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Jogos Eternos – Flamengo 0x3 América-MEX 2008

 

Data: 07 de maio de 2008

O que estava em jogo: uma vaga nas quartas de final da Copa Libertadores da América de 2008.

Local: Estádio Jornalista Mário Filho (Maracanã), Rio de Janeiro (RJ), Brasil.

Juiz: Alfredo Intriago (EQU)

Público: 50.954 pessoas

Os Times:

Clube de Regatas do Flamengo-BRA: Bruno; Léo Moura, Leonardo, Ronaldo Angelim e Juan; Jaílton (Renato Augusto, 34’/2ºT), Kleberson (Obina, intervalo), Ibson e Toró; Marcinho e Souza (Diego Tardelli, 10/2ºT). Técnico: Joel Santana.

Club de Fútbol América-MEX: Ochoa; Sánchez, Sebá e Rodrigues; Castro, Villa, Arguëllo (Mosqueda, 30’/2ºT), Silva e Rojas; Esqueda (Iñigo, 34’/2ºT) e Cabañas (Federico Higuaín, 49’/2ºT). Técnico: Juan A. Luna.

Placar: Flamengo 0x3 América. Gols: Cabañas-AME, aos 20′ e Esqueda-AME, aos 38′ do 1ºT; Cabañas-AME, aos 32′ do 2ºT.

Cartão Vermelho: Juan-FLA, aos 39’ do 2º T.

 

“Maracanazo Rubro-Negro – Parte 2”

 

Por Guilherme Diniz

 

Algumas derrotas marcam de maneira impiedosa clubes e seus torcedores. E, para o torcedor do Flamengo, até o ano de 2008, a maior derrota do clube havia acontecido no dia 30 de junho de 2004, quando o rubro-negro perdeu por 2 a 0 para o Santo André em pleno Maracanã e viu o clube do ABC Paulista levantar a Copa do Brasil daquele ano. Um Maracanazo daqueles, que sangrou, machucou, doeu. Alguns anos se passaram e quis o destino que um novo fantasma surgisse ao flamenguista, de novo no Maracanã, dessa vez com proporções continentais. Depois de vencer o América-MEX por 4 a 2 em pleno estádio Azteca, o Flamengo tinha a vantagem de até perder por um gol que mesmo assim iria avançar às quartas de final da Copa Libertadores. Parecia barbada, tanto é que o técnico Joel Santana poupou alguns titulares. Mas o América fez naquela noite do dia 07 de maio de 2008 um de seus maiores jogos da história. E contou com a atuação da vida de Salvador Cabañas, que marcou dois gols e comandou a vitória por 3 a 0 dos mexicanos que tirou o Flamengo da Libertadores de maneira épica. Foi uma catástrofe para o clube carioca. A parte 2 de um Maracanazo, de tempos sombrios e sem qualquer esperança de conquistar o sonhado bicampeonato sul-americano. É hora de relembrar.

 

Pré-jogo

Léo Moura (à dir.) contra o goleiro Ochoa: Fla venceu a ida por 4 a 2.

 

O choque da eliminação do Flamengo naquele ano foi muito por conta da enorme vitória da equipe no primeiro jogo e as circunstâncias de tal. No dia 30 de abril, o técnico Joel Santana chegou a poupar alguns atletas (acredite!) para o duelo no Azteca por conta da final do Campeonato Carioca (oi? Estadual mais importante que Liberta? Ah, tá…), que iria acontecer no fim daquela semana. E, mesmo assim, o Flamengo venceu por 4 a 2, com dois gols de Marcinho, um de Diego Tardelli e outro de Leonardo Moura, enquanto Cervantes e Mosqueda descontaram para os mexicanos. Dias depois, o Flamengo conquistou o Carioca e o confronto contra o América seria uma festa, com entrega de faixas e o adeus ao técnico Joel Santana, que iria dirigir a seleção da África do Sul, que se preparava para ser a anfitriã da Copa do Mundo de 2010. Na verdade, ele iria embora logo após Carioca, mas acabou permanecendo até o jogo contra o América.

Juan, Ibson e Obina: trio se destacava no Fla de 2008.

 

Do lado mexicano, o técnico Ruben Romaro deixou o comando do América logo após a derrota, que selou um péssimo momento do time na temporada: lanterna do Campeonato Mexicano e com seus jogadores não rendendo o esperado. E olha que os Millonetas tinham nomes famosos como o goleiro Ochoa, o zagueiro Sebá Domínguez (ex-Corinthians) e Salvador Cabañas. Juan Antonio Luna, ex-jogador do América nos anos 1980, assumiu o comando da equipe a fim de pelo menos fazer uma partida digna no Maracanã e começar a reconstrução do time para a próxima temporada. Porém, ele iria fazer muito mais do que isso…

Joel Santana foi homenageado antes da partida contra o América. Foto: Alexandre Cassiano / ESPN.

