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Craque Imortal – Edgar Davids

Foto: Pierre Minier / Onze / Icon Sport

 

Foto: Marcus Brandt/Bongarts/Getty Images)

 

Nascimento: 13 de Março de 1973, em Paramaribo, Suriname (à época colônia da Holanda).

Posições: Volante e Meia.

Clubes: Ajax-HOL (1991-1996 e 2007-2009), Milan-ITA (1996-1998), Juventus-ITA (1998-2004), Barcelona-ESP-empréstimo (2004), Internazionale-ITA (2004-2005), Tottenham Hotspur-ING (2005-2007), Crystal Palace-ING (2010) e Barnet-ING (2012-2014).

Principais títulos por clubes: 1 Mundial Interclubes (1995), 1 Liga dos Campeões da UEFA (1994-1995), 1 Copa da UEFA (1991-1992), 1 Supercopa da UEFA (1995), 3 Campeonatos Holandeses (1993-1994, 1994-1995 e 1995-1996), 2 Copas da Holanda (1992-1993 e 2006-2007) e 1 Supercopa da Holanda (1995) pelo Ajax.

3 Campeonatos Italianos (1997-1998, 2001-2002 e 2002-2003) e 1 Supercopa da Itália (2003) pela Juventus.

1 Copa da Itália (2004-2005) pela Internazionale.

Principais títulos individuais:

Eleito para o All-Star Team da Copa do Mundo da FIFA: 1998

Eleito para o All-Star Team da Eurocopa: 2000

FIFA 100: 2004

 

“The Pitbull”

Por Guilherme Diniz

 

Ele tinha apenas 1,69m de altura, mas em campo se transformava em um ser imponente, implacável, onipresente. Você olhava para qualquer lugar do meio de campo e lá estava ele, correndo, correndo e correndo. Se você fosse um camisa 10, coitado, receberia provavelmente a marcação mais ferrenha e angustiante de sua carreira, como se um Pitbull estivesse à sua cola o tempo todo querendo te morder. Além de anular grandes craques e desarmá-los incontáveis vezes, aquele pequenino meio campista tinha velocidade, explosão, driblava quem visse pela frente e, vez ou outra, disparava chutes poderosos de fora da área. 

Com uma carreira repleta de títulos e exemplo de superação ao continuar jogando usando óculos especiais por conta de um glaucoma, Edgar Steven Davids, ou simplesmente Davids, foi um dos mais completos e talentosos meio-campistas dos anos 1990 e 2000 e reconhecido por muitos como um dos melhores da história. Lenda do Ajax e ídolo na Juventus, o craque teve uma trajetória marcante e brilhou, também, pela seleção da Holanda, com a qual fez uma Copa do Mundo em 1998 simplesmente sensacional e, mesmo com a eliminação da equipe na semifinal, ele foi eleito para o All-Star Team daquele torneio. É hora de relembrar.

 

Bravo por natureza

Edgar Davids em sua apresentação no Ajax, em 1992, ainda sem os dreadlocks. Foto: VI Images via Getty Images

 

Davids nasceu em 1973 em Paramaribo, capital do Suriname, época na qual o país ainda era uma colônia holandesa – a independência veio dois anos depois, em 1975. Filho de pai africano e mãe judia, ele se mudou ainda criança para Amsterdã (HOL), onde teve uma vida difícil e encontrou no futebol a válvula de escape para superar as dificuldades do cotidiano. Nos jogos com os garotos de seu bairro, Davids demonstrava desde cedo ser temperamental, não levando desaforo para casa e se impondo mesmo com a baixa estatura. Jogando futebol de rua ao lado do irmão, Lorenzo Davids, Edgar desenvolveu muita habilidade, técnica e virou o “dono da rua” em sua vizinhança. Após jogar um tempo na equipe amadora do ASV Schellingwoude, Davids tentou a sorte no Ajax em duas oportunidades ainda na infância, mas foi rejeitado. Só na terceira tentativa, aos 12 anos, que conseguiu uma vaga no clube de Amsterdã.

