Grandes feitos: Campeão do Campeonato Brasileiro (2021), Campeão da Copa do Brasil (2021) e Campeão do Campeonato Mineiro (2021). Reconquistou o título do Brasileirão após 50 anos de jejum, conquistou a Copa do Brasil com a melhor campanha da história do torneio e levantou a Tríplice Coroa do futebol nacional, algo que não acontecia no Brasil há 18 anos.
Time-base: Éverson; Mariano (Guga), Nathan Silva (Igor Rabello / Réver), Junior Alonso e Guilherme Arana (Dodô); Jair (Tchê Tchê) e Allan (Hyoran); Zaracho (Eduardo Sasha), Nacho Fernández (Nathan / Vargas) e Keno (Savarino / Diego Costa); Hulk. Técnico: Cuca.
“O Galo do Triplete”
Por Guilherme Diniz
A imagem em preto e branco sempre aparecia quando o assunto Campeonato Brasileiro vinha à tona. O time posado de 1971. O mestre Telê no banco. O gol solitário de Dadá Maravilha no Maracanã. A glória inédita. Outras chances vieram. A primeira, em 1977, com um timaço que conseguiu ser vice-campeão brasileiro invicto e com um artilheiro implacável autor de 28 gols em apenas 18 jogos. Malditos pênaltis… Três anos depois, em 1980, outro esquadrão sensacional e uma final eletrizante contra o Flamengo, no Maraca, diante de mais de 130 mil pessoas. Reinaldo, mesmo machucado, marcou dois gols. O empate era do Galo. Mas uma péssima arbitragem – e o carrasco Nunes – sepultaram o sonho do bi. Em 1999, a dupla de ataque Marques e Guilherme fez o torcedor sonhar, mas o Corinthians foi mais forte e levou o título. No novo século, um Bruxo comandou um time cheio de alternativas no Brasileiro de 2012, mas a força demonstrada em casa faltou fora dela e deu Flu. Em 2015, de novo, foi vice-campeão. Parecia carma. Tantos timaços, tantos craques e nenhuma conquista. Será que o Clube Atlético Mineiro estaria marcado como o primeiro campeão brasileiro e somente isso?
Pois exatos 50 anos depois, o Galo conseguiu a justiça tardia em um ano de libertação. Com reforços, retorno de um professor cheio de manias e com a massa jogando junto depois de mais de um ano sem torcida nos estádios, o Atlético levantou o sonhado bicampeonato brasileiro. E não foi só ele. Veio também o Mineiro. E a Copa do Brasil com a melhor campanha da história da competição – 90% de aproveitamento. Sim, veio a Tríplice Coroa (ou Triplete, como os alvinegros gostam de chamar). Um título antes reservado apenas ao rival Cruzeiro. E, com os azuis na Série B, o Galo ainda teve o gostinho de proporcionar aos rivais o maior de todos os pesadelos. Por tudo isso, 2021 foi o ano do Galo. Um marco inabalável na história do Atlético. É hora de relembrar.
RRRReconstrução
Depois de anos maravilhosos entre 2012 e 2014, período no qual conquistou a Libertadores, a Recopa Sul-Americana e a inesquecível Copa do Brasil sobre o maior rival, o Atlético passou por uma reformulação e conviveu com os amargos vice-campeonatos do Brasileirão de 2015 e da Copa do Brasil de 2016. Em 2020, a diretoria começou a montar um elenco forte que pudesse brigar pelos principais torneios e manter o Atlético competitivo. Para isso, o clube fez uma parceria com ousados investidores que iriam garantir dinheiro para boas contratações e tentar, da maneira que fosse possível, sanar as dívidas milionárias do clube, além do financiamento do estádio alvinegro, a Arena MRV, concluída em 2023.
O mecenato atleticano era composto por Rubens Menin, fundador e presidente do conselho da MRV Engenharia, seu filho, Rafael Menin, que divide a gestão das empresas da família, Ricardo Guimarães, acionista do Banco BMG, e Renato Salvador, da família dona da rede hospitalar Mater Dei, de BH. Os chamados “quatro Rs” eram todos estreitamente ligados ao Atlético e sabiam que um ousado aporte financeiro poderia resultar em títulos e no aumento de sócios e renda.
“Nosso grupo surgiu há mais de dez anos, os Amigos do Galo. Fomos importantes para o Atlético, quando ele estava na Série B. Fomos ajudando o clube, mas não estávamos dentro do Atlético como agora. Nossa meta é transformar o