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Esquadrão Imortal – River Plate 2014-2019

Em pé: Maidana, Nacho Fernández, Armani, Lucas Pratto e Pinola. Agachados: Ponzio, Casco, Enzo Pérez, Pity Martínez, Palacios e Montiel.
 

Grandes feitos: Bicampeão da Copa Libertadores (2015 e 2018), Campeão Invicto da Copa Sul-Americana (2014), Tricampeão da Recopa Sul-Americana (2015, 2016 e 2019), Campeão Argentino (2014 -Torneio Final), Tricampeão da Copa Argentina (2015-2016, 2016-2017 e 2018-2019), Campeão da Supercopa Argentina (2017), Campeão da Copa Suruga (2015) e Vice-campeão do Mundial de Clubes da FIFA (2015).

Time-base: Armani (Barovero / Batalla); Montiel (Mayada / Mercado), Maidana (Pezzella / Paulo Díaz), Pinola (Funes Mori) e Casco (Vangioni); Enzo Pérez (Ariel Rojas / Kranevitter) e Ponzio (Lucas Martínez Quarta); Ignacio “Nacho” Fernández (Bertolo / Pisculichi / Tabaré Viudez / Quintero), Exequiel Palacios (Carlos Sánchez / D’Alessandro / De La Cruz / Borré) e Gonzalo Martínez (Alario / Matías Suárez); Lucas Pratto (Teófilo Gutiérrez / Cavenaghi / Rodrigo Mora / Driussi / Scocco). Técnicos: Ramón Díaz (2014) e Marcelo Gallardo (2014-2019).

 

“O Retorno do Más Grande”

Por Guilherme Diniz

Estádio Monumental, Buenos Aires, 26 de junho de 2011. Após um empate em 1 a 1 com o Belgrano, o Club Atlético River Plate, maior vencedor de títulos nacionais de toda a Argentina, um dos mais emblemáticos clubes do mundo, revelador de craques inesquecíveis, dono de um patrimônio único tanto físico quanto imaterial, é rebaixado para a segunda divisão do Campeonato Argentino pela primeira vez em seus mais de 100 anos de história. O jogo nem sequer acabou, pois foi encerrado antes dos 45 minutos finais por causa do risco de invasão de campo. A torcida não acreditava naquele drama. Era algo inimaginável para um clube tão grande, tido como intocável e “incaível”. Foi um choque. Nas horas seguintes, depredação no estádio e seus entornos, muito trabalho das forças policiais e caos. As cenas correram o mundo.

Como será que o River Plate iria se reerguer? Com a força de sua camisa. De seus ídolos. De sua gente. E de Marcelo Gallardo. É possível dividir a história do clube entre a.G. e d.G. Antes de Gallardo e depois de Gallardo. O que o Muñeco fez foi simplesmente arrebatador. Ele retomou o orgulho ferido. Criou times competitivos ao extremo mesmo sem grandes craques. Colecionou títulos. E bateu como nunca no maior rival Boca Juniors, exorcizando os tempos de angústia vividos no começo dos anos 2000.

Entre 2014 e 2019, o River voltou a ser grande. Temido. Levantou duas Libertadores em três finais disputadas. Uma Copa Sul-Americana. Três Recopas. Três Copas Argentinas. Um Campeonato Argentino. Uma Supercopa Argentina. Façanhas que nem os mais lendários esquadrões do clube conseguiram. O River de Gallardo se transformou, em termos de conquistas, no maior River de todos os tempos. Venceu a maior final de Libertadores da história, sobre o Boca. E catapultou o time ao mais alto patamar do futebol sul-americano. É hora de relembrar a fase mais laureada e o retorno triunfal do Más Grande, o mais glorioso time sul-americano da década de 2010.

O início de tudo

Após a trágica queda para a Série B, o River começou um intenso trabalho de reestruturação com o objetivo de subir o mais rápido possível. E a equipe o fez já na temporada seguinte, graças ao retorno do ídolo Cavenaghi e as contratações de Ramiro Funes Mori, Leonardo Ponzio, David Trezeguet entre outros. Em 2013, sob o comando do ídolo Ramón Díaz (técnico do lendário time campeão da Libertadores de 1996), o River esboçou uma reação que foi consumada em 2014, quando a equipe encerrou um jejum de dez anos sem vencer o rival Boca em La Bombonera ao bater os xeneizes por 2 a 1, e ainda conquistou, em maio de 2014, o título do Torneio Final do Campeonato Argentino com cinco pontos de vantagem sobre o segundo colocado. A taça veio na rodada final com uma goleada de 5 a 0 sobre o Quilmes, no estádio Monumental, que voltou a receber um momento de alegria depois da fria e dramática tarde de junho de 2011. Foi o primeiro título nacional do clube millonario desde o troféu de 2008. O River terminou a competição com 37 pontos, 11 vitórias, quatro empates e quatro derrotas em 19 jogos. Além disso, foi mais um título para a coleção de Ramón Díaz, que aumentou ainda mais sua idolatria perante os torcedores.

Dias depois, a equipe ainda venceu o tira-teima contra o San Lorenzo (campeão do Torneio Início) por 1 a 0 e faturou a simbólica Copa Campeonato. No entanto, o torcedor millonario ficou pasmo quando o técnico Ramón Díaz anunciou seu adeus logo após o título, em 27 de maio. Sem dar uma explicação concreta, apenas declarações vagas de que “não estava de acordo com os passos a seguir no próximo semestre”, Díaz não quis ficar mesmo com os vários desafios que teria pela frente, incluindo Copa Sul-Americana, Copa Argentina e Campeonato Argentino.

Ramón Díaz não quis continuar no River mesmo com o título nacional.
 

O presidente Rodolfo D’Onofrio e os diretores Norberto Alonso e Enzo Francescoli tiveram que agir rápido e pensar em um nome para assumir o time com foco nos desafios do segundo semestre de 2014. A princípio, eles queriam Ricardo Gareca, mas ele já tinha vínculo com o Palmeiras-BRA. Outros dois nomes surgiram no radar, e curiosamente ambos com laços muito fortes com o River Plate: Hernán Crespo e Marcelo Gallardo. E coube a Enzo Francescoli decidir o nome certo para o cargo. “El Príncipe” indicou Gallardo, que já tinha “muita personalidade e uma cabeça diferente”, segundo o próprio Francescoli. O “Muñeco” vinha de um título uruguaio com o Nacional em 2011-2012 e mostrava um talento em potencial para construir times com jogadores pouco badalados, apostando na parte tática, na intensidade da marcação e no poder do contra-golpe. Com um grande passado no clube, a escolha por Gallardo foi muito bem vista pela torcida, principalmente pelas falas do treinador em sua apresentação.

“Primeiro vem o River, em segundo o River e em terceiro, River. Seremos uma equipe protagonista que pensa em atacar e defender-se bem. Acredito que tendo a bola você tem mais possibilidades de atacar, mas existem outras formas. No Uruguai, começamos com um sistema com quatro defensores, por momentos defendíamos com três ou até dois, jogando com um ou dois volantes centrais, dois meias e três pontas… Não me prendo a nenhum esquema, mas vou respeitar a ideia, a história, a forma e espero que o torcedor se sinta identificado”.

Começaria a partir daquele momento uma das maiores reviravoltas na história de um clube em todos os tempos.

A formação

Marcelo Gallardo, em 2014: o início da transformação.
 

Contratado logo após o final do Campeonato Argentino, Gallardo teve tempo para conhecer seu plantel e buscar reforços para o segundo semestre. Chegaram Rodrigo Mora e Carlos Sánchez, que estavam emprestados, além do atacante Pisculichi, ex-Argentinos Juniors, que assinou contrato de um ano e meio com o clube do Monumental. Após alguns amistosos, Gallardo conseguiu esboçar um time para a sequência da temporada, com um ataque rápido e oportunista formado por Teófilo Gutiérrez, Rodrigo Mora e Pisculichi (com Cavenaghi entrando em algumas partidas), um meio de campo bastante combativo e com possibilidades de criação com Ponzio e Carlos Sánchez, além de uma defesa eficiente com Vangioni, Pezzella, Mercado, Funes Mori e o goleiro Barovero, que vivia grande fase.

Gallardo fez questão de aproveitar os jogadores formados no River, assim como ele foi em seus tempos de jogador, pois sabia que a identificação em campo de atletas assim é maior e melhor. Funes Mori, Pezzella e Kranevitter foram os exemplos de crias da base que ganharam espaço entre os titulares e conseguiram desempenhar um bom papel no time, isso sem contar vários outros jogadores que entravam no decorrer de algumas partidas ou mesmo como titular, entre eles Driussi, Mammana, Lucas Boyé, Giovanni Simeone e Augusto Solari.

Carlos Sánchez, Pisculichi e Gallardo.
 

Além dos compromissos em solo nacional, o River iniciou em setembro sua caminhada na Copa Sul-Americana, vencendo o duelo doméstico contra o Godoy Cruz por 1 a 0, fora de casa, e 2 a 0, em casa. Nas oitavas, os millonarios bateram o Libertad-PAR por 3 a 1 e 2 a 0 e voltaram a topar com um rival argentino, nas quartas: o Estudiantes. E, de novo, os comandados de Gallardo venceram bem: 2 a 1, em La Plata, e 3 a 2, no Monumental, de virada, em jogo que mostrou pela primeira vez uma das características que aquele time iria demonstrar: a superação e a crença de buscar o resultado até o fim, com raça, entrega e muita intensidade. Classificado para a semifinal, o River teria um desafio gigantesco antes da final: o rival Boca Juniors, no primeiro racha de Gallardo contra um antigo algoz de seus tempos de jogador.

A primeira alegria e o troféu invicto

Pisculichi vibra: carrasco da primeira classificação sobre o Boca que marcou o início da dinastia. Foto: AP.
 

Pensar em Boca para Gallardo e o River naquele ano de 2014 ainda gerava recordações amargas e momentos difíceis. Embora os xeneizes não viam uma taça continental desde 2007, a virada do milênio foi toda do Boca nos duelos contra o River, principalmente pelas vitórias nos mata-matas das Libertadores de 2000 e a épica de 2004, com dança de Tevez em pleno Monumental e tudo mais. Mais do que isso, os torcedores do Boca não se cansavam de zoar o rival com fantasminhas com a letra “B” e de chamar os millonarios de RiBer. Para acabar com aquela bajulação, o time alvirrubro teria que vencer o Boca não uma vez, mas várias vezes, das mais variadas maneiras, nos mais diferentes torneios, em toda e qualquer decisão. Era o Superclásico, o maior da Argentina, um dos maiores do mundo. E o River precisava se reerguer também contra o seu maior inimigo.

Com muito trabalho mental e união, Gallardo armou seu time para não perder o primeiro duelo daquela semifinal, em La Bombonera. E conseguiu: 0 a 0, resultado que dava a vantagem de uma vitória simples ao River para a volta, no Monumental. Mas, com apenas um minuto de jogo, o Boca teve um pênalti a seu favor. Será que o carma iria continuar? Não! O goleiro Barovero foi enorme, defendeu a cobrança de Gigliotti e provou que os tempos difíceis iriam mudar de lado a partir daquela noite. Quinze minutos depois, Pisculichi fez 1 a 0 para o River, resultado que permaneceu até o fim e classificou o River para a final da Copa Sul-Americana. Foi um jogo tocante e carregado em emoção para Gallardo não só pela vitória, mas pelo fato de ele ter perdido a mãe dias antes, algo que abalou o técnico e até os jogadores. Mas aquilo serviu como um combustível extra para que os millonarios ficassem ainda mais focados na vaga à final.

O time da decisão. Em pé: Barovero, Vangioni, Pezzella, Mercado e Funes Mori. Agachados: Ponzio, Teófilo Gutiérrez, Rojas, Mora, Pisculichi e Sánchez.
 

No último desafio, um bom presságio: o adversário seria da Colômbia – o Atlético Nacional -, cenário experimentado pelo River nos dois títulos da Libertadores do clube, em 1986 e 1996, em ambos contra o América de Cali, também da Colômbia. No primeiro jogo, fora de casa, Orlando Berrío abriu o placar para os colombianos, mas Pisculichi, no segundo tempo, empatou e garantiu um resultado importantíssimo para a volta. E, no dia 10 de dezembro, mais de 70 mil pessoas iluminaram o Monumental para um grande jogo do River, que venceu por 2 a 0 com gols dos defensores Mercado e Pezzella, prova da força de um elenco que não dependia de um só artilheiro ou goleador. O River faturou a taça de maneira invicta, com oito vitórias e dois empates, e teve o maior assistente da competição: Pisculichi, com seis passes para gols em nove partidas. Rodrigo Mora, com quatro gols, foi o artilheiro do time.

Aquela conquista foi a primeira de Gallardo no comando do River e não poderia ser mais especial por ser um título internacional, com vitória sobre rivais domésticos pelo caminho e em casa, diante da torcida. E sem perder! O treinador dedicou o troféu à sua mãe, em discurso bastante emocionado ao final do jogo contra o Atlético Nacional.

“Hoje pudemos festejar. Estou orgulhoso de poder ter vindo a esse clube, time que iniciei e me criei como jogador, que me formou como pessoa. E mais do que tudo, quero dedicar esse título a minha velha”.

O time de Gallardo até tentou a taça de campeão argentino naquele ano, mas o troféu ficou com o Racing, vencedor com dois pontos de vantagem mesmo com duas derrotas a mais que o River (quatro dos albicelestes contra duas dos millonarios), que empatou demais (seis vezes) ao longo da competição. Em dezembro, outra boa notícia: o colombiano Teófilo Gutiérrez foi eleito o melhor jogador das Américas pelo tradicional jornal El País (URU).

Foco na América!

Gutiérrez faz a festa com a taça da Recopa de 2015.
 

