Data: 18 de maio de 1960
O que estava em jogo: A taça da Liga dos Campeões da UEFA de 1959-1960
Local: Estádio Hampden Park, Glasgow, Escócia
Juiz: John Mowatt (ESC)
Público: 127.621 (recorde em uma final de competição europeia)
Os times:
Real Madrid CF-ESP: Rogelio Domínguez; Marquitos, Santamaría e Pachin; Zárraga e Vidal; Canario, Del Sol, Di Stéfano, Puskás e Gento. Técnico: Miguel Muñoz.
Eintracht Frankfurt-ALE: Egon Loy; Friedel Lutz, Hermann Höfer e Eigenbrodt; Weilbächer e Stinka; Kress, Lindner, Erwin Stein, Alfred Pfaff e Erich Meier. Técnico: Paul Osswald.
Placar: Real Madrid 7×3 Eintracht Frankfurt (Gols: Kress-EIN aos 18´, Di Stéfano-RMD aos 27´, 30´do 1º T e aos 28´do 2º T e Puskás-RMD aos 45´+1 do 1º T´; Puskás-RMD aos 11´, 15´e 26´ e Stein-EIN aos 27´e 30´ do 2º T).
“A majestosa pirotecnia dos pentacampeões da Europa”
Por Guilherme Diniz
Nem italianos nem franceses foram capazes de parar aquela máquina vestida de branco. Stade de Reims, duas vezes, Milan e Fiorentina já haviam sucumbido diante dos majestosos de Madrid. Naquele dia 18 de maio de 1960, porém, o estádio Hampden Park, em Glasgow-ESC, tinha a certeza de ver um novo campeão europeu. Os espanhóis teriam pela frente os alemães do Eintracht Frankfurt, que tinha enfiado 12 gols no prepotente Rangers-ESC na semifinal. Pfaff e companhia não seriam adversários fáceis para os merengues. Mas foram. Mais do que isso, eles foram os mais fáceis de todos os já enfrentados pelo Real Madrid em finais continentais. As mais de 127 mil pessoas que formaram o maior público de uma final europeia na história viram um dos maiores espetáculos futebolísticos de todos os tempos. Foram 10 gols. Sete do Real. Três do Eintracht. Puskás fez quatro. Di Stéfano três. Não havia jeito melhor de se completar um pentacampeonato e de encerrar uma década estrondosa. Cinco Copas europeias realizadas. Cinco vencidas pelo esquadrão de Santiago Bernabéu e do Santiago Bernabéu, então presidente merengue. Jamais houve uma final como aquela. E dificilmente haverá. Os jogadores trajados de branco trataram a bola como um bem precioso, com sutileza, classe, técnica e amplitude. Aquilo tudo parecia um filme de ficção, algo surreal. Mas não foi. Puskás, Di Stéfano, Gento, Canário e Santamaría eram de carne e osso. E arte. É hora de relembrar.
Pré-jogo
Não havia clima melhor e mais entusiasmante quanto os de Real Madrid e Eintracht Frankfurt para aquela final de Liga dos Campeões da UEFA de 1960. Os espanhóis haviam eliminado nas semifinais ninguém mais ninguém menos que o Barcelona-ESP com duas vitórias inesquecíveis e categóricas: 3 a 1 no Santiago Bernabéu e 3 a 1 em pleno Camp Nou, totalizando um 6 a 2 no placar agregado. A festa merengue foi enorme e a confiança no penta era ainda maior. Do lado alemão, não era diferente. O time eliminou de maneira épica os soberbos escoceses do Rangers, que cantaram vitória antes da hora, fizeram pouco caso da equipe de Frankfurt e foram goleados impiedosamente nos dois jogos: 6 a 1 na Alemanha e 6 a 3 na Escócia, placar geral de 12 a 4 para o Eintracht. Foi um show de gols e talento de Pfaff, craque da equipe, e de Lindner, Stein e Meier. Por conta disso, a final era tida como uma das mais esperadas dos últimos anos e havia boas chances de a hegemonia de quatro títulos seguidos do Real ser quebrada. Por conta disso, é fácil entender a massiva presença de público no imenso Hampden Park, em Glasgow, que recebeu mais de 127 mil pessoas, o maior público já registrado em uma final europeia de todos os tempos.
