferente”. Hulk, em entrevista publicada no globoesporte.com, 04 de abril de 2011.

Diante da festa portista em sua casa, o Benfica tentou dissipar o rival apagando a luz do estádio e ligando o sistema de irrigação do gramado, mas a artimanha em nada adiantou, pois os jogadores não arredaram os pés da Luz (sem luz!). “Apagou-se tudo…até a luz. Foi uma vitória total dentro do campo, com um critério de arbitragem como todos viram. Para a vitória ser mais completa, apagou-se a luz e ficaram as trevas”, ironizou o presidente do Porto, Pinto da Costa, na época.

Nas cinco rodadas seguintes, o Porto venceu quatro jogos e empatou um, selando uma das campanhas mais impressionantes da história do Campeonato Português e que teve uma sequência de 16 vitórias consecutivas. Eis os números do esquadrão portista:

84 pontos

30 jogos

27 vitórias

3 empates

0 derrotas

73 gols marcados (melhor ataque)

16 gols sofridos (melhor defesa)

 

A equipe ainda teve a maior diferença de pontos já registrada para o segundo colocado na época (21 pontos); foi o primeiro clube desde 1973 a vencer o Campeonato Português de maneira invicta; registrou o melhor aproveitamento de pontos desde a adoção de três pontos por vitória na história do Campeonato Português (93,3%) e teve o artilheiro do campeonato, Hulk, com 23 gols em 26 jogos, além de 16 assistências para gols. Falcao foi o vice-artilheiro do time no torneio com 16 gols. Um campeão simplesmente incontestável. E sedento por mais…

 

O retorno do Dragão da Europa!

O caneco em casa transformou o duelo contra o Spartak Moscou-RUS, no Estádio do Dragão, pela ida das quartas de final da Liga Europa da UEFA, em uma verdadeira festa. E, embalados, os jogadores retribuíram o carinho da fanática torcida com uma goleada inapelável de 5 a 1 pra cima dos russos, com três gols de Falcao, um de Varela e um contra de Kombarov. Os quase 40 mil torcedores foram ao delírio com a apresentação do time azul e branco e só contavam os dias para a semifinal. Na volta, na casa do Spartak, o Porto mais uma vez foi avassalador e fez 5 a 2, com gols de Hulk, Cristian Rodríguez, Guarín, Falcao e Rúben Micael, fechando um agregado de 10 a 3.

O Porto de 2011: ataque rápido e mortífero levou sérios problemas às defesas rivais.

 

Nas semis, o Porto encarou em casa o Villarreal-ESP no primeiro jogo e parecia jogar à moda dos cinco. Motivo? Aplicou mais um 5 a 1 com outro show de Falcao, que anotou quatro gols – todos no segundo tempo! -, enquanto Guarín, mais artilheiro do que nunca naquela Liga Europa, também deixou o seu. E o curioso é que o Porto terminou o primeiro tempo perdendo por 1 a 0. Imagine a ensaboada do técnico Villas-Boas no vestiário para uma virada dessa acontecer… Bem, de fato ela foi real, como relataram Hulk e Guarín no programa “FC Porto em casa”, transmitido nos meios do clube e reproduzido no jornal Record (Portugal):

 

“Lembro-me da eliminatória com o Villarreal, que tinha uma grande equipe e era conhecido na altura como o Barcelona B. Fomos para o vestiário a perder por 1-0 e o Villas-Boas chutava tudo o que via à frente, deu-nos uma bronca de todo o tamanho. Depois, na saída do túnel, falamos todos e prometemos que íamos mostrar o nosso valor, que podíamos ganhar o jogo. Fomos para a segunda parte e demos a volta. Ganhamos de 5 a 1. Éramos muito superiores, eles quase não viam a bola”.

 

Radamel Falcao empata contra o Villarreal: início da virada. Foto: Angel Martinez/Getty Images

 

Aquele jogo, de fato, mostrou a fase de esplendor vivida pelo Porto na época. O quanto Falcao e Hulk se entendiam, com assistências, toques, tabelas, gols. Como o meio de campo cadenciava e atacava na medida certa. E como a zaga não sofria riscos desnecessários nem pressões exacerbadas. Na volta, no Estádio de la Cerámica, o Villarreal abriu o placar no início do jogo, mas levou a virada do Porto após gols de Musacchio (contra) e Falcao García. Os espanhóis ainda viraram com Capdevila e Giuseppe Rossi, mas o 3 a 2 não evitou a classificação portuguesa para a final, que seria disputada em Dublin, na Irlanda, contra um adversário bem comum aos dragões: o Braga, um dos três clubes que conseguiu tirar pontos do Porto no Campeonato Português e que havia eliminado pelo caminho da Liga Europa equipes como Liverpool e Benfica.

