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Jogos Eternos – Portugal 3×3 Espanha 2018

Data: 15 de junho de 2018

O que estava em jogo: a vitória, claro, e pontos preciosos em busca de uma vaga na segunda fase da Copa do Mundo da FIFA de 2018.

Local: Estádio Olímpico de Fisht, em Sochi, Rússia

Juiz: Gianluca Rocchi (ITA)

Público: 43.866 pessoas

Os Times:

Portugal: Rui Patrício; Cédric, Pepe, José Fonte e Raphaël Guerreiro; William Carvalho e João Moutinho; Bernardo Silva (Quaresma, aos 24’ do 2º T), Gonçalo Guedes (André Silva, aos 35’ do 2º T) e Bruno Fernandes (João Mário, aos 23’ do 2º T); Cristiano Ronaldo. Técnico: Fernando Santos.

Espanha: De Gea; Nacho, Piqué, Sergio Ramos e Jordi Alba; Sergio Busquets e Koke; David Silva (Lucas Vázquez, aos 41’ do 2º T), Isco e Iniesta (Thiago, aos 25’ do 2º T); Diego Costa (Iago Aspas, aos 32’ do 2º T). Técnico: Fernando Hierro.

Placar: Portugal 3×3 Espanha. Gols: (Cristiano Ronaldo-POR, PEN, aos 4’, Diego Costa-ESP, aos 24’, e Cristiano Ronaldo-POR, aos 44’ do 1º T; Diego Costa-ESP, aos 10’, Nacho-ESP, aos 13’, e Cristiano Ronaldo-POR, aos 43’ do 2º T).

 

“CR7 3×3 Espanha”

Por Guilherme Diniz

Quando os grupos da Copa do Mundo da FIFA de 2018 foram sorteados em dezembro de 2017, todos os aficionados por futebol anotaram em suas agendas e lembretes nos smartphones um jogo imperdível, “O” jogo da primeira fase daquele Mundial: Portugal e Espanha, o clássico ibérico, em Sochi, na partida inaugural do Grupo B. Seria o duelo com os últimos três troféus da Eurocopa em campo – os dois da Espanha em 2008 e 2012 e a taça histórica de Portugal de 2016. O jogo entre uma seleção candidatissima ao título contra outra baseada quase que exclusivamente no melhor jogador do mundo, o atleta completo, o destruidor de recordes e um dos maiores fazedores de golos de todos os tempos: Cristiano Ronaldo. Seria mais um duelo entre os ibéricos em uma Copa, a exemplo de 2010, quando a Fúria venceu Portugal nas oitavas de final por 1 a 0 e seguiu firme rumo ao título mundial. Pouco mais de seis meses se passaram desde o sorteio. Muita coisa aconteceu. A Espanha, então favorita, foi pega de surpresa com uma demissão de técnico dias antes da estreia no Mundial. Cristiano Ronaldo atravessava uma incômoda seca em seus últimos três jogos da Liga dos Campeões pelo Real Madrid, e, mesmo campeão, dava como incerta sua permanência no clube merengue.

Será que a ânsia pelo mais aguardado duelo da primeira fase iria cair por terra? De jeito nenhum. No dia do jogo, nunca a realidade superou tanto as expectativas. Cristiano Ronaldo estava com apetite. Endiabrado. No segundo minuto do jogo, já se mandou para a área, pedalou e foi derrubado. Pênalti. E golo. A Espanha buscou o empate. Mas, tempo depois, Cristiano fez mais um, de fora da área. No segundo tempo, a Espanha ressuscitou a arte que encantou o mundo entre 2008 e 2012 e virou para 3 a 2. Mas Cristiano “estava lá”, como ele frisava. E, faltando pouco para o fim do jogo, falta para Portugal na entrada da área. Adivinhe… Cristiano bateu com perfeição, de maneira quase mecânica. E converteu: 3 a 3. Foi Cristiano Ronaldo 3×3 Espanha. Foi a maior partida de um dos maiores jogadores de todos os tempos na maior competição de futebol de todas. Ele precisava de um show desses. Assim como a Copa do Mundo. Foi, também, um jogo de diversos artistas. Como não lembrar de Iniesta e seus passes? Isco e Silva, infernais e flutuando pelo ataque? O mantra do tiki-taka e os 727 passes? O bloqueio quase intransponível português na primeira etapa? E, claro, a presença de Ronaldo, vedete de Sochi, por uma noite a capital ibérica e centro das atenções de pouco mais de 10 milhões de portugueses e quase 47 milhões de espanhóis. É hora de relembrar.