Em 2015, o River de Gallardo começou o ano contratando o atacante Gonzalo “Pity” Martínez, por quase quatro milhões de euros, e também com uma conquista: a Recopa Sul-Americana, após derrotar o compatriota San Lorenzo (campeão da Libertadores de 2014) por 1 a 0 na partida de ida, no Monumental (gol de Carlos Sánchez), e vencer a volta em pleno Nuevo Gasómetro com outro 1 a 0, de novo gol de Carlos Sánchez. Gallardo apostaria ainda mais naquela temporada em um ataque formado pelo colombiano Teófilo Gutiérrez ao lado de Rodrigo Mora, com Pisculichi como articulador e Sánchez o elemento surpresa vindo de trás do meio de campo para municiar os atacantes ou ele mesmo criar chances de gol. Habilidoso e com grande visão de jogo, o uruguaio iria se transformar em um dos principais jogadores do River naquele ano.

Um mês depois, o River provou que tinha apetite por copas e faturou mais uma, essa em caráter mais amistoso: a Supercopa Euroamericana, disputada entre os campeões da Copa Sul-Americana e da Liga Europa de 2014, no caso, o River Plate e Sevilla-ESP, respectivamente. E os comandados de Gallardo se impuseram, deram 16 chutes a gol contra apenas seis do rival e venceram os espanhóis por 1 a 0 no estádio Monumental, fazendo a festa dos quase 55 mil torcedores.

Em abril, outra copa para o River disputar, mas aí o time conheceu seu primeiro revés em uma decisão. Foi a Supercopa Argentina, quando os millonarios perderam para o Huracán (campeão da Copa Argentina de 2014) por 1 a 0, em San Juan, e acabaram com o vice. Mas não havia motivo para tristeza. Pois era hora de mudar a chave para a Copa Libertadores, sem dúvida um sonho para o torcedor e troféu que não vinha desde o longínquo ano de 1996.

Festa do River após o título da Euroamericana sobre o Sevilla.
 

O início da caminhada millonaria não foi nada bom. Os argentinos estrearam com derrota por 2 a 0 para o San José, da Bolívia, e só empataram em 1 a 1 no segundo jogo, em casa, contra o Tigres-MEX. No duelo seguinte, novo empate em 1 a 1 com o Juan Aurich-PER, fora de casa, e mais um empate em casa contra o mesmo Juan Aurich, também por 1 a 1. No quinto jogo, fora, contra o Tigres, outro empate (2 a 2). Os resultados deixaram o River com sérios riscos de ser eliminado ainda na primeira fase. A equipe teria que vencer o San José no último jogo, em casa, e torcer por uma vitória do Tigres contra o Juan Aurich para tentar a classificação em segundo lugar. E não é que eles conseguiram?

No dia 15 de abril, o River venceu os bolivianos por 3 a 0 (dois gols de Mora e um de Gutiérrez) e viu o Tigres vencer o Juan Aurich por um alucinante 5 a 4, resultado que beneficiou o time argentino e o classificou em segundo lugar no Grupo 6 com apenas sete pontos, enquanto o Tigres avançou em primeiro, com 14. O time peruano ficou em terceiro com seis pontos. E mais: o River avançou com a pior campanha entre os 16 classificados, o que obrigou o time millonario a encarar o time de melhor campanha na fase inicial. E adivinha quem foi? O Boca Juniors…

Sobreviventes do gás

O insólito caso do gás jogado pela torcida contra os jogadores do River, em 2015, causou queimaduras e lesões nas córneas de alguns atletas millonarios.
 

Enfrentar o maior rival logo nas oitavas de final da Libertadores de 2015 foi um teste de fogo para o River. Levando em conta o passado relativamente recente de eliminações diante dos xeneizes na principal competição do continente, o torcedor ficava com um pé atrás em relação ao futuro de seu time. Ainda mais pela péssima campanha na primeira fase, com apenas sete pontos diante de adversários nem tão complicados. E, com o Boca dono da melhor campanha da fase inicial, o favoritismo pendia para o lado de La Bombonera, ainda mais com os azuis e dourados com a vantagem de decidir em casa. No primeiro duelo, no Monumental, o River conseguiu vencer por 1 a 0 (gol de Carlos Sánchez, de pênalti), e foi com a vantagem do empate para a volta, no caldeirão boquense. Os millonarios seguraram o rival no primeiro tempo, mas na volta do intervalo, começou uma confusão.

Sánchez vibra: vitória millonaria no primeiro duelo!
 

Os jogadores do River foram atacados com gás de pimenta caseiro feito pelos torcedores xeneizes, que lançaram a mistura no túnel de acesso ao gramado. Quatro jogadores millonarios foram severamente afetados nos olhos e na pele pelo gás. Após mais de uma hora de espera, o árbitro decidiu cancelar o jogo e o Boca foi eliminado por razões óbvias pela Conmebol, que manteve o placar em 0 a 0. O clube ainda levou uma multa de 200 mil dólares e a pena de jogar seus próximos quatro jogos em competições da entidade com portões fechados. Uma punição bem branda pela selvageria causada naquela noite. Com “gás extra”, o River ganhava um moral enorme para a sequência da competição. A América era uma realidade. E totalmente possível!

A volta da mística

Contra o Cruzeiro, Sánchez foi mais uma vez decisivo. Foto: EFE/Paulo Fonseca.
 

Nas quartas, o River teve pela frente um velho conhecido: o Cruzeiro-BRA, que sempre foi uma pedra na chuteira dos argentinos desde os anos 1970, quando a dupla decidiu a Libertadores de 1976, com vitória dos brasileiros, além de vários torneios nos anos 1990. E a fama de “bestia negra” do time azul se confirmou no duelo de ida, no Monumental: vitória por 1 a 0, resultado catastrófico para o River, que teria que vencer por pelo menos dois gols no Mineirão se quisesse ficar com a vaga. E, mesmo em um território hostil, o River provou que sua camisa entortava qualquer varal.

Com uma atuação de gala, o time argentino venceu por 3 a 0, com gols de Sánchez, Maidana e Gutiérrez. Foi uma classificação marcante do time de Gallardo e outra partidaça de Carlos Sánchez, que vivia fase esplendorosa. Após a vitória, o River teve um mês para descansar antes das semifinais, por conta da realização da Copa América. Nesse período, o clube se reforçou e contratou os jogadores Bertolo, Alario, Casco e Viudez, além do veterano Javier Saviola, que não teria grandes chances no time e nem marcaria gols.

Maidana celebra o segundo gol na vitória sobre o Cruzeiro. Foto: AP Photo/André Penner.
 

Em julho, o River teve pela frente o Guaraní-PAR, que havia eliminado de maneira surpreendente o tradicional Racing-ARG. No primeiro jogo, em casa, o River venceu por 2 a 0 – gols de Mercado e Mora – e viajou até o Paraguai com a vantagem do empate. Dito e feito: 1 a 1 (o gol millonario foi de Alario) e vaga na final garantida! Enfim, depois de 19 anos, o River Plate estava em uma decisão de Libertadores da América! O adversário dos argentinos seria o Tigres-MEX, mesmo rival lá da fase de grupos. A boa notícia é que os millonarios poderiam decidir em casa por causa do regulamento da época, que não permitia um clube fora da Conmebol – o Tigres é da CONCACAF – disputar a partida decisiva em casa. Vale lembrar que os times mexicanos ainda eram convidados nas Libertadores até aquele ano. Isso acabou em 2016.

Tricampeón!

Endinheirado e com jogadores como Arévalo Ríos, Gignac e Rafael Sóbis, o Tigres provou sua força ao longo daquela Libertadores e chegava com moral elevado e apenas duas derrotas – para o Emelec, por 1 a 0, nas quartas de final, e 2 a 1 para o Internacional-BRA, nas semifinais. Pendia para o lado do River não só o fator casa, mas também não ter perdido para os mexicanos na primeira fase, além dos reforços Alario e Viudez, que entraram muito bem no time e deram mais opções para o ataque. E, no primeiro jogo, em San Nicolás, o River segurou o ímpeto do rival e empatou sem gols, resultado que deixou a final totalmente aberta para a volta. No Monumental, a festa da torcida foi simplesmente espetacular, com muitas luzes, papéis picados e uma energia bem parecida com a decisão de 1996.

O time da final da Liberta: River dominou completamente o rival principalmente no meio de campo.
 

Gallardo mandou a campo um time diferente do primeiro jogo, e apostou na experiência de Cavenaghi ao lado de Alario no ataque, colocou Bertolo no lugar de Viudez e Kranevitter e Ponzio no meio de campo, deixando Carlos Sánchez mais livre para criar. E a tática deu certo. O River simplesmente amassou o rival, meteu ainda três bolas na trave e goleou por 3 a 0. Alario abriu o placar no finalzinho do primeiro tempo. Sánchez, de pênalti, fez o segundo já na etapa complementar. E o defensor Funes Mori fechou a conta quatro minutos depois.

Ao apito do árbitro, o River coroava uma fase espetacular do time iniciada lá em 2014 e faturava sua terceira Libertadores. Foram 14 jogos, cinco vitórias, sete empates e duas derrotas, com 18 gols marcados e nove sofridos. Os uruguaios Mora e Sánchez, com quatro gols cada, foram os artilheiros do time na competição. Na hora de levantar a taça, o capitão Barovero chamou Cavenaghi e ambos ergueram a Copa, para delírio dos torcedores. Foi a última taça do atacante, que anunciou o término de seu vínculo com o River e se despediu do clube.

Veja os gols:

Os primeiros “brinquedos” de Gallardo…
 

Dias depois do título, a equipe conquistou também a Copa Suruga, no Japão, ao bater o Gamba Osaka por 3 a 0, gols de Sánchez, Pity Martínez e Mercado. Ainda em agosto, o clube anunciou a venda de Funes Mori para o futebol inglês, além do atacante Teófilo Gutiérrez para o Sporting-POR e do meio-campista Ariel Rojas para o Cruz Azul-MEX. No segundo semestre, o time tentou alcançar a final da Copa Sul-Americana, mas foi eliminado nas semifinais para o compatriota Huracán, asa-negra do time de Gallardo naquela temporada. No campeonato nacional, os millonarios não foram bem por causa do foco nas competições internacionais e terminaram apenas na 9ª posição.

Show da torcida e vice

Em dezembro, o River viajou até o Japão para a disputa do Mundial de Clubes da FIFA. E o clube foi abraçado pela torcida, que compareceu em peso para prestigiar seu time – mais de 15 mil torcedores foram até o outro lado do mundo! E isso ficou evidente nas arquibancadas, com muito barulho e festa dos que foram e também dos argentinos por lá. Na semifinal, contra o Sanfrecce Hiroshima-JAP, Alario marcou o gol da vitória por 1 a 0. Querendo seu segundo título mundial – o primeiro foi lá em 1986 – o River teve pela frente na decisão o Barcelona-ESP do trio MSN (Messi, Suárez e Neymar). Por mais que o torcedor tivesse esperança e fizesse uma linda festa no Estádio Internacional de Yokohama, a diferença técnica era enorme. E o Barça venceu por 3 a 0, com dois gols de Suárez e um de Messi.

Mesmo com a derrota, o torcedor argentino não deixou de apoiar seu time em nenhum minuto e cantou sem parar mesmo quando o placar já estava consolidado a favor dos catalães. Algo tocante que mostrou a paixão exacerbada de hinchas, que viam seu time brigar por um título mundial e dar a volta por cima em apenas quatro anos, algo inimaginável naquela fria tarde de junho de 2011.

River copeiro!

Foto: Getty Images.
 

O ano de 2016 ficaria marcado pela saída de expoentes do time multicampeão de 2014 e 2015. E não foram poucas. Deixaram as bandas de Núñez ao longo daquela temporada o goleiro Barovero, o lateral Vangioni, o meia Pisculichi, o defensor Gabriel Mercado, o volante Kranevitter e o meia Carlos Sánchez. No entanto, Gallardo soube remontar o time rapidamente não só com os jogadores que permaneceram, mas também com reforços pontuais como o meia D’Alessandro, o lateral Montiel, o polivalente Exequiel Palacios e o meio-campista Ignacio “Nacho” Fernández, ex-Gimnasia y Esgrima e que viria a ser uma das grandes descobertas do treinador.

Muitos duvidaram que o River pudesse manter a pegada competitiva com tantas baixas ao longo da temporada, ainda mais em um ano de transição, quando o futebol argentino iria remanejar seu calendário para que ficasse parecido com o europeu, passando a vigorar de 2016-2017, 2017-2018, e assim por diante. No primeiro semestre, os millonarios até deram trela para um possível “fim de uma era”. No Campeonato Argentino “curto” daquela primeira etapa, o time terminou na 9ª colocação. E, na Libertadores, embora tenha terminado na liderança do Grupo 1 com 11 pontos, à frente de São Paulo-BRA, The Strongest-BOL e Trujillanos-VEN, o River foi eliminado já nas oitavas de final pelo surpreendente Independiente Del Valle-EQU, que venceu por 2 a 0 a ida e perdeu por apenas 1 a 0 a volta no Monumental.

D’Alessandro (à esq.) vibra durante a final da Recopa de 2016. Foto: Juan Mabromata/AFP.
 

Os resultados ruins deixaram o torcedor receoso para o restante da temporada. Mas Gallardo e companhia conseguiram dar a volta por cima. Primeiro, veio o título da Recopa Sul-Americana, após empate sem gols e vitória em casa por 2 a 1 sobre o Independiente Santa Fe-COL (campeão da Copa Sul-Americana de 2015). Driussi e Alario fizeram os gols do título, o 5º troféu internacional de Gallardo no comando do River em apenas dois anos, algo surreal e que fica ainda maior se pensarmos que o time millonario tinha apenas cinco taças internacionais antes de Gallardo! No período a.G., o River tinha:

  • 1 Mundial Interclubes(1986)
  • 2 Libertadores (1986 e 1996)
  • 1 Copa Interamericana (1987)
  • 1 Supercopa da Libertadores (1997)

No d.G. até aquele momento, o River havia vencido:

  • 1 Libertadores (2015)
  • 1 Copa Sul-Americana (2014)
  • 2 Recopas (2015 e 2016)
  • 1 Copa Suruga (2015)

Isso sem contar a Copa Euroamericana contra o Sevilla! Gallardo simplesmente dobrou a quantidade de taças internacionais do clube! E dava ao River um notável ar copeiro. “É impressionante. Não paramos para pensar, mas foram dois anos muito intensos. Outra final com nossa gente. É impressionante”, disse Gallardo na época. E, nos meses seguintes, o treinador voltou sua atenção ao território nacional para a disputa da Copa Argentina e do Campeonato Argentino.