 

No dia do jogo, o oba-oba era nítido nas ruas do Rio. Os jogadores do Flamengo foram em direção ao Maracanã sob enorme festa, contornando pela Serra ao invés de ir pela Lagoa. E, com isso, a equipe chegou atrasada ao Maracanã (faltando 50 minutos para o início do jogo…), algo que prejudicou o aquecimento e a preparação. Dentro do ônibus, tranquilidade e a certeza de que a vaga nas quartas de final estava ganha. Bem, isso no imaginário dos rubro-negros…

 

Primeiro tempo – 2 a 0 é nosso, Joel!

Depois das entradas das equipes em campo e de uma homenagem a Joel Santana, que foi aplaudido pelos jogadores do Fla e ganhou uma camisa comemorativa, a bola rolou e o Flamengo pressionou em busca de um gol para dar tranquilidade no decorrer do jogo. Porém, sem grandes talentos na frente, ficava difícil o time carioca fazer alguma coisa. Por outro lado, o América foi esperando o momento certo para contra-atacar. E ele apareceu aos 20’. Cabañas recebeu na entrada da área, arriscou o chute, mas a bola bateu no marcador. No rebote, o paraguaio dominou, percebeu o goleiro rubro-negro adiantado e chutou no ângulo para marcar um golaço e abrir o placar: 1 a 0.

Sebá (à esq.) comemora com Cabañas, o carrasco do Fla naquela noite.

 

O “gordinho” nem comemorou, e foi em direção ao meio de campo. Parecia o gol protocolar, da honra, aquela coisa. Dois minutos depois, o Flamengo tentou a resposta em chute de Juan, mas Ochoa, sempre ele, fez uma defesaça e evitou o empate. Após a cobrança de escanteio, Souza perdeu um gol feito e a torcida começou a perder a paciência. Pedindo Obina, o atacante xodó da época e “melhor que Eto’o”, a massa flamenguista não gostava nada do que via. Um time apático, sem qualquer organização e sentado na vantagem. Só aos 36’ que o Flamengo chegou de novo com perigo, em cabeçada de Souza defendida espetacularmente por Ochoa. O goleiro mexicano, desde aquela época, adorava jogo grande, assim como sempre fez pelo México em Copas do Mundo.

Os times em campo: muito aberto, o Fla foi presa fácil para o América, que aproveitou as chances que teve em contra-ataques para construir um placar histórico.

 

Até que, aos 38’, contra-ataque mortal dos mexicanos, a bola vai de maneira rápida e objetiva aos pés de Esqueda, que avançou sozinho no meio da atrapalhada zaga flamenguista. Na saída do goleiro, o atacante tocou por cima e fez 2 a 0. O resultado dava esperanças ao América, mas ainda classificava o Flamengo. Porém, Joel Santana parecia não entender aquilo e começou a pensar que o time precisava de um gol. E mandou o Flamengo pra cima ao invés de se precaver. A tática se mostraria suicida principalmente no segundo tempo. Ronaldo Angelim, zagueiro na época, comentou tempo depois. “O Joel não sabia que 2 a 0 dava a gente, ele acabou fazendo a substituição e colocou o time mais para a frente (…). Ele achava que dois (2 a 0) estava eliminando a gente, e não estava (…), nós fizemos quatro gols fora de casa. Depois ele veio a entender que 2 a 0 dava a gente”, disse o jogador em entrevista reproduzida aqui.

Obina, também na entrevista, disse que Joel queria fazer um gol, achava que estava empatado, e disse para o técnico: ‘Professor, não, estamos nos classificando”. Era uma bagunça. Que seria consumada na segunda etapa.

 

Segundo tempo – Catástrofe

O Flamengo voltou para a etapa complementar com Obina no lugar do volante Kleberson. E, dez minutos depois, Diego Tardelli entrou no lugar de Souza. As mudanças de Joel eram para dar mais força ofensiva ao time da casa, mas quem começou a assustar foi o América, logo aos 3’, quando Silva recebeu de Cabañas, driblou Ibson e chutou à direita do gol. Só aos 14’ que o Flamengo apareceu bem, quando Leonardo Moura cruzou da direita, a bola sobrou para Diego Tardelli e, no chute do atacante, a bola bateu no defensor e não entrou. Cinco minutos depois, Juan recebeu na esquerda e chutou, mas a bola tirou tinta do travessão de Ochoa. Antes, o mesmo Juan havia aparecido com perigo pela esquerda e cruzado para Marcinho, mas o atacante isolou.

