Grandes feitos: Vice-campeã da Eurocopa (2004) e 4ª colocada na Copa do Mundo da FIFA (2006).
Time-base: Ricardo; Miguel, Fernando Meira (Jorge Andrade), Ricardo Carvalho e Nuno Valente; Costinha e Maniche; Figo (Tiago / Hélder Postiga), Deco (Rui Costa) e Cristiano Ronaldo (Simão); Pauleta (Nuno Gomes / Petit). Técnico: Luiz Felipe Scolari.
“De volta à cena, 38 anos depois”
Por Guilherme Diniz
Wembley, 28 de julho de 1966. Com uma vitória por 2 a 1 sobre a URSS, Portugal, despontando pela primeira vez em uma Copa do Mundo, alcança um incrível 3º lugar e revela ao futebol uma geração de craques inesquecíveis, com destaque para o “Pantera Negra” Eusébio e o “Monstro Sagrado” Mário Coluna. No entanto, os portugueses só voltariam a um Mundial 20 anos depois, em 1986, em campanha que terminou já na fase de grupos. Dois anos antes, eles alcançaram a semifinal da Eurocopa de 1984, mas sucumbiram diante da França de Platini. Nos anos 1990, o torcedor português se empolgou com a equipe campeã mundial sub-20 de 1991, na histórica decisão contra o Brasil em um Estádio da Luz tomado por mais de 120 mil pessoas, mas a seleção lusitana não se classificou para as Copas de 1994 e 1998. Portugal só voltou a uma Copa em 2002, mas de novo caiu na fase de grupos. Toda essa história começaria a mudar em 2003, quando o brasileiro Luiz Felipe Scolari transformou de vez a equipa portuguesa.
Mesclando a experiência de remanescentes da geração de 1991 como Figo e Rui Costa com a juventude de Cristiano Ronaldo, Miguel, Tiago e companhia, Felipão, vindo de um título Mundial em 2002 com o Brasil, fez o torcedor português redescobrir o prazer de torcer e vibrar por sua seleção. Jogando em casa na Eurocopa de 2004, Portugal fez uma campanha histórica e alcançou pela primeira vez a final do torneio. Mas, em um desses acasos do futebol, os encarnados perderam para a maior zebra de todos os tempos, a Grécia. A equipe deu a volta por cima, e, dois anos depois, repetiu o esquadrão de Eusébio e chegou a mais uma semifinal de Copa, superando adversários hostis e sobrevivendo à Batalha de Nuremberg. A queda para a França de Zidane doeu, mas Portugal deixou o Mundial da Alemanha com a 4ª colocação em mais uma grande campanha em Copas, algo jamais repetido desde então. Mesmo sem taças, aquela seleção marcou época. Afinal, não é sempre que temos Figo, Deco, Costinha, Maniche, Pauleta e Cristiano Ronaldo jogando juntos… É hora de relembrar.
Família Portuguesa!
Após a eliminação precoce de Portugal na fase de grupos da Copa do Mundo de 2002, a Federação Portuguesa demitiu o treinador António Oliveira do comando da seleção e trouxe Agostinho Oliveira para breves seis partidas no comando da equipe. O treinador definitivo dos lusos a partir de 2003 seria Luiz Felipe Scolari, campeão do mundo com o Brasil em 2002 e vivendo o auge da carreira. Ele era um dos mais competitivos técnicos do futebol na época e vinha em uma ascensão incontestável, que começou lá em 1991 no título do Criciúma na Copa do Brasil, passou pelas glórias nacionais e internacionais do grande Grêmio de 1994-1997, campeão da Libertadores de 1995, e do Palmeiras campeão da Copa do Brasil de 1998 e da Libertadores de 1999.
O troféu de 2002 catapultou de vez a carreira de Felipão, que não precisava provar mais nada sobre sua competência em formar times aguerridos, competitivos e vencedores. A Federação Portuguesa apostou nisso e tinha a esperança de que o brasileiro pudesse extrair o melhor da geração de futebolistas lusitanos daquela época. Grandes nomes eram vistos em todos os setores e também jovens promessas, como um tal de Cristiano Ronaldo, com apenas 19 anos e que ganhou sua primeira convocação para a seleção em agosto de 2003 justamente sob as mãos de Felipão. Foi naquele ano que o craque deixou o Sporting para iniciar uma trajetória de sucesso no Manchester United-ING.
Mas Felipão mostrou naquele início de trabalho que também tinha personalidade para barrar jogadores tidos como intocáveis, a exemplo de quando barrou Romário da seleção que foi ao Mundial da Coreia do Sul e Japão. Ele não deu mais chances ao goleiro Vítor Baía, algo que pegou a todos de surpresa pelo fato de o arqueiro ser o mais conhecido do país na posição e titular do Porto, esquadrão que seria campeão da Liga dos Campeões da UEFA de 2003-2004. Felipão queria nomes novos e ficou sabendo através do presidente do próprio Porto que Baía em breve poderia se aposentar. Por isso, o treinador deu vez ao goleiro Ricardo, titular do surpreendente Boavista campeão português de 2000-2001.
O veto gerou muitas críticas, mas seria uma primeira mostra do estilo Felipão que os portugueses ainda não conheciam. Ele tinha suas convicções, suas apostas, e ia com elas até o fim. O fato é que o treinador queria construir uma equipe unida, forte e competitiva a exemplo de seu trabalho no Brasil e reeditar a “Família Scolari” em solo lusitano, como foco total na preparação para a Eurocopa de 2004, que seria disputada no país pela primeira vez. Como anfitrião, Portugal não precisava disputar as Eliminatórias e teria pouco mais de um ano para treinar e disputar diferentes amistosos. Esperançoso, mas cauteloso, Felipão resumiu assim seu novo desafio antes de iniciar os trabalhos: “Título europeu não é uma promessa, mas é um objetivo”.