Na Copa, o River passou pelo Rivadavia por 3 a 0, eliminou o Sportivo Estudiantes por 2 a 1 e venceu o Arsenal por 1 a 0, nas oitavas. Nas quartas, vitória por 3 a 0 sobre o Unión e triunfo por 2 a 0 sobre o Gimnasia y Esgrima, nas semis. Na grande final, o River encarou o perigoso Rosario Central, do goleiro Sosa, do habilidoso Lo Celso e dos atacantes Teófilo Gutiérrez e Marco Ruben. Com dois times jovens e foco no futebol ofensivo, a final disputada em Córdoba foi emocionante. Alario abriu o placar aos 11’, mas Musto e Ruben viraram para o Rosario. Aos 40’, Alario empatou. No segundo tempo, Marco Ruben fez outro para o Rosario e obrigou Gallardo a mexer no time. O técnico colocou Mora e Alonso nos lugares de D’Alessandro e Pity Martínez. E, após as mexidas, o River conseguiu uma virada histórica.

Festa dos campeões da Copa Argentina de 2016. Foto: Daniel Cáceres.
 

Aos 27’, Alario empatou. E, aos 30’, Alonso, que estava apenas quatro minutos em campo, virou o jogo: 4 a 3. O resultado deu o título ao River Plate, copeiro como nunca, competitivo como sempre. Se alguém ainda duvidava do poder daquele time, eis a resposta. Alario, com sete gols em seis jogos, consolidou a grande fase na carreira e foi o artilheiro da competição. No Campeonato Argentino, o River terminou com o vice-campeonato, sete pontos atrás do rival Boca, campeão de 2016-2017. Driussi, com 17 gols, foi o artilheiro do time, seguido de Alario, com 12.

Da pane à volta por cima

Scocco viveu grande fase em 2017.
 

O ano de 2017 era cercado de expectativas para o torcedor millonario. Após a reviravolta épica contra o Rosario Central na final da Copa Argentina de 2016, ir bem na Libertadores de 2017 era uma obrigação a um time já acostumado às decisões e que absorvia cada vez mais a mentalidade vencedora de Gallardo. Embora tenha perdido a final da Supercopa Argentina para o Lanús (guarde bem esse time…) em fevereiro por 3 a 0, em La Plata, a esperança millonaria seguiu em alta. Ainda mais pelo fato de o time ter se reforçado com as contratações do zagueiro Pinola, do ótimo goleiro Armani (campeão da Libertadores de 2016 pelo Atlético Nacional-COL), do meio campista Enzo Pérez, dos atacantes Rafael Borré, Scocco e Lucas Pratto, do meia colombiano Quintero e do meio-campista uruguaio De La Cruz, irmão de Carlos Sánchez. Foram contratações certeiras que aumentaram ainda mais a força do elenco do River, que poderia disputar com chances de títulos as várias competições do ano. As baixas mais sentida seriam de Alario, negociado no segundo semestre de 2017 ao Bayer Leverkusen-ALE, e Driussi, vendido ao Zenit-RUS.

Na fase de grupos da Liberta, o River terminou na primeira posição com 13 pontos, à frente de Emelec-EQU, Independiente Medellín-COL e Melgar-PER. Nas oitavas, o fantasma da eliminação precoce do ano anterior foi exorcizado com a vitória por 2 a 0 sobre o Guaraní, no Paraguai, e empate em 1 a 1, em casa. Nas quartas de final, um choque tremendo com a derrota por 3 a 0 para o Jorge Wilstermann-BOL na ida, resultado que obrigava o time millonario a marcar quatro gols na volta, no Monumental, para avançar sem depender de pênaltis. Só que os comandados de Gallardo fizeram mais que isso. Fizeram o dobro! Scocco marcou cinco gols (três em menos de 20 minutos), Enzo Pérez fez dois e Ignacio Fernández deixou o seu no massacre de 8 a 0 do River! Foi uma das maiores goleadas da história da Libertadores!

Scocco marcou cinco gols na goleada de 8 a 0!
 

Com moral, o River chegou à semifinal para encarar o compatriota Lanús, que havia despachado o San Lorenzo nas quartas de final. Favorito, o River fez valer seu mando de campo e venceu por 1 a 0 o duelo de ida, no Monumental, e foi com a vantagem do empate para a volta, em Lanús. Em apenas 21 minutos, Scocco e Montiel fizeram 2 a 0 e aumentaram para 3 a 0 o placar agregado para o River. A vaga na final estava garantida, pensaram todos. Mas tudo começou a virar de cabeça para baixo nos acréscimos do primeiro tempo, quando Sand diminuiu.

No primeiro minuto da segunda etapa, Sand fez mais um e empatou. Pouco tempo depois, Acosta virou. E, aos 23’, Silva fez 4 a 2 para o Lanús em pênalti marcado pelo VAR. Foi um desastre para o River. O fim do sonho de outra final continental e a queda do especialista em mata-matas Gallardo, que buscava sua 31ª classificação em 38 confrontos desde 2014. E outro revés para o Lanús na temporada, algoz lá da Supercopa Argentina de fevereiro. Além disso, o River acumulou outro 4 a 2 para a conta em Libertadores, placar que causa pânico no torcedor desde o fatídico ano de 1966 – descubra aqui!

Sand, o carrasco do River em 2017. Foto: Natacha Pisarenko/AP.
 

Aquela foi, segundo o próprio Gallardo, a mais dolorida derrota de sua carreira como técnico. Ele disse que o time demoraria três meses para se recompor – e isso influenciou inclusive na campanha do River no Campeonato Argentino, onde os millonarios nem sequer brigaram pela taça. A chance de volta por cima foi na Copa Argentina. E o River a abraçou com toda força. A equipe eliminou Atlas (3 a 0), Instituto (4 a 1), Defensa y Justicia (3 a 0), Atlanta (4 a 1) e Deportivo Morón (3 a 0) até alcançar mais uma final, contra o Atlético Tucumán.

Jogando em Mendoza, o River abriu o placar logo no início do jogo com Scocco, artilheiro do time naquela temporada. Dois minutos depois, o Tucumán empatou, mas Ignacio Fernández, no começo da segunda etapa, fechou a conta: 2 a 1. O River faturou mais uma Copa para sua coleção e emendou o quarto ano seguido com pelo menos um troféu em sua galeria. Após o revés na Liberta, o crescimento do time naquele final de 2017 foi notável. Mas o auge estava guardado para um dos anos mais mágicos da história do River: 2018.

O aumento da freguesia

Logo no mês de março de 2018, o River, como campeão da Copa Argentina de 2016-2017, disputou a final da Supercopa Argentina de 2017 contra o Boca Juniors, campeão do Campeonato Argentino de 2016-2017. Era a primeira final entre os maiores rivais da Argentina desde 1976, quando ambos decidiram o Metropolitano daquele ano, vencido pelo Boca de Juan Carlos Lorenzo. Disputada em Mendoza, a decisão foi cercada de expectativa, pois seria um combustível único para o restante do ano. E, mostrando muita eficiência e controle de jogo, o River venceu por 2 a 0, gols de Pity Martínez e Scocco, e levantou a Supercopa diante do maior rival. Que maneira de começar o ano! Supercampeão!

Borré e Quintero.
 

Depois do título, o River voltou suas atenções para a Libertadores, mais uma vez a principal competição do ano para o clube. Com as contratações certeiras, o River tinha ainda mais força em relação ao ano anterior e era um dos favoritos ao título. A caminhada começou contra o Flamengo-BRA, no Rio, com empate em 2 a 2. Na sequência, a equipe empatou sem gols com o Independiente Santa Fe-COL e venceu o Emelec no Equador por 1 a 0 (gol de Pinola). No returno do grupo, outra vitória sobre os equatorianos (2 a 1, gols de Pity Martínez e Pratto) e triunfo por 1 a 0 sobre o Santa Fe fora de casa (gol de Pratto). No último jogo da primeira fase, empate sem gols com o Flamengo e classificação em primeiro lugar garantida. Era hora do mata-mata. E, logo de cara, um adversário doméstico pela frente: o Racing.

O Destruidor de Avellaneda!

Pratto comemora no jogo contra o Racing. Foto: AFP PHOTO / JUAN MABROMATA.
 

Embora o fantasma da eliminação na edição passada da Liberta para um rival doméstico ainda fosse recente, o River tratou de apagar as más recordações para superar o Racing. No primeiro jogo, no El Cilindro, o time de Gallardo segurou um empate sem gols mesmo com um jogador a menos para levar a decisão ao Monumental. E nele o time millonario deu show: 3 a 0, com belos gols de Pratto, Palacios e Borré. Foi um jogo todo do River, que usou e abusou de sua marcação adiantada, dos passes rápidos e envolventes e da força de seu esquema ofensivo.

Nas quartas de final, o River encarou outro rival de Avellaneda: o Independiente, que mantinha vivo o sonho da oitava Libertadores para sua galeria e perseguia um troféu que não vinha desde 1984. O primeiro jogo foi na casa dos Diablos e mais uma vez o River segurou um 0 a 0, cartilha máxima de um time copeiro e que sabia da força de sua casa. Os rojos mandaram duas bolas na trave e pararam também em Armani, que fez defesas incríveis – uma à queima roupa – e comprovou sua temporada magnífica com reflexos apurados, muita segurança nas saídas de bola e participação na Copa do Mundo da FIFA.

Armani salvou o River contra o Independiente no primeiro duelo.
 

Na volta, no Monumental, Scocco abriu o placar logo no primeiro minuto do segundo tempo, após passe de Borré, mas Romero empatou para o Independiente oito minutos depois. Aos 23’, Quintero chutou colocado e fez o segundo do River. Precisando de um gol, o Independiente teve que sair para o ataque, mas cedeu justamente o que o River mais queria: um contra-golpe, aos 38’, quando Borré recebeu, driblou Franco com um corte seco e chutou para fazer um golaço: 3 a 1. River na semifinal! Era a 38ª vez que o esquadrão de Gallardo avançava em um duelo de mata-mata em 46 jogos disputados! Que aproveitamento! Só que o próximo rival não era nada fácil: o Grêmio, então campeão da América e com a vantagem de decidir em casa. Daquela vez, o River teria que fazer seu dever no Monumental para só depois tentar a sorte longe de seus domínios.

Os imbatíveis

Lembra do empate em 2 a 2 com o Flamengo lá na fase de grupos da Libertadores? Pois bem. A partir daquele jogo, o River de Gallardo permaneceu incríveis 32 jogos sem perder! Isso mesmo! A série englobou jogos pela Libertadores, Campeonato Argentino, Copa Argentina e Supercopa Argentina. Desses 32 jogos, em 22 a equipe não levou gols, em três conseguiu virar o placar, marcou 60 gols e levou apenas 12.

A sequência invicta do River. Arte: Diário Olé (ARG).
 

Pelo Campeonato Argentino, foram 17 partidas, com 11 vitórias e 6 empates; pela Libertadores, foram 10 partidas, com 5 vitórias e 5 empates; pela Copa Argentina, foram 4 vitórias em 4 partidas; e pela Supercopa Argentina foi uma vitória em uma partida. Já era outubro e a última derrota havia acontecido em 24 de fevereiro, ante o Vélez, que venceu por 1 a 0 em Liniers. Os millonarios só perderam no dia 19 de outubro, para o Colón, por 1 a 0, pelo Argentino.

Muñeco providencial

Câmera do SporTV flagrou o técnico do River se comunicando com seu auxiliar na Arena do Grêmio.
 

Na partida de ida das semis da Libertadores, logo após o revés para o Colón, no Monumental, o River tinha plena certeza da vitória e confiava no retrospecto favorável de quase um ano sem derrotas jogando em casa – a última havia acontecido no dia 26 de novembro de 2017, contra o Newell’s Old Boys, pelo Campeonato Argentino. Além disso, os millonarios vinham de duas classificações marcantes sobre os compatriotas Racing e Independiente com vitórias acachapantes no Monumental. E pesava também o fato de o Grêmio não ter à sua disposição seus principais atacantes: Everton Cebolinha e Luan. No entanto, o time brasileiro fez uma grande partida, neutralizou as principais jogadas do rival e venceu por 1 a 0. Além do prejuízo no placar, o River ainda viu Marcelo Gallardo ser punido pela Conmebol por atrasar a entrada de seus jogadores no segundo tempo. Com isso, ele não poderia ficar no banco de reservas na partida de volta, no Brasil.

Foto: Lucas Uebel/Gremio.net.
 

Mas o técnico millonario deu um jeitinho, foi à tribuna e se comunicou com seu assistente por rádio. No primeiro tempo, o Grêmio fez 1 a 0 e poucos acreditavam na virada millonaria. Mas, durante o intervalo do duelo em Porto Alegre, Gallardo conseguiu ir ao vestiário – outra ação proibida pela suspensão que levou – disfarçado e passar as instruções necessárias aos seus jogadores. Tudo em prol da virada e da sonhada vaga na decisão. “Foi uma necessidade minha, estar com meus jogadores, minha equipe técnica. Não que eu pudesse mudar algo e sabendo que eu poderia sofrer as consequências. É que eu queria estar presente naquele momento”, disse o treinador tempo depois.

