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Craque Imortal – Hugo De León

Hugo De León Grêmio

Nascimento: 27 de fevereiro de 1958, em Rivera, Uruguai.

Posição: Zagueiro

Clubes: Nacional-URU (1977-1980, 1988-1989, 1991 e 1992-1993), Grêmio-BRA (1981-1984), Corinthians-BRA (1985), Santos-BRA (1986-1987), Logroñes-ESP (1987-1988), River Plate-ARG (1989-1990), Botafogo-BRA (1991) e Hokkaido Consadole Sapporo-JAP (1991-1992).

Principais títulos por clubes: 1 Mundial Interclubes (1988), 2 Copas Libertadores da América (1980 e 1988), 1 Recopa Sul-Americana (1989), 1 Copa Interamericana (1988) e 3 Campeonatos Uruguaios (1977, 1980 e 1992) pelo Nacional.

1 Mundial Interclubes (1983), 1 Copa Libertadores da América (1983) e 1 Campeonato Brasileiro (1981) pelo Grêmio.

Principal título por seleção: 1 Mundialito (1980) pelo Uruguai.

Principais títulos individuais:

Bola de Prata da revista Placar: 1984

Eleito para o Time do Ano da América do Sul: 1988 e 1989

 


“Corazón de León”

Por Guilherme Diniz

Ele era carrancudo, autoritário e sempre exibiu uma faceta intimidadora. Dentro da área, afastava todos os ousados que a invadiam. Podia ser na bola, mas também com um pouco de força… Um símbolo de raça e técnica, aquele uruguaio foi um dos maiores zagueiros do mundo no final dos anos 1970 e início dos anos 1980. Revelado pelo Nacional (URU), ganhou a Libertadores de 1980 com o clube uruguaio e chamou a atenção dos dirigentes gremistas, que o contrataram em 1981. Em seu primeiro ano, assumiu a liderança do time e conquistou o Brasileiro. Em 1983, veio a coroação com as conquistas da América e do Mundo, muito graças ao seu futebol sem firulas ou riscos, sempre com eficiência e raça pura. É um dos maiores ídolos da história do Grêmio.

Teve sucesso novamente no Nacional, em 1988, levantando pela terceira vez na carreira uma Libertadores e outro Mundial, os últimos do tricolor do Uruguai. Pela seleção, venceu o Mundialito e esteve na Copa do Mundo de 1990. Hugo Eduardo de León Rodríguez, mais conhecido como Hugo De León, brilhou com camisas tricolores e marcou seu nome no futebol sul-americano com grandes jogos, liderança e capitaneando esquadrões lendários. Sempre cresceu em jogos grandes e refletiu essa característica com as taças gigantescas que venceu, sempre com paixão e seu “coração de León”. É hora de relembrar.

Líder desde cedo e a primeira Libertadores

De León começou sua trajetória no futebol profissional no Nacional, seu clube do coração, e sempre demonstrou enorme capacidade defensiva, inteligência tática e habilidade com a bola nos pés, características que fizeram dele uma figura marcante no futebol sul-americano. O jovem subiu ao time profissional já em 1977, ano em que venceu o título do Campeonato Uruguaio. Na mesma temporada, foi campeão do Sul-Americano Sub-20 pela seleção do Uruguai e, dois anos depois, debutou na equipe principal da Celeste. Em 1980, venceu outro campeonato nacional, mas seu maior troféu naquela época foi a Copa Libertadores.

Após superarem a fase inicial, os tricolores passaram pelo Grupo 2, deixando para trás Defensor-URU, The Strongest-BOL e Oriente Petrolero-BOL. Foram cinco vitórias e uma derrota em seis jogos, 14 gols marcados e apenas quatro sofridos, reflexo da aplicação tática proposta pelo técnico Mujica e pelo talento que aflorava do trio de ataque, do fortíssimo meio de campo e da zaga imponente que não deixava os rivais pensarem. 

No triangular semifinal, o Nacional teve pela frente o Olimpia-PAR (campeão da Libertadores de 1979) e o O´Higgins-CHI. Diante de uma fase decisiva que não permitia erros, o time uruguaio adotou uma estratégia mais precavida com foco nos contra-ataques e na força da marcação. No primeiro duelo, contra o O´Higgins, em Santiago, o Nacional venceu por 1 a 0 (gol do jovem Dardo Pérez) e trouxe pontos importantes para o restante da competição. Em seguida, foi a vez de viajar até o Paraguai, se impor e vencer o campeão Olimpia por 1 a 0. 