 

Pré-jogo

Julen Lopetegui ficou poucos dias na Rússia. Foto: Pierre-Philippe Marcou/AFP/Getty Images.

 

Antes da emblemática partida, é preciso entender a explosão de uma verdadeira bomba que iria influenciar o futuro de uma das protagonistas daquele duelo: a Espanha. La Roja era uma das favoritas ao título, estava invencível desde 2016, vinha de grandes partidas, de uma goleada de 6 a 1 sobre a Argentina (!) em amistoso pré-Copa e com uma nova e promissora leva de jogadores como Isco, Nacho, Asensio, Lucas Vázquez, Koke entre outros. O técnico Julen Lopetegui, com boas passagens pelas seleções de base da Espanha entre 2010 e 2014, mesclou tais jovens com os já consagrados Diego Costa, Iniesta, David Silva, Piqué, Sergio Ramos e Jordi Alba e aperfeiçoou a metodologia do tiki-taka espanhol. Entre 2016 e 2018, a equipe não só dominou seus rivais como não perdeu um jogo sequer e se mostrou mais goleadora. Nas Eliminatórias, foram dez jogos, nove vitórias, um empate, 36 gols marcados e apenas três sofridos. Somando os amistosos, foram 20 jogos, 14 vitórias e seis empates, 61 gols marcados e 13 sofridos. Aproveitamento de 70%. Média de 3,05 gols por jogo.

Eram números impressionantes que só confirmavam a Espanha como grande favorita ao título mundial – mais até do que a então campeã Alemanha e a vice-campeã europeia França. O problema é que, no dia 13 de junho – isso mesmo, DOIS dias antes da estreia da seleção na Copa do Mundo, o presidente da Real Federação Espanhola de Futebol, Luis Rubiales demitiu Lopetegui. Você deve estar se perguntando qual o motivo, causa, razão e circunstância disso. Pois bem. Rubiales ficou sabendo – assim como todo mundo – que Lopetegui seria o técnico do Real Madrid logo após a Copa. O clube merengue anunciou o treinador no dia 12 de junho em nota oficial.

A notícia caiu como uma bomba e Rubiales não perdoou Lopetegui pela falta de compromisso com a seleção – o treinador tinha acabado de renovar contrato até 2020 com a federação. Ele poderia ter esperado o Mundial acabar para depois fazer tal mudança. Abrir o jogo com a diretoria sobre a proposta do Real. Mas não fez nem isso nem aquilo. Rubiales e a comissão técnica se sentiram traídos, assim como toda a nação espanhola. Jornais chegaram a dizer que Lopetegui “traiu um país inteiro, com exceção dos aficionados do Real Madrid”. Realmente pegou bem mal. Ou melhor, bem péssimo! Rubiales, em coletiva de imprensa, foi categórico:

 

“Existem decisões que temos que tomar baseados na compreensão de como você deve se comportar e na ética. […] Se alguém quer estabelecer um relacionamento com alguém da Federação, tem que falar com o trabalhador e também com a Federação. É básico, porque é a equipe de todos os espanhóis, uma Copa do Mundo é a data máxima. Não podemos ficar de fora de uma negociação de um dos seus trabalhadores e descobrir cinco minutos antes de um anúncio público. Fomos forçados a agir”.

 

Rubiales, Lopetegui e Hierro, quando o treinador renovou até 2020. Foto: EFE.