Calibrando
A estreia de Felipão no comando português não foi das melhores: derrota por 1 a 0 para a Itália, fora de casa, mas o time aos poucos foi se acertando e mostrando resultados. A equipe bateu o Brasil por 2 a 1 (gols de Pauleta e Deco), em amistoso disputado na cidade do Porto, venceu a Macedônia por 1 a 0 (gol de Figo), empatou com a Holanda (1 a 1) e Paraguai (0 a 0), goleou a Bolívia (4 a 0), venceu o Cazaquistão (1 a 0), perdeu para a Espanha (3 a 0), venceu a Noruega (1 a 0) e a Albânia (5 a 3), empatou com a Grécia (1 a 1), goleou o Kuwait (8 a 0), empatou com Suécia (2 a 2) e Inglaterra (1 a 1), venceu Luxemburgo (3 a 0) e Lituânia (4 a 1), e perdeu para a Itália (2 a 1).
Os amistosos e treinamentos serviram para o técnico ajustar fundamentos para o time não ser surpreendido na Euro. Portugal marcava muitos gols, criava alternativas, mas demonstrava alguns problemas defensivos por conta dessa exposição. Durante a preparação, Scolari praticamente definiu seu time para a Eurocopa, com Ricardo no gol, Miguel e Nuno Valente nas laterais, Jorge Andrade e Ricardo Carvalho no miolo de zaga (além do experiente Fernando Couto), Costinha e Maniche como meio-campistas mais marcadores e três jogadores de criação de exímio talento que poderiam construir as mais diversas oportunidades de gol: Figo, Deco e Cristiano Ronaldo, além de Simão e Nuno Gomes, que seriam titulares em alguns jogos também.
No ataque, apenas Pauleta como centroavante de ofício. Rui Costa, outro craque da época, não teria grandes oportunidades no time muito por causa das seguidas lesões e também pela fase esplendorosa do brasileiro naturalizado Deco, que gastava a bola no Porto e tinha a juventude que tanto Felipão queria no time. Falando no Porto, o clube foi a base que Felipão iria utilizar na seleção. Nada mais nada menos do que cinco jogadores titulares do time campeão europeu de 2004 seriam, também, titulares de Portugal: Ricardo Carvalho, Nuno Valente, Costinha, Maniche e Deco.
Um fato importante é que o treinador brasileiro conseguiu atrair a atenção do povo português e despertar um enorme nacionalismo e ufanismo antes e durante a Eurocopa. Ele pediu para que as pessoas “colocassem a bandeira na janela” e torcessem por Portugal, pois aquilo era algo único e histórico. Seria a primeira vez que o país sediava o principal torneio de seleções do continente, com vários estádios novos e uma seleção que crescia de produção a cada partida e com jogadores de muito talento. Era um momento ímpar para o esporte do país. E toda aquela empolgação tomou conta dos portugueses, que coloriram as ruas para uma Eurocopa energética e repleta de expectativas.
Na convocação para a Euro, Felipão chamou apenas 10 dos 23 jogadores que haviam disputado a última Copa do Mundo por Portugal: Fernando Couto, Figo, Pauleta, Rui Costa, Jorge Andrade, Ricardo, Nuno Gomes, Petit, Beto e Rui Jorge. Foi de fato uma renovação na equipe e a chance para os jovens provarem seus valores. No Grupo A da Euro, ao lado de Grécia, Rússia e Espanha, Portugal era favorito para a vaga ao lado dos vizinhos ibéricos. Grécia e Rússia corriam por fora. Bem, isso é o que todos pensavam…
Susto e classificação
Com quase 50 mil pessoas no novíssimo Estádio do Dragão, na cidade do Porto, Portugal e Grécia fizeram a abertura da Eurocopa de 2004. A frenesi da torcida era contagiante e os lusos abraçaram por completo sua seleção em busca de uma grande campanha no torneio, e, quem sabe, um título inédito. Felipão levou a campo um time diferente do habitual, com Fernando Couto no miolo de zaga, Rui Jorge e Paulo Ferreira nas laterais e Figo, Rui Costa e Simão na linha ofensiva do meio de campo. A tática não deu certo e a equipe perdeu por 2 a 1 para os gregos – na primeira zebra da competição.
O gol solitário dos lusitanos saiu já nos acréscimos do segundo tempo, com Cristiano Ronaldo, que entrou ao lado de Deco e Nuno Gomes na etapa complementar. Felipão foi surpreendido pela aplicação tática dos gregos e seus contra-ataques, que definiram o jogo com os gols de Karagounis, aos 7’ do 1º T, e Basinas, de pênalti, aos 6’ do 2º T. Foi um balde de água fria nos lusitanos, claro, mas a volta por cima veio já na partida seguinte.
Felipão mudou o time, colocou os laterais Miguel e Nuno Valente, sacou Fernando Couto da zaga e colocou Ricardo Carvalho, pôs Deco na vaga de Rui Costa e deu a braçadeira de capitão ao meia Figo. Pronto. Com muito mais velocidade e fluidez, Portugal venceu a Rússia por 2 a 0, com um gol de Maniche, aos 7’, em jogada de Deco, e outro de Rui Costa (que entrou na vaga de Simão no decorrer da partida), aos 44’ do 2º T, após receber um lindo passe de trivela de Cristiano Ronaldo.
Ainda precisando de uma vitória para seguir viva na Euro, a seleção portuguesa teve um duelo decisivo contra a vizinha Espanha na última rodada do grupo. A rival estava com quatro pontos e só precisava de um empate, enquanto Portugal tinha que vencer para não depender de outros resultados. Felipão apostou em Cristiano Ronaldo como titular pela primeira vez naquela Euro e muitos esperavam Portugal bem ofensivo. No entanto, o jogo foi disputado e com os dois times precavidos, esperando a famosa “uma bola”. E ela só apareceu no segundo tempo com o toque de Felipão, que tirou Pauleta, colocou Nuno Gomes e este marcou o gol da vitória por 1 a 0 após passe sensacional de Figo, que tocou para o atacante chutar da entrada da área e classificar a seleção encarnada para a fase de mata-mata.
Veja abaixo:
Com seis pontos, Portugal avançou na primeira colocação e ainda por cima eliminou a Espanha, que terminou com a mesma pontuação da Grécia, mas os gregos ficaram com a classificação graças aos critérios de desempate. Faltavam apenas três jogos para o sonho do título europeu.