Capa do jornal Olé destaca triunfo do River…
 

Com ânimo extra, o River foi pra cima, não se intimidou com a pressão do rival e venceu de virada por 2 a 1, vitória que veio após um pênalti assinalado pelo VAR – que demorou dez minutos para encontrar o veredicto – no finalzinho e anotado por Pity Martínez. Após o jogo, o atacante Borré disse que “essa equipe tem coração para jogar até o final, até o final!”. E o River estava na final! Bem, até aquele momento, pois o Grêmio, inconformado, foi imediatamente à Conmebol reivindicar uma severa punição ao técnico Gallardo e até a eliminação do River da competição. Antes do julgamento, a apreensão era nítida tanto no Brasil quanto na Argentina. Por um momento, a classificação do River ficou na berlinda. Só quando aconteceu o julgamento, que sacramentou a punição ao treinador em 50 mil dólares e três jogos de suspensão, incluindo o banimento de Gallardo da primeira partida da final, que o torcedor millonario ficou aliviado.

No dia seguinte ao jogo do River, aconteceu a outra semifinal da Libertadores entre Palmeiras e Boca Juniors. E adivinhe quem se classificou? O Boca. Sim, a final da Libertadores de 2018 seria Boca x River. O maior clássico das Américas na final da América. Estava sacramentada a maior final de todas, a mais sonhada, aquela só possível nos videogames. Era real. Surreal!

La final más linda del mundo!

Grande parte do texto a seguir foi extraído do especial que o Imortais fez sobre a superfinal da Libertadores de 2018. O texto completo você pode ler clicando aqui!

 

Com poucos dias para a primeira partida, a Argentina ficou em polvorosa. Um amplo esquema de segurança foi montado e até a data dos jogos foi mudada para evitar problemas, principalmente pelo fato de uma reunião da cúpula do G20 acontecer em Buenos Aires justamente no final de novembro e exigir todos os esforços policiais da cidade. Por isso, as finais, que iriam acontecer nos dias 7 e 28 de novembro, passaram para os dias 10 e 24 de novembro. Como acontece desde 2013 nos clássicos do país, o jogo seria com torcida única. O peso daquela partida interferiu diretamente no cotidiano de toda a Argentina e também do mundo do futebol. Os noticiários só debatiam as possíveis escalações, as táticas dos treinadores, o peso que a ausência de Gallardo poderia causar no River, entre muitos outros fatores. E muitas histórias começaram a surgir por causa daquele jogo.

A comunidade judaica, por exemplo, pediu – em vão – para que a partida acontecesse no domingo, dia 11, para que não atrapalhasse o Shabat, período entre o anoitecer da sexta e o anoitecer do sábado respeitado pelo judaísmo que abstém os judeus de coisas como trabalhar, mexer com dinheiro, dirigir, ver TV, enfim, repouso absoluto que exige a desconexão com tudo o que acontece no mundo exterior. Mas um grupo de 35 fanáticos encontrou um jeito: viajou até a Espanha só para ver o jogo! Por causa do fuso horário, a partida começaria de noite por lá e aí sim eles poderiam vê-la tranquilamente.

Quando chegou o dia 10 de novembro, a grande data da partida, acredite, um verdadeiro dilúvio caiu em Buenos Aires. Aquele jogo era tão enorme, tão grande, que mexeu com a meteorologia. Mexeu com a Terra. Quiseram os deuses do futebol adiar aquela peleja. Adiar o inacreditável. Adiar o superclásico do século. Ou melhor, “dos séculos”. A arbitragem até tentou rolar a bola no gramado. Ela nem quicou. Nem a ótima drenagem de La Bombonera foi capaz de conter tanta água. A chuva começou de madrugada, por volta das 1h. E não parou. Foram 95 milímetros de chuva! Ou seja, sem chance de final naquela tarde de 10 de novembro de 2018. A Conmebol adiou para o dia seguinte, domingo, 11 de novembro.

No dia seguinte, enfim, os céus cessaram. Nada de chuva. O gramado drenou toda a água do dia anterior e as lágrimas de quem chorou o adiamento da partida do sábado. Era domingo. Dia tradicional para um bom jogo de futebol. Desde 1979, no duelo de ida entre Olimpia 2×0 Boca Juniors, que não acontecia uma partida final de domingo na Libertadores. No fim, nunca deu tão certo. Às 16h50, a taça chegou. Brilhante, límpida. E toda alegre diante daquela multidão tão característica e que tanto adora aquele troféu. Para provocar o rival, a torcida do Boca jogou penas de galinhas perto do banco do River. Era o claro e nítido clima de um Superclásico, com o tempero extra de ser em uma épica decisão da América.

Antes dos times entrarem nos gramados, a polícia entrou no vestiário do River à procura de Marcelo Gallardo. Vai que ele estava lá escondido, não é mesmo? Depois de vasculharem tudo, aí sim o ok foi dado para o início do jogo. Os times entraram separados, mas depois se uniram para a entrada oficial. Nas transmissões da TV, os locutores não ousaram narrar o inarrável. Só a festa da torcida e os times em campo já exemplificavam o que era aquele momento único e inédito na história do futebol mundial. Era hora do “início do fim do mundo”, como diziam. Da maior final de Libertadores de todos os tempos.

Veja à esquerda as penas de galinha que a torcida do Boca jogou perto do banco do River.
 

Quando a bola rolou, a torcida xeneize já começou a pulsar na tradicional arquibancada atrás do gol. Mas tudo aquilo logo de cara em nada assustou o River, único clube no mundo capaz de manter o sangue frio quando joga em La Bombonera. Afinal, ele nasceu ali, em La Boca. Sabe todas as artimanhas, conhece todos os trejeitos de seus moradores. Sabe como se portar e como neutralizar toda e qualquer investida de seu mais que centenário rival. O jogo foi pegado, disputado e com os dois rivais tentando errar o mínimo possível. Até que, aos 33’, Ábila chutou, Armani espalmou e o mesmo Ábila mandou outro petardo no mesmo canto. Armani até tentou defender, mas a redonda estava tão quente que passou pelas luvas do camisa 1 e entrou. Explosão em La Bombonera: 1 a 0 para o Boca.

Festa de Ábila: 1 a 0 Boca!
 

Com a bola no centro do campo para o recomeço, o River pensou na arma que poderia utilizar para esfriar todo aquele caldeirão. Lembra que falei que o clube millonario é o único no planeta que sabe como escapar das armadilhas de La Bombonera? Pois é. Quando deu a saída, o River estudou a zaga boquense para preparar um bote rápido, daquele que foge do olhar comum. Pity Martínez caminhou pelo meio de campo e, num só passe, encontrou Lucas Pratto em velocidade. Como uma flecha, o atacante se infiltrou no meio de três defensores do Boca, entrou na área e chutou do lado oposto do goleiro Rossi, que não alcançou a bola e a viu correr e se aconchegar nas redes do gol: 1 a 1. Em menos de um minuto, o River empatava o jogo. Jogava gelo e mais gelo naquele caldeirão. Parte da torcida xeneize continuava cantando, mas a maioria dela emudeceu, pois sabia que um gol daquele jeito era muito, mas muito perigoso.

O goleiro Armani e a hinchada xeneize. Foto: Juano Tesone.
 

Aos 45’, após sofrer falta pouco depois do meio de campo, Benedetto foi para a grande área. Villa percebeu o companheiro por lá e mandou a bola exatamente para o voraz boquense. No ar, Benedetto cabeceou sem nenhum problema e fez o segundo do Boca: 2 a 1. No banco, Schelotto, técnico xeneize, atentava seus jogadores de que o primeiro tempo estava acabando, para o erro de marcação do gol do River não ser repetido. Quando deu a saída e planejava o mesmo bote, o River sofreu falta no meio de campo e o Boca conseguiu preciosos segundos até o árbitro apitar o fim da primeira etapa. Os primeiros 45 minutos da superfinal estavam encerrados. Foram intensos. Emocionantes. Frenéticos. Com predomínio do River, mas vencidos pelo Boca.

Na etapa complementar, o Boca foi mais incisivo no ataque e o River permaneceu em seu campo de defesa, ainda estudando uma melhor maneira de empatar sem correr o risco de levar um terceiro gol – algo que àquela altura seria catastrófico. Os millonarios só chegaram pela primeira vez com perigo aos 10’, quando Montiel engatilhou um contra-ataque e cruzou rasteiro para a área boquense, mas Rossi conseguiu interceptar. Dois minutos depois, Pratto escorou um cruzamento e deixou com Casco, que encheu o pé, mas a bola subiu demais e passou por cima do gol. Aos 13’, Gallardo tirou um zagueiro (Lucas Martínez) e colocou um meia (Ignacio Fernández) para ser mais agressivo no ataque. Dois minutos depois, o time millonario teve uma falta a seu favor. Na cobrança, Pity Martínez mandou na área, Izquierdoz e Pratto foram nela, e o zagueiro do Boca acabou tocando primeiro. Acontece que esse toque mandou a bola para o fundo do gol. Empate do River: 2 a 2. La Bombonera ficou muda. A tensão aumentou ainda mais. O empate não era bom resultado para o Boca, embora não fosse o fim do mundo. Mas era inegável que deixava o River em situação mais confortável para o duelo de volta.

Benedetto teve a bola do jogo para virar. Mas Armani fez essa defesa aí…
 

O jogo ficou acelerado de novo, mas com menos espaços, os times marcando muito e um nítido medo de errar. Um estudava o outro. Nas disputas de bola, mais fibra, mais encontrões e mais faltas. Só aos 44’ que o Boca teve uma chance para matar o jogo. Tevez recebeu, correu em direção à área, escapou do carrinho do zagueiro e viu Benedetto livre. O veterano tocou para o camisa 18. Era ele e Armani. A chance do gol. A torcida atrás da meta millonaria já preparava a avalanche. Benedetto deu um tapa na bola. Mas Armani apareceu como um muro, como um bloqueio em uma estreita ruazinha de La Boca. A bola explodiu na coxa esquerda do arqueiro e se mandou dali. Foi a defesa do jogo. Quem sabe a defesa do título do River. Um gol feito não feito inacreditavelmente pelo bendito Benedetto. ¡Más que maledetto!, deve ter pensado o torcedor boquense.

Os times na decisão: River apostou em três zagueiros e nos ataques pelas pontas. Boca foi na pressão e no oportunismo. Tanto equilíbrio só poderia resultar em empate.
 

Com mais cinco minutos de acréscimos, o Boca se mandou desesperadamente ao ataque, mas o experiente River marcou a partir do meio de campo e não deu espaços. Conseguiu gastar aquele tempo restante. E o apito do árbitro soou como uma doce melodia aos millonarios. Era o fim dos últimos 45 minutos da final em La Bombonera, vencidos pelo River por 1 a 0. O primeiro capítulo da final terminava empatado em 2 a 2. La Bombonera aplaudiu. Os jogadores do Boca estavam apáticos. Rapidamente, o banco de reservas xeneize foi levar ânimo aos atletas. Nada estava perdido. Mais 90 minutos seriam peleados. Do outro lado, o inegável sorriso maroto dos millonarios brilhava até Belgrano. O empate estava ótimo para eles. Era só ganhar no coliseu do Monumental. Por 1 a 0. Meio a zero. Mas, claro, com todo o cuidado do mundo para não cair nas armadilhas que o Boca sempre tem em suas entranhas, ainda mais em Libertadores.

Da bagunça à festa eterna

A taça no Monumental: um dia lindo, ensolarado e perfeito que terminaria de maneira triste e vexatória. Foto: MARCELO CARROLL.
 

Para o duelo de volta, o River tinha problemas no ataque. Borré, suspenso, não jogaria. Outra grande esperança millonaria, Scocco, também foi descartado por causa de uma lesão – e justo ele que havia marcado gols em dois jogos contra o Boca em 2018. Entre os preparativos do superjogo, o River anunciou que iria triplicar o número de postos de atendimento médico no dia da final. Foi o recorde de ambulâncias, postos médicos e equipes em uma só partida de futebol na história da Argentina. Afinal, o Monumental seria o maior reduto para possíveis infartos no mundo naquele dia 24 de novembro, data do jogo da volta. Ao todo, foram nove ambulâncias de alta complexidade (com UTI móvel), 24 postos com 35 médicos e 17 enfermeiros, além de 45 macas. Espalhados pelas tribunas, estariam à disposição desfibriladores externos.

Porém, horas antes do jogo, uma cena lamentável aconteceu durante o trajeto do ônibus do Boca até o Monumental quando torcedores do River jogaram paus, pedras, latas e tudo o que viam pela frente contra o veículo. E isso acabou quebrando vários, isso mesmo, vários vidros do ônibus. E, através desses buracos, os selvagens travestidos de torcedores jogaram gás de pimenta dentro do veículo. Isso causou mal-estar em vários jogadores e, quando o ônibus chegou ao Monumental, mais confusão: alguns jogadores relataram agressões. A polícia teve que conter os torcedores com gás de pimenta e a ação acabou atingindo alguns atletas do Boca.

Veja a sequência de imagens acima: o ônibus segue em uma avenida… Mas, no final dela, dezenas e dezenas de torcedores do River esperam pela passagem do veículo… Falta de planejamento total!
 

A questão é que tudo isso poderia ter sido evitado. Foi um claro e patético erro de segurança. Ao invés de fazer um caminho totalmente seguro e com bloqueios previamente organizados pelo policiamento da partida, o ônibus do Boca, que tinha escudo e cores do clube, passou por um local repleto de torcedores millonarios e sem policiamento. A cena correu o mundo. Eles foram direto por uma avenida que terminava em uma curva tomada por torcedores. Por que ir por ali? Custava virar a esquina anterior? A reação dos selvagens não poderia ser outra, infelizmente. Foi como arremessar uma suculenta carne num rio cheio de piranhas. Com tudo aquilo, adivinhe: começaram a suspeitar do cancelamento do jogo por causa dos incidentes.

