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Corinthians x Palmeiras – Derby Paulista

Por Guilherme Diniz

 

A rixa: ambos tiveram origem nas classes trabalhadoras de São Paulo e foram os responsáveis por levar o futebol às classes mais populares da cidade – afinal, ele era totalmente elitista naquele começo de século XX. Os alviverdes surgiram nas colônias italianas espalhadas principalmente pelo Bixiga, Brás, Mooca e Barra Funda, enquanto os alvinegros cresceram associados às camadas mais populares, de operários, no Bom Retiro. Como praticamente monopolizaram as torcidas da capital, os confrontos entre ambos virou um clássico instantâneo. Ainda mais com as provocações que os próprios jogadores e torcedores começaram a fazer entre si a partir de 1918.

Quando começou: o primeiro jogo aconteceu no dia 06 de maio de 1917, com vitória do então Palestra Itália por 3 a 0 sobre o Corinthians, com três gols de Caetano. Mas a rivalidade nasceu mesmo após o duelo do dia 13 de maio de 1918, pelo Campeonato Paulista. Antes do jogo, torcedores palestrinos jogaram um osso pela janela de um restaurante em que jogadores corintianos almoçavam, no centro de São Paulo, com um bilhete dizendo: O Corinthians é canja para o Palestra”. Até aquele momento, o Palestra não sabia o que era derrota para o Corinthians em quatro jogos disputados. Após estar perdendo por 1 a 0 e 3 a 2, o Corinthians arrancou um heroico empate em 3 a 3. Foi hora da réplica. Os corintianos retrucaram com uma mensagem no mesmo osso: “Esse osso era para a canja. Mas não cozinhou por ser duro demais”. Estava dada a largada para o Derby.

Maior artilheiro: Cláudio (Corinthians): 21 gols

Quem mais venceu: Palmeiras – 134 vitórias (até fevereiro / 2024). O Corinthians venceu 129. Foram 116 empates.

Maiores goleadas: Palmeiras 8×0 Corinthians, 05 de novembro de 1933

Palmeiras 6×0 Corinthians, 25 de abril de 1948

Corinthians 5×1 Palmeiras, 27 de agosto de 1952

Corinthians 5×1 Palmeiras, 1º de agosto de 1982

Eles nasceram sob o mesmo ideal: levar o futebol às classes mais populares da sociedade paulista. Frequentaram os mesmos bairros. Tiveram constelações de estrelas em diferentes épocas. Sempre criaram polêmicas e provocações de diferentes tipos, jeitos, tamanhos. Um jogo entre ambos sempre vale mais que um título. Se for por um título, o troféu é um mero bônus. A vitória será sempre mais saboreada. É um choque de milhões. Um duelo de alviverdes e alvinegros que se evitam. O alvinegro repele o verde a ponto de não comer verdura só por causa da cor. E o alviverde evita o preto e branco em tudo, seja no prato (arroz branco com feijão preto? Nunca!), no cotidiano (caminhar pelos arredores do Parque São Jorge é proibido) e até na sinuca (nunca usarás a bola 8). Corinthians e Palmeiras é isso e muito mais. É um confronto centenário, cujas histórias são transmitidas de pai para filho. É de equilíbrio, até mesmo quando um está bem e o outro nem tanto assim. E de explosão pura quando os dois estão em fases de esplendor, como nos anos 30, 40, 50, 90 (ah, que década…) e 2010.

Um Derby nos anos 1920.

 

Quando o futebol era restrito às camadas mais nobres de São Paulo, eles construíram, juntos, as sólidas bases para a popularização daquele esporte junto às classes operárias. Todos tinham o direito de torcer e vibrar. O futebol merecia e podia ser democrático. Em 1910, o Sport Club Corinthians Paulista foi fundado por trabalhadores do Bom Retiro, inspirados pela excursão do Corinthian FC, de Londres (ING), pelo Brasil na época. Já em 1914, o novato clube foi campeão invicto e com 100% de aproveitamento do Campeonato Paulista da Liga Paulista de Futebol, mesmo ano em que um grupo de imigrantes italianos, motivados pela presença no Brasil de dois clubes da Itália – o Pro Vercelli e o Torino -, fundou, em agosto daquele ano, o Palestra Itália, que seria a representação da colônia italiana em São Paulo no futebol. Com isso, muitos italianos que antes torciam pelo Corinthians acabaram virando a casaca e abraçaram as cores do novo clube, estritamente ligado à Itália e não tão plural como o time alvinegro.

