Nome: Olympiastadion
Localização: Berlim, Alemanha
Inauguração: 1º de agosto de 1936
Proprietário: Governo de Berlim
Capacidade: 74.475 pessoas
Por Guilherme Diniz
Com quase 100 anos de história, ele acompanhou a transformação de um país. Viu sua ascensão, sua queda, sua divisão, sua reunificação, sua transformação, sua redenção. Abrigou momentos marcantes tanto na política quanto no esporte. Foi sede das Olimpíadas de 1936, quando registrou públicos superiores a 100 mil pessoas e viu histórias emblemáticas, sendo a principal delas de Jesse Owens, que calou a arrogância e prepotência de Hitler ao conquistar quatro medalhas de ouro e enterrar a ideia da supremacia ariana dos nazistas. Foi palco da Medalha de Ouro da Itália no futebol, maior seleção do planeta na década de 1930. Durante a Segunda Guerra Mundial, conseguiu passar quase ileso, servindo como abrigo antiaéreo e fábrica oculta, perdendo apenas sua enorme Torre do Sino de 77 metros, mas cujo sino resistiu aos bombardeios e segue até hoje em um memorial do estádio.
Anos depois, registrou o maior público da Bundesliga na história – mais de 88 mil pessoas -, abrigou partidas da Copa do Mundo de 1974 e outra Copa do Mundo, em 2006, quando a Itália, de novo, fez a festa ao levantar sua quarta Copa diante da França. Moderno, histórico, belíssimo e um monumento icônico, o Estádio Olímpico de Berlim, também conhecido como Olympiastadion, é um dos mais famosos estádios do mundo, orgulho alemão e um marco na arquitetura do país. É hora de conhecer a história dessa verdadeira lenda do esporte.
Os primórdios
Durante os Jogos Olímpicos de 1912, em Estocolmo (Suécia), a cidade de Berlim foi escolhida como sede das Olimpíadas de 1916. Isso motivou o governo a construir um estádio digno para abrigar o evento e a área já estudada pelo comitê do país era onde estava a pista de corrida de cavalos em Grunewald. Com capacidade para 40 mil pessoas, a pista tinha uma depressão de 85 mil metros quadrados que era onde o futuro estádio poderia ser construído. Em agosto de 1912, as escavações para o Estádio Nacional (ou Deutsches Stadion, como era chamado na época) começaram com base no projeto de Otto March, um dos mais renomados arquitetos do país. Em apenas 200 dias, o estádio foi construído e inaugurado em 08 de junho de 1913, mas os Jogos de 1916 acabaram cancelados por causa da Primeira Guerra Mundial.
Com isso, o Deutsches Stadion serviu como hospital no pós-guerra e só nos anos 1920 que passou a ser utilizado para jogos de futebol, disputas de atletismo entre outros esportes. Naquela década, o estádio ganhou o nome de German Sport Forum após uma área dedicada ao ensino de professores de educação física e ao estudo da ciência do esporte ser construída ao nordeste do local do estádio. Em 1925, Werner March e Walter March, filhos de Otto March, despontaram como promissores arquitetos e, após vencerem um concurso, foram designados a projetarem um anexo poliesportivo ao estádio.
Mas, após Berlim virar sede dos Jogos Olímpicos, dessa vez em 1936, o partido nazista que venceu as eleições de 1933, sob liderança de Adolf Hitler, decidiu construir um novo estádio que pudesse refletir a força do partido e usar os jogos como propaganda do regime que iria dominar a Alemanha nos anos seguintes. Com um orçamento superior a 6 milhões de marcos (estima-se que o valor total da obra tenha chegado aos 25 milhões), o Reichssportfeld seria construído cerca de 13 metros acima do antigo estádio, e teria um estádio olímpico, uma área para ginástica (o Maifeld), um anfiteatro e várias locações para a prática de esportes como natação, hipismo e hóquei na grama. O novo projeto foi feito pelos irmãos March e iniciado em 1934, sendo concluído em 1936 em uma área de 132 hectares.
Quando finalizado, o Olympiastadion de fato refletiu a grandeza idealizada pelos nazistas. O estádio tinha capacidade para 110 mil pessoas e era simplesmente majestoso. Com o gramado ao centro e uma grande pista de atletismo em volta, o estádio tinha imponentes arquibancadas que, ao contrário da maioria dos estádios olímpicos, não fechavam o arco, mas tinham um espaço para o portão de maratona e um altar onde residia a pira olímpica. Do lado de fora, se destacava ainda a Torre do Sino, com 77 metros e altura e um enorme sino de bronze. No topo da torre, os oficiais que ficavam vigiando o estádio em dias de jogos tinham uma vista plena de toda cidade de Berlim. A perfeição nos detalhes e sua beleza eram o cartão postal idealizado pelos nazistas para os Jogos e viraram o marco da grandeza e perfeição da arquitetura alemã.