 

O Porto era favorito, claro, mas o jogo foi muito equilibrado e, no geral, com poucas chances de gol. Mas o único tento do jogo surgiu ainda no primeiro tempo em uma jogada que podia sintetizar o próprio Porto naquela temporada. O time recuperou a bola no campo do adversário, Guarín dominou, olhou e cruzou para a área. Nela, estava Falcao, o predador absoluto. Ele cabeceou e fez 1 a 0, resultado que permaneceu assim até o apito final, decretando a glória continental tão sonhada pelo torcedor e que não vinha desde o ano mágico de 2004. Na primeira final europeia totalmente portuguesa, deu Porto! E Falcao García, com 16 gols (foram 17 gols contando o jogo do play-off, contra o Genk), se consagrou como o maior artilheiro de uma só Liga Europa / Copa da UEFA de toda a história! Um desempenho individual impressionante que superou vários artilheiros históricos como:

 

  • Jürgen Klinsmann – 15 gols em 1995-1996, pelo Bayern München;
  • Ruud Geels – 14 gols em 1975-1976, pelo Ajax;
  • John Wark – 14 gols em 1980-1981, pelo Ipswich Town;
  • Jupp Heynckes – 12 gols em 1972-1973, pelo Borussia Mönchengladbach;
  • Derlei – 12 gols em 2002-2003, pelo Porto

 

Além desse recorde de Falcao, o técnico André Villas-Boas se tornou o mais jovem treinador a vencer uma competição europeia na história, com 33 anos na época. Em 17 jogos, o Porto venceu 14, empatou um e perdeu dois, com 44 gols marcados e 16 gols sofridos. A conquista deixou o rival, Benfica, ainda mais atrás em números de títulos internacionais: 7 troféus dos portistas contra dois dos benfiquistas. Dias depois, o Porto fechou a temporada mágica com uma goleada de 6 a 2 sobre o Vitória de Guimarães (três gols de James Rodríguez, um de Varela, um de Rolando e um de Hulk), e levantou a Taça de Portugal, o quarto troféu da temporada do dragão. Em 58 jogos na época 2010-2011, o Porto venceu 49, empatou cinco, perdeu apenas quatro, marcou 145 gols e sofreu 42, aproveitamento de 84,4%. O maior artilheiro do time foi Falcao García, com 39 gols, seguido de Hulk, com 35 gols, e Varela, com 12.

 

Difícil de superar

Após vencer tanto e encantar tanto, o Porto perdeu duas de suas principais figuras para a época 2011-2012: o técnico André Villas-Boas, contratado pelo Chelsea, e o atacante Falcao García, que foi brilhar no Atlético de Madrid. Com isso, o Porto só conseguiu manter a coroa em Portugal e não repetiu o apetite nos torneios continentais, perdendo a final da Supercopa da UEFA para o Barcelona de Guardiola (2 a 0), sendo eliminado na fase de grupos da Liga dos Campeões da UEFA e nos 16-avos de final da Liga Europa. Na época 2012-2013, veio o tricampeonato consecutivo no Português – com outra vitória emblemática sobre o Benfica, mas nenhuma novidade no âmbito continental. 

Kelvin e seu golo histórico de 2013.

 

Desde então, o clube espera uma nova safra de jogadores capaz de repetir o sucesso dos esquadrões dos anos 1980, 2000 e aquele de 2010-2011, que até hoje é considerado um dos maiores da história do Porto pela quantidade de títulos em um curto espaço de tempo, o futebol apresentado e os jogadores em grande forma da época. O próprio técnico André Villas-Boas, anos depois, foi categórico sobre aquele esquadrão. 

 

“No FC Porto, quando estávamos a preparar-nos, até os jogadores adivinhavam qual a equipa que ia jogar. Mas o que é certo é que essa equipa era pornográfica. Tinha Hulk, Falcao, James, Moutinho, Fernando, Otamendi… Foi uma das melhores equipas do mundo. Quando olhamos para a carreira que esses jogadores fizeram, é incrível”. – André Villas-Boas, em entrevista ao Sapo.pt.

De fato, aquele Porto foi um assombro. Um esquadrão imortal.

 

Os personagens:

 

Helton: depois de brilhar no Vasco no começo dos anos 2000, o brasileiro assumiu a meta do Porto a partir de 2005, após uma breve passagem pelo União Leiria. O início foi difícil, mas Helton superou o criticismo com atuações muito sólidas, defesas impressionantes e agilidade que fizeram dele um dos principais goleiros dos anos 2000. O arqueiro ficou no Porto de 2005 até 2016 e se tornou um dos recordistas em jogos pelo clube com 334 partidas. Helton levantou 18 títulos pelo Porto, entre eles a Liga Europa da UEFA e 7 Campeonatos Portugueses.