Ano a ano, os clubes começaram a se popularizar entre as classes mais baixas da cidade e, em 1917, disputaram o primeiro jogo entre si, com vitória de um novato Palestra sobre o já experiente Corinthians por 3 a 0, com três gols de Caetano, em um estádio da Barra Funda chamado Parque Antárctica, da Companhia Antarctica Paulista, que na época locava o estádio até vendê-lo para o Palestra, em 1920. Curiosamente, o alviverde não conheceu derrotas para o alvinegro nos primeiros encontros e venceu o segundo duelo (3 a 1), empatou o terceiro (3 a 3), e venceu o quarto (4 a 2). Antes da quinta partida, porém, o clima relativamente amistoso que pairava sobre a dupla começou a mudar para sempre após o “caso do osso” relatado acima. A partir daquele ano, alviverdes e alvinegros iniciaram definitivamente um dos maiores, mais acirrados, mais quentes e mais equilibrados clássicos do Brasil e do mundo.

Em setembro de 1920, quatro dias após o aniversário de dez anos do Corinthians, um clássico entre os dois teve os primeiros ingredientes de tensão envolvendo jogadores em campo. Quando o Corinthians vencia o rival por 2 a 1, o alvinegro Neco se chocou com o alviverde Primo e o encontrão gerou uma briga generalizada. Na discussão, Neco tirou a cinta que segurava seu calção (os uniformes eram beeeeeem diferentes naquela época) e ameaçou o rival. O fato encheu a torcida corintiana de orgulho, que passou a gritar nos jogos posteriores “tira a cinta!” ao ídolo. No entanto, justamente em 1920, o Palestra venceu seu primeiro Campeonato Paulista.

Neco, ídolo corintiano.

 

O Palestra campeão de 1920.

 

Em 1922, os rivais disputaram um amistoso que valeu taça pela primeira vez: a Taça Cântara Portugália. O Corinthians venceu por 2 a 0 (gols de Gambarotta e Neco) e levantou o primeiro troféu em um duelo contra o rival na história. No começo dos anos 30, a rivalidade aumentou ainda mais com a boa fase do Palestra. Entre julho de 1930 e agosto de 1934, o alviverde acumulou 11 vitórias e um empate em 12 jogos, que se tornou a maior série invicta do time na história do confronto. E com requintes de crueldade do atacante palestrino Romeu, que virou o terror dos corintianos. Veja alguns resultados daquela série e os gols:

24 de agosto de 1930 – 4 a 0 (Serafini, Romeu, Ministrinho e Heitor)

29 de março de 1931 – 3 a 1 (Gagliardo, Romeu e Heitor)

07 de setembro de 1931 – 2 a 0 (Romeu e Heitor)

15 de novembro de 1931 – 3 a 2 (Heitor, Osses e Romeu)

06 de novembro de 1932 – 3 a 0 (Sandro e dois de Romeu)

07 de maio de 1933 – 5 a 1 (dois de Romeu, dois de Gabardo e um de Carazzo)

05 de novembro de 1933 – 8 a 0 (quatro de Romeu, três de Imparato e um de Gabardo)

O atacante Romeu (à esq.), terror dos alvinegros na goleada de 8 a 0.

 

Só nesses sete jogos, Romeu anotou 11 gols. E os quatro que ele marcou na goleada de 8 a 0 jamais foram superados até hoje. Aliás, essa foi a maior goleada da história do clássico e causou sérios estragos no Corinthians. Teve quebra-quebra no Parque São Jorge após o duelo e a torcida alvinegra inclusive ateou fogo em parte do estádio como protesto. Toda a diretoria do Corinthians caiu, incluindo o presidente Alfredo Schurig. E, para piorar, no jogo preliminar a esse duelo entre os times B de Corinthians e Palestra, deu alviverde: 4 a 0. Ou seja: em um só dia, foi Palestra 12×0 Corinthians. Dá pra imaginar isso nos dias atuais?