Enterrando um fantasma e a vaga na final
Nas quartas de final, Portugal teve pela frente a Inglaterra, fortíssima na época com Gerrard, Lampard, Owen, Rooney, Beckham, Scholes, Terry, Campbell e Ashley Cole. O English Team era um dos favoritos ao título e tinha ainda um retrospecto favorável nos duelos contra Portugal: em 20 jogos, eram nove vitórias da Inglaterra, oito empates e apenas três vitórias de Portugal, além da fatídica semifinal da Copa do Mundo de 1966, quando os ingleses eliminaram a brilhante geração de Eusébio e Coluna com o triunfo por 2 a 1. Falando nesse triunfo, Eusébio estava no Estádio da Luz naquele dia 24 de junho de 2004 como membro da comissão técnica da seleção portuguesa, função exercida pelo Pantera Negra desde 1979. Ele era uma espécie de conselheiro e estava bastante nervoso antes do jogo justamente por causa do rival e as más lembranças que ele trazia.
Por conta do gol anotado contra a Espanha, Nuno Gomes começou como titular no ataque, municiado por Cristiano Ronaldo, Figo e Deco. Mas, quando a bola rolou, foi Owen quem abriu o placar logo aos 3’, após falha da zaga, aumentando ainda mais o drama lusitano. O jogo seguiu tenso até Hélder Postiga completar de cabeça um cruzamento de Simão e empatar já no segundo tempo. O 1 a 1 levou o duelo para a prorrogação. Nela, a Inglaterra fez um gol com Campbell, mas o tento foi anulado por falta do zagueiro no lance. Aos 5’ do segundo tempo da prorrogação, Rui Costa saiu outra vez do banco para marcar um gol.
O craque escapou da marcação e chutou forte da entrada da área. Golaço! A classificação estava perto, mas Lampard aproveitou uma bola na pequena área após cobrança de escanteio e empatou: 2 a 2. A decisão seria mesmo nos pênaltis. Antes do início das cobranças, a presença de Eusébio junto aos jogadores trouxe ainda mais ânimo para acabar de vez com o estigma que perseguia os portugueses em duelos contra os ingleses.
“Lembro-me de estar com o Eusébio e tentar acalmá-lo. Aquilo mexeu com ele por causa do Mundial de 1966 e ele estava muito alterado durante os pênaltis. A presença do Eusébio era muito importante para nós. Disse-nos que desta vez íamos ganhar e tudo o que ele nos dizia era com sentimento.” – Ricardo, goleiro de Portugal em 2004, em entrevista ao Notícias Magazine (PT), 24 de junho de 2016.
Nas penalidades, Beckham começou chutando para fora, mas Rui Costa também errou sua cobrança. Já nas cobranças alternadas, Ricardo decidiu tirar as luvas na cobrança de Vassell. Todos ficaram atônitos com a atitude do goleiro, mas deu certo: ele defendeu, em seguida converteu sua cobrança e Portugal venceu por 6 a 5. Enfim, o fantasma estava enterrado! E o instinto de Ricardo, como ele mesmo disse, de fato estava afiado!
“É uma sucessão de acontecimentos que não podes prever. Eu decidi tirar as luvas porque estava farto de ali estar e havia um inglês que nunca tinha convertido um pênalti como profissional. Não foi tanto para colocar pressão, mas para me motivar a mim próprio. Sabia que aquilo podia mudar alguma coisa. Depois foi normal porque era eu a bater a seguir. Curiosamente, já tinha passado a minha vez. Quem marcou na minha vez foi o Postiga e fez aquele panenka (cavadinha) fantástico. Eu era o sexto a marcar, mas estávamos tão focados naquilo que deixamos passar. O Postiga não me viu avançar e pensou que era ele. Depois de o Vassel falhar, o Nuno Valente estava a avançar porque era o número dele, mas eu fiz-lhe sinal a dizer-lhe que era a minha vez. Ainda hoje me agradece!”. – Ricardo, em entrevista ao Notícias Magazine (PT), 24 de junho de 2016.
Foi o jogo mais emocionante daquela Euro. E bem que poderia ser a final tamanha dramaticidade e craques em campo. Por fim, o alívio de Eusébio e seu abraço em Ricardo foram os símbolos de uma partida histórica. “No final, abracei-me a ele para sentir que a nossa promessa de vitória estava ali. Agradeci-lhe as palavras e o carinho e aproveitei para lhe sentir o pulso, para ver se lhe baixava a adrenalina. Ele disse-me: ‘Obrigado, Ricardo. Sozinho ganhaste isto.’ E eu nunca senti que tinha ganho aquilo sozinho. Respondi-lhe que nós é que tínhamos de lhe agradecer por toda a inspiração que nos passava”, disse o goleiro ao Notícias Magazine (PT). Muito emocionado, Eusébio beijou o gramado do Estádio da Luz, remodelado para aquela Euro, mas ainda com a aura icônica que sempre teve e palco de grandes exibições do próprio Pantera Negra. Era um agradecimento por uma noite única e pela vitória de sua querida seleção.
Na semifinal, os lusitanos tiveram pela frente a Holanda, que passava por uma reformulação após a brilhante equipe de 1998-2000, mas ainda tinha nomes de peso como o goleiro Van der Sar, os defensores Reiziger e Stam, o volante Davids, os polivalentes Seedorf e Cocu e o ponta Overmars. Além deles, o técnico Dick Advocaat escalou o centroavante Van Nistelrooy e o atacante Robben. Com duas equipes ofensivas, o jogo foi bastante aberto e Portugal fez sua melhor partida na Euro. Aos 26’, Deco cobrou escanteio e Cristiano Ronaldo subiu de cabeça para marcar o primeiro gol: 1 a 0. O time luso ainda criou várias oportunidades, incluindo uma com Pauleta, que esbarrou no goleiro Van der Sar, e Figo, que chamou Van Bronckhorst para dançar e acertou a trave em chute cruzado dentro da área.
No segundo tempo, em cobrança de escanteio curta, Maniche recebeu e acertou um chutaço de fora da área no ângulo do goleiro holandês para marcar o segundo gol. Cinco minutos depois, Andrade foi tentar interceptar uma bola, mas acabou desviando contra o próprio gol. No entanto, o placar seguiu 2 a 1 e Portugal conseguiu a vaga na final da Euro pela primeira vez na história! Faltava apenas um jogo. Um desafio para a primeira grande taça do selecionado português. E de novo estaria a Grécia no caminho da equipe de Felipão. Era a hora da desforra. De vencer a única equipe que bateu Portugal naquela Euro. E fazer a festa da nação.