 

Rubiales foi informado pelo Real Madrid que Lopetegui havia sido contratado cinco minutos antes do anúncio oficial. O presidente da federação pediu para que o anúncio fosse cancelado a fim de evitar problemas na preparação da seleção. Em vão. Os jogadores foram avisados e ficaram perplexos, principalmente os que não eram do Real Madrid. Apenas Sergio Ramos saiu em defesa do treinador. Após várias conversas entre a comissão técnica e os jogadores, eles deixaram bem claro que a liderança de Lopetegui havia se perdido com tal postura. E o caminho natural foi mesmo a demissão. Imediatamente, Fernando Hierro foi anunciado como treinador da Espanha na Copa, ele que fora da equipe de Lopetegui e que também se sentiu traído pelo ex-treinador.

A notícia, como não poderia deixar de ser, repercutiu em todo mundo e atrapalhou bastante o ambiente espanhol na Copa. Por mais que eles deixassem claro que “aquilo não era nada, bola pra frente”, era nítido no olhar e na expressão de cada um o desconforto e desânimo. Todo um trabalho de dois anos havia sido destruído por falta de comprometimento, comunicação e profissionalismo. Algo que só provou o poder do dinheiro no futebol. Quem tem mais, leva. Dane-se a camisa, a história, a Copa. Uma triste e real (que ironia…) constatação.

Do lado português, o clima era bem mais tranquilo, embora a equipe não estivesse na grande fase demonstrada em 2016, quando conquistou a Eurocopa em cima da França em pleno Stade de France (leia mais clicando aqui!). Sem alguns jogadores daquela conquista como Renato Sanches, Nani, André Gomes, Eliseu e Danilo, o time português ainda tinha um bom time, mas não era considerado favorito. Por mais que tenha se classificado para o Mundial com facilidade – nove vitórias e uma derrota em dez jogos – a equipe vinha de uma vitória sobre a Argélia (3 a 0), dois empates (0 a 0 com a Bélgica e 2 a 2 com a Tunísia) e derrota de 3 a 0 para a Holanda, todos amistosos.

O futebol da equipe não empolgava, mas a grande esperança era em Cristiano Ronaldo, melhor do mundo na época, sempre decisivo e o grande estandarte daquela seleção. Mas, assim como todo o time, ele não vinha de grandes jogos também. Pelo Real Madrid, após destruir a Juventus-ITA no mata-mata da Liga dos Campeões de 2017-2018, com direito a gol de bicicleta, ele passou em branco nas semifinais contra o Bayern München-ALE e contra o Liverpool-ING, na grande final. O Real foi (tri)campeão, mas Cristiano comemorou em tom de adeus ao clube merengue. E, nos já citados amistosos, o craque não marcou contra a Holanda e contra a Argélia e não jogou contra Tunísia e Bélgica.

Cristiano vibra com José Fonte, pelas Eliminatórias. Foto: Octavio Passos/Getty Images Europe.

 

Antes eficiente, a zaga portuguesa não vivia grande fase – foram sete gols sofridos em sete amistosos. José Fonte e Pepe, veteranos, não inspiravam confiança e tinham sérios problemas contra adversários habilidosos e rápidos. No ataque, por mais que Gonçalo Guedes fosse tido como promessa, ele também caiu de rendimento na reta final da temporada e tinha sérios problemas de finalização. Ou seja: tudo teria que passar pelos pés de Cristiano Ronaldo. Ele seria o termômetro do time. Se ele brilhasse, o time iria longe. Se estivesse apagado, nada de classificação para Portugal. Mas o capitão luso queria brilhar. Era a quarta Copa na carreira dele. Em 2006, ainda era novato na brilhante seleção comandada pelo técnico Felipão. Em 2010, foi mal, como todo o time. E em 2014 sofreu com lesões e um fraco time português. Ele devia uma boa atuação para a Copa. E a Copa precisava de um bom Cristiano Ronaldo para sua rica história.