Para completar uma era inesquecível, o Palestra ainda faturou o Campeonato Paulista de 1936 em cima do rival, com vitória por 2 a 1 na finalíssima. Em 1938, um fato curioso: os rivais, juntamente com a Portuguesa, participaram de um torneio organizado pelo São Paulo. Corinthians e Palestra empataram sem gols e o Timão foi para a final contra a Lusa (o alvinegro venceu por 2 a 1) por causa do saldo de escanteios (2 a 0). O jogo ficou conhecido como “Jogo das Barricas”, pois os torcedores depositavam o dinheiro em barricas antes de entrar no estádio. Toda a renda foi revertida ao São Paulo, que não passava por um bom momento financeiro. Mas vale lembrar que os torcedores não eram obrigados a pagar para ver os duelos, mas sim contribuir com alguma quantia caso pudessem comprando “cartões de lembrança”.

 

O Derby, a Era dos gols e dos ídolos

Em agosto de 1940, Palestra e Corinthians disputaram o último jogo da história do confronto no Parque São Jorge. E foi uma partida emblemática. Um torcedor palestrino levou um galo pintado de verde ao estádio para provocar o Corinthians. Mas o Timão venceu por 2 a 0 e a torcida alvinegra caçou o galo e o depenou. Duas penas estão guardadas até hoje na sede do clube. Naquela década, o Palestra acabou mudando de nome para Palmeiras por causa da eclosão da II Guerra Mundial e por não poder fazer menções aos países do Eixo, e jamais voltou a disputar um jogo no tradicional campo alvinegro. Foi naquela época, também, que o clássico ganhou o apelido de Derby graças ao jornalista Thomaz Mazzoni, que comparou o jogo ao Derby de Epsom, uma famosa corrida de cavalos inglesa realizada desde o século XVIII que virou sinônimo de principal jogo, principal partida, principal evento esportivo.

E foi exatamente a partir dos anos 40, com o batizado e a inauguração do Pacaembu, que o clássico viveu momentos de grandes jogos e muitos gols. Placares como 4 a 1, 4 a 2, 3 a 3 e 4 a 3 foram bastante comuns. Nos anos 50, o Palmeiras venceu o Torneio Rio São Paulo de 1951 após duas vitórias sobre o rival na final: 3 a 2 e 3 a 1, este último com show de Jair Rosa Pinto, autor de dois gols. Em 1952, a equipe alvinegra aplicou sua maior goleada até então: 5 a 1, com quatro gols de Carbone e um de Cláudio. Em 1953, um Derby alucinante terminou Corinthians 6×4 Palmeiras, e é até hoje o com maior número de gols em toda a história. Em 1954, enfim, veio o troco do Timão em um duelo decisivo. O clube formou um de seus mais lendários esquadrões e foi campeão do Campeonato Paulista do IV Centenário de São Paulo justamente após um empate diante do Palmeiras, em 1 a 1.

 

A mítica linha de ataque do Corinthians de 1951: Cláudio, Luizinho, Baltazar, Carbone e Mário.

 

 

Aqueles anos 50 ficaram marcados pela série de dez jogos (sete vitórias e três empates) sem derrota do Corinthians sobre o Palmeiras, entre julho de 1952 e julho de 1954, e também pelo auge do trio Cláudio, Luizinho e Baltazar, até hoje os maiores artilheiros do Timão no clássico com 21, 20 e 19 gols respectivamente. Nos anos 60, foi a vez do Palmeiras começar a equilibrar as coisas com a Academia comandada por Julinho, Vavá, Servílio e Ademir da Guia, um dos poucos times do Brasil que conseguia na época duelar com o Santos de Pelé. E foi justamente naquele período que o Corinthians enfrentou seu maior jejum de títulos – mas ainda sim conseguiu derrotar o rival em algumas ocasiões graças a Flávio, Dino Sani e um abusado e talentoso garoto chamado Rivellino.

A Academia do Palmeiras dos anos 60 é um dos maiores esquadrões da história do futebol brasileiro.

 

Em 1969, os alvinegros começaram a provocar o rival com o apelido de “porco”, que surgiu em quando dois jogadores do Corinthians morreram em um acidente automobilístico e o clube precisou contar com a unanimidade em uma reunião do conselho arbitral da Federação Paulista de Futebol para inscrever dois novos jogadores para substituir os falecidos. No entanto, o representante do Palmeiras votou contra e impediu a inscrição, causando indignação dos corintianos, que criticaram o “espírito de porco” do cartola. No duelo seguinte a esse caso, a torcida alvinegra começou a chamar o rival de “porco” e o apelido virou o pior dos xingamentos para os alviverdes, que durante décadas odiavam ser chamados assim. Só no final dos anos 80 que eles adotaram de vez o animal como “segunda mascote” (junto com o periquito, o tradicional, lá dos anos 1910) e o tom pejorativo de antes virou combustível para cânticos de apoio ao time.