Tristeza. Mas orgulho lá em cima
Sol, tempo aberto, um estádio abarrotado de gente e remodelado, uma torcida que reaprendeu a torcer por sua seleção e um time embalado. Assim era o clima todo a favor de Portugal naquela final de Eurocopa. Embora a Grécia tenha derrotado a campeã França e a República Checa, os anfitriões eram francos favoritos e não pensavam em mais uma derrota diante dos azuis de Otto Rehhagel. A Grécia jogava pelo maior feito da história dos esportes coletivos de seu país e para a consagração de um time puramente tático e com a “melhor defesa do mundo”. Já os portugueses queriam a primeira grande glória no futebol mundial e o troféu para coroar uma geração de ouro como há mais de três décadas não se via pelas bandas lusitanas. E mais: o brasileiro Luiz Felipe Scolari tinha a chance de se tornar o primeiro treinador na história a vencer uma Copa e uma Eurocopa por países diferentes.
Quando a bola rolou, a Grécia mostrou-se fria como sempre e conhecedora do estilo de jogo de Portugal. A muralha grega permaneceu intransponível e o iluminado goleiro Nikopolidis mais uma vez fez um punhado de grandes defesas durante os 90 minutos. E, aos 12’ do segundo tempo, em cobrança de escanteio para os gregos, Ricardo Carvalho falhou na marcação, Costinha tentou disputar com Charisteas, mas o grego venceu fácil na subida e testou para o gol de Ricardo: 1 a 0. A zaga lusitana sabia que ele era letal em jogadas aéreas e mesmo assim concedeu espaço suficiente para o atacante marcar.
O 1 a 0 no placar se transformou em drama para Portugal, que tentou de todas as maneiras possíveis, mas falhou na hora de tentar pelo menos o empate e por insistir nas jogadas aéreas, todas interceptadas pelo gigante Dellas. Portugal deu 17 chutes a gol contra apenas quatro da Grécia. Os lusos tiveram 10 escanteios a favor contra um da Grécia – exatamente o que originou o gol. Nem a entrada de Rui Costa no segundo tempo ajudou Portugal.
Quando o árbitro alemão Markus Merk apitou o final do jogo, estava escrita a mais nova mitologia grega. A Grécia era campeã da Europa pela primeira vez. E, pela primeira vez, havia vencido tanto o país-sede (Portugal) como o detentor do título (França) em uma mesma Eurocopa. A comemoração grega sacramentou o ano de 2004 como a temporada com maior quantidade de “zebras” no futebol. Afinal, foi em 2004 que equipes como Zaragoza-ESP (campeão da Copa do Rei), Werder Bremen (campeão Alemão), São Caetano (campeão do Campeonato Paulista), Santo André (campeão da Copa do Brasil) e Once Caldas-COL (campeão da Copa Libertadores) brilharam em cenários tão comuns aos grandes clubes.
Muito abatido, Felipão destacou a eficiência do rival em seu jogo defensivo e lamentou a falha no gol de Charisteas.
“A Grécia é muito forte nas bolas paradas e nas bolas aéreas. (Eles) Ganharam porque sabem jogar muito bem dessa forma, num esquema táctico defensivo. Sofremos um gol de uma forma, que, em princípio, não deveria ter acontecido. Futebol é assim, uma desatenção pode levar à derrota. Peço desculpas por não ter dado uma última alegria ao povo português, mas temos que trabalhar para chegar ao Mundial em excelente condição”. – Luiz Felipe Scolari, em entrevista ao Público (PT), 04 de julho de 2004.
A tristeza tomou conta do Estádio da Luz, que só ouviu ecos de alegria do lado da torcida grega. Muito choro e lamento de uma torcida que tanto queria um título inédito. Porém, havia o respeito. E a certeza de que aquela seleção havia chegado onde muitos não imaginavam no início, quando os holofotes estavam na França, na Inglaterra, na República Checa e na Holanda. Muitos disseram que a derrota de Portugal em casa foi uma espécie de Maracanazo português, em alusão à derrota do Brasil para o Uruguai na Copa de 1950.
Mas as condições eram outras. Portugal era uma equipe em formação, que cresceu ao longo da competição e ainda não estava 100% de suas condições, além de enfrentar um adversário duríssimo, que dificultava qualquer estilo de jogo por causa de sua retaguarda. Já o Brasil de 1950 vinha destruindo seus adversários, goleando, já era um timaço e o título era tido como “favas contadas”. Acontece que desdenharam dos uruguaios, que também tinham uma seleção formidável e muito mais aguerrida. Aí, deu no que deu.
Após a Euro, o presidente de Portugal em 2004, Jorge Sampaio, fez questão de condecorar Luiz Felipe Scolari e os jogadores com a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique, uma das mais altas honrarias do país, pelos serviços prestados à seleção, algo que surpreendeu o treinador e provou o respeito que o povo lusitano tinha pelo que ele havia feito, além de simbolizar uma nova cultura que ele não conhecia, a da valorização de um trabalho mesmo sem o título.
“Com isso eu digo parabéns. Estamos orgulhosos com o que fizemos. Nós perdemos o último jogo. Isso acontece. Mas nós chegamos aqui com muita dignidade. Parabéns a todos os atletas que chegaram aqui com muita classe. […] As lágrimas de ontem (domingo), no final da partida, eu vi nos olhos de vocês, confirmando as altas expectativas, o senso de obrigação e, acima de tudo, o patriotismo”. – Jorge Sampaio, presidente de Portugal em 2004, em trecho extraído de seu pronunciamento e publicado pela Reuters, 05 de julho de 2004.
Em seis jogos, Portugal venceu três, empatou um e perdeu dois, marcando oito gols e sofrendo seis. Ricardo Carvalho, Maniche, Figo e Cristiano Ronaldo foram eleitos para o All-Star Team da competição.
Destino: Alemanha
O primeiro compromisso de Portugal após o vice-campeonato europeu aconteceu já em setembro de 2004, na primeira rodada das Eliminatórias para a Copa do Mundo da Alemanha. Felipão manteve a base e teve como principal desfalque o meia Rui Costa, que anunciou sua aposentadoria da seleção logo após o torneio continental. O grupo dos portugueses não era tão difícil. Os adversários seriam Rússia, Eslováquia, Letônia, Estônia, Liechtenstein e Luxemburgo. E, sem dar qualquer brecha aos rivais, o time de Felipão passou sem sustos.