Foto: Fifa.com

 

No dia do jogo, os times foram a campo com o que tinham de melhor. A Espanha tinha a chance de apagar a desconfiança de sua conturbada semana e queria uma boa estreia para tentar amenizar o estigma de ir mal em suas partidas inaugurais de Copas do Mundo. Em 14 estreias em Mundiais, La Roja havia vencido apenas quatro. Até em 2010, ano do título, ela perdeu (1 a 0 para a Suíça) e, em 2014, levou o chocolate histórico de 5 a 1 para a Holanda (leia mais clicando aqui!). Já Portugal queria a vitória para vingar, em parte, a eliminação para a Espanha nas oitavas de final da Copa de 2010 e um triunfo que certamente iria encher o time de moral para a sequência da primeira fase. Para eles, era proibido perder. Era questão de orgulho. Contra Irã e Marrocos, eles tinham certeza de que iriam vencer. Ou seja: o vencedor daquele duelo seria o primeiro colocado do grupo. Nos hinos, os portugueses cantaram com entusiasmo, e Cristiano mostrou estar aceso, pronto para brilhar. Na Marcha Real espanhola (sem letra), os espanhóis mostraram um semblante mais sério, tenso. La Roja iria dar o pontapé inicial. Diego Costa, sozinho, era quem tinha a bola. Após a contagem regressiva, ele tocou para trás. E a pelota começou a rolar…

 

Primeiro Tempo – A amostra do capitão

Foto: Fifa.com

 

Com o hino ainda fresco na cabeça, os jogadores de Portugal começaram mais empolgados. Cristiano Ronaldo pegou na bola pela primeira vez aos 54 segundos e escutou as primeiras ovações em Sochi. Aos dois minutos, eis que o craque apareceu pra valer. Ele invadiu a grande área, pedalou e foi derrubado na passagem por Nacho. Pênalti. Na batida, óbvio, o camisa 7 foi para a bola. Chute forte, firme, no canto esquerdo de De Gea: 1 a 0. Não havia começo melhor para Cristiano. E pior para a Espanha, que sofria logo de cara um duro golpe. Portugal tentava fechar os espaços, dificultar o jogo espanhol e a chance de passes e tabelinhas típicas da seleção roja.

A primeira chance espanhola veio só aos 9’, quando um chute de David Silva subiu demais. A equipe do técnico Hierro passou a dominar o jogo, sem pressa. Como não encontrava espaço, tentava passes longos com Ramos e Busquets, sem sucesso. Aos 12’, um raro momento de domínio português, que durou pouco menos de um minuto. Os encarnados queriam tomar as rédeas, mas a Espanha adiantava a marcação. Aos 15’, Portugal engatilhou um contra-ataque com Gonçalo Guedes e Cristiano no canto esquerdo. O caminho natural seria Guedes conduzir a bola, tentar o drible e tocar na medida para o capitão finalizar a jogada. Mas o jovem se atrapalhou, levou a bola para o lado oposto ao de Cristiano e perdeu.

Aos 17’, Busquets cometeu falta em Guedes e levou amarelo. Na cobrança, a bola chutada por Cristiano explodiu na barreira. A Espanha respondeu aos 20’, em linda jogada de Iniesta pela esquerda, que tabelou, entrou na área, deixou com Silva, mas a bola bateu na zaga e foi para escanteio. Após a cobrança, Portugal retomou a bola e começou mais um contra-ataque rápido. Bruno fernandes tocou para Cristiano. Eram três contra dois. O capitão não foi fominha e deixou com Guedes, que, ao invés de bater direto, tentou ajeitar, pensar, etc, etc. Resultado: foi desarmado antes de finalizar e perdeu a chance do segundo gol.

Diego Costa não perdoou e empatou para a Espanha. Foto: Fifa.com

 

Sabe a famosa frase “a bola pune”? Pois é. Dois minutos depois, Diego Costa recebeu um lançamento em profundidade, pintou e bordou na zaga portuguesa e fez um golaço: 1 a 1. Tudo bem que ele deixou o braço em Pepe antes de começar a driblar todo mundo, mas se o VAR não viu, ninguém viu! O gol ressuscitou a Espanha. Que passou a azucrinar Portugal. Aos 25’, um lance impressionante. Após chegada espanhola pela esquerda, a zaga portuguesa rebateu e a bola sobrou para Isco. O meia encheu o pé, a bola bateu no travessão, em cima da linha e saiu. Os espanhóis pediram gol, mas a redonda não cruzou totalmente a linha. Na sequência, um espanhol estava impedido e Portugal conseguiu respirar aliviado. Aos 27’, Bruno Fernandes levou amarelo e o jogo ficou tenso, com a Espanha muito mais incisiva. Na cobrança de falta, David Silva mandou a bola na barreira. Aos 33’, a Espanha foi com três jogadores tomar a bola portuguesa, num claro exemplo de sua gana pelo gol. Aos 34’, linda tabela de Diego Costa com Iniesta, com toque de letra do centroavante para o camisa 6, que deixou com Jordi Alba, este cruzou, deixou com Iniesta e ele chutou. A bola caprichosamente passou pertinho da trave esquerda. Por centímetros a virada não aconteceu!