Ademir da Guia e Rivellino: gênios que marcaram a história do Derby.

 

O Derby com maior público da história, em 1974: mais de 120 mil pessoas! Crédito: ARQUIVO / ESTADÃO CONTEÚDO/AE.

 

Nos anos 70, o Derby passou a ser mais disputado e menos cheio de gols. Os placares pirotécnicos de antes deram lugar a muitos empates e resultados magros. Naquela década, os times fizeram outra decisão de Campeonato Paulista, em 1974, e deu Palmeiras: 1 a 0, gol de Ronaldo, no jogo que marcou o recorde de público em um Derby na história: mais de 120 mil pessoas lotaram o Morumbi, sendo a grande maioria de alvinegros, que tinham certeza do fim do jejum. Mas eles não conseguiram superar a segunda Academia de Leão, Luis Pereira, Dudu, Ademir da Guia, Edu, Leivinha e companhia.

Após o jogo, a torcida azucrinou o rival cantando “Zum, zum, zum… É 21”, em alusão aos anos de fila do Corinthians na competição – só em 1977 que a seca do Timão iria terminar. Naquele jogo, ficou marcada uma foto em que Rivellino é consolado pelo zagueiro palmeirense Luis Pereira. Ele foi praticamente expulso do time por “entregar o jogo”. E a imagem captada pela revista Placar na época virou a representação da derrota.

A foto da Placar que causou a saída de Rivellino do Corinthians.

 

Acontece que, ao contrário do que pensavam, o consolo de Pereira não foi no final do jogo, com a vitória alviverde consolidada. Foi em um lance corriqueiro, após Rivellino reivindicar uma falta não marcada pelo juiz. Só depois, em um contra-ataque, que o Palmeiras fez seu gol. Curiosamente, o técnico do Palmeiras na época era Oswaldo Brandão, o mesmo que brilhou no próprio Corinthians lá nos anos 50. Foi nos anos 70, também, que os rivais se enfrentaram pela última vez no Parque Antárctica: em janeiro de 1976 (empate em 1 a 1). Depois daquele jogo, eles se enfrentaram mais no Morumbi, por ser maior, possibilitar rendas mais vertiginosas aos clubes e ser neutro – os rivais jogaram esporádicas vezes no Pacaembu. Só nos anos 2010, com as construções dos novos estádios de ambos, que o clássico passou a ser disputado nas respectivas casas de alviverdes e alvinegros.

Casagrande deu show na goleada de 5 a 1 do Timão em 1982.

 

Jorginho, do Palmeiras, na Placar de 1986, ano em que o clube alviverde assumiu o porco como mascote.

 

Nos anos 80, foi a vez do Corinthians viver grandes momentos e o rival aturar um jejum angustiante. Em 1982, com o time que ficou conhecido pela Democracia Corintiana, o alvinegro goleou o Palmeiras por 5 a 1 pelo Paulistão daquele ano com três gols de um novato Casagrande. O Timão ainda venceu quatro jogos seguidos entre dezembro de 1983 e agosto de 1985, mas o Palmeiras, mesmo em tempos difíceis, venceu cinco dos sete clássicos que disputou entre outubro de 1985 e abril de 1987, incluindo uma goleada de 5 a 1 em agosto de 1986, justamente após o Palmeiras adotar o porco como segunda mascote. Em 1988, aconteceu a primeira morte envolvendo torcedores dos dois times na história, do palmeirense Cleofas Sóstenes da Silva – foi também a primeira morte envolvendo briga de torcidas no futebol brasileiro. Infelizmente, as brigas e casos de violência aumentariam drasticamente nas décadas seguintes, principalmente nos anos 90, quando o clássico explodiu em termos de rivalidade.

 

Nervos à flor da pele. E futebol ao máximo

Se nos anos 70 e 80 o clássico teve poucos gols e viu a rivalidade esfriar um pouco, nos anos 90 ela ressurgiu para ficar. Tudo começou a esquentar em 1993, quando o Palmeiras, com um grande aporte financeiro e recheado de craques, destroçou o jejum de 16 anos sem títulos ao bater o rival Corinthians na final do Paulista daquele ano com um inesquecível 4 a 0 em um dia 12 de junho, Dia dos Namorados e considerado o “dia da paixão palmeirense” pelos torcedores – mais de 104 mil pessoas estavam no Morumbi naquela data. Além de lavar a alma do torcedor, a goleada serviu para calar o rival e o atacante Viola, que imitou um porco no primeiro jogo da final após marcar o gol da vitória corintiana por 1 a 0.