Na estreia, venceu a Letônia fora de casa por 2 a 0 (gols de Cristiano Ronaldo e Pauleta). Na sequência, goleou a Estônia por 4 a 0, em casa (dois gols de Hélder Postiga, um de Cristiano Ronaldo e outro de Pauleta), empatou com Liechtenstein, fora, em 2 a 2, massacrou a Rússia em casa por 7 a 1 (em atuação coletiva memorável dos lusos, com dois gols de Cristiano Ronaldo, dois de Petit, um de Deco, um de Simão e outro de Pauleta), goleou Luxemburgo fora por 5 a 0, empatou com a Eslováquia fora em 1 a 1, venceu os eslovacos em casa por 2 a 0, bateu a Estônia fora por 1 a 0, venceu Luxemburgo por 6 a 0, empatou sem gols com a Rússia fora de casa, venceu Liechtenstein em casa por 2 a 1 e fechou as Eliminatórias com vitória por 3 a 0 sobre a Letônia, em outubro de 2005. Pauleta, com 11 gols, foi o artilheiro de Portugal, seguido por Cristiano Ronaldo, que marcou sete. Os lusitanos garantiram a vaga no Mundial com nove vitórias e três empates em 12 jogos, 35 gols marcados (média de quase três gols por jogo) e apenas cinco sofridos.
Durante as Eliminatórias, Felipão ainda pôde testar o elenco em alguns amistosos e percebeu que o time vinha em uma ascensão notável, com muito entrosamento entre os jogadores de meio de campo e ataque. Por mais que a Copa do Mundo tivesse grandes seleções no páreo e favoritos de peso como Brasil, França, Itália, Argentina e a anfitriã Alemanha, ninguém podia duvidar do time de Felipão. Ainda mais por ele ser o detentor do título mundial e ter a chance de se tornar o primeiro técnico a vencer duas Copas do Mundo por duas seleções diferentes e o primeiro desde o italiano Vittorio Pozzo a erguer o troféu duas vezes seguidas. Seria simplesmente épico! Na convocação, o brasileiro não fez surpresas e levou ao Mundial os nomes conhecidos dos torcedores. Dos mais tarimbados, Vítor Baía, João Pinto e Quaresma não foram chamados. Com sete vitórias consecutivas somando Eliminatórias e amistosos, a seleção de Portugal chegou à Alemanha tinindo. E pronta para pelo menos repetir a boa campanha da geração de 1966.
Imbatíveis!
A estreia de Portugal na Copa foi contra Angola, na cidade de Colônia. A equipe que entrou em campo era um pouco diferente da Euro, com Fernando Meira na zaga ao lado de Ricardo Carvalho, Tiago e Petit como volantes e Simão, Figo e Cristiano Ronaldo na linha ofensiva, com Pauleta como centroavante de ofício. E, com apenas um minuto de jogo, o camisa 9 quase abriu o placar em chute cruzado que tirou tinta da trave do goleiro angolano. Mas ele se redimiu logo aos 4’, quando Figo invadiu a grande área, escapou do marcador e tocou para Pauleta fazer 1 a 0. Portugal seguiu no ataque, Cristiano Ronaldo mandou uma bola na trave em cabeçada após cobrança de escanteio e teve um grande volume de jogo, mas o placar foi mesmo pela contagem mínima. Aquele foi o 15º jogo seguido sem derrota do time de Felipão, a maior sequência da história da seleção na época.
No duelo seguinte, Felipão voltou a escalar os titulares Costinha, Maniche e Deco, e o time das Quinas não teve trabalho para vencer o Irã por 2 a 0, gols de Deco e Cristiano Ronaldo (de pênalti), ambos no segundo tempo. A vitória classificou o time luso para as oitavas de final e possibilitou o técnico Felipão a chance de poupar alguns jogadores, principalmente Deco, Nuno Valente, Pauleta e Cristiano Ronaldo, que vinham de uma cansativa temporada por seus clubes. Mesmo com vários reservas, a equipe venceu o México na última rodada por 2 a 1, com gols de Maniche, aos 6’ do primeiro tempo, em belo passe de Simão, e do próprio Simão, aos 24’, em cobrança de pênalti. O triunfo, além de confirmar o 100% dos lusos, evitou um confronto contra a Argentina nas oitavas, adversário sempre perigoso em Copas. Por outro lado, o time de Felipão teria um velho conhecido pela frente: a Holanda.
A Batalha de Nuremberg
Algoz dos holandeses na Euro de 2004, Portugal sabia que o rival não seria fácil. Ainda mais depois de a seleção laranja sair viva do chamado “Grupo da Morte” da Copa, ao vencer Sérvia (1 a 0), Costa do Marfim (2 a 1), e empatar com a Argentina em 0 a 0. Embora tivesse grandes nomes, a Holanda não demonstrava o brilho de gerações passadas e o técnico Marco van Basten era muito criticado pelo fato de deixar o atacante Ruud van Nistelrooy no banco e ter preterido nomes como Kluivert e Seedorf para aquele Mundial. Em termos de time e clima, Portugal levava muito mais vantagem para o duelo marcado para a cidade de Nuremberg. Mas, se tratando de Holanda, todo cuidado era pouco para os lusitanos.
No dia do jogo, as escalações eram as melhores possíveis para ambos os lados. Felipão mandou à campo o que tinha de melhor e apostava na criatividade de seu plantel. Do lado holandês, Van Basten deixou mesmo Van Nistelrooy no banco e apostou na entrada de Dirk Kuyt para jogar ao lado de Robben e Van Persie. Além da vitória, a equipe queria diminuir o péssimo retrospecto holandês no confronto e vingar a derrota na semifinal da Eurocopa de 2004. Seria preciso jogar muito futebol para vencer os lusitanos. E força para quebrar a sequência de dez vitórias em dez jogos de Felipão em Copas do Mundo.