Os times em campo: Espanha usou e abusou dos passes e tabelinhas. Portugal apostou nos contra-ataques e se fechou com duas linhas de quatro.

 

Cristiano chutou…

 

… E De Gea aceitou…Foto: Dean Mouhtaropoulos / Getty Images.

 

Aos 37’, Iniesta tabelou com Alba, deu um passe magistral e a zaga portuguesa conseguiu mandar para escanteio. Aos 42’, Isco chutou após triangulação pela direita e Rui Patrício defendeu. O jogo estava todo para a Espanha. E nada para Portugal. Até que, perto do fim, Rui Patrício mandou com as mãos para Cristiano Ronaldo iniciar um contra-ataque. A bola chegou até Bruno Fernandes, que recebeu e tocou no meio. A bola passou por William Carvalho, Bernardo Silva e Cédric, que cruzou, mas a zaga afastou. Portugal recomeçou a jogada e Gonçalo Guedes recebeu na entrada da área. Ele já havia perdido duas chances claras de gol. A terceira seria demais. Por isso, ao ver Cristiano por perto, o jovem não quis continuar a jogada. Ele tocou para o capitão. Era melhor deixar com quem entendia perfeitamente do assunto. O camisa 7 chutou e o goleiro De Gea… Aceitou, num legítimo pollo do espanhol: 2 a 1. Ao final do primeiro tempo, a Espanha viu que seus 63% de posse de bola não adiantaram nada. Portugal estava na frente e se mostrava mais perigoso nos contra-ataques. E Cristiano era o grande perigo. Se a bola sobrasse no pé dele…

 

Segundo tempo – A virada e o triplete do veterano

Iniesta (à dir.) em ação: craque fez grande partida em Sochi. Foto: Fifa.com

 

Os times voltaram para o segundo tempo iguais, com Portugal mais recuado em seu campo de defesa e a Espanha mais no ataque. Aos 5’, a roja mostrou alguns dos vícios que seriam vistos na Rússia: estava no campo de ataque, com várias opções e o rival todo retraído. Ela tocou, tocou e tocou sem dar um chute. Sem arriscar. Só aos 8’ que a equipe começou a mudar. Em falta ensaiada pouco depois da meia lua, David Silva mandou pra área, Busquets ajeitou de cabeça e Diego Costa, livre, só teve o trabalho de empurrar para o gol dentro da pequena área: 2 a 2. Portugal sentiu o gol. E, quatro minutos depois, uma jogada clássica da Espanha terminou de maneira sublime.

Pela esquerda, Isco tocou para Alba, que dominou e viu David Silva aparecer para arrumar a jogada com dois dribles. Ele tocou para Isco, que tentou o chute, mas a bola bateu no zagueiro e sobrou na entrada da área, do lado direito. Nacho apareceu, bateu seco, de primeira, na “cara” da bola. Ela pegou um efeito que nem os mais inteligentes cientistas russos poderiam explicar, foi pro gol, bateu em uma trave, percorreu a linha, bateu na outra e entrou: GOLAÇO! A Espanha estava na frente. Enfim, uma rara vitória em estreia de Copa. Um prêmio a tanta insistência. Será que eles tinham superado a turbulência dos últimos dias? Parecia que sim.