No ano seguinte, novo delírio verde: vitória na decisão do Campeonato Brasileiro de 1994, até hoje o maior torneio decidido pelos rivais na história. Com grandes jogadores em ambos os lados e partidas eletrizantes, o Derby voltou a ser enorme e o centro das atenções na cidade na época. Em 1995, foi a vez do Corinthians levantar uma taça sobre o rival: o Paulista, no primeiro título conquistado pelo alvinegro sobre o Palmeiras após uma decisão oficial. Foi 2 a 1 para o Timão, gols de Marcelinho e Elivélton.

Viola tirou o sarro do Palmeiras em 1993.

 

Em 1999, novos capítulos tensos. Entre maio e junho daquele ano, os rivais se enfrentaram pelas quartas de final da Copa Libertadores e pelas finais do Campeonato Paulista. Na competição sul-americana, muito equilíbrio, com uma vitória do Palmeiras no primeiro jogo (2 a 0) e uma do Corinthians no segundo (2 a 0). Nos pênaltis, melhor para o Verdão, que venceu por 4 a 2, se classificou e seguiu rumo ao título inédito. Um mês depois, foi a vez do troco alvinegro no Paulista. No primeiro jogo, vareio do Timão: 3 a 0.

Na volta, o empate em 2 a 2 deu o caneco à equipe do Parque São Jorge. Quando o jogo estava praticamente definido, o atacante Edílson começou a fazer embaixadinhas e provocou a ira dos palmeirenses, que partiram pra cima e iniciaram uma briga homérica que entrou para a história do clássico. Era fogo puro. Como ambos viviam grande fase – nunca os times haviam passado por tempos de ouro justamente na mesma época – cada duelo era cercado de rivalidade, provocações e falas que atiçavam ainda mais o torcedor.

Paulo Nunes parte pra cima de Edílson…

 

… E Edílson revida: briga de 1999 foi épica. Fotos: Gazeta Press.

 

Paulo Nunes, Vampeta e o próprio Edílson colaboravam bastante na alimentação daquela rivalidade. O atacante palmeirense, após a final estadual de 1999, ironizou: “Deixa o Paulistinha para eles, que é o que eles merecem”. Anos depois, Vampeta revelou, em abril de 2018 ao repórter André Ranieri, da Jovem Pan, que as embaixadinhas do companheiro Edílson foram planejadas.

 

“Nós entramos pilhados naquela partida, porque, um mês antes, havíamos sido eliminados pelo Palmeiras na Libertadores. Além disso, no primeiro jogo da final, os caras entraram em campo com o cabelo pintado de verde, porque tinham acabado de ganhar a Libertadores. Só que nós vencemos por 3 a 0. […] Aquela confusão, aquelas embaixadinhas… Foi tudo planejado. Eu me lembro que, durante um treino em Atibaia, o Edílson falou: ‘nós temos que devolver a gozação para os caras’. O Dinei falou: ‘pô, então vamos imitar a Tiazinha, a Feiticeira’, porque era assim que o Paulo Nunes costumava fazer. Ele disse: ‘isso aí não… Só me avisem quando estiver para acabar o jogo, que eu vou cruzar o campo fazendo embaixadinha, independentemente do placar’. E ele fez… O jogo estava 2 a 2, gritaram do banco que faltavam 15 minutos para acabar, e o Edílson fez as embaixadas. Aí o pau quebrou”.

 

E não parou por aí. No final daquele ano, nas vésperas da final do Mundial Interclubes entre Palmeiras e Manchester United-ING, camisas provocativas foram confeccionadas em São Paulo para os corintianos provocarem o rival. Elas eram metade do Corinthians e metade do Manchester. E tal amuleto deu sorte, pois o Verdão perdeu por 1 a 0. No ano 2000, outra vez as equipes se enfrentaram em uma Libertadores, dessa vez na semifinal. Os jogos foram ainda mais energéticos. Na primeira disputa, 4 a 3 para o Corinthians. Na segunda, 3 a 2 para o Palmeiras, em jogo com duas viradas. Nos pênaltis, vitória do alviverde por 5 a 4, com o último pênalti cobrado por Marcelinho e defendido por Marcos, num dos jogos mais emocionantes da história do Derby (leia mais clicando aqui!). Na decisão, o Palmeiras acabou perdendo para o Boca de Bianchi, mas a torcida até hoje tem aquela vitória sobre o rival como um verdadeiro “título”.