No duelo seguinte, de novo contra o Olimpia, mas em Montevidéu, os paraguaios abriram o placar, mas De la Peña empatou com um golaço e deixou o Nacional a um passo da decisão. E ela veio após o triunfo sobre o O´Higgins, em casa, por 2 a 0 (gols de De la Peña e Victorino), resultado que colocou os tricolores na final da Libertadores depois de nove anos. Mas o adversário seria complicadíssimo: o Internacional, de Mauro Galvão, Batista, Jair, Mário Sérgio, o brilhante Falcão e o lendário técnico Ênio Andrade.

Entrosados e só pensando no bicampeonato continental, os jogadores do Nacional sabiam que deveriam pelo menos empatar contra o Internacional no primeiro duelo da decisão, que seria disputado no gigante Beira-Rio, em Porto Alegre. Antes do duelo, os tricolores ficaram sabendo que sua fanática torcida estava se preparando para comparecer em peso à capital gaúcha para apoiar ainda mais seus heróis. Os atletas pensavam em algumas centenas de torcedores apenas, mas tiveram uma grata e surpreendente surpresa quando entraram em campo naquele dia 30 de julho de 1980 e viram mais de 20 mil tricolores ensandecidos que gritavam sem parar e conseguiam rivalizar em euforia com os mais de 50 mil colorados.

O Nacional e sua torcida em 1980: festa e título em casa. Foto: Site do Nacional.
 

Contagiados pelo exemplo histórico de fanatismo, os atletas do Nacional jogaram com o coração no bico da chuteira e frustraram Falcão, que fazia seu último jogo no Beira-Rio antes de ir jogar na Roma-ITA. O meio-campista foi anulado sem dó por Espárrago e o Nacional segurou um 0 a 0 providencial para a partida de volta, no Centenário. No dia 06 de agosto de 1980, o estádio uruguaio ficou absolutamente lotado muito antes do apito inicial. 

Ao contrário do defensivismo, as duas equipes brigaram pelo gol desde o início, mas o Nacional era o responsável pelas principais oportunidades. Depois de tanto martelar, o time da casa abriu o placar aos 35´do primeiro tempo, quando Victorino, artilheiro daquela Libertadores, subiu mais alto do que todo mundo e testou firme para o gol de Gasperin após aproveitar um cruzamento vindo da direita.

Com o 1 a 0 no placar, o Nacional jogou com inteligência o segundo tempo e soube neutralizar as principais investidas dos colorados, que passaram mais um jogo sem marcar. Ao apito do peruano Édson Perez, a torcida tricolor vibrou como nunca o feito histórico de seu time. Com um ataque preciso e econômico e um sistema defensivo pleno baseado nas defesas homéricas de Rodríguez (que defendeu uma cabeçada letal de Falcão perto do final do jogo) e na imposição de Hugo De León, o Nacional era bicampeão da Copa Libertadores. 

Mundialito e ida ao Grêmio

De León celebra a conquista com a camisa do Grêmio.
 

Por causa da mudança no formato de disputa do Mundial Interclubes de 1980 – ao invés de jogos de ida e volta, a competição seria em jogo único, no Japão, a partir daquele ano – o torneio só seria disputado em fevereiro de 1981. Antes disso, o Nacional cedeu grande parte de seus atletas à Seleção Uruguaia que disputou – e venceu – o Mundialito de 1981, competição organizada pela FIFA que celebrou os 50 anos de criação da Copa do Mundo, que teve início em 1930 no próprio Uruguai. 

Além do time celeste, participaram todos os campeões mundiais à época (Argentina, Alemanha, Brasil e Itália), com exceção da Inglaterra, que foi substituída pela Holanda, vice-campeã das Copas de 1974 e 1978. O Uruguai venceu Holanda (2 a 0), Itália (2 a 0) e Brasil (2 a 1), na final, e sagrou-se campeão. Rodríguez, Moreira, Eduardo de la Peña, Victorino, Morales e Luzardo foram os tricolores presentes entre os campeões, além de Hugo De León, que logo em seguida se transferiu para o Grêmio-BRA e perdeu a chance de disputar o Mundial Interclubes pelo Nacional.