As histórias de 1936
A Alemanha se preparou como nunca para ir bem nas Olimpíadas de 1936. E, de fato, ela foi. O país liderou o quadro final de medalhas com 33 ouros, 26 pratas e 30 bronzes, ficando à frente dos EUA (24 ouros, 20 pratas e 12 bronzes) e Hungria (10 ouros, uma prata e cinco bronzes). Porém, nos esportes coletivos, os germânicos acabaram fracassando. No futebol, o torneio teve protagonismo da Itália, então campeã mundial em 1934 e que conseguiu levar um time fortíssimo com os defensores Foni e Rava e o meia Ugo Locatelli, além do lendário técnico Vittorio Pozzo.
Sem Argentina e Uruguai na disputa, os italianos venceram EUA (1 a 0), Japão (8 a 0), Noruega (2 a 1) e Áustria (2 a 1), conquistando o Ouro pela primeira vez. Annibale Frossi, que jogava na Ambrosiana-Inter, foi o artilheiro do torneio com 7 gols, dois deles na final, que teve um público recorde na época de 90 mil pessoas. Dois anos depois, em 1938, a Itália venceria outra Copa do Mundo e consagraria outra seleção imortal.
A Índia venceu no hóquei sobre a grama e a Hungria venceu o torneio de polo aquático. Mas os momentos mais emblemáticos foram, sem dúvida, as provas de atletismo, nas quais as equipes estadunidenses venceram as principais disputas e Jesse Owens faturou quatro medalhas de ouro: no revezamento de 4x100m (39s8), os 100m (10s3) e 200m rasos (20s7) e o salto em distância (8,06m). Negro, Owens derrubou a crença de “superioridade ariana” que os nazistas proclamavam na época e seus feitos foram uma resposta direta ao racismo e à segregação que o governo local impunha na época.
Durante suas vitórias, Owens foi aplaudido pela primeira vez por plateias de maioria branca. Ele compartilhou, também, quartos com atletas brancos pela primeira vez. Entre uma de suas vitórias, Owens retribuiu um aceno de cumprimento de Hitler, derrubando a lenda de que o chefe dos nazistas teria ignorado a vitória do estadunidense. Owens nunca quis polemizar sobre o tema e nunca falou mal dos alemães. Vale lembrar que o atleta, ao contrário do que se esperava, não recebeu qualquer parabéns do presidente dos EUA na época, Franklin Delano Roosevelt. Foi durante as Olimpíadas de 1936 que começou pela primeira vez o revezamento da tocha olímpica, que saiu de Olímpia, na Grécia, e chegou à Berlim. Desde então, a tradição é mantida nos anos dos Jogos.
“Sobrevivente” de Guerra
Após as Olimpíadas, o Estádio Olímpico de Berlim virou palco oficial da final da Copa da Alemanha de futebol e abrigou a primeira decisão em 1937, quando o Schalke 04 derrotou o Nuremberg por 2 a 0. Nos anos seguintes, os nazistas começaram a dominar territórios na Europa e a eclosão da Segunda Guerra Mundial transformou o complexo do Reichssportfeld em abrigo antiaéreo e local para fabricação de armas e bombas, além de depósito de comida e vinho. Embora estivesse na capital alemã, o complexo pouco sofreu durante as batalhas e só foi alvejado algumas vezes por submetralhadoras.
Quem acabou sofrendo com a Guerra foi a Torre do Sino, alvejada severamente por bombas em 1945 e demolida após a guerra em 1947 pelos britânicos. Em 1960, a Torre do Sino foi reconstruída usando os planos originais de Werner March. A nova torre manteve a aparência e a função da original e é uma atração turística até hoje. Os visitantes podem subir até o topo e apreciar vistas panorâmicas do complexo esportivo e da cidade de Berlim. O Sino Olímpico original, que havia sido recuperado do Lago de Wannsee onde tinha sido jogado pelos britânicos, foi colocado em exposição no térreo da torre, em um memorial. A torre também abriga uma exposição sobre a história do estádio e dos Jogos Olímpicos de 1936.
No pós-guerra, o Estádio Olímpico foi dominado pelos britânicos, que fizeram reformas no local e uma intensa limpeza, que incluía destruição de armas, bombas e o enterro de corpos encontrados principalmente nas áreas externas e no Maifeld. Nos primeiros anos da década de 1950, foram realizados reparos básicos para tornar o estádio funcional novamente, incluindo a remoção de escombros e a reparação de estruturas danificadas. Após os julgamentos e a volta da normalidade no país, as autoridades alemãs renomearam oficialmente o Reichssportfeld para Olympiastadion, eliminando por completo o passado nazista que ainda persistia no local.