A camisa dupla de 1999 serviu para secar o rival na final do Mundial.

 

No ano seguinte, outra camisa para azucrinar o rival.

 

Nos anos seguintes, o Palmeiras passou por momentos difíceis, caiu para a série B, em 2002, e viu o rival em alta até 2005, quando o cenário mudou de lado e foi o Corinthians quem caiu, em 2007. Na segunda década do século XXI, o clássico voltou a ganhar força com novos tempos de destaque dos clubes no cenário nacional. Em 2011, o Corinthians eliminou o rival nos pênaltis nas semifinais do Paulista, quebrando o tabu de nunca ter vencido o Palmeiras em disputas de penalidades. Naquele mesmo ano, o Corinthians celebrou seu quinto título brasileiro justamente sobre o Verdão, no Pacaembu, após empate sem gols e duas expulsões para cada lado. Em 2014, o Derby foi realizado pela primeira vez no novo estádio do Corinthians, em Itaquera, e o Timão venceu por 2 a 0. No ano seguinte, foi a vez do Derby acontecer no novo Allianz Parque, estádio alviverde, mas quem fez a festa foi o visitante: 1 a 0. Naquele mesmo ano, os rivais fizeram um clássico de arrepiar que terminou 3 a 3, na casa do Palmeiras.

Em 2017, ano do Centenário do Derby, os rivais se enfrentaram três vezes. No primeiro jogo, em Itaquera, pelo Paulista, vitória alvinegra por 1 a 0. No segundo, no primeiro turno do Brasileiro, vitória corintiana dentro do Allianz Parque por 2 a 0. E, no último jogo do ano entre a dupla, na Arena Corinthians, outra vitória alvinegra: 3 a 2. Os 100% de aproveitamento do Timão sobre o rival serviu para igualar os 100% do Palmeiras no ano anterior. E, em 2018, os rivais se reencontraram em uma final de Estadual após 19 anos.

No primeiro jogo, na Arena Corinthians, vitória palmeirense por 1 a 0. No segundo, no Allianz, vitória alvinegra por 1 a 0. Nos pênaltis, triunfo do Corinthians e festa em plena casa do rival, com muita discussão no pós-jogo sobre a arbitragem. O troco alviverde veio em 2020, em outra decisão de Estadual, com vitória nos pênaltis após dois empates (0 a 0 e 1 a 1), título que impediu o Corinthians de conquistar seu primeiro tetracampeonato consecutivo no Paulista e colocou ainda mais tempero em um duelo que segue acirrado, disputado, equilibrado e sempre gigante, tal como seus protagonistas. É aquela velha história: um Derby nunca será um jogo comum…

 

No centenário, rivais fizeram ações em conjunto para a promoção do Derby.

 

Com novos estádios e times em boa fase, o Derby segue repleto de emoção, polêmicas e pronto para mais histórias.

 

Para evitar confrontos entre torcedores, os clássicos atuais são de torcida única, tanto na Arena Corinthians…

 

… Como no Allianz Parque.

 

Curiosidades do Derby:

 

  • Ademir da Guia foi quem mais jogou o Derby: 57 jogos;
  • O estádio do Pacaembu é o palco com mais confrontos na história (152 jogos), seguido do Morumbi (112);
  • Os rivais já se uniram em jogos amistosos contra outras equipes. E nunca perderam. Em 1917, o Palestra/Corinthians venceu o Paulistano por 2 a 0; Em 1929, o Sírio (5 a 0); Em 1930, o Tucumán-ARG (5 a 2); E, em 1992, o Corinthians/Palmeiras venceu o combinado Flamengo/Vasco por 2 a 1;
Rivais unidos contra argentinos em 1930.