Diego Costa empatou de novo…

 

… A Espanha foi pra cima…

 

… E virou com um golaço de Nacho. Fotos: Fifa.com

 

Portugal tentou uma resposta de imediato, em vão. No meio de campo, a Espanha dominava. Iniesta passava como queria. Silva fazia uma bela partida, com velocidade, dribles e flutuando por todo ataque. Em 20 minutos do segundo tempo, Portugal era simplesmente nulo no ataque. O técnico Fernando Santos decidiu mexer no time aos 22’, quando João Mário entrou no lugar de Bruno Fernandes e, em seguida, Quaresma assumiu o posto de Bernardo Silva. A Espanha também mexeu com a entrada de Thiago no lugar de Iniesta, aplaudido de pé pelo estádio. Logo em sua primeira aparição em campo, Thiago surgiu em boa jogada espanhola com Silva, Alba e Costa, que finalizou, mas sem perigo.

Minutos depois, Portugal tentou responder com Pepe, que apareceu após cobrança de escanteio e quase mandou a bola pro gol, e Quaresma, com um chute de trivela que acabou saindo sem pontaria. Aos 33’, Cristiano, sumido naquela segunda etapa, recebeu de Cédric, tocou por cima, dividiu com De Dea e Quaresma não conseguiu aproveitar o rebote. O jogo foi se aproximando do final e a Espanha parecia contente com a virada. Com toques rápidos, tabelas e domínios perfeitos, o time lembrava em determinados momentos a equipe encantadora de 2008-2012. Realmente, aquela Espanha era favorita ao título.

Mas, aos 40’, o experiente zagueiro Piqué cometeu um erro que atletas como ele jamais poderiam cometer. Ele derrubou Cristiano Ronaldo na entrada da área faltando cinco minutos para o fim. Justo ele. Um jogador que precisava de pouco para fazer muito. O estádio inteiro ficou na expectativa. Se levantou. O camisa 7 pegou a bola, contou os passos. Respirou fundo. Arregaçou o calção. Olhou para o gol. Concentrado. Era a chance. Do empate. Ele não queria perder para a Espanha de novo. Era questão de orgulho. Ele tratava aquela Copa do Mundo como “a” Copa. Talvez a derradeira de sua carreira. Cristiano bateu, a bola passou milimetricamente pela barreira, por fora, pouco depois de Sergio Busquets colocar a cabeça de lado em busca dela. O goleiro De Gea nem foi na bola. Nem se atreveu. GO-LA-ÇO! Na comemoração, Cristiano falou: “eu estou aqui!” E como estava! Ele se tornava o mais velho jogador a anotar um hat-trick na história das Copas: 33 anos de idade. Era uma clara alusão ao 3 a 3 no placar em Sochi.

Cristiano dispara o chute…

 

… A bola viaja…

 

… Passa pela barreira…

 

… E entra no gol!

 

Portugal 3×3 Espanha! Ou melhor: CR7 3×3 Espanha! Fotos: Fifa.com

 

E ainda tinha jogo! Nos acréscimos, Portugal foi pra cima em busca da virada. Aos 46’, o time encarnado apareceu pela esquerda, Quaresma fintou um, dois, e, na hora em que ia chutar para fazer um golaço, foi travado pela zaga. Em seguida, cruzamento para a área. Cristiano estava ali, pronto para o quarto, mas a zaga espanhola conseguiu afastar. Que sufoco! Após quatro minutos de tempo extra, o árbitro apitou o final do jogo. Aplausos. Vibração portuguesa. Cristiano, com sorriso de orelha à orelha e “Homem do Jogo”, cumprimentou cada um de seus companheiros dizendo “até o fim, até o fim”. Ele era a referência, o estandarte daquele time em busca de uma glória inédita. Do lado espanhol, decepção por ter deixado escapar uma vitória de virada que seria apenas a quinta em 15 estreias de Mundiais. Mas não foi.

O fato é que o empate foi o resultado justo a dois times que jogaram muito futebol e proporcionaram um espetáculo digno aos presentes em Sochi. A Espanha teve lapsos de arte, colocou os portugueses na roda em vários momentos do jogo, mas Portugal teve o antídoto para tudo aquilo personificado em um jogador: Cristiano Ronaldo, que fez sua maior partida em uma Copa do Mundo na carreira. A Copa precisava disso. Cristiano precisava disso. Foi um jogo inesquecível. E que estará para sempre entre as maiores partidas da história dos Mundiais.