Mas, quando a bola rolou, uma verdadeira guerra começou. Ao invés de futebol bem jogado, lances bonitos e gols, o público viu entradas violentas, faltas e mais faltas e um árbitro incapaz de coibir o anti-jogo. Só no primeiro tempo foram cinco cartões amarelos e Cristiano Ronaldo acabou fora da partida já aos 34’ por causa de uma solada que levou de Boulahrouz, que cravou as travas de sua chuteira na coxa do português. Detalhe: o holandês foi advertido com o cartão amarelo, sendo que a falta era para vermelho e fruto de uma selvageria absurda. Felipão, à beira do gramado, ficava enlouquecido com a brandeza do árbitro.
Porém, antes de deixar o campo, Cristiano Ronaldo tocou para Deco pela direita, aos 22’, o meia recebeu e cruzou rasteiro para Pauleta. O centroavante deixou para Maniche, que driblou um, dois e chutou alto sem chances para Van der Sar: 1 a 0. Golaço! E valeu para o jogo inteiro. A partida seguiu selvagem, bruta, e terminou com o seguinte saldo: 16 cartões amarelos (!!) e quatro vermelhos. Foi a partida mais violenta, com maior quantidade de expulsões e de cartões da história das Copas. Um jogo que ficou em segundo plano e ganhou o singelo apelido de Batalha de Nuremberg. Esse duelo foi tão grande que não cabe aqui. Ele tem um capítulo à parte aqui no Imortais. Leia mais clicando aqui.
“Foi uma vitória de heróis, que merecem ser lembrados para sempre. […] O jogo teve a minha cara, a cara da superação. Foi um jogo de Libertadores. É meu papel fazer os jogadores correrem um pouco mais, lutarem um pouco mais. É assim que se vence”. – Luiz Felipe Scolari, em entrevista à Folha de S. Paulo, 26 de junho de 2006.
Aquilo não se assemelhou em nada com um jogo da estirpe de uma Copa do Mundo. Parecia uma volta ao passado. Parecia até uma Copa Libertadores. E, de Libertadores, apenas uma pessoa em meio a toda aquela gente entendia: Luiz Felipe Scolari. Com taças conquistadas por Grêmio e Palmeiras, o treinador brasileiro sabia como vencer aquele jogo. E conseguiu. Fez Portugal ganhar na briga e inflou a Holanda a cair nela. Aquela batalha foi fichinha para ele…
Freguesia inglesa e Ricardo épico
O novo desafio de Portugal seria mais um repeteco da Euro: a Inglaterra. Outra vez Felipão teria o técnico Sven-Göran Eriksson e o English Team pelo caminho em uma fase de quartas de final de Copa, exatamente como na campanha de 2002 com o Brasil. Era um inegável bom presságio, mas o jogo foi bem mais difícil. Sem vários jogadores por causa da Batalha de Nuremberg, Felipão teve que mexer bastante no time. Ele escalou Maniche, Petit e Tiago no meio, mais recuados, fez uma linha ofensiva reduzida, com Cristiano Ronaldo e Figo, e deixou Pauleta na frente.
Precavida, a Inglaterra bloqueou os espaços e praticamente não deu chances ao rival, que teve que arriscar em chutes de fora da área. Portugal não conseguiu sequer aproveitar a expulsão de Rooney logo aos 17’ do segundo tempo para marcar um gol. Truncada, a partida ficou no 0 a 0 tanto nos 90 minutos quanto na prorrogação e foi para os pênaltis. Simão, Postiga e Cristiano Ronaldo converteram para Portugal, enquanto Ricardo se agigantou ainda mais e defendeu as cobranças de Lampard, Gerrard e Carragher, garantindo a vitória por 3 a 1. Foi a primeira vez na história das Copas que um goleiro defendeu três cobranças de pênaltis. Simplesmente épico!
“Eu tinha muita confiança, meus companheiros me deram muita força, mas nunca se sabe o que pode acontecer nos pênaltis. Temos de entregar as coisas a Deus, e hoje Ele foi português. […] Passamos por muitas dificuldades, mas quem trabalha dignamente, mesmo com altos e baixos, nunca é esquecido por Deus. Portugal está de parabéns. É um orgulho enorme pertencer a esta seleção. Tenho de agradecer ao público português que esteve aqui hoje. Foram poucos torcedores, mas com uma alma muito grande”. – Ricardo, em entrevista ao UOL Esporte, 1º de julho de 2006.
Depois de 40 anos, Portugal estava de volta a uma semifinal de Copa. Já era um feito histórico, único. Mas seria preciso superar outro rival de peso e que crescia a cada jogo: a França de Zidane.
Não deu…
Se Portugal era muito mais time do que seus rivais anteriores, não era possível afirmar o mesmo naquele duelo semifinal. A França tinha um elenco experiente, com remanescentes do time campeão do mundo em 1998 e o reforço de outros bons jogadores. Havia Barthez no gol, Thuram e Gallas na zaga, Abidal e Sagnol nas laterais, Makélélé e Vieira no meio de campo, Ribéry, Zidane e Malouda como meias e Henry no ataque. Um timaço, que havia destroçado a Espanha nas oitavas – 3 a 1 – e eliminado o Brasil nas quartas – 1 a 0, com baile de Zizou. Os Bleus ainda tinham um retrospecto favorável contra os portugueses: em 21 jogos, eram 15 vitórias francesas e 5 lusas, com apenas um empate. A última vitória de Portugal havia acontecido no longínquo ano de 1975, em Paris (2 a 0).
Mais descansada do que Portugal – que vinha de duas angustiantes partidas e tinha Figo e Cristiano Ronaldo com desconfortos musculares -, a equipe francesa provou em campo sua força e venceu por 1 a 0, gol de Zidane, de pênalti, aos 33’ do primeiro tempo. Foi a primeira derrota de Felipão em Copas e o fim da invencibilidade de 12 jogos do treinador. Por mais que tenha atacado mais e cruzado 40 bolas para a área francesa, Portugal parou na retaguarda rival assim como havia parado contra a Grécia dois anos antes. Era o ponto fraco do time de Felipão: retrancas. Se um rival conseguisse marcar os principais nomes ofensivos dos lusos e fechar os espaços, o time encarnado não conseguia furar tal bloqueio. O jogo contra a Inglaterra foi um exemplo disso. E contra os gregos lá em 2004 também.