Sapunaru: o lateral romeno chegou ao Porto em 2008 e permaneceu até 2012, atuando não só na lateral-direita, mas também no meio de campo, como volante, e ainda na zaga. Com quase 1,90m de altura, tinha muito vigor físico e era eficiente na marcação e no jogo aéreo. Foram 102 jogos e dois gols pelo Porto entre 2008 e 2012.

Fucile: o lateral vivia grande fase na época e foi titular da seleção uruguaia na brilhante campanha da Copa do Mundo de 2010, quando a Celeste terminou na 4ª colocação. Tinha características mais defensivas e era bom nos passes e cobertura do setor para dar mais liberdade aos meias do time.

Rolando: o zagueirão foi um dos principais nomes do Porto na época e fez uma boa dupla de zaga ao lado do argentino Otamendi naquela temporada histórica. Por ser eficiente no jogo aéreo, costumava marcar gols importantes em suas investidas ao ataque – em 174 jogos pelo Porto, marcou 16 gols. Figurou algumas vezes, também, na seleção portuguesa, pela qual disputou 21 jogos.

Otamendi: após despontar no Vélez, o zagueiro foi para o Porto em 2010 e se consagrou como um dos mais regulares defensores do futebol ao longo da década. Vigoroso, marcador implacável e ágil, virou titular absoluto do time e foi fundamental para as conquistas daquele ano. Após quatro temporadas no clube, foi jogar no Valencia e, em seguida, no Manchester City, onde brilhou na equipe de Guardiola e levantou 9 troféus. Pelo Porto, Otamendi venceu 8 títulos e é até hoje figura constante na seleção da Argentina, pela qual disputou as Copas do Mundo de 2010 e 2018 e venceu a Copa América de 2021 e a Finalíssima de 2022.

Maicon: cria do Cruzeiro, o zagueiro brasileiro jogou a maior parte da carreira no Porto e fez bons jogos naquela temporada marcante de 2010-2011, embora não fosse titular. Maicon jogou de 2009 até 2016 no clube azul e branco e teve no período uma passagem por empréstimo pelo São Paulo.

Álvaro Pereira: o uruguaio vivia a melhor fase da carreira naquela virada de década não só por clubes, mas também pela seleção do Uruguai, com a qual esteve na Copa do Mundo de 2010 e na conquista da Copa América de 2011. Eficiente no apoio ao ataque e cruzamentos, foi titular do time de André Villas-Boas e podia atuar até mesmo mais avançado se fosse necessário. Jogou no Porto entre 2009 e 2012 até ser contratado pela Inter de Milão.

Fernando: o volante brasileiro despontou no Vila Nova, de Goiás, e foi contratado pelo Porto em 2007. Após um período de adaptação no Estrela Amadora por empréstimo, Fernando retornou em 2009 e fez grandes jogos no meio de campo do time, ao lado de Lucho González e Raul Meireles. Com as saídas de seus companheiros, permaneceu como titular e reeditou um grande meio de campo ao lado do colombiano Guarín e do português João Moutinho, atuando em 38 jogos na temporada 2010-2011. Fernando deixou o Porto em 2014 para jogar no Manchester City e, tempo depois, na temporada 2019-2020, jogando pelo Sevilla, conquistou sua segunda Liga Europa da carreira.

Rúben Micael: jogou apenas a temporada 2010-2011 pelo Porto e não foi titular absoluto, mas quando atuou foi bem tanto na troca de passes quanto na marcação do meio de campo, além de ter marcado quatro gols – três deles na Liga Europa. Foram 35 jogos pelos dragões naquela época.

Guarín: enquanto Falcao e Hulk causavam estragos nas zagas rivais, era Guarín um dos principais responsáveis pela organização e movimentação do meio de campo portista naquela temporada de ouro. Com muita técnica, velocidade, dribles, cruzamentos e presença constante no ataque, Guarín foi o principal motor do time e do esquema tático do técnico Villas-Boas. O colombiano atuou em 42 jogos na temporada e marcou 10 gols – cinco na Liga Europa. Ele foi constantemente convocado para a seleção colombiana e esteve na Copa do Mundo de 2014, quando a equipe cafetera chegou até as quartas de final. 

Belluschi: o argentino chegou em 2009 ao Porto e foi um dos mais utilizados pelo técnico Villas-Boas na época 2010-2011, quando participou de 43 jogos. Atuava mais recuado, ajudando na marcação.