Primeiro tempo – pura arte
Com o seu característico e imponente uniforme branco, o Real Madrid foi a campo com o que tinha de melhor, bem como os alemães, trajados em vermelho e branco. As equipes jogavam um futebol ofensivo e não ligavam muito para afazeres defensivos. Se levavam um gol, iam até o ataque e faziam três, quatro. Foi assim durante toda a competição daquela temporada. E na final não seria diferente. O jogo começou com algumas faltas ríspidas (como uma solada violenta de Puskás no zagueiro Eingenbrodt), mas vistoso e com toques de bola muito bonitos. O Eintracht levava mais perigo nas jogadas pelas pontas, aproveitando os espaços deixados por Pachín e Marquitos. No Real, a velocidade dos pontas Canário e Gento eram as grandes armas, bem como a maestria do sempre impecável Di Stéfano.
No entanto, que abriu o placar foi o Eintracht. Após uma boa jogada pela direita, o cruzamento de Steiner encontra Kress, livre no meio da área, ter o trabalho de colocar a bola para dentro: 1 a 0. A torcida fez a festa em Glasgow, mostrando estar mais para o lado alemão do que o espanhol. Era fato que a maioria queria ver um campeão europeu inédito. Mas o gol apenas despertou a ira do gigante de Madrid. Aos 27´, ótima jogada do Real e Zárraga toca para Canário na direita. O brasileiro passa em velocidade pelo marcador e cruza para Di Stéfano completar: 1 a 1. Palmas tímidas ecoam no estádio Hampden Park. O Madrid estava despertando…
Aos 30´, Del Sol recebe e toca para Canário, que chuta forte, mas o goleiro Loy não segura. Ele dá rebote e Di Stéfano não perdoa: 2 a 1. Era a virada madrilena. Tudo voltava ao normal. Será que os alemães iriam voltar para o jogo? Não. A virada foi a deixa para o Real Madrid usar e abusar do talento de seus craques de frente, com jogadas vistosas, toques maravilhosos e lances de efeito. Em um deles, Gento dominou e deu de letra para Di Stéfano, que deixou com Vidal. Este emendou um chutaço, a bola bateu no zagueiro, na trave e não entrou por puro capricho. Nos acréscimos da primeira etapa, pressão total do Real, a bola sobra na esquerda e Puskás, até então quietinho, fuzila sem ângulo e marca um golaço: 3 a 1. O juiz escocês apita o final do primeiro tempo com a majestade espanhola na frente. O Eintracht precisava de um milagre na segunda etapa: virar para 4 a 3 e não levar um só gol do Real.
Segundo tempo – o espetáculo pirotécnico
Quem esperava uma reação alemã na segunda etapa teve que presenciar um baile formidável e inesquecível do Real Madrid, baile este que começou polêmico, com a marcação de um pênalti inexistente em Gento. Os alemães, lacônicos, pouco reclamaram, o árbitro demorou a beça para marcar e o Real comemorou. Puskás bateu e fez o quarto gol aos 11´. O Eintracht se lançou todo ao ataque, sempre pelas pontas, mas aos 15 minutos, Santamaría interceptou uma jogada alemã com classe e iniciou um contra-ataque fulminante espanhol. De pé em pé, a bola sobrou para Gento, velocíssimo como sempre, que cruzou para Puskás fazer mais um, fácil, fácil: 5 a 1.
Embora o Real estivesse goleando, o Eintracht era um bom time, mas pecava demais nas finalizações. Faltava ao time vermelho atacantes com a precisão e talento de um Puskás ou Di Stéfano, bem como alguém veloz como Gento ou Canário. Como eles não tinham nada disso, o Real marcou mais um, aos 26´, em mais um ataque sublime, de pé em pé, quando Puskás girou e deu outro chutaço indefensável: 6 a 1. Era o quarto gol do húngaro. Incrível! A partir dali, a torcida não teria tempo nem de piscar os dois olhos de uma vez, pois poderia perder os gols sequenciais que estavam por vir. Um minuto depois do sexto gol, aos 27´, o Eintracht desconta após um lançamento longo para a área espanhola que Stein aproveita: 2 a 6. O Real dá a saída, brinca com a bola, Di Stéfano recebe e chuta rasteiro de fora da área: 7 a 2.