Treinando em uma das melhores escolas – para muitos, a melhor – de base do mundo, Davids aprendeu princípios táticos importantes e a jogar em dois toques. Foi ganhando mais chances nas equipes titulares dos juniores e acompanhado de perto por Louis van Gaal, então auxiliar dos Godenzonen. Van Gaal seria treinador do Ajax a partir de 1991 e não hesitou em levar o jovem para o time profissional naquele ano. O técnico já era fã do futebol de Davids, dizendo que ele parecia um “pitbull”, pela ferocidade com a qual marcava seus adversários. Além de tal qualidade, Davids se destacava pela imensa categoria com a bola nos pés, saindo bem com a bola, iniciando contra-ataques e arriscando chutes de fora da área. Ele ainda não se intimidava e aplicava dribles desconcertantes nos rivais.

A estreia de Davids no time titular aconteceu em 06 de setembro de 1991, na goleada de 5 a 1 do Ajax sobre o Waalwijk. No mês seguinte, anotou seu primeiro gol e acumulou 16 jogos na temporada 1991-1992, sendo três na caminhada do título da Copa da UEFA. Com apenas 18 anos, ele até que teve várias chances mesmo com o Ajax contando na época com nomes como Aron Winter e Van ‘t Schip, ainda os preferidos de Van Gaal. Porém, aquilo ia mudar rapidamente.

 

Ascensão e estrela em um esquadrão imortal

A temporada 1992-1993 foi a segunda com mais jogos na carreira de Davids pelo Ajax. O meio-campista disputou 41 jogos e marcou 12 gols, um deles na goleada de 6 a 2 sobre o Heerenveen na final da Copa da Holanda. Com grandes estrelas vindo das categorias de base como Overmars, Seedorf, Bergkamp, Van der Sar e os irmãos De Boer, o Ajax começaria a partir daquela época a levantar títulos em profusão e se tornar um dos maiores esquadrões daquela década e também do século XX. Os alvirrubros foram tricampeões holandeses entre 1993 e 1996, venceram uma Supercopa da Holanda e, acima de tudo, levantaram em 1995 a Liga dos Campeões da UEFA, o Mundial Interclubes e a Supercopa da UEFA. Davids foi um dos expoentes daquele timaço graças aos seus desarmes precisos, marcação implacável nos mais diversos craques e gols pontuais – foram 5 em 31 jogos. 

O inesquecível Ajax de 1995 – Em pé: Van der Sar, Seedorf, Rijkaard, Finidi George, Frank de Boer e Danny Blind. Agachados: Litmanen, Reiziger, Davids, Overmars e Ronald de Boer.

 

O meio-campista compôs o quarteto que até hoje o torcedor alvirrubro não esquece: Rijkaard, Seedorf, Litmanen e Davids, jogadores que eram o “número 4” do 3-4-3 que Van Gaal impôs naquele time. Na zaga, ficavam Reiziger, Blind e Frank de Boer, enquanto que no ataque brilhavam Finidi George, Ronald de Boer e Overmars. Além de todas essas feras, o Ajax ainda tinha Kluivert, Kanu e Bogarde. Uma curiosidade é que Davids quase não jogou a final da UCL contra o Milan, pois havia passado por uma cirurgia no olho esquerdo e teve que correr contra o tempo para se recuperar a tempo. Ali, era o primeiro sinal de um problema que seria revelado anos depois.

Kluivert, Bogarde e Davids, pelo Ajax.

 

Na temporada 1995-1996, o craque assumiu de vez as ações do meio campo após as saídas de Seedorf e Rijkaard e foi essencial no título nacional com 7 gols em 28 jogos. Naquela época, Davids já era figura constante, também, na seleção holandesa, pela qual estreou em 1994. Porém, em 1996, durante a disputa da Eurocopa, o craque passou por um momento desagradável ao ser cortado da seleção pelo técnico Guus Hiddink, que não gostou quando Davids deu uma declaração na zona mista após a vitória sobre a Suíça por 2 a 0, na fase de grupos, dizendo que “Ele [Hiddink] deveria parar de lamber o saco dos jogadores brancos, para ver melhor o time”. Hiddink obviamente ficou sabendo daquilo e mandou Davids de volta para a Holanda. Ali, começou uma grave crise entre os jogadores e comissão técnica conhecida como De Kabel, que quase arruinou uma geração inteira de atletas na equipe laranja. Leia mais clicando aqui.