Médicos foram aos vestiários do Boca para examinar os jogadores e ver se havia a necessidade de adiamento do jogo. Almendra, Tevez, Villa e Pérez foram os mais afetados. O tempo passava e a partida não começava. Sob sol forte, os mais de 60 mil torcedores no Monumental não aguentavam mais de ansiedade. Faltava menos de meia hora e toda a multidão estava lá, quieta, olhando para as cabines de TV tentando um alento tipo “vai ter jogo?”. Diante daquela situação, ficava a dúvida: se o jogo fosse mesmo cancelado, como fazer para que as mais de 60 mil pessoas saíssem dali pacificamente?

Torcedores olham para as cabines de imprensa e buscam uma explicação. Sistema de som do estádio sequer atualizada as informações aos presentes.
 

Depois de muita conversa e especulação, o jogo foi adiado em uma hora. Com isso, começaria às 19h de Brasília (18h no horário de Buenos Aires). Quando o anúncio foi feito no estádio, a torcida imediatamente começou a cantar aliviada, pois o clima antes era de consternação e silêncio. Depois, mudaram para 19h20. Depois, para 20h20. Era uma angústia absurda. Muitos torcedores começaram a sair das arquibancadas para comer alguma coisa, espairecer ou até mesmo ir embora. Afinal, a maioria estava lá desde às 12h. Mais de seis horas sob sol, tensão, ansiedade.

Às 19h27, os xeneizes Tevez e Gago saíram para falar com a imprensa. Eles disseram que havia uma pressão dos dirigentes da Conmebol obrigando os jogadores a jogar mesmo com três atletas, incluindo o capitão, sem condição alguma de entrar em campo. Além disso, já havia passado muito tempo desde a última refeição dos jogadores. Eles estavam há cinco horas dentro do vestiário. Toda a preparação antes da partida foi destruída. Depois de muita especulação, eis que o jogo foi cancelado.

A final foi remarcada para o dia seguinte, 25 de novembro, no mesmo horário. Mas, óbvio, o Boca não via condição alguma de disputar o jogo depois de tanta bagunça. Não havia igualdade de condições e o clube xeneize enviou um comunicado à Conmebol dizendo exatamente isso. Por volta das 14h50 da tarde do dia 25, o jogo foi oficialmente adiado. Detalhe: os portões já haviam sido abertos e milhares de torcedores já se dirigiam ao estádio (!) e estavam no Monumental(!!). Ou seja: voltaram de novo. Por que raios não decidir isso na noite anterior!!!? Por que fazer com que pessoas e mais pessoas fossem até lá!!!!?

A maior final da história foi destruída pela selvageria, pelos barras bravas, pela escória humana e pela Conmebol. Uma coisa absurda. Uma série de equívocos jamais permitidos por autoridades como aquelas. Ninguém, em nenhum momento, pensou nos hinchas, nas famílias, nas pessoas de bem que iam curtir apenas o esporte, o futebol. E quem foi naquele domingo ao Monumental já foi triste. E, quando saiu, mais triste ainda. Foi uma cena lamentável, deplorável, vergonhosa e o retrato mais profundo de um triste momento social da Argentina.

Muitas especulações começaram a surgir sobre o rumo daquela final, principalmente o fato de o Boca querer o título nos tribunais usando como exemplo o insólito gás de pimenta de 2015, mas tal apelação foi negada. Até que, no dia 27 de novembro, a Conmebol anunciou que a partida iria ser jogada, sim, no fim de semana dos dias 8 e 9 de dezembro. Mas fora da Argentina, cogitando lugares como Catar, Paraguai ou EUA. O presidente da entidade disse que “a administração, junto com o conselho da Conmebol, decidiu que a partida, sujeita à decisão da comissão disciplinar (…) será disputada fora do território argentino porque entendemos que as condições não estão dadas”, e que “o futebol não é o que se viu neste fim de semana, isso é uma doença que precisa ser erradicada”. O duro era erradicar a final para longe dos torcedores que esperavam por aquela final, que haviam comprado ingressos e que queriam desfrutar daquele momento único do futebol. A Conmebol iria pagar a passagem de todos eles até o Catar? Pois é…

Até que, no dia 29 de novembro, a Conmebol deu o veredicto: a final seria disputada em Madri, no Santiago Bernabéu, dia 09 de dezembro, domingo, às 17h30, horário de Brasília (20h30 hora de Madrid e 16h30 hora da Argentina). A escolha se deu pelo fato de a colônia argentina na Espanha ser grande e por questões de logística mais palpáveis. Além, claro, de a cidade ser muito mais vidrada e respirar futebol do que a petroleira Doha. O River foi penalizado por dois jogos com portões fechados em torneios da Conmebol e levou uma multa de 400 mil dólares, além de sua apelação de jogar em sua casa ou na Argentina também ter sido negada.

Já na semana do jogo, os barra-bravas que ousavam viajar até a Espanha sentiram na pele que ali eles não tinham vez nem voz. O número 2 da principal torcida do Boca, Maxi Mazzaro, foi deportado assim que desembarcou em Madri. A polícia espanhola tinha uma lista com os mais perigosos pseudo torcedores do Boca e não iria hesitar em mandá-los de volta a Buenos Aires. E, sob forte (e pensado) esquema de segurança, tudo ocorreu bem.

Voltando ao jogo, toda essa confusão foi benéfica ao Boca, pois o tempo ganho ajudou na recuperação de atletas que antes eram dúvida, como Ábila e Pavón, que chegaram em condições de jogo. Pérez, ferido no fatídico dia 24, também estava pronto. Só o River que tinha os mesmos problemas de antes, com as ausências de Scocco, Borré e de seu técnico, ainda suspenso, além de vir de uma eliminação na Copa Argentina pelo Gimnasia La Plata. Mas o River sabia de seu potencial e do grande jogo que fizera em La Bombonera. Ele tinha convicção da vitória. E queria o triunfo para aqueles mais de 60 mil torcedores que não puderam ver a final no Monumental. O técnico Gallardo também foi preciso nos detalhes. Logo quando chegou a Madri, ele foi conversar com Solari, técnico do Real e que jogou ao lado do meia entre 1996 e 1998 no próprio River. Gallardo quis falar com ele a respeito dos gandulas, para que eles fossem rápidos e “jogassem” a favor do River no dia do jogo. Além disso, a cidade de Madri era mais simpática ao River pelo fato de o maior ídolo da história do Real, Alfredo Di Stéfano, ter sido revelado pelo clube millonario.

Torcedores de Boca e River em Madri: clima totalmente diferente. Foto: Gabriel Bouys / AFP.
 

Por ser em campo neutro, a regra de torcida única não foi aplicada, e cada clube teve direito a uma carga de 25 mil ingressos. Os outros 22 mil disponíveis foram destinados a patrocinadores e público em geral, além de sócios do próprio Real Madrid. E apenas 10 mil ingressos foram vendidos aos residentes na Argentina, restringindo ainda mais a presença dos hinchas característicos dos clubes. No dia 09 de dezembro, enfim, a final aconteceu. Os times chegaram inteiros ao estádio. Os torcedores estavam comportados nas arquibancadas. Mas, de fato, não parecia final de Libertadores. Não teve a linda cobertura da torcida do River como no Monumental. Não teve chuva de papéis picados. Não teve fumaça. Foi uma final europeizada, elitizada. Sem aquele calor, sem aquela paixão que só a Libertadores tem.

Por mais que as torcidas fizessem o barulho característico, faltava um algo a mais. E esse algo a mais só poderia ser compensado pelos próprios gigantes que iriam entrar no gramado do Santiago Bernabéu: River e Boca. Eles deveriam assumir o protagonismo. Eles deveriam chamar a atenção. Todo aquele cenário deveria ser deixado em segundo plano. As instituições e suas camisas eram as grandes vedetes da noite espanhola. E privilegiados deveriam se sentir os que ali estavam. Que tudo o que aconteceu nos dias 24 e 25 de novembro, pelo menos naquele instante, fosse esquecido. Era a última esperança de torcer por um Superclásico do bem. Com futebol. Emoção. E gols.

Nada de papel picado, fumaça, bandeiras… Foto: AFP.
 

Perfilados e sob o som do hino argentino, os jogadores eram a personificação de mais de 100 anos de rivalidade. E estavam prontos para fazer história. Não era o cenário ideal. Mas eles tinham o poder de transformar o ocaso em espetáculo. Ali, na beira do gramado, a taça da Libertadores, avessa a tudo aquilo, só esperava ansiosa e reluzente pelo seu novo dono. Pela nova plaquinha em sua imponente base. E pela imortalidade adquirida após o apito final do maior Superclásico (em todos os sentidos!) de todos os tempos.

Com a bola rolando no primeiro tempo, o Boca foi mais incisivo quando tinha a bola, mas o River foi quem teve mais a redonda em seus pés, controlando a velocidade, marcando em cima, uma tática parecida com a do primeiro duelo. As chances foram poucas, um reflexo do nervosismo que um jogo daquele tamanho causava. Mas, antes do relógio chegar aos 45’, o Boca encontrou um contra-ataque quando Pérez recuperou e deixou com Nández. O camisa 15 tocou para Benedetto, que deu uma finta em Maidana, ficou no mano a mano com Armani, e, por um momento, relembrou aquele gol perdido em La Bombonera.

Mas ele tinha aprendido a lição. E não errou. Deu um tapa na bola típico de matador e fez 1 a 0. Na comemoração, o atacante fez careta para Montiel como quem diz “¡Soy su terror!”. E era mesmo! O River tentou a resposta, mas a etapa inicial ficou mesmo 1 a 0. Assim como no primeiro jogo, vitória do Boca no primeiro tempo mesmo com amplo domínio do River, que teve 67% da posse de bola e 192 passes contra 70 do rival. No entanto, foi o Boca que finalizou mais: 5 a 2.

Benedetto deixa Maidana para trás (Foto: AP)…
 
… E faz careta para o rival Montiel! Foto: Matthias Hangst / Getty Images.
 

Na etapa final, o Boca claramente entrou para segurar o resultado. Trouxe o River para seu campo. Era o jeito Boca de jogar. Mas era perigoso. Incisivo, o River passou a perambular ainda mais pelo campo do rival. Aos 10’, Andrada foi nas pernas de Pratto, mas o árbitro marcou falta de ataque. O VAR não foi acionado, mas foi falta do arqueiro. Dois minutos depois, Ponzio deu lugar a Quintero, e o colombiano melhorou bastante o toque de bola no elo entre o meio de campo e ataque. Depois de tanto insistir, eis que o River assinou uma obra-prima com a mais pura essência do futebol argentino. Aos 22’, na base dos passes perfeitos e de primeira, o time millonario chegou com Ignacio Fernández, que tocou para Palacios, que devolveu para Ignacio Fernández, que deu a bola para Pratto e este mandou pro gol. Que gol! Foi a vez do lado millonario gritar e pulsar no Bernabéu.

Pratto vibra: River estava mais vivo que nunca!
 

O River emergiu. Inflamou sua torcida. Jogava pela hinchada na Argentina e “pelos 66 mil”, como disse o capitão Ponzio. O Boca ficava encolhido, querendo a decisão por pênaltis. O River era superior, com cinco ataques até os 25’, contra apenas dois do Boca. Com o cronômetro chegando perto do fim, os nervos ficavam ainda mais à flor da pele. Já pensou levar um gol naquele finalzinho? Ninguém tinha coragem. Era melhor deixar tudo para a prorrogação.

Na segunda final, o River foi com dois zagueiros e apenas um homem na frente. No entanto, estilo de jogo da equipe, com toques rápidos e mais posse acabou envolvendo o Boca, que só jogou bem no primeiro tempo e preferiu abdicar do ataque.
 

Já no tempo extra, o Boca gastava o tempo. Mas o River não queria saber daquilo. Ele sabia que tinha mais técnica e mais futebol. E mais fôlego. E a missão millonaria começou a ser facilitada quando, aos 2’, Barrios levou o segundo cartão amarelo e foi expulso. O Boca ficaria 28 minutos com 10 jogadores. E com o meio de campo fragilizado ao máximo. Nández estava exausto. O capitão Pérez já tinha saído. Era o cenário perfeito para o River. Aos 8’, Quintero recebeu, chutou, mas a bola subiu. Dois minutos depois, outra chance do colombiano, mas sem efeito. O Boca estava bem cansado. O River, mais inteiro e ávido pela vitória. Tentava em cruzamentos, tentava nos passes em profundidade. O Boca não conseguiu chegar uma vez sequer na primeira etapa do tempo extra. A última tentativa do River foi de Pity Martínez, aos 15’, mas não tinha ninguém no meio da área para receber o passe do meia.

No segundo tempo, as torcidas começaram a fazer ainda mais barulho. Elas não paravam de cantar. E tanta melodia inspirou o jogador que mais chutava naquele tempo extra: Quintero. Aos 3’, o colombiano recebeu na entrada da área e chutou forte. A bola raspou no travessão, fez aquele barulho seco, bonito, e foi pro fundo do gol: 2 a 1. Era o prêmio ao time que mais atacava, que mais tentava. E o estopim para o jogo pegar fogo de novo.

Quintero corre pro abraço: River perto do título! Foto: AP.
 

Dois minutos depois, Ábila tentou no meio dos zagueiros, mas a bola ficou com Armani. Aos 5’, Tevez entrou e se transformou na esperança xeneize de uma nova arte do atacante, como naquele clássico de 2004. Aos 8’, Pratto tentou, no quatro contra três, mas o passe não saiu bom e Andrada ficou com a bola. O goleiro, desesperado, saiu jogando como se fosse um líbero! Era loucura! Tudo por um gol. Tudo pela glória eterna, histórica, para as enciclopédias, para o século. O mesmo Andrada foi para a área, aos 9’, em cobrança de escanteio. Com 1,93m de altura, ele era a esperança. Mas, depois de duas tentativas de tiro de canto, nada de gol. Ao invés de voltar, o camisa 1 ficou ali, depois do meio de campo. Para tentar concluir a jogada, Gago chutou de fora da área, mas Armani pegou.