Uma curiosidade é que o zagueiro celebrou a conquista do Mundialito com a camisa do Grêmio e acabou multado pela federação uruguaia na época. Aquilo foi uma forma do zagueiro confrontar a ditadura em vigor no país. O enredo de exaltação da ditadura uruguaia através da conquista do título foi desestabilizado pela imagem do capitão De León beijando a taça vestindo a tricolor.

Em 1981, De León tinha apenas 22 anos e aparentava ser um zagueiro experiente e temido. A barba envelhecia sua fisionomia e causava temor nos rivais, algo que sempre ajudou o defensor a cultivar a fama de xerife. Rapidamente, o uruguaio cravou seu espaço no tricolor gaúcho não só comandando a grande área, mas também por lançar-se à intermediária adversária para organizar ataques. Com ele e Newmar no miolo de zaga, Paulo Roberto e Casemiro nas laterais e Leão no gol, o Grêmio tinha uma retaguarda segura, que sofreu 21 gols em 30 jogos na campanha do título do Campeonato Brasileiro de 1981, o primeiro da história gremista. Na decisão, contra o forte São Paulo, os gaúchos venceram o duelo da ida, em Porto Alegre, por 2 a 1, e derrotaram os paulistas por 1 a 0 em pleno Morumbi.

No ano seguinte, faltou experiência à equipe na trajetória da Libertadores, quando os gremistas foram eliminados já na fase de grupos. No Brasileirão, a equipe fez grande campanha até a final, mas acabou derrotada pelo Flamengo de Zico na decisão. Mas o vice ainda rendeu uma vaga na Libertadores de 1983. E seria nela que De León entraria de vez para o rol de imortais do clube gaúcho.

Capitão da América

Os capitães De León e Olivera na final de 1983.
 

O ano de 1983 começou muito bom para o tricolor. O time ganhou o reforço do meia Tita, ex-Flamengo, do novo técnico Valdir Espinosa, do zagueiro Baidek e da titularidade do atacante Renato, que esquentou o banco em grande parte de 1982 por opção do técnico Ênio Andrade. Com a base das duas temporadas anteriores e os reforços pontuais, o time queria fazer bonito já no começo do ano, na Libertadores. O tricolor estreou contra o Flamengo, algoz do Brasileiro de 1982, em Porto Alegre, e empatou em 1 a 1. Na sequência, vitórias marcantes na altitude boliviana sobre Blooming e Bolívar. No returno, nova vitória sobre o Blooming e triunfo por 3 a 1 sobre o Bolívar, que sacramentou a classificação do tricolor para a segunda fase e eliminou o rival Flamengo.

Na última partida do grupo, para cumprir tabela, o tricolor foi ao Rio enfrentar o Flamengo, no Maracanã, e venceu por 3 a 1, vitória que lavou a alma do time e da torcida. Na fase seguinte, o Grêmio disputou um triangular com Estudiantes (ARG) e América de Cali (COL) para ver quem iria para a final da competição. O time estreou contra os perigosos argentinos, em Porto Alegre, e venceu por 2 a 1. Na sequência, derrota por 1 a 0 para o América, em Cali, e vitória em Porto Alegre por 2 a 1, gols de Caio e Osvaldo, com um milagre do goleiro Mazarópi, que defendeu um pênalti quando o jogo estava 2 a 1 para o tricolor.

O jogo seguinte seria decisivo e perigoso: contra o Estudiantes, em La Plata. Uma vitória dava ao Grêmio a classificação para a final. Um empate deixaria a equipe na dependência do confronto entre América e Estudiantes, na última rodada. Para piorar, o clima não era nada bom, afinal, um suposto favorecimento do Brasil aos ingleses na Guerra das Malvinas à época provocou a fúria dos argentinos, que viam no Grêmio o inimigo ideal para descontar a raiva. Na chegada dos jogadores, muita hostilidade, pedras e um campo propício para uma verdadeira batalha. Em campo, foi exatamente isso que aconteceu. O jogo foi um dos mais tensos e dramáticos da história da competição e terminou empatado em 3 a 3. Na última rodada, colombianos e argentinos empataram e o tricolor foi para a final, encarar o então campeão do mundo Peñarol.