 

  • Em 1945, os rivais se uniram por uma causa política. Eles se enfrentaram no Pacaembu em um jogo beneficente para o Movimento Unificador dos Trabalhadores (MUT). Organizada perto das eleições gerais daquele ano, a partida serviu, também, para arrecadar fundos para o Partido Comunista Brasileiro. O jogo terminou com vitória alviverde por 3 a 1 e ficou conhecido como “O Jogo Vermelho”;
  • O Corinthians saiu campeão após uma partida decisiva sobre o rival em 1954 (Paulista), 1995 (Paulista), 1999 (Paulista) e 2018 (Paulista);
  • O Palmeiras saiu campeão após uma partida decisiva sobre o rival em 1936 (Paulista), 1938 (Paulista extra, disputado no período da Copa do Mundo), 1951 (Torneio Rio-SP), 1974 (Paulista), 1993 (Torneio Rio-SP), 1993 (Paulista), 1994 (Brasileiro) e 2020 (Paulista);
  • Vários jogadores já vestiram a camisa tanto de um quanto de outro. Alguns deles: César Sampaio, Edmundo, Antonio Carlos, Edu Dracena, Emerson Leão, Gamarra, Luizão, Rincón, Rivaldo, Roberto Carlos, Rogério, Vágner Love, Paulo Nunes e Viola. Além deles, os técnicos Vanderlei Luxemburgo e Oswaldo Brandão foram ídolos tanto pelos alvinegros como pelos alviverdes;
  • Corinthians e Palmeiras já se enfrentaram por mais de 20 torneios diferentes, menos pela Copa do Brasil e pela Copa Sul-Americana;
  • Infelizmente, já aconteceram 11 mortes em dias de clássicos;
  • Ambos são rivais, também, no carnaval. As duas maiores torcidas organizadas dos clubes, Gaviões da Fiel e Mancha Verde, possuem escolas de samba no carnaval paulistano;
  • O Monumento a Duque de Caxias e a Catedral da Sé, duas construções icônicas do centro de São Paulo, tiveram ajuda de rendas provenientes de Derbys em suas obras;
  • O placar 1 a 0 é o mais comum na história do Derby: até fevereiro de 2024, foram 66 vezes;
  • O duelo já inspirou até filme. Em 2005, a comédia romântica “O Casamento de Romeu e Julieta”, de Bruno Barreto, contou a história de Julieta, palmeirense, que começa a se envolver com Romeu, corintiano.

 


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10 Comentários

  1. Olá Imortais.

    Parabéns pelo lindo texto.

    Nasci em 1978, mas sou um Corinthiano aficcionado pela história. Li muito a respeito de dois Derbys que me chamaram a atenção.
    Corinthians 3×2 Palmeiras (11/10/1954) e Corinthians 4×3 Palmeiras (25/04/1971). Nos livros que pesquisei, muitos falam que este Derby de 1954 é a mais emblemática vitória Corinthiana (O Maior de Todos os Derbys), pois a corrida estava acirrada demais pelo Título do IV Centenário. Já 1971, vi muitas vezes no You Tube e realmente foi um jogo de tirar o folego.

    Saberia dizer mais a respeito deste jogo de 1954?

    Grato pela atenção.

    Grande Abraço.

    Fabio.

    • Olá Fabio! Muito obrigado pelos elogios! Os clássicos do Campeonato de 1954 foram mesmo emblemáticos porque todos queriam vencer o torneio daquele ano pelo valor simbólico, do IV Centenário da cidade de São Paulo. Mas o jogo que mais marcou, na verdade, foi o empate em 1 a 1 do dia 06 de fevereiro de 1955, que sacramentou o título do Corinthians, um jogo no qual o Palmeiras jogou de azul por causa de um pai de santo consultado pelo clube às vésperas do jogo. A tática não deu certo e o empate beneficiou o Timão, que foi campeão! Leia mais aqui: https://www.imortaisdofutebol.com/2014/02/22/esquadrao-imortal-corinthians-1950-1954/

      • Azul nunca foi uma cor que trouxe sorte ao Palmeiras, achei que era só em 2009 com o Brasileirão “perdido” kkkkkk mas pelo visto isso vem de muitos anos atrás. Espero nunca mais ver o Palmeiras usar uniforme azul.

  2. E por causa das grandes semelhanças entre os confrontos (duas equipes da mesma cidade, grande rivalidade (a ponto de, infelizmente, ocorrer briga de torcidas e morte de torcedores), assim como o Corinthians uma das equipes ser alvinegra e assim como o Palmeiras a outra ser alviverde), um jornalista decidiu chamar o confronto entre Guarani e Ponte Preta de “Derby campineiro”.

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