Andrada já era goleiro linha. E o Boca, entrega total. Mas parecia tarde demais. Quando tinha a bola, o River tentava caprichar demais em busca do terceiro gol. Passados dez minutos do segundo tempo da prorrogação, o jogo era uma bagunça. Não tinha mais esquema. Não tinha tática. A torcida millonaria até arriscava um grito de “olé”. Aos 11’, o volante Gago se machucou sozinho e, um minuto depois, deixou o gramado e o Boca com nove jogadores. O River aproveitou e atacava sempre no três contra três ou até quatro contra três, mas a finalização deixava a desejar. O relógio chegava perto dos 15’. O grito de campeão estava entalado. Ninguém ousava gritar.

Aos 14’, Jara chutou no pé da trave direita do goleiro Armani, com desvio, e a bola foi para escanteio. Andrada foi outra vez para a área. O jogo era infartante. Escanteio cobrado, mas o árbitro mandou voltar. Veio o segundo. E outra vez ele mandou voltar. Quanta angústia! Na terceira, Armani tirou de soco, a bola sobrou com Quintero e ele tocou para Pity Martínez. O gol estava escancarado. Martínez saiu em disparada, sozinho, ele e o gol do Bernabéu. O único gol que teve suas redes balançadas naquela noite. Justamente o gol amparado pela torcida do Boca. Ela estava ali e via o atacante vestido de branco com a faixa vermelha. Uns choravam. Outros fechavam os olhos para não ver aquele golpe no coração. Alguns jogavam zica. Ou simplesmente viam, com os olhos marejados, a vinda cada vez mais próxima de Martínez. Era o cenário perfeito. Que hincha do River não queria estar no lugar dele? Era só fazer de qualquer jeito. Mas era contra o Boca. Sem pestanejar, Martínez olhou para trás primeiro, viu que o rival estava sob uma distância segura, e, na linha do pênalti, chutou no meio do gol. Pronto. 3 a 1. River campeão. De virada. O que poderia ser maior? Absolutamente nada. Era a glória eterna. Imensurável. Medí-la? Talvez amanhã. Mas, ao certo, nunca.

O placar, Martínez e o gol para a eternidade…
 

O árbitro nem se deu ao trabalho de recomeçar. O jogo acabou ali mesmo. O Santiago Bernabéu via a festa do tetracampeão da Libertadores mais confusa e bagunçada de todos os tempos. Mas que, felizmente, foi encerrada com uma ótima partida de futebol, com todos os ingredientes de uma grande final. Na hora da premiação, claro, os xeneizes desdenharam de suas medalhas. Queriam sumir dali. Para não voltar nunca mais. Já os millonarios eram festa, euforia. Maidana, Ponzio e Gallardo, foram os protagonistas na hora de levantar o troféu. Justamente o trio que virou símbolo da reconstrução do River após a página mais negra de sua história. Maidana, remanescente do descenso de 2011. Ponzio, capitão e presente desde 2012. E Gallardo, o técnico que se transformou naquele dia no maior de toda a história do River, com duas Libertadores conquistadas e outras sete taças, alcançando as nove taças vencidas pelo então técnico mais vitorioso do clube na história, Ramón Díaz.

O River foi campeão com sete vitórias, seis empates e apenas uma derrota em 14 jogos. Os millonarios marcaram 19 gols e sofreram nove. Pity Martínez foi eleito o craque da competição e, na premiação dos melhores do ano no continente do El País, o Top 3 foi todo do River: Pity Martínez em primeiro, Quintero em segundo e Armani em terceiro! Gallardo levou ainda o prêmio de melhor técnico da América.

Era o auge daquele River. Um time com uma força mental absurda, uma competitividade plena e que nunca se intimidava. Copeiro máximo e que batia sem dó e com juros no maior rival, conseguindo revanche em cima de revanche pelos tempos de sofrimento dos anos 2000. A Argentina tinha um novo rei. A América tinha um novo rei. E ele era o River Plate.

Quem quer saber de Mundial? Yo quiero mi casa!

Ao contrário de muitos clubes sul-americanos, aquele River de 2018 foi para o Mundial de Clubes da FIFA com a cabeça longe. Depois de vencer a final mais importante da história do clube, ficou difícil se concentrar na competição. E, já nas semis, o River foi eliminado nos pênaltis pelo Al Ain-EAU, após empate em 2 a 2 no tempo normal e derrota por 5 a 4 na marca da cal. Na disputa pelo terceiro lugar, os millonarios venceram o Kashima Antlers-JAP por 4 a 0 e ficaram com o bronze, deram tchau e se mandaram para Buenos Aires sedentos para rever sua torcida, familiares e amigos depois de longas e intensas semanas. A festa tomou conta da cidade e se estendeu até o Monumental, com estádio lotado, jogadores em cima de ônibus e a taça da Libertadores como a vedete da alegria. A torcida nem sequer ligou para o Mundial. O título do ano era aquela Libertadores, em cima do maior rival de sempre!

Base mantida e apetite por mais

Gallardo e Montiel. Foto: Reuters / Pablo Stefanec.
 

A concentração na América em 2018 mais uma vez custou o título do Campeonato Argentino, competição que teimava escapar das mãos do técnico Gallardo – o River terminou na 4ª colocação. No entanto, houve tempo para o goleiro Armani quebrar um recorde histórico ao permanecer 965 minutos sem levar gols – sendo nove jogos inteiros! -, superando marcas lendárias de Amadeo Carrizo (788 minutos), Montoya (825 minutos) e Jorge Traverso (842 minutos). O goleirão só não alcançou o goleiro Carlos Barisio, que em 1981 ficou 1075 minutos sem levar gols e segue em primeiro lugar, com Armani em segundo.

Para 2019, o time alvirrubro perdeu Pity Martínez para o futebol estadunidense e viu também as saídas de Rodrigo Mora (se aposentou), do zagueiro Maidana, que foi jogar no futebol mexicano e rompeu a famosa zaga “torres gêmeas” ao lado de Pinola, e do meio-campista Mayada (foi jogar no futebol mexicano). Mesmo com importantes baixas, o time manteve bons jogadores no plantel, Gallardo voltou a remanejar seu time e dar espaço a outros jogadores como De La Cruz e Matías Suárez e o escrete millonario seguiu como favorito em todas as competições do ano. Prova disso foi na disputa da Recopa Sul-Americana, contra o Athletico-PR, campeão da Copa Sul-Americana de 2018.

Mais uma Copa para a coleção. Foto: Juan Mabromata/AFP.
 

No primeiro duelo contra os brasileiros, na Arena da Baixada, o River perdeu por 1 a 0, mas conseguiu reverter o resultado com um categórico 3 a 0 no Monumental, gols de Ignacio Fernández, Lucas Pratto e Matías Suárez. Foi o terceiro título do River na competição e a 10ª taça de Gallardo à frente do clube, façanha que transformou o Muñeco no técnico mais vencedor da história millonaria! Foi ainda o 12º título internacional do clube, que ficou ainda mais próximo dos rivais Boca e Independiente, ambos com 18 taças.

Mesmo com perdas no elenco, era impressionante como Gallardo conseguia remanejar seu time e mantê-lo competitivo. A força do conjunto, com a prevalência de atletas sempre em boas condições físicas, eram os segredos do treinador. Por mais que um atacante tivesse uma rica história recente – como Lucas Pratto, grande goleador de 2018 -, se aparecia outro em melhor fase – como Rafael Borré, em 2019 -, Gallardo não hesitava em deixar o jogador em pior fase (no caso, Pratto) no banco.

Estar em melhores condições era um requisito fundamental para aquele esquadrão seguir forte. Afinal, jogando com muita força na marcação adiantada, forçando o erro do rival e toques rápidos em direção ao ataque exigia muito do físico e da técnica dos atletas. E os jogadores de meio de campo Enzo Pérez, Ignacio Fernández, Exequiel Palacios e De La Cruz seriam os grandes elementos do sucesso do time em 2019, com muita eficiência na marcação, ótimo toque de bola – principalmente de Fernández, em fase esplendorosa -, dribles e visão de jogo.

Nova saga americana

Tarimbado e campeão, o River começou sua caminhada no Grupo A da Libertadores de 2019 com três empates: 1 a 1 contra o Alianza Lima-PER (fora), 0 a 0 com o Palestino-CHI (em casa) e 2 a 2 com o Internacional-BRA (fora), este um jogo marcante de De La Cruz, que marcou um gol e foi decisivo para o time buscar o empate após perder o primeiro tempo por 2 a 0. Só no returno que os millonarios voltaram a vencer e garantiram a vaga em segundo lugar após vitórias sobre Alianza Lima (3 a 0, em casa) e Palestino (2 a 0, fora), e empate em 2 a 2 com o Inter em casa. Nas oitavas, o time argentino enfrentou mais uma vez o Cruzeiro e empatou as duas partidas em 0 a 0, embora tenha criado inúmeras chances de gols, principalmente no duelo no Mineirão. A decisão da vaga foi para os pênaltis, e deu River: 4 a 2, com eficiência plena de Borré, De La Cruz, Martínez Quarta e Montiel.

Nas quartas de final, a classificação veio após vitória por 2 a 0 sobre o Cerro Porteño-PAR, na Argentina, e empate em 1 a 1 no Paraguai. Em busca de um lugar na primeira final única da Libertadores – que aconteceria exatamente em 2019 – o River tinha um último desafio. E um velho conhecido: o Boca Juniors. De novo…

La Quinta por la quinta!

Foto: Pablo Stefanec/Reuters.
 

Mesmo sem o peso do ano anterior, um novo Superclásico na Libertadores balançou novamente as emoções dos amantes do futebol. Felizmente, após os erros de segurança, tudo correu bem e os dois jogos puderam ser realizados tanto no Monumental quanto em La Bombonera. O River, claro, era favorito, pois o Boca já não tinha boa parte dos jogadores que se destacaram na campanha de 2018 – entre eles Pérez e Benedetto. Gallardo tratou de minimizar o clima de “revanche” dizendo que o “jogo de sua carreira já havia sido disputado e vencido”, se referindo à final do ano anterior. Mas é claro que o Muñeco quis completar a quina de vitórias sobre o rival em mata-matas. No duelo de ida, no Monumental, Borré e Ignacio Fernández fizeram os gols da vitória por 2 a 0 sobre o Boca, resultado excelente que deixou o River muito confortável para a volta. O domínio do River sobre o rival foi enorme, provando a boa fase do elenco e a maturidade de um time acostumado aos jogos decisivos. Na volta, La Bombonera tentou jogar junto com o Boca, mas o River só levou um gol e a derrota por 1 a 0 não foi suficiente para tirar os millonarios da final.

Borré comemora: River despachou o rival Boca pelo segundo ano seguido na Libertadores.
 

Estava sacramentada a quinta derrota do Boca em duelos eliminatórias contra o River de Gallardo. Tudo começou lá nas semifinais da Sul-Americana de 2014, passou pelas oitavas da Libertadores de 2015, em seguida a Supercopa Argentina de 2017, o ápice com a final da Libertadores de 2018 e o desfecho com a semifinal da Libertadores de 2019. O time alvirrubro aumentou para 13 o número de triunfos em duelos de mata-mata contra o rival em 18 disputados em toda a história. Nunca o River havia conseguido um predomínio tão absoluto contra seu rival de toda vida. Era o maior pesadelo possível para o torcedor xeneize, que não conseguia engolir derrota atrás de derrota para os alvirrubros. Gallardo comentou sobre a classificação.

“É um pouco de tudo. Somos uma equipe que sabe também jogar em condições adversas. Hoje, quando não conseguimos desabrochar nosso jogo, tivemos que lutar. Sabemos sofrer também. Para chegar em uma final de Libertadores, tem que passar por momentos em que tem que saber sofrer. E nós sofremos. O Boca tem um poderio aéreo muito forte, acabou fazendo um gol. Volto a tirar meu chapéu para esse grupo de jogadores, que tiveram esse espírito e essa fome de seguir. Temos um passo a mais. […] Tenho uma alegria enorme pelos jogadores e pela torcida que deve estar feliz de jogar outra final de Libertadores, deixando o Boca fora. Felicidade que não cabe no meu corpo”. Marcelo Gallardo, em entrevista publicada no Fox Sports, 23 de outubro de 2019.

A festa foi enorme e a divindade de Gallardo só aumentou. Aquele River estava cada vez mais na história, nos livros, nas enciclopédias. Mais do que isso, era o primeiro time a alcançar duas finais de Libertadores seguidas desde o São Paulo de 2005-2006. E poderia conquistar duas Libertadores seguidas desde o Boca Juniors 2000-2001.

Campeões por 88 minutos…

Borré chuta para marcar o primeiro do River no jogo. Foto: REUTERS / Henry Romero.
 

A primeira final única da história da Libertadores colocou frente a frente River Plate e Flamengo no estádio Monumental “U”, em Lima, no Peru. Era, de fato, a decisão com os times que praticavam o melhor futebol do continente, com jogadores em grande fase e muito talento. Todos esperavam um jogo equilibrado, mas o que se viu no primeiro tempo foi um “nó” de Gallardo no técnico Jorge Jesus. Com muita organização e disciplina tática, o time millonario não cedia espaços e o Flamengo não conseguia impor seu futebol rápido e de pressão no ataque. Experiente e frio, o River sabia o que fazer com a bola. Nada abalava os nervos daquele esquadrão. Até que, aos 14’, Enzo Pérez tocou na direita para Ignacio “Nacho” Fernández, este cruzou na área, a zaga rubro-negra não tirou dali e a bola sobrou para Borré, que chutou de primeira, sem marcação e chance alguma para Diego Alves: 1 a 0.