Os cariocas erravam demais na hora de finalizar e o tempo passava. Até que, já na casa dos 30’, falta para os mexicanos. De muito longe. Cabañas foi para a bola. O paraguaio chutou forte, a bola desviou e entrou no cantinho do gol: 3 a 0. Os jogadores do Flamengo não acreditaram. Era nítido o desespero no semblante de todos. Enquanto isso, os mexicanos fizeram uma festa enorme, uma apoteose inacreditável no Maracanã. Ainda dava tempo para o Flamengo tentar um gol, mas o psicológico do time estava destruído. Para piorar, aos 39’, Cabañas iniciou um contra-ataque, recebeu e foi derrubado por Juan, que ainda chutou a bola no jogador paraguaio caído no chão. O brasileiro foi expulso e enterrou de vez qualquer chance de virada.

Ao apito do árbitro, o América celebrou a classificação histórica para as quartas de final, enquanto o Flamengo amargou um de seus maiores vexames em todos os tempos. Os jogadores rubro-negros, abatidos, deixaram o gramado sem entender. Alguns saíram bem tarde do estádio, para escapar dos protestos da torcida flamenguista. “Saí 4h da manhã. Galera quebrando os carros do Bruno, do Souza e do Tardelli. Ficou eu e Angelim conversando na escada para entender o que passava nesse dia aí”, comentou Christian, do Flamengo, anos depois, em entrevista publicada no site da ESPN em 19 de janeiro de 2022. Levaria um tempo até o torcedor digerir aquele revés. Mas foi apenas mais um exemplo da bagunça que era o clube e da fragilidade do time em torneios continentais na época. Um maracanazo com tempero mexicano e muita pimenta…

 

Pós-jogo: o que aconteceu depois?

 

Flamengo: com a queda vexatória e a saída de Joel Santana, Caio Júnior assumiu o comando do rubro-negro para o restante da temporada e conduziu o time à 5ª colocação no Campeonato Brasileiro, vencido naquela temporada pelo São Paulo. No ano seguinte, o rubro-negro conseguiu uma alegria com o título do Brasileirão de 2009, em grande ano de Adriano, artilheiro da equipe. Em 2010, a equipe voltou à Libertadores e passou pelas oitavas de final após eliminar o Corinthians, porém, caiu nas quartas de final para a Universidad de Chile, que venceu o primeiro jogo por 3 a 2 e segurou uma derrota por 2 a 1 que classificou os chilenos pelo critério do gol marcado fora de casa. O segundo título da Libertadores só viria em 2019, em uma história que você pode ler mais clicando aqui.

Só em 2019 que a angústia flamenguista acabou, nos dois de Gabigol (foto) na final histórica contra o River Plate.

 

América-MEX: a vitória diante do Flamengo fez o América apostar tudo na Libertadores. Nas quartas, a equipe encarou outro clube brasileiro, o Santos, e venceu o primeiro jogo em casa por 2 a 0, com dois gols de Cabañas. Na volta, o Peixe venceu por apenas 1 a 0 e o América chegou à semifinal, quando encarou a LDU do Equador. Na ida, no México, empate em 1 a 1. Na volta, no Equador, o empate sem gols classificou os equatorianos para a final, na qual venceram o Fluminense nos pênaltis e celebraram o inédito título continental. Mesmo sem o troféu, Cabañas foi o artilheiro da competição com 8 gols, repetindo a artilharia conquistada em 2007, quando anotou 10 gols. 

Mas, em janeiro de 2010, o paraguaio viveu um drama ao ser baleado na cabeça em um bar durante uma discussão. O jogador ficou entre a vida e a morte e acabou perdendo a chance de disputar a Copa do Mundo de 2010, na qual a seleção do Paraguai alcançou as quartas de final. Cabañas sobreviveu e retornou ao futebol em 2012, jogando entre idas e vindas até 2014, quando pendurou de vez as chuteiras.

 

 

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Comentários encerrados

Um Comentário

  1. Essa foi a eliminação mais vexatória do Clube de Regatas do Flamengo na história da Copa Libertadores da América. Eu tenho uma sugestão de Jogos Eternos pra te propor: Chelsea 4 X 4 Liverpool pelas Quartas de Final da Liga dos Campeões de 2009. Um Dos Jogos mais eletrizantes do Século. Vale a pena der relembrado. Abraço

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