Dois minutos depois, Pfaff dá um passe majestoso para Stein, a bola fica com a zaga espanhola, que faz lambança e dá de presente para o mesmo Stein fazer o último gol do jogo: 3 a 7. Quatro gols em apenas cinco minutos! Suspiros, gritos e sorrisos eram vistos aos montes àquela altura no Hampden Park. Perto do final do jogo, o Real quase marca o oitavo gol, com Di Stéfano querendo igualar os quatro gols do companheiro Puskás, mas, depois de um sutil toque por cobertura, a bola bate na trave e volta para o goleiro Loy. O “ohhhh” da torcida foi marcante. Mas já estava de bom tamanho aqueles 10 gols (!).
Aos 45´, o árbitro escocês encerrou a mais pirotécnica final europeia da história: Real Madrid 7×3 Eintracht Frankfurt. Estava consolidado o inédito, incrível e imbatível pentacampeonato consecutivo dos majestosos de Madrid, uma seleção que vestia a camiseta de um clube, toda em branco, límpida, que chegava a brilhar em campo e parecer parte do gramado verde tamanha simetria e feição ao esporte. Os que torciam por uma reviravolta alemã tiveram que aplaudir, de pé, os artistas que haviam proporcionado um espetáculo tão grandioso e tão belo. Mas era preciso aplaudir, também, o Eintracht, que em nenhum momento deixou de atacar e não demonstrou medo algum daqueles ferozes predadores espanhóis. Naquele dia, não foi apenas o Real Madrid CF que conquistou um título. O futebol e o mundo também foram laureados com uma rica e dourada mostra de quão belo poderia ser o esporte. Só restava dizer, bem alto, um “muito obrigado” para aqueles heróis da arte.
Pós-jogo – o que aconteceu depois?
Real Madrid: o pentacampeonato europeu foi algo tão grande, tão incrível e tão marcante que o time caiu logo de cara na primeira rodada da Liga dos Campeões de 1960-1961 diante do rival Barcelona. Os espanhóis voltaram a uma final em 1962, mas perderam para o Benfica de Eusébio. Em 1964, nova decisão e velha derrota, dessa vez para a Internazionale-ITA. A coroa europeia só foi reconquistada em 1966, com uma vitória por 2 a 1 sobre o Partizan-IUG. Os anos se passaram, os madrilenos viveram um jejum e voltaram a conquistar títulos europeus no final dos anos 90. Em 2002, a equipe conquistou sua nona taça europeia contra outro rival alemão que também vestia vermelho (e preto), o Bayer Leverkusen. A vitória não foi elástica e sublime como em 1960 (2 a 1 para o Real), mas teve um toque de arte com o gol mais sensacional da história das finais europeias, marcado por Zidane, em um voleio inesquecível. O local da epopeia? Hampden Park, Glasgow, Escócia, em 15 de maio de 2002, mesmo local da pirotecnia de 42 anos atrás de Puskás, Di Stéfano, Gento…
Eintracht Frankfurt: após a derrota para o Real em 1960, o Eintracht jamais voltou a disputar uma Liga dos Campeões da UEFA. O time frequentou apenas as competições “menores” do continente, como a Copa da UEFA (atual Liga Europa) e a extinta Recopa Europeia. O melhor resultado do time desde então foram algumas copas nacionais e a Copa da UEFA de 1980, conquistada em uma final caseira contra o Borussia Mönchengladbach disputada em dois jogos, ambos na Alemanha. E bem longe dos fantasmas de Hampden Park.
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Ler está matéria da até vontade de chorar, sério mesmo…o como o futebol era e o como é o de hoje feio, marketeiro e cheio de jogadores fracos bem deixa pra lá fazer o que né.