Felipão disse após o jogo que o placar mais justo seria o empate e atribuiu a derrota à arbitragem de Jorge Larrionda (URU), que não marcou um pênalti em Cristiano Ronaldo e insinuou que o árbitro favoreceu a França por ser uma equipe de mais tradição. “Se tem alguém da América do Sul que vai bem, arranjam alguma maneira de tirar [da Copa]. O juiz acertou ao dar o pênalti para a França, mas errou ao não dar o pênalti no Cristiano Ronaldo. Vocês [jornalistas brasileiros] conhecem bem a arbitragem sul-americana. Eles sabem como matar o jogo, sabem fazer o querem”, disse Felipão em entrevista reproduzida pela Folha de S. Paulo, um dia após o jogo.
Na disputa pelo terceiro lugar, Portugal sentiu a fadiga, não teve Figo e foi presa fácil para a anfitriã Alemanha, que venceu por 3 a 1, para a alegria de sua fanática torcida, que deu show naquela Copa mesmo com a eliminação dos germânicos diante da futura campeã Itália na semifinal. Ao final do Mundial, Portugal ganhou o simbólico prêmio de seleção mais empolgante da Copa, em votação feita no site da FIFA. No All-Star Team, os portugueses Ricardo, Ricardo Carvalho, Maniche e Figo foram eleitos entre os melhores da competição. Na volta para casa, a seleção foi recebida com festa em Lisboa e outra vez muito elogiada pela torcida e pelo público. A queda na Copa fez com que o capitão Figo anunciasse sua despedida da seleção lusitana.
À espera de CR7
Felipão ficou no comando de Portugal até 2008, quando se despediu do time após a eliminação nas quartas de final da Eurocopa daquele ano diante da Alemanha. Foi o fim daquela brilhante geração portuguesa, que cedeu espaço para uma outra leva de jogadores aparecer e conseguir, enfim, o que nenhuma outra conseguiu: um título. Em 2016, com Cristiano Ronaldo já como uma estrela mundial e vestindo a camisa 7 (e não a 17), o time levantou a Eurocopa com uma vitória emblemática de 1 a 0 sobre a França na prorrogação em pleno Stade de France e sem CR7, que se lesionou no começo do jogo. Foi a primeira grande conquista de Portugal e que sanou de vez a angústia de milhões de portugueses que tanto torceram e vibraram entre 2004 e 2006 com o time que fez ressurgir a camisa portuguesa no cenário futebolístico mundial e provar que o país ibérico deveria, sim, ter seu lugar de destaque no pelotão de elite do esporte.
O caminho começou a ser pavimentado lá em 1966, ganhou reforços em 2004 e 2006 até ser finalizado em 2016 e também em 2019, quando Portugal venceu a primeira edição da Liga das Nações da UEFA. Com aura própria, a seleção desta segunda década do século XXI já está na história. Mas ela só foi possível graças ao trabalho de Felipão, Ricardo, Miguel, Ricardo Carvalho, Costinha, Maniche, Figo, Deco, Cristiano Ronaldo, Pauleta, Simão e companhia iniciado em 2004, a seleção do ressurgimento português.
Os personagens:
Ricardo: após ser campeão português pelo Boavista em 2001, Ricardo começou a ser convocado naquele mesmo ano para a seleção, mas não conseguia competir com o titular Vítor Baía. Isso só acabou com Felipão, que apostou no goleiro como titular e não se arrependeu. Ricardo fez grandes partidas e virou o carrasco da Inglaterra com os pênaltis defendidos que eliminaram os ingleses na Euro de 2004 e na Copa de 2006. Disputou 79 jogos pela seleção entre 2001 e 2008 até perder espaço para os goleiros Quim e Eduardo. Ricardo detém até hoje o recorde de maior número de pênaltis defendidos em uma única disputa de penalidades na história das Copas do Mundo (três), feito igualado apenas pelo croata Subasic, no duelo de sua Croácia contra a Dinamarca, em 2018.
Miguel: o lateral-direito foi o preferido de Felipão na posição, ganhou a vaga de Paulo Ferreira e cumpriu seu papel com muita regularidade e eficiência. Revelado pelo Estrela Amadora, fez carreira no Benfica e também no Valencia-ESP, onde permaneceu por sete temporadas até encerrar a carreira em 2012.
Fernando Meira: muito bom no jogo aéreo graças à sua altura (pouco mais de 1,90m), o zagueiro foi titular de Portugal na Copa do Mundo de 2006 e fez uma boa dupla ao lado de Ricardo Carvalho. Disputou os sete jogos da campanha lusitana no Mundial. Foram 54 jogos e dois gols pela seleção entre 2000 e 2008.
Jorge Andrade: presente na seleção que disputou a Copa de 2002, Jorge Andrade seguiu nos planos de Felipão e foi titular na Eurocopa de 2004. Não era tão seguro quanto seu companheiro Ricardo Carvalho, mas foi regular na competição. Acabou de fora da Copa de 2006 por causa de uma lesão no joelho.
Ricardo Carvalho: é o 9º jogador na lista dos que mais vestiram a camisa da seleção portuguesa na história com 89 jogos, além de cinco gols marcados. Grande defensor do Porto campeão europeu de 2004, Carvalho marcou época também no Chelsea-ING e se transformou em um dos mais respeitados zagueiros do futebol mundial nos anos 2000. Tinha um notável senso de colocação, eficiência no jogo aéreo, era bom nos desarmes e na antecipação. Foi titular tanto na Euro de 2004 quanto na Copa de 2006. Já veterano, estava no grupo campeão da Eurocopa de 2016.
Nuno Valente: lateral-esquerdo de muita eficiência na marcação, foi outro titular absoluto do time de Felipão naquele período. Vinha em uma grande ascensão pelo Porto e fez bons jogos pela seleção. Disputou 33 partidas e marcou um gol pela equipe encarnada entre 2002 e 2008.
Costinha: especialista nos desarmes e com ótimo senso de colocação, foi um dos motores do meio de campo de Portugal e um dos mais famosos jogadores portugueses dos anos 2000. Se entendia perfeitamente como Maniche e reeditou a dupla de sucesso do Porto na seleção. Foram 53 jogos e dois gols por Portugal entre 1998 e 2006. Disputou as Eurocopas de 2000 e 2004 e a Copa de 2006.