Na ida, em Montevidéu, o empate em 1 a 1 manteve o Grêmio a apenas uma simples vitória da taça. Mas, em casa, o time brasileiro teve que suar muito. Caio abriu o placar logo aos 10’, mas o Peñarol pressionou bastante o time tricolor e chegou com perigo diversas vezes e ainda não deixava barato nas divididas – em uma delas, Olivera deixou o cotovelo em Renato e só recebeu cartão amarelo. Os uruguaios dominaram praticamente o primeiro tempo e continuaram assim na segunda etapa, com técnica, passes precisos e lances de perigo com Ramos e o sempre artilheiro Morena. Até que, aos 25’, Ramos sofreu falta que ele mesmo cobrou na cabeça de Fernando Morena, que empatou: 1 a 1. 

De León, o sangue e a Liberta: imagem clássica.
 

O Grêmio não se abateu e, aos 32’, Renato apareceu. O ponta-direita fez uma jogadaça e cruzou espetacularmente para César fazer 2 a 1. Era o suficiente. O time gaúcho se segurou como pôde, manteve a bola nos pés do endiabrado Renato o maior tempo possível e fez a festa. Na hora da entrega da taça, ao apoiá-la em sua cabeça, o capitão De León não percebeu um prego exposto na base do troféu. Resultado? Perfuração no couro cabeludo e sangue escorrendo por seu rosto. Mas a cena já estava na história e épicos sendo construídos pelos mais fanáticos torcedores. Era a taça da raça, do “sangue derramado”. E a imagem se tornou instantaneamente a tradução máxima do que era o torneio naquela época. 

Campeão do Mundo

De León com a taça do Mundial. Foto: Masahide Tomikoshi.
 

No final de 1983, De León pôde, enfim, disputar sua primeira final de Mundial Interclubes. Mais uma vez o time da América do Sul (Grêmio) era a zebra diante do adversário europeu (Hamburgo). Isso facilitou a vida dos brasileiros e aliviou a pressão de um jogo tão importante. O Grêmio foi a campo com um time que mesclava segurança defensiva e talento no ataque: Mazarópi; Paulo Roberto, Baidek, De León e Paulo César Magalhães; China, Osvaldo e Mário Sérgio; Renato, Tarciso e Paulo Cézar Caju. Com o pontapé inicial, o campo seco por conta do rigoroso inverno japonês prejudicava o toque de bola, mas não foi empecilho para o Grêmio mostrar mais ímpeto e partir para cima dos alemães, quando Renato, aos 38´, abriu o placar para o tricolor num lindo gol. 

Na segunda etapa, o jogo ficou nervoso, o Grêmio apostando na velocidade de Renato e na eficiência de sua zaga. Tudo corria bem até os 41´, quando Schroeder, no único momento que não precisou marcar Renato, subiu ao ataque e marcou o gol de empate do Hamburgo. O jogo iria para a prorrogação. Cansados, os jogadores tinham que jogar mais meia hora em busca da maior glória tricolor. E Renato tratou de pôr o Hamburgo “no bolso” de uma vez aos 3´, quando entortou mais uma vez seu marcador e chutou, marcando outro belo gol: Grêmio 2×1 Hamburgo. Os alemães não conseguiram mais pressionar e o clube brasileiro pôde comemorar: o mundo era azul, preto e branco! E De León levantou o maior troféu da história tricolor!

Outras camisas e a volta triunfal ao Nacional

A partir de 1984, quando saiu do tricolor após a derrota na Libertadores para o Independiente, De León passou a rodar por diferentes equipes sem se firmar. Defendeu o Corinthians e o Santos, antes de ter sua primeira experiência na Europa, vestindo a camisa do Logroñés. Não estava contente na Espanha e, em setembro de 1988, aceitou a proposta para retornar ao Parque Central e vestir a camisa do Nacional. Mais do que um talento inegável ao sistema defensivo, ainda introduziu sua experiência e o seu temperamento forte, aumentando a confiança do grupo na reta final da Libertadores.

Após superar vários obstáculos, o Nacional chegou à final da Libertadores de 1988 e teve pela frente o forte Newell’s Old Boys, de Batistuta, Alfaro e Almirón. Os argentinos venceram a ida por 1 a 0, e, na volta, o Nacional teria que vencer de qualquer maneira se quisesse o tricampeonato. O gol inaugural saiu aos 13 minutos, graças a uma jogadaça do lateral Carlos Soca. O defensor aproveitou a bola mal afastada pelos adversários para deixar um marcador no chão e, dentro da área, rolar para Ernesto Vargas. O ponta dominou, girou sobre o zagueiro leproso e soltou uma bomba indefensável. O Nacional seguiu pressionando e ampliou aos 37’. Sempre venenoso na bola parada, William Castro cobrou escanteio cheio de efeito e Santiago Ostolaza apareceu para desviar de cabeça, aumentando a diferença. 