Borré comemora ao lado de De La Cruz e Casco. Foto: REUTERS / Pilar Olivares.
 

Todos pensaram que a partida iria pegar fogo, com o Flamengo indo pra cima, ao seu estilo, jogo aberto e tudo mais… Mas não. O River é quem controlava as principais jogadas. Com lançamentos rápidos para seus jogadores de ataque, o time estava mais perto do segundo gol do que o Flamengo do empate. O meio de campo rubro-negro simplesmente não existia. Gabriel e Bruno Henrique sequer apareciam. A zaga millonaria guardava a dupla e não tirava do bolso. Aos 20’, Suárez recebeu na esquerda, cruzou e De La Cruz quase teve uma grande chance para fazer o segundo.

Everton Ribeiro e De Arrascaeta não criavam. Filipe Luís e Rafinha ficavam presos. Willian Arão errava passes. Aliás, o time todo errava passes de maneira incomum. E o River só acertava. E roubava bolas e mais bolas. Em um desses desarmes, De La Cruz tomou de Everton Ribeiro, deixou com Matías Suárez, que chutou de fora da área e quase fez. Aos 36’, Montiel avançou pela direita, tocou para Borré, este deixou com Palacios, que chutou de longe e quase, mas quase fez o gol. Era chocante. O Flamengo não era nem uma caricatura do time que tanto massacrava os rivais nas partidas anteriores. Já o River impunha autoridade. Jogava como o campeão que era e como o bicampeão que almejava ser. Gallardo impedia as ações rápidas, reduzia os espaços dos atacantes brasileiros.

Os times em campo: River foi dono do jogo no ataque e na defesa. Mas isso até os 88 minutos…
 

Aos 43’, Borré chutou cruzado para boa defesa de Diego Alves, mas o auxiliar marcou impedimento. Ao apito do árbitro, o River, naqueles primeiros 45 minutos, era campeão da América mais uma vez. E seguiu assim no segundo tempo. Bem, isso até Gallardo tirar Ignacio “Nacho” Fernández, um dos melhores jogadores do River no jogo, e colocar Julián Álvarez. Foi um erro. A partir daquele instante, o time argentino iria afrouxar a marcação. Por que raios sacar justo aquele jogador? Cansaço? Talvez. Cinco minutos depois, Borré saiu e entrou Lucas Pratto, que não era nem de longe o artilheiro decisivo de 2018.

Gabriel disputa bola com Pinola. Foto: REUTERS / Pilar Olivares.
 

O River foi ficando menos agressivo, menos intenso. E o Flamengo, mais acordado. Dois minutos depois, Diego recebeu na entrada da área, tocou para Gabriel, que deixou com Everton Ribeiro. O camisa 7 cruzou, De Arrascaeta tentou um voleio plástico, ao seu estilo, mas a bola só espichou. Diego ainda pegou o rebote, mas mandou para fora. Segundo lance mais lúcido do Flamengo no jogo. Aos 35’, Palacios, de novo ele, quase fez o gol. O jogo entrou nos cinco minutos finais. Os argentinos contavam os segundos para uma façanha incrível, um bicampeonato, o terceiro caneco em cinco anos, uma hegemonia avassaladora, a consagração do mais copeiro River de todos os tempos. Já o Flamengo temia o fim, um novo fracasso, mais um ano como órfão de uma geração. Até que, aos 42’, Lucas Pratto perdeu a bola para De Arrascaeta, que deu um carrinho perfeito e desarmou o rival. Ele mesmo engatilhou um contra-ataque e viu os espaços que tanto o Flamengo buscou o jogo inteiro. O camisa 14 tocou para Bruno Henrique, na esquerda, que escapou da marcação, foi para lá, para cá, chegou perto da meia-lua e devolveu para De Arrascaeta. O uruguaio cruzou rasteiro, aos 43’, e Gabriel, o iluminado, fez o gol de empate.

Gabigol comemora: o Fla ainda tinha força! Foto: Ernesto Benavides / AFP.
 

A torcida flamenguista explodiu em Lima. Os jogadores, extasiados, viam a esperança do título voltar. Jorge Jesus tentou conter a comissão técnica e os reservas, pois ainda havia jogo. O River vivia um pesadelo. E fantasmas do passado já assombravam o torcedor. Gallinas de novo? Assim como em 1966, na final perdida para o Peñarol por 4 a 2 após estar vencendo por 2 a 0? Assim como em 2004, nas semis contra o Boca? Ou como em 2017, nas semis contra o Lanús? Pesadelos não faltavam. E outro parecia surgir. O Flamengo se agigantou. No primeiro minuto após o fim dos 45’ regulamentares, Diego, lá no campo de defesa e com a bola dominada, lançou uma bola perfeita para Gabriel. Ela deu um pingo no gramado. O zagueiro Pinola, que passou o jogo inteiro sem dar trégua para o camisa 9 rubro-negro, deu de presente a bola para o jogador brasileiro.

Sem hesitar, sem enrolar, sem lenga lenga, do jeito que ela veio, o atacante disparou o petardo certeiro: 2 a 1. O jogo recomeçou, mas o Flamengo manteve a bola consigo. Teve tempo ainda para Palacios ser expulso após chutar Bruno Henrique no campo de ataque e Gabriel também levar vermelho, após o quarto árbitro flagrar o jogador zombando da torcida argentina e dos jogadores do River no banco sacudindo os órgãos genitais. Passado o rebuliço, que felizmente não teve brigas nem grandes confusões, o árbitro finalizou a partida.

Gabriel sai para comemorar um dos gols mais épicos da história do Flamengo. (Foto: REUTERS / Henry Romero).
 

O Flamengo venceu sua segunda Libertadores na história. E o River sucumbiu. Foi um duro revés para um time que dominou o jogo durante 88 minutos, mas tirou o pé no final, cansou e deu os espaços que não poderia dar. De fato, não existe time perfeito. Mas ainda sim o River perdeu jogando bola, sem mudar seu estilo, sendo o River tão audacioso e brigador que a América se acostumou a ver desde 2014. Para o técnico Gallardo, foi a segunda derrota mais dolorida daquela sua trajetória. A primeira seguia a contra o Lanús, em 2017.

Mesmo com a derrota, o treinador voltou a ser eleito o melhor técnico da América do Sul em 2019, superando o campeão flamenguista Jorge Jesus. Gallardo foi inclusive exaltado naquele ano por Pep Guardiola, que disse ser uma injustiça tremenda o argentino não ter figurado na lista dos melhores do mundo da FIFA.

“O que o Gallardo tem feito no River é incrível a nível de resultados. Dá consistência em um ano, e outro ano, e outro ano. Se vão jogadores, mas ele segue lá. Há coisas que não explico muito: são nomeados três treinadores para o melhor do ano e ele nunca está. […] Parece que existe apenas a Europa no mundo, e eu não entendo como Gallardo não é indicado entre os melhores treinadores do mundo. Não apenas por um ano, mas sim por tanto tempo”. – Pep Guardiola, técnico do Manchester City, em entrevista publicada no globoesporte.com, 04 de outubro de 2019.

A 11ª glória

Foto: Getty Images/Alexis Lloret.
 

Na volta para casa, o River Plate foi recebido com uma enorme festa por sua torcida, que reconheceu profundamente o desempenho do time. Foi uma prova de devoção máxima ao time e que emocionou a todos os jogadores e comissão técnica. O elenco sofreu outra baixa com a negociação de Exequiel Palacios ao Bayer Leverkusen-ALE, mas compensou a dor do vice continental com mais um título: a Copa Argentina, vencida após vitória por 3 a 0 sobre o Central Córdoba. Pelo caminho, o River passou por Gimnasia y Esgrima de Mendoza (1 a 1 e 5 a 4 nos pênaltis), Godoy Cruz (1 a 0), Almagro (2 a 0) e Estudiantes BA (2 a 0). O troféu foi a 11ª conquista do clube na Era Gallardo e a terceira Copa Argentina nas últimas quatro disputadas.

Um River para toda a história

O River de 2014-2019 já escreveu um capítulo único na história do futebol. Foi o maior vencedor da América do Sul na década de 2010, o River mais vencedor de todos os tempos e marcou a ressurreição de um clube gigantesco, que saiu do período mais dramático de sua centenária história para glórias em profusão em um curto espaço de tempo de maneira impressionante. Foi um time que soube se reconstruir ano após ano mesmo com as saídas de importantes jogadores. Um time com uma mentalidade vencedora que sempre batalhou e brigou pelas glórias. E teve em Marcelo Gallardo o grande arquiteto e estandarte de tempos de glórias inesquecíveis e uma hegemonia inapelável e irrepreensível perante o maior rival. O que foi visto durante seis anos pelas bandas do Monumental nunca havia acontecido. Nem nos tempos de La Máquina. Nem nos tempos de Onega e Carrizo. Nem com o timaço de Alonso, Alzamendi, Ruggeri, Gallego e Pumpido. Nem no River de Francescoli, Crespo e Ortega. Só vimos no River de Sánchez, Barovero, Gutiérrez, Scocco, Pisculichi, Alario, Maidana, Ponzio, Enzo Pérez, Palacios, Pratto, Martínez, Borré, Fernández… E Gallardo. Um River Plate mais do que imortal. Único. El Más Grande de toda la historia.

Os personagens:

(OBS.: o River teve vários outros jogadores nesse período vitorioso. Listamos abaixo os principais e mais marcantes)

Armani: ídolo do Atlético Nacional, deixou o clube colombiano para jogar no River Plate com o intuito de chamar a atenção do técnico Jorge Sampaoli e ter uma vaga no elenco da Argentina para a Copa do Mundo de 2018. A tática deu certo, ele foi convocado e o River ganhou um goleiraço fundamental para a campanha vitoriosa daquele ano mágico. Com reflexos apurados e defesas impressionantes, Armani pegou tudo e mais um pouco em 2018, ficou quase 1000 minutos sem levar gols no Campeonato Argentino e foi o melhor goleiro da América do Sul. Manteve a regularidade em 2019, embora tenha caído um pouco de produção no segundo semestre. Entre 2018 e 2019, disputou mais de 80 jogos e sofreu pouco mais de 50 gols.

Barovero: foram quatro anos de River e presença fundamental nos títulos que reergueram o gigante do Monumental. O arqueiro defendeu pênaltis, garantiu resultados decisivos e foi um dos ídolos da torcida entre 2012 e 2016. Foi um dos melhores goleiros do continente naquele período e disputou mais de 165 jogos pelo River. Deixou o alvirrubro para jogar no futebol mexicano.

Batalla: cria das bases, teve algumas chances no time entre 2016 e 2017, mas perdeu espaço após a chegada de Armani. Jogou no Atlético Tucumán e no Tigre e depois foi jogar no futebol chileno.

Montiel: lateral-direito, cresceu muito de produção sob o comando de Gallardo e foi um dos destaques do time entre 2017 e 2018. Rápido e com bons passes, foi muito importante para o estilo de jogo daquele esquadrão, com força na marcação e domínio de bola. Esteve nos sete títulos conquistados pelo River entre 2016 e 2019.

Mayada: o uruguaio podia atuar como meio-campista e também na lateral-direita, com características mais defensivas. Chegou em 2015 e disputou mais jogos entre 2016 e 2017. Não teve uma sequência maior por causa de um doping sofrido em 2017 por causa de um diurético que o afastou dos gramados por sete meses. Deixou o River em 2019.

Mercado: lateral-direito, foi um dos destaques do River entre 2014 e 2015 não só pela eficiência no setor defensivo, mas também por aparecer na área em jogadas aéreas e marcar gols importantes, como na decisão da Copa Sul-Americana de 2014 e da Copa Suruga de 2015. Deixou a equipe para jogar no Sevilla, em 2016. Disputou 146 jogos pelo River e marcou 11 gols entre 2012 e 2016. Ganhou espaço, também, na seleção argentina, pela qual disputou a Copa do Mundo de 2018.

Maidana: se tornou um dos grandes ídolos da torcida pela identificação com o River e por permanecer no clube mesmo nos tempos difíceis do rebaixamento. Jogou de 2010 até 2018 no clube e disputou quase 300 jogos. Forte na marcação e no jogo aéreo, não dava moleza para os atacantes rivais e demonstrava muita raça e disposição. Fez uma dupla de zaga emblemática ao lado de Pinola durante a campanha do título da Libertadores de 2018. Foi eleito um dos melhores zagueiros da América do Sul em 2015 e 2018.

Pezzella: cria das bases do River, começou no time titular em 2011 e teve várias chances no miolo de zaga ao lado de Maidana quando Gallardo assumiu o time. Foi um dos destaques na campanha do título da Copa Sul-Americana e marcou um gol na decisão contra o Atlético Nacional. Deixou o River em 2015 para jogar no futebol europeu.

Paulo Díaz: o zagueiro chegou em 2019 para suprir a ausência de Maidana. Já com ampla bagagem por suas passagens pelo Palestino, San Lorenzo e também pela seleção chilena, Díaz foi bem nas oportunidades que teve, embora não tenha conseguido a titularidade plena por causa da boa fase de Martínez Quarta ao lado de Pinola.

Pinola: chegou em 2017 após uma conturbada saída do Rosario Central e encontrou a paz no Monumental. Ao lado de Maidana, fez uma dupla de zaga temida pelos adversários e muito segura, com força física, bom posicionamento e regularidade. Após a saída do companheiro, virou capitão do time em 2019 e fez grandes jogos. Seu único “pecado” foi ter baixado a guarda nos minutos finais da decisão da Liberta contra o Flamengo. Ele havia anulado Gabigol durante 88 minutos. Mas um jogo tem 90 minutos e quase sempre alguns acréscimos… Ele se esqueceu disso. Deu no que deu. Mesmo assim, foi um dos principais nomes daquele esquadrão multicampeão.