Maniche: com chutes poderosos de fora da área, habilidade e criatividade, foi outro grande jogador de meio de campo a se destacar naquela seleção. Passou a ser convocado exatamente por Felipão, e estreou na vitória sobre o Brasil, em março de 2003, por 2 a 1. Titularíssimo, foi peça-chave na Euro de 2004 e na Copa de 2006. Foram 53 jogos e sete gols pela seleção entre 2003 e 2009.
Figo: um dos maiores craques portugueses de todos os tempos, Melhor do Mundo da FIFA em 2001, vencedor do Ballon d’Or em 2000 e 2º na lista dos que mais vestiram a camisa de Portugal na história com 127 jogos (atrás apenas de CR7), além de 32 gols. Criativo, genial, capaz de passes perfeitos e improváveis e capitão de Portugal na Euro de 2004 e na Copa de 2006. Figo foi tudo isso e muito mais. Um maestro incontestável e figura ilustre daquela geração inesquecível. Leia mais sobre ele clicando aqui!
Tiago: volante eficiente na marcação e no desarme, bom passador e que dava proteção à defesa quando o time partia ao ataque, Tiago foi uma alternativa para Felipão quando o time sofria de algum desfalque no setor de meio de campo. Assim, disputou cinco dos sete jogos de Portugal na Copa do Mundo de 2006. Foram 66 jogos e três gols pela seleção entre 2002 e 2015.
Hélder Postiga: é o sexto maior artilheiro da história da seleção com 27 gols em 71 jogos e começou a ser convocado por Felipão em junho de 2003. Marcou o gol que levou o tenso duelo contra a Inglaterra para a prorrogação nas quartas de final da Eurocopa de 2004 e marcou outros três gols nas Eliminatórias para a Copa de 2006. Por causa da concorrência no ataque, não foi titular absoluto.
Deco: jogando muito, conseguiu desbancar Rui Costa e deixar o astro no banco naquela seleção. Cerebral e com visão de jogo plena, deu muita qualidade ao toque de bola de Portugal e alternativas ofensivas fundamentais ao time. Um dos preferidos de Felipão, foi crucial para o sucesso luso naquela época. Disputou 75 jogos e marcou cinco gols entre 2003 e 2010 pela seleção portuguesa.
Rui Costa: um dos mais notáveis meias da história de Portugal, Rui Costa acabou ofuscado por Deco naquela seleção e vinha passando por problemas físicos em seu fim de carreira. Mesmo na reserva, marcou dois gols na campanha da Eurocopa de 2004 e sonhou em se despedir da seleção com o título europeu. A taça não veio, mas mesmo assim é um ídolo de gerações. Disputou 94 jogos e marcou 24 gols pela seleção. É o 9º na lista dos que mais vestiram o manto encarnado e o 7º maior artilheiro. Leia mais sobre ele clicando aqui!
Cristiano Ronaldo: ainda um garoto que abusava dos dribles e na contenção da bola, Cristiano Ronaldo começou a construir sua história na seleção graças ao técnico Felipão, que apostou no jovem e o escalou como titular já na Euro de 2004. O atacante evoluiu bastante sob o comando do brasileiro e se transformou no que todo mundo já sabe: um dos maiores jogadores de todos os tempos. Enquanto ele não se aposenta, leia muito mais sobre ele pelo Manchester United, no auge pelo super Real Madrid, e, claro, pela seleção campeã da Euro em 2016, além do show que ele deu contra a Espanha na Copa do Mundo de 2018. Ah, sim, CR7 é o maior artilheiro da história de Portugal com 115 gols e também o com maior número de jogos – 186. Só para constar…
Simão: com 85 jogos e 22 gols pela seleção entre 1998 e 2010, o ponta-esquerda foi outro jogador bastante utilizado por Felipão naquela época por conta de sua habilidade, versatilidade e por criar muitas oportunidades de gol. Foi um dos mais talentosos jogadores daquela geração.
Pauleta: foi durante algum tempo o maior artilheiro da história da seleção com 47 gols em 88 jogos, superando Eusébio, que anotou 41 gols em 64 partidas, até ser superado por CR7. Não era um atacante técnico, mas um clássico fazedor de gols que viveu grandes momentos pela seleção. Gostava de jogar isolado na frente para receber passes dos companheiros pelas pontas. Fez uma boa Eurocopa em 2004, foi o artilheiro da equipe nas Eliminatórias para a Copa de 2006, mas decepcionou no Mundial ao anotar apenas um gol, na estreia contra Angola. Fez história, também, pelo PSG-FRA, pelo qual é o 3º maior artilheiro com 109 gols em 211 jogos.
Nuno Gomes: é o 5º maior artilheiro de Portugal com 29 gols em 79 jogos. Alternou partidas como titular e como suplente. E foi nessa última condição que Nuno Gomes marcou o gol da vitória sobre a Espanha que classificou Portugal para a segunda fase da Eurocopa de 2004. Marcou época no Benfica, pelo qual jogou por mais de 10 anos.
Petit: outro jogador do Boavista campeão português de 2001, o meio-campista foi titular em algumas ocasiões e tinha grandes virtudes na marcação e nas roubadas de bola, características que lhe renderam o apelido de “Pitbull”. Disputou 57 jogos e marcou quatro gols pela seleção entre 2001 e 2008.
Luiz Felipe Scolari (Técnico): mesmo sem títulos, o trabalho de Felipão no comando de Portugal entrou para a história e lhe rendeu o profundo e eterno respeito dos portugueses. Ele quebrou paradigmas, trouxe de volta o orgulho do torcedor para com sua seleção e recolocou a equipe lusitana de volta ao cenário futebolístico mundial. Naquela época, enfrentar Portugal era uma dureza para qualquer seleção. Como foi durante anos encarar os times treinados por Felipão. Sem dúvida, treinar a seleção encarnada foi um dos maiores trabalhos do técnico em sua carreira. Scolari comandou Portugal em 74 jogos, acumulando 42 vitórias, 18 empates e 14 derrotas.
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No “papel” acho que essa seleção portuguesa era até melhor que a seleção que foi campeã da Euro em 2016, mas tem a diferença é que CR7 ainda não era esse jogador fora do comum que é hoje.
Deco também é um imortal.
Faz sobre o Boavista de 2001 hehe
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