Foto: Fifa.com

 

Pós-jogo: O que aconteceu depois?

Portugal: no duelo seguinte, contra Marrocos, Portugal venceu por 1 a 0 com mais um gol de Cristiano Ronaldo. Tudo levava a crer que aquela Copa realmente seria dele. E que, talvez, tivéssemos um desempenho individual semelhante ao de outras estrelas em edições passadas como Rivaldo, Romário, Maradona, Garrincha… Mas Cristiano não balançou mais as redes. Pior: perdeu um pênalti no empate em 1 a 1 com o Irã que quase custou a vaga encarnada às oitavas de final. No sufoco, os portugueses conseguiram chegar entre os 16 melhores times da Copa. Mas, contra o Uruguai, Cristiano viu outro jogador brilhar: Cavani, autor de dois gols e estrela da classificação da Celeste após vitória por 2 a 1. A seleção portuguesa foi eliminada, mas Cristiano saiu com seu melhor retrospecto em um Mundial na carreira e dois recordes: ele se tornou um dos quatro jogadores a marcar pelo menos um gol em quatro Copas diferentes e o jogador mais velho a marcar um hat-trick na história das Copas (33 anos). E tudo isso graças ao iluminado dia do português em Sochi.

 

Espanha: aquele empate histórico com Portugal foi o único grande jogo da Espanha na Copa. Nas partidas seguintes, a equipe parece ter se esquecido de como produzir grandes espetáculos e foi totalmente aquém de seus princípios. Contra o Irã, o time venceu por um magro 1 a 0. Contra Marrocos, estava perdendo por 2 a 1 até os 46’ do segundo tempo quando Iago Aspas empatou e salvou a classificação do time de Hierro. Nas oitavas, a Espanha enfrentou a dona da casa (Rússia), usou e abusou da posse de bola, mas foi de uma morosidade sem igual. Após empate em 1 a 1 no tempo normal e na prorrogação, a equipe caiu nos pênaltis e voltou mais cedo para casa. Castigo pela falta de ímpeto ofensivo.

Para se ter uma ideia, a equipe teve 75% de posse de bola, trocou incríveis 1137 passes (a Rússia teve 284…), mas não criou quase nada. Foi uma enorme decepção pelo fato de o time ter jogado tão bem na estreia. Hierro não seguiu no comando técnico e Luis Enrique, ex-treinador do goleador Barcelona de 2014-2017, é quem tem a missão de levar a Espanha de volta aos trilhos. E aos gols. Inspiração e bons jogadores ele tem de sobra. É só colocar tudo isso em prática. Se precisar refrescar a memória, é só rever aquele jogo contra Portugal. Ou os 6 a 1 contra a Argentina, a final da Euro de 2012 contra a Itália…

A Copa na Rússia definitivamente não deixará saudades à Espanha. Foto: Fifa.com

 

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Comentários encerrados

5 Comentários

  1. Sou um grande fã do Imortais á muito tempo. E tô curtindo demais os jogos da recente Copa já serem imortalizados aqui. Um outro jogo que também foi de tirar o fôlego foi Bélgica 3×2 Japão pelas Oitavas. Espero vê-lo aqui em breve.
    Abraços

  2. Os textos da copa da Rússia estão excelentes, notei que os árbitros de vídeo mais atrapalharam que ajudaram e o Brasil foi o maior exemplo disso.

    Ressalto aqui, a respeito da histórica campanha dos croatas, o trabalho de Iva Olivari na seleção xadrez e deixo novamente a sugestão de termos um texto a respeito do futebol feminino.

    Abraços

  3. Olá Gilherme mais uma vez dexou um show de bola. Eu sou torcedor do Chelsea desde pequeno e eu gostaria muito de saber se aquele Chelsea de 2004-2008 será imortalizado. Obrigado e fique com Deus

Craque Imortal – Zanetti

Jogos Eternos – Vasco 1×3 Flamengo 2001