João Moutinho: o meio-campista atuou em 48 jogos na temporada e se destacou bastante no esquema tático do time. Cadenciava o jogo quando necessário, ajudava nos passes e nas bolas paradas. Polivalente, podia jogar em qualquer setor do meio, tanto na defesa como no ataque. Jogou de 2010 até 2013 no Porto até se transferir para o Monaco e, em seguida, para o Wolverhampton. Em 2016, integrou o elenco da seleção portuguesa campeã da Eurocopa.

Cristian Rodríguez: o cebolla chegou em 2008 ao Porto e foi titular em sua primeira época no clube. Nas temporadas seguintes, perdeu espaço, mas seguiu disputando quase 30 jogos na média por ano. Tinha características mais de marcação e de distribuir a bola, mas levava perigo com seus chutes poderosos de fora da área.

Hulk: o brasileiro que hoje é ídolo do Atlético Mineiro com gols, títulos e jogadas impressionantes se transformou no “Incrível Hulk” exatamente vestindo a camisa do Porto. Com 35 gols em 50 jogos na temporada 2010-2011, o atacante viveu um dos melhores períodos de sua carreira e seu auge físico – embora isso seja difícil de dizer, afinal, ele sempre está em forma! Com suas arrancadas, chutes, dribles e oportunismo, Hulk foi o grande expoente do Porto naquele ano e principal figura do título do Campeonato Português com 23 gols e outras 16 assistências. Em 2012, acabou indo para o futebol russo e, depois, para a China, até retornar ao Brasil e brilhar de maneira parecida com os tempos de Porto no Atlético de 2021, quando marcou 36 gols em 68 jogos, superando em um gol a sua mais prolífica temporada na carreira, aquela de 2010-2011. Hulk disputou 170 jogos e marcou 77 gols pelo Porto entre 2008 e 2012.

Falcao García: rápido, letal, incansável, oportunista, decisivo. Radamel Falcao García simplesmente destroçou os rivais naquela temporada mágica com a camisa do Porto e foi o principal artilheiro do time com 39 gols em 42 jogos, sendo 17 deles na campanha da Liga Europa da UEFA, no mais avassalador desempenho individual de um artilheiro em toda a história da competição europeia. Em apenas duas temporadas, o colombiano entrou para a história do clube com seus gols e atuações que até hoje são contadas e relembradas pelo torcedor. Em 87 jogos, Falcao marcou 72 gols. Um assombro! Na temporada 2011-2012, Falcao continuou com o faro apurado e foi campeão e artilheiro mais uma vez da Liga Europa, dessa vez pelo Atlético de Madrid. Só não disputou a Copa do Mundo de 2014 por causa de uma séria lesão no joelho. Se estivesse na equipe, certamente os colombianos teriam ido ainda mais longe…

Walter: o brasileiro tinha sérios concorrentes no ataque, por isso, não tinha muitas chances. Ele costumava entrar mais nos minutos finais ou em jogos mais tranquilos do Campeonato Português. Em 24 jogos, Walter marcou 10 gols.

Varela: o ponta-esquerda fechava o tridente ofensivo do Porto naquela temporada e contribuiu com 12 gols em 40 jogos disputados. Rápido e com bons passes, viveu naquela temporada seu melhor momento, mas caiu bastante de produção nos anos seguintes.

James Rodríguez: o colombiano não foi titular absoluto naquela temporada, mas ainda sim brilhou nas vezes em que jogou, com destaque para os três gols na final da Taça de Portugal e as 11 assistências para gols na trajetória do título do Campeonato Português. Com as saídas de Falcao e Hulk nos anos seguintes, Rodríguez passou a jogar mais vezes como titular e cresceu ainda mais de produção, chegando ao auge em 2014, quando foi artilheiro da Copa do Mundo e brilhou na campanha colombiana no Mundial do Brasil. Ele jogou de 2010 até 2013 no Porto, disputou 107 jogos e marcou 32 gols.

André Villas-Boas (Técnico): a história do treinador é provavelmente uma das mais inexplicáveis do futebol neste século. É que depois da temporada espetacular que teve no Porto, o treinador era tido como o novo Mourinho e com um futuro brilhante pela frente. Porém, Villas-Boas se perdeu completamente no Chelsea e acabou demitido em sua primeira temporada com pífios 47% de aproveitamento. Depois, decepcionou no Tottenham, conseguiu uma reviravolta no Zenit, pelo qual conquistou três títulos, se escondeu na China e retornou em 2019 ao Olympique de Marselha, onde também acabou sem troféu algum. Ele subiu demais as expectativas sobre ele por conta do desempenho no Porto e desde então ninguém espera menos do que isso do treinador. Talvez por isso seja tão complicado para ele um novo sucesso. Afinal, não é sempre que um técnico em seu primeiro ano num clube conquista 4 taças e atinge 84,4% de aproveitamento…

 

 

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