Funes Mori: cria do River e de família de futebolistas, o defensor jogou de 2011 até 2015 no River e foi um dos pilares do sistema defensivo do time campeão argentino e da Sul-Americana em 2014 e também da Libertadores de 2015. Disputou 109 jogos e marcou 11 gols pelos millonarios, além de ter recebido algumas convocações para a seleção argentina no período.

Casco: chegou em 2015 e se tornou titular da lateral-esquerda com muita disciplina tática e força na marcação, embora às vezes chegasse com muito apetite e cometesse faltas desnecessárias. Jogou com mais regularidade a partir de 2016 e foi um dos destaques do time campeão da Libertadores de 2018. Não costumava aparecer muito no ataque, pois tinha mais eficiência na proteção à zaga para as investidas dos meias.

Vangioni: após alguns anos no Newell’s, chegou ao River em 2012 e escreveu seu nome no clube com um futebol muito eficiente, sendo um dos destaques da reconstrução do time naquele período. Aparecia na frente para municiar os atacantes e meias com passes precisos e tinha muito vigor físico. Ficou até 2016 no clube e ganhou quase tudo o que disputou – só faltou o Mundial de Clubes. Deixou o River para jogar no Milan-ITA. Foram 131 jogos e cinco gols pelos millonarios.

Enzo Pérez: meio-campista tarimbado e experiente, chegou para dar ainda mais qualidade defensiva ao River, possibilitando mais alternativas de ataque sem enfraquecer a zaga. E o jogador cumpriu à risca sua função com um futebol de alto nível, titular absoluto e um dos grandes nomes do time campeão da América em 2018. Disputou quase 100 jogos pelo River entre 2017 e 2019 e marcou quatro gols.

Ariel Rojas: o meio-campista podia atuar como volante central ou mesmo mais aberto pela esquerda, sempre com muita visão de jogo, bons passes e presença no ataque. Foi titular durante a campanha do título nacional de 2014 e também na conquista da Copa Sul-Americana daquele ano. Com as boas contratações que a diretoria fez após 2015, entre elas Fernández, Palacios e Martínez, Rojas acabou perdendo espaço e foi negociado ao futebol mexicano. Disputou 153 jogos, marcou três gols e deu 15 assistências pelo River.

Kranevitter: ao lado de Rojas e Sánchez, compôs o ótimo meio de campo do River multicampeão em 2014 e 2015. Tinha uma leitura de jogo notável, um fôlego privilegiado, ótimos passes e muita liderança. Embora tenha sofrido uma grave lesão durante o Campeonato Argentino de 2014, voltou a tempo para ajudar o time em várias partidas. Acabou negociado em 2015 para jogar no Atlético de Madrid.

Ponzio: sem dúvida, um dos maiores símbolos do River da segunda década do século. Líder, extremamente identificado com a camisa millonaria, um jogador que veste as cores de fato de sua equipe. Passou por momentos difíceis, alegres, foi criticado, mas sempre deu a volta por cima em campo, com seu estilo de jogo brigador, ávido, com muita entrega na marcação e sempre bem posicionado. Entre suas duas passagens pelo River, de 2007 até 2008 e de 2012 até 2019, disputou 326 jogos e marcou 10 gols, além de dar 17 assistências. Conquistou 14 títulos com a camisa millonaria.

Lucas Martínez Quarta: cria das bases, passou a ganhar oportunidades no time titular sob o comando de Gallardo e garantiu a titularidade principalmente na temporada de 2019, além de ter disputado vários jogos em 2018. Muito calmo e seguro, supriu bem a saída de Maidana do time e ganhou a confiança da torcida.

Ignacio “Nacho” Fernández: virou o motor do meio de campo do River a partir de 2016 como referência no estilo de jogo do time, com a marcação alta, os contra-ataques imparáveis e o passe preciso. Com uma visão de jogo privilegiada, muita habilidade e eficaz nas investidas ao ataque, virou ídolo da torcida e referência de um time multicampeão e competitivo. Com uma perna esquerda habilidosa, marcou vários gols – foram 25 em 163 jogos -, e deu 21 assistências entre 2016 e 2019. Já é um dos maiores jogadores da história do clube neste século XXI.

Bertolo: o meia teve algumas oportunidades em 2015 e 2016, mas não conseguiu desempenhar seu melhor futebol por causa da concorrência no setor. Deixou o River já em 2016.

Pisculichi: virou o talismã do River nas conquistas de 2014 e 2015 com sua velocidade e faro artilheiro principalmente nos duelos decisivos – que o diga o Boca, vítima do jogador na Sul-Americana de 2014. Sua principal virtude, no entanto, era abrir espaços nas zagas e dar passes precisos aos companheiros. Jogou de 2014 até 2016 no River, disputou 73 jogos, marcou 10 gols e deu 17 assistências.

Tabaré Viudez: experiente, o uruguaio chegou ao River na reta final da Libertadores de 2015 e teve destaque nos duelos contra o Guaraní-PAR, dando o passe para o gol de Alario que empatou o jogo e garantiu o time argentino na decisão. Jogou a primeira final, mas se contundiu e acabou de fora do segundo jogo. Ficou no River até 2016 e foi jogar no Nacional-URU.

Quintero: o meia colombiano chegou em 2018, e, quando estava em forma e não brigando com a balança, foi decisivo e importantíssimo para o River com suas investidas ao ataque, chutes perigosos de fora da área e tabelinhas com os companheiros. Marcou um gol épico na decisão da Libertadores de 2018 contra o Boca em um momento crucial do jogo. Ganhou ainda vários prêmios individuais naquele ano. Se tivesse mais cuidado com a forma, seria titular absoluto daquele River – quase sempre foi um reserva de luxo. Disputou 55 jogos, marcou 11 gols e deu sete assistências no período.

Exequiel Palacios: habilidoso, rápido e com boa presença de ataque, foi outro criado pelas canteras do River que ganhou notoriedade sob o comando de Gallardo. Após alguns jogos esporádicos entre 2015 e 2017, virou titular em 2018 e foi um dos destaques do esquadrão campeão da América – foi dele o passe para o gol decisivo de Pity Martínez, contra o Boca, em Madri. Foi eleito um dos melhores jogadores do continente em 2018 e recebeu ainda convocações para a seleção argentina. Entre 2015 e 2019, disputou 87 jogos, marcou 10 gols e deu 11 assistências. Foi negociado ao Bayer Leverkusen-ALE no final de novembro de 2019, logo após a decisão da Libertadores.

Carlos Sánchez: o uruguaio despontou para o continente vestindo a camisa do River e, com muita habilidade, gols decisivos e precisão nos chutes de média e longa distâncias, se tornou uma das referências do time de Gallardo entre 2014 e 2015, podendo atuar tanto como um meio-campista mais recuado como um meia que distribuía passes e aparecia lá na frente para finalizar. Marcou gols em todos os momentos que o River mais precisou: na final da Copa Sul-Americana de 2014, nas duas partidas da final da Recopa Sul-Americana de 2015 e ainda na final da Libertadores de 2015, além de ser dele o gol da vitória sobre o Boca nas oitavas daquela mesma competição. Foi o melhor jogador da América em 2015. Jogou no River de 2011 até 2013 e de 2014 até 2015. Foram 137 jogos, 28 gols (12 só em 2015!) e 17 assistências. Simplesmente incontestável!

D’Alessandro: veio por empréstimo apenas em 2016, e, no clube que o revelou, ajudou o time a vencer a Recopa Sul-Americana e a Copa Argentina daquele ano. Disputou 30 jogos e marcou cinco gols naquele retorno.

De La Cruz: irmão de Carlos Sánchez, fez grandes jogos em 2018 e 2019, e, assim como o irmão, faturou uma Libertadores. Figurou mais no time titular na temporada de 2019 com muita velocidade e polivalência no meio de campo, abrindo espaços nas defesas e dando passes precisos para os atacantes. Entre 2017 e 2019, disputou 78 jogos, marcou 11 gols e deu 19 assistências.

Borré: atacante oportunista, chegou ao clube em 2017 e passou a brilhar mais intensamente entre 2018 e 2019. Bem posicionado e com facilidade para chutar de primeira, foi uma das grandes armas de ataque do técnico Gallardo. Disputou 105 jogos, marcou 36 gols e deu 13 assistências no período.

Gonzalo Martínez: outra contratação certeira de Gallardo, o atacante foi decisivo no time principalmente em 2018 e provou com gols e muitas assistências a confiança em seu futebol. Rápido, técnico e oportunista, foi uma das grandes revelações argentinas no período. Entre 2015 e 2018, Pity disputou 163 jogos, marcou 35 gols e deu 34 assistências, o maior garçom millonario do esquadrão multicampeão. Sua frieza no gol da classificação contra o Grêmio, na semifinal da Liberta de 2018, e o gol na final contra o Boca ainda elucidam muitos sonhos do torcedor. E gera pesadelos eternos aos tricolores e xeneizes. Fez muita falta em 2019.

Alario: o atacante fez história entre 2015 e 2016 com gols decisivos tanto na final da Libertadores quanto na infartante decisão da Copa Argentina de 2016 – na qual ele fez três e ainda foi o artilheiro da competição. Chegou até a ser comparado com Enzo Francescoli pelo estilo de jogo, a velocidade e os gols. Foi convocado para a seleção argentina e ganhou a idolatria da torcida. Ficou de 2015 até 2017 no River, disputou 83 jogos e marcou 42 gols, além de dar 13 assistências.

Matías Suárez: revelado pelo Belgrano, foi cedo para a Europa e jogou oito temporadas no Anderlecht-BEL. Chegou ao River em 2019 e foi titular em vários jogos, atuando como meia e também atacante. Marcou um gol e deu passe para outro nos 3 a 0 sobre o Athletico-PR, na final da Recopa de 2019, e jogou algumas partidas da campanha do vice-campeonato da Libertadores.

Lucas Pratto: chegou à peso de ouro no River por mais de 10 milhões de dólares, a maior contratação da história do clube na época. O investimento foi correspondido com gols marcantes, principalmente nas finais da Libertadores contra o Boca, e também na trajetória do time ao longo da temporada. Se identificou rapidamente com a torcida e viveu um ano mágico. Só em 2019 que não foi bem e passou a frequentar mais o banco de reservas com a ascensão de Borré. Disputou 91 jogos pelo River no período, marcou 22 gols e deu 18 assistências.

Teófilo Gutiérrez: o colombiano estava iluminado em 2014, ano em que foi o melhor jogador das Américas, convocado para a seleção colombiana na Copa do Mundo e ainda peça-chave no time do River campeão argentino e também da Copa Sul-Americana. Rápido, driblador e oportunista, foi uma referência do setor ofensivo do time de Ramón Díaz e também de Gallardo. A badalação o levou ao futebol europeu em 2015. Disputou 70 jogos pelo River entre 2013 e 2015, marcou 28 gols e deu oito assistências.

Cavenaghi: cria das bases do River, é outro que passou pelos maus e bons momentos naquela transformação do clube. El Torito foi o capitão do River na Série B, e, já em 2014, levantou a histórica Copa Sul-Americana e o Argentino. Nesse retorno, o atacante marcou 21 gols em 53 jogos e ainda deu seis passes para gols. Embora não tenha sido titular absoluto, sempre correspondeu quando entrou.

Rodrigo Mora: fez uma boa dupla de ataque ao lado de Gutiérrez na campanha do título da Copa Sul-Americana de 2014 e foi o artilheiro do time com quatro gols em oito jogos. Brilhou ainda em 2015, quando marcou 14 gols em 41 jogos. Com as contratações de outros atacantes após 2015, perdeu espaço no time até se aposentar em 2018.

Driussi: mais uma cria das bases do River, despontou em 2014 e foi uma das alternativas do técnico Gallardo para o ataque. Por causa da concorrência no setor naqueles primeiros anos, teve mais chances entre 2016 e 2017, quando anotou 25 gols em 44 jogos, além de dar cinco assistências. Deixou o River em 2017 para jogar no Zenit, da Rússia.

Scocco: muito identificado com o Newell’s Old Boys, conseguiu apagar o estigma que tinha com o clube de Rosário e escreveu seu nome na história do River com gols decisivos – muitos sobre o Boca Juniors – e grandes atuações. Marcou 22 gols em 42 jogos entre 2017 e 2018, e teve uma atuação de gala na remontada de 8 a 0 sobre o Jorge Wilstermann pela Libertadores de 2017, na qual marcou cinco gols.

Ramón Díaz e Marcelo Gallardo (Técnicos): Ramón Díaz teve grande mérito ao montar o River campeão argentino de 2014, primeiro grande título do clube após a queda para a segunda divisão, mas esse River de 2014-2019 entrou para a história por causa de Marcelo Gallardo. O que ele fez no clube millonario já está cravado na memória do torcedor e do amante do futebol como algo impressionante, único, incontestável. Ano a ano, ele soube remontar seu time, pincelar reforços promissores a um bom preço no mercado, incorporou jovens das categorias de base, não hesitou em mudar esquemas táticos ou maneiras de jogar, sufocou rivais, não teve medo de arriscar seja jogando em casa, seja fora, e colecionou recordes e mais recordes, alcançando um aproveitamento superior a 60% em seis anos.

Mais do que isso, sempre foi fiel ao seu clube de coração, negando qualquer rumor de transferência para outros clubes (muitos disseram que ele iria para o Barcelona em 2017) ou mesmo para a seleção argentina. De quando assumiu o River, em 2014, até dezembro de 2019, Gallardo comandou o time em 285 jogos, venceu 147, empatou 80 e perdeu 58. O River marcou 480 gols e sofreu 252, um saldo positivo de 228 gols. Venceu 22 dos 26 mata-matas sul-americanos que disputou pelo River de 2014 até 2019, aproveitamento de quase 85%. Venceu 11 títulos, e, somando as taças que conquistou como jogador pelo clube, possui 19 troféus, atrás apenas de Ángel Labruna, que detém 22 no total. Gallardo já é o maior treinador da história do River Plate. Sem contestações. Um imortal do futebol.

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