Hugo De León: reforço de peso para a sequência da temporada.
 

Já no segundo tempo, o Nacional fechou o placar aos 33 minutos. William Castro estava imparável na ponta esquerda e sofreu um pênalti. Na cobrança, Hugo De León teve calma para encarar Scoponi e tirou do alcance do goleiro. O problema é que o regulamento esdrúxulo daquela Libertadores ainda guardava as suas peripécias. O saldo de gols não importava nos 180 minutos da final, apenas os pontos assinalados. Assim, com uma vitória para cada lado, o Newell ‘s ganhou sobrevida e poderia ser campeão se vencesse a prorrogação (!). 

Ao Bolso, pelo menos, permanecia a vantagem se o placar se mantivesse inalterado ou se marcasse o mesmo número de tentos dos leprosos. A superioridade era tamanha que os argentinos não conseguiram reagir e, de fato, os 3 a 0 terminaram de eternizar os tricolores, em 30 minutos com alguns focos de destempero em campo. Os tricampeões da América provocaram uma comemoração ensandecida em Montevidéu. 

Bicampeão mundial

Gerets e De León antes da bola rolar no Japão.
 

Um mês e quinze dias depois da final da Libertadores de 1988, o Nacional foi para o Estádio Nacional de Tóquio sabendo bem dos seus pontos fortes. Só havia um problema: o adversário que esperava o clube uruguaio tinha um time melhorado, em comparação com o que ganhara o título continental. Afinal de contas, no PSV campeão europeu em maio de 1988 já estava gente como o goleiro Hans van Breukelen, o zagueiro-líbero Ronald Koeman, o meio-campista/lateral Hubertus “Berry” van Aerle, o ponta-de-lança Gerald Vanenburg, o atacante Wim Kieft, todos também campeões europeus de seleções com a Holanda em junho daquele ano. Como se faltasse experiência na defesa dos Boeren, estava o belga Eric Gerets, 34 anos, fundamental na lateral-direita do time treinado por Guus Hiddink. E, acima de tudo, o grande reforço daquele PSV tinha chegado em outubro, após fabulosa participação no torneio olímpico de futebol em Seul: Romário, já titular absoluto no ataque.

Entre a garra do Nacional e a experiência cheia de técnica do PSV, dava para esperar um grande jogo no Estádio Nacional de Tóquio, naquele 11 de dezembro de 1988 ensolarado na capital japonesa. E ele veio: foi uma das mais emocionantes decisões da história do Mundial Interclubes. O time uruguaio começou sendo paciente na defesa quando o PSV tinha a posse de bola. Era esperar uma chance, nos contra-ataques. E ela não demorou: já aos sete minutos da etapa inicial, Ostolaza se credenciou a ser o herói da decisão. Daniel Revelez cobrou escanteio da direita, Van Breukelen saiu mal do gol, e o meio-campista uruguaio entrou livre, perto da segunda trave, para fazer 1 a 0 e comemorar com a “barra” do Bolso atrás do gol.

Romário e De León durante a final.
 

Se pegar um time melhorado vindo de Eindhoven era um tremendo desafio, o Nacional passou a maior parte daquele tempo normal superando-o brilhantemente: ficou bem mais confiante após o gol, teve velocidade no primeiro tempo, criou chances. Porém, mesmo firme na defesa, o Nacional deu uma chance valiosa ao PSV, aos 30 minutos do segundo tempo, já mais cansado, cedendo um lateral perto da área, na direita. Vanenburg cobrou forte, mandando a bola para a área. Seré saiu do gol, socou a bola fracamente, e a redonda parou nos pés de quem? Romário. O destino você já deve imaginar… Rede: 1 a 1. Romário saiu correndo para comemorar abraçando Guus Hiddink. E a final entre PSV e Nacional iria para a prorrogação.

Se o tempo normal já fora empolgante, a prorrogação seria para fazer qualquer torcedor cardíaco do Bolso (e até em Eindhoven, embora um pouco menos) pegar o remédio mais próximo. As bolas altas sempre eram escoradas pelos meio-campistas, levando as chances de parte a parte. O Nacional exemplificou isso logo aos cinco minutos do tempo extra: após desvio, William Castro pegou a bola livre na esquerda, chegou à área e finalizou cruzado, rente à trave de Van Breukelen.