Das mudanças à volta do protagonismo
Durante a década de 1960, o estádio Olímpico de Berlim passou por mais obras de modernização para atualizar suas instalações e acomodar melhor os espectadores. Isso incluiu a melhoria dos assentos, a atualização dos sistemas de iluminação e som, e a construção de novas áreas de serviço. No final da década, o estádio registrou o recorde de público em uma partida de Bundesliga, quando o Hertha Berlim, que passou a mandar seus jogos no Estádio Olímpico, enfrentou o Colônia para um público de 88.075 pessoas. Nos anos 1970, o Olympiastadion foi expandido para acomodar mais espectadores, com a capacidade aumentada para atender à crescente demanda por eventos esportivos e culturais. Parte das arquibancadas receberam uma cobertura e 26 mil lugares ficaram protegidos do sol e da chuva.
O estádio foi um dos palcos da Copa do Mundo de 1974, mas recebeu apenas três jogos: a vitória da Alemanha Ocidental por 1 a 0 sobre o Chile (com 81.100 pessoas), o empate da Alemanha Oriental em 1 a 1 com o Chile e o 0 a 0 entre Austrália e Chile, todos os jogos válidos pelo Grupo A. Embora fosse um estádio histórico, o Olímpico de Berlim acabou preterido naquela Copa pelo Olímpico de Munique e pelo Westfalenstadion, que foram os principais palcos do Mundial vencido pelo timaço de Beckenbauer, Gerd Müller e companhia.
Mas, entre os anos 1990 e 2000, o Olímpico de Berlim passou por novas reformas com foco total na Copa do Mundo de 2006, competição na qual o estádio foi o principal nome do torneio. A superfície do campo foi rebaixada e a pista de atletismo foi pintada de azul em homenagem ao Hertha Berlim. Uma das mudanças mais importantes foi a cobertura completa de todos os 74.475 assentos. Os custos foram de 242 milhões de euros e mantiveram boa parte da aura histórica do estádio, em especial a fenda que abriga a pira olímpica. Com isso, o estádio se tornou um dos mais modernos do país, recebeu classificação máxima da UEFA (categoria Elite) e foi palco de seis jogos na Copa de 2006:
- Brasil 1×0 Croácia, Grupo F
- Suécia 1×0 Paraguai, Grupo B
- Equador 0x3 Alemanha, Grupo A
- Ucrânia 1×0 Tunísia, Grupo H
- Alemanha 1×1 Argentina (vitória da Alemanha por 4 a 2 nos pênaltis), quartas de final
- Itália 1×1 França (vitória da Itália por 5 a 3 nos pênaltis), final
Curiosamente, a Itália voltou a celebrar um grande título no estádio assim como fizera em 1936. Comandada por lendas como Buffon, Cannavaro, Pirlo, Totti e o técnico Marcello Lippi, a Azzurra encerrou um jejum de 24 anos sem títulos em Copas e bateu a França de Zidane na final com triunfo nos pênaltis após empate em 1 a 1 no tempo regulamentar.
Sediar uma final de Copa trouxe ainda mais peso ao Olímpico de Berlim, que voltou a abrigar mais jogos importantes, shows e eventos esportivos. O estádio viu Usain Bolt quebrar os recordes mundiais nos 100m e 200m durante o Mundial de Atletismo de 2009, além de abrigar partidas de baseball e até futebol americano. Em 2011, o estádio sediou a abertura da Copa do Mundo Feminina da FIFA, no triunfo da Alemanha sobre o Canadá por 2 a 1, e em 2015, 70.244 pessoas viram o 5º título europeu do Barcelona, que derrotou a Juventus por 3 a 1 e se tornou o primeiro clube a conquistar dois Trebles na história (o primeiro foi em 2009).
Naquele dia, a equipe catalã consagrou de vez um esquadrão memorável comandado pelo trio MSN e por nomes como Ter Stegen, Rakitic, Iniesta e Busquets. Em 2024, o estádio foi palco de seis jogos da Eurocopa, incluindo três partidas da fase de grupos, uma das oitavas de final, uma das quartas de final e a grande final, disputada em 14 de julho de 2024 e que teve a Espanha como campeã ao derrotar a Inglaterra por 2 a 1. Com um misto de modernidade e classicismo, o Olímpico de Berlim é um orgulho do povo alemão e um verdadeiro patrimônio cultural do país.
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