 

Da crise à volta por cima 

O ano de 1996 realmente foi de altos e baixos para Davids. Além do corte na Euro, ele perdeu um pênalti na final da Liga dos Campeões da UEFA diante da Juventus, erro que, ao lado do também cometido por Silooy, custaram o bicampeonato consecutivo aos holandeses, que viram os italianos vencerem por 4 a 2 e celebrarem o título europeu. Em crise, o meio-campista não figurou entre os convocados da Holanda no restante de 1996 nem em todo ano de 1997. Com o fim de seu contrato no Ajax, Davids preferiu se arriscar no futebol italiano e assinou, junto com seu compatriota Reiziger, um acordo com o Milan. Porém, o clube rossonero vivia uma fase tenebrosa e Davids ainda por cima quebrou a perna em fevereiro de 1997, o que acabou abreviando consideravelmente sua passagem por Milão. Com isso, em dezembro daquele ano, a Juventus topou apostar no jogador e o levou para Turim.

Recuperado da lesão e com vontade de provar seu valor, Davids encaixou de maneira plena no esquema do técnico Marcello Lippi, que definiu o holandes como “uma sala de máquinas de um homem só”. E, de fato, ele era mesmo. Cada vez mais dinâmico, rápido e com uma precisão de desarme impressionante, Davids entrou de vez para o rol de grandes jogadores do futebol mundial e fez uma parceria inesquecível ao lado de Zidane. Enquanto o francês construía jogadas plásticas, distribuía a bola e enxergava o jogo, Davids era o terror para os rivais, o homem que roubava a bola e entregava para o francês se esbaldar. 

Foto: Allsport

 

Sua passagem pela Juventus foi muito bem-sucedida, com o holandês contribuindo significativamente para o sucesso do clube nas competições nacionais e internacionais. Durante sua estadia em Turim, conquistou três títulos da Serie A e alcançou a final da Liga dos Campeões em 1998, quando perdeu para o Real Madrid. Foi pela Juventus que Davids teve o diagnóstico de glaucoma e passou por intervenções cirúrgicas que quase o fizeram desistir da carreira.

 

“Sim, foi um grande golpe (o glaucoma). Fiquei preocupado e pensei que talvez precisasse me aposentar. Mas então descobri que havia uma opção: usar óculos de proteção. Foi estranho a primeira vez que toquei neles: eles ficavam mais fortes e demorava para me ajustar, mas não acho que isso tenha afetado meu desempenho”. Davids, em entrevista à revista Four Four Two, 1º de janeiro de 2010.

 

Com isso, ele acabou utilizando principalmente a partir de 1999-2000 os óculos especiais desenvolvidos para a prática do futebol, aliado a um colírio especial que teve que ser permitido pela FIFA em uma regra de exceção para não ser captado em exames antidoping. Antes, em fevereiro de 1998, Davids teve uma conversa presencial com o técnico Guus Hiddink, na qual confirmou sua volta à seleção para a disputa da Copa do Mundo de 1998. E, com ele, a Holanda ganhou ainda mais força para brigar pelo título na mais forte seleção a ir para um Mundial desde a geração dos anos 1970. 

Davids, motor turbo do meio de campo da Holanda de 1998.

 

Quando a bola rolou, o que Davids jogou naquele Mundial foi algo impressionante. Desarmou, passou, cruzou, marcou… Enfim, foi completo, como bem sabiam os torcedores do Ajax e da Juventus, clubes por onde ele mais desfilou suas virtudes. Os jogos mais emblemáticos do craque naquele Mundial foram, sem dúvida, na reta final. Nas oitavas, marcou o gol da vitória por 2 a 1 sobre a Iugoslávia. Nas quartas de final, na vitória por 2 a 1 sobre a Argentina, deu uma arrancada fulminante do meio de campo, entrou na área e quase marcou um gol antológico. Pouco depois, arriscou de longe para a bola defesa de Roa. E, nas semifinais, foi o Pitbull que atazanou a vida de Ronaldo Fenômeno no infartante Brasil 1×1 Holanda daquela noite em Marselha. 

Davids chega junto e impede gol de Ronaldo.

 

Ele desarmou, marcou e se desdobrou de maneira descomunal naquele jogo épico, sem dúvida um dos cinco ou seis maiores de todas as Copas. Ali, Davids praticamente garantiu sua presença no All-Star Team do Mundial, o que realmente aconteceu. A Holanda acabou derrotada nos pênaltis e ficou em quarto lugar. Mas o futebol de Davids chegou ao mais alto patamar após aquela Copa.

 

Troféus e mudanças

Após a Copa e de começar a utilizar óculos, Davids seguiu jogando o fino. Com a habilidade do futebol de rua, a experiência de jogos grandes e o fôlego privilegiado, o craque dominava as ações do meio de campo da Juventus e, mesmo com a saída de Zidane, continuou a esbanjar sua classe e vitalidade na equipe. Em 2000, pela seleção, disputou outra Eurocopa, mas a Holanda acabou eliminada nos pênaltis para a Itália na semifinal. Quando questionado sobre qual time foi melhor, Davids nunca escondeu seu carinho pela seleção de 1998. 

 

“O time de 98 foi melhor por causa do ambiente, dos jogadores. A equipe estava muito equilibrada. Mas é o que é – é uma das melhores equipas em que joguei, mas não é uma desilusão. O que você pode dizer? No Euro 2000, perdemos dois pênaltis durante os 90 minutos na derrota nas semifinais para a Itália. Nunca joguei um jogo em que houvesse dois pênaltis perdidos. Então, é o que é”. 

 

Davids, no entanto, foi eleito para outro All-Star Team como um dos melhores do torneio. Em 2003, o craque ajudou a Juventus a disputar outra final de UCL, mas os pênaltis (de novo!) impediram o troféu do holandês e da Velha Senhora – o Milan foi o campeão. Na época 2003-2004, Davids acabou emprestado ao Barcelona, que começava sua era sob o comando de Frank Rijkaard, velho conhecido de Davids. Foram apenas seis meses na Catalunha, mas o suficiente para reerguer o time, ainda sob as sombras do rival, e ajudar a pavimentar o caminho para Ronaldinho e companhia chegarem ao topo. Ele disputou 18 jogos, marcou um gol e ajudou o Barça a ficar com o vice-campeonato espanhol. 

Foto: Getty Images.

 

Ainda em 2004, Davids queria ficar em definitivo no Barcelona, mas problemas burocráticos minaram seus desejos. Com isso, ele foi jogar na Internazionale, mas por lá acabou jogando menos do que merecia sob o comando de Roberto Mancini. Isso acabou influenciando em seu adeus à seleção holandesa, com a geração dos anos 1990 cada vez mais escassa nas convocações. Seu último jogo foi em 2005 e ele acabou preterido por Marco van Basten nos convocados para o Mundial de 2006.

Na Inter, Davids jogou bem menos do que poderia. Foto: Imago.

 

Após a Inter rescindir seu contrato em 2005, Davids foi jogar no Tottenham e virou um dos xodós da torcida. Com seus desarmes precisos e ainda com fôlego, fez partidaças e retomou o bom futebol. Os títulos, porém, não vieram. Após 44 jogos e um gol, Davids retornou ao Ajax em 2006 e foi titular na caminhada do título da Copa da Holanda de 2006-2007, com o gol dele na decisão por pênaltis – enfim, com final feliz! Uma lesão na perna em julho de 2007, porém, prejudicou um desempenho melhor do antigo ídolo, que deixou Amsterdã em 2008.

 

Aposentadoria e vida esportiva

 

Davids flertou com outros clubes após sua saída do Ajax, mas só jogou brevemente pelo Crystal Palace, em 2010-2011 e pelo pequenino Barnet em 2012-2014, quando foi inclusive treinador-jogador e utilizou a camisa 1 mesmo jogando no meio de campo. Em janeiro de 2014, após desavenças, se demitiu e pôs fim à sua carreira em definitivo. Aposentado, Edgar Davids não se afastou completamente do esporte. Ele passou por experiências como treinador e consultor, toca projetos de futebol de rua e foi auxiliar técnico de Louis van Gaal na Copa do Mundo de 2022, quando a Holanda alcançou as quartas de final, mas perdeu para a futura campeã Argentina em um jogaço que teve muita briga no final, com participação, claro, de Davids, que jamais fugiu de uma discussão ou desavença. Durante aquele jogo, com certeza Davids deve ter pensado em um duelo entre ele e Messi. Se ele pararia o craque argentino? Sim, várias e várias vezes. Um pitbull é sempre difícil de ser controlado… 

 

Números de destaque:

 

Disputou 188 jogos e marcou 32 gols pelo Ajax.

Disputou 228 jogos e marcou 10 gols pela Juventus.

Disputou 74 jogos e marcou 6 gols pela seleção da Holanda.

 

 

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