Se a equipe sul-americana perdera sua chance, o PSV não perderia a dele para virar o jogo. Já na segunda parte da prorrogação, aos cinco minutos, lançamento pelo alto, e Héctor Morán foi dividir a bola na área com Hans Gillhaus. O meia-atacante holandês caiu na área. A disputa nem fora tão faltosa, mas convenceu o juiz colombiano Jesús Díaz Palacios: pênalti. Se Romário concluindo as jogadas era garantia para o time da Philips, Ronald Koeman nas bolas paradas também tranquilizava a torcida. Bingo: Koeman cobrou o penal, bola no meio, Seré na direita, 2 a 1.

Era para ser o título mundial que configuraria a “quádrupla coroa” do PSV em 1988, após as três conquistas de 1987-1988 (campeonato e copa holandeses, e Liga dos Campeões da UEFA). Mas qual era o maior trunfo do Nacional, acima da técnica de Cardaccio, da velocidade de Vargas, da experiência de Hugo De León? A garra personificada em Santiago Ostolaza. A garra que o levou a tentar algo num escanteio, no último dos 120 minutos de bola rolando. O zagueiro Adick Koot ainda tentou tirar a bola em cima da linha, mas o juiz não se enganou. 

Transmitindo o jogo para o Brasil, na TV Bandeirantes, direto do estádio, Jota Júnior confirmou: “Entrou, sim”. Ostolaza fizera o milagre: 2 a 2. Os pênaltis definiriam o campeão mundial de 1988 num angustiante 7 a 6 a favor do Nacional, tricampeão mundial assim como o rival Peñarol, com um dos gols anotados por De León. Era a maior glória possível, também, pelo clube de coração. O “Coração de León” estava completo. Após o Mundial, o zagueiro ainda venceu mais um campeonato uruguaio, uma Copa Interamericana e uma Recopa. Em 1988, ele foi eleito um dos melhores jogadores da América do Sul e integrou o Time do Ano do continente.

Única Copa e aposentadoria

Em 1990, já com 32 anos, Hugo De León foi convocado para sua primeira e única Copa do Mundo. Ele foi titular absoluto da Celeste comandada por Óscar Tabárez e ajudou a equipe a se classificar para as oitavas de final após empate sem gols contra a Espanha, derrota por 3 a 1 para a Bélgica e vitória por 1 a 0 sobre a Coreia do Sul. A caminhada uruguaia, no entanto, acabou logo, na derrota por 2 a 0 para a anfitriã Itália, em Roma. De León se aposentou a seleção naquele mesmo ano após 48 jogos disputados entre 1979 e 1990.

Após passar pelo futebol argentino, vestir a camisa do Botafogo em 1991 e jogar brevemente no futebol japonês, De León retornou ao Nacional em 1992 já pensando na aposentadoria. E, antes de pendurar as chuteiras, foi mais uma vez campeão uruguaio e se retirou dos gramados em 1993. De León se aventurou na carreira de técnico, comandou clubes no Brasil, mas não teve nem a sombra de seu sucesso como jogador. No final dos anos 2000, se arriscou na carreira política e foi candidato à vice-presidência do Uruguai pelo partido Colorado (uma heresia para os gremistas…), na chapa de Pedro Bordaberry, mas a dupla acabou perdendo para José Mujica, da Frente Ampla.

Hugo De León é mais lembrado como um dos grandes ícones do futebol uruguaio e sul-americano. Sua carreira vitoriosa como jogador o coloca entre os maiores defensores e líderes da história do esporte. Sua habilidade em transmitir segurança à defesa e sua capacidade de comandar seus companheiros de equipe o tornaram um exemplo de profissionalismo e dedicação, além de ter sido um emblema por Nacional e por Grêmio, onde sua história sempre é reverenciada. Afinal, ele venceu uma Libertadores pelo Nacional em cima do Inter (maior rival do Grêmio). E venceu uma Libertadores pelo Grêmio em cima do Peñarol (maior rival do Nacional). Nada pode ser maior. Coisa de craque imortal.

Números de destaque:

Disputou 204 jogos e marcou 7 gols pelo Nacional.

Disputou 242 jogos e marcou 11 gols pelo Grêmio.

Disputou 48 jogos pela seleção do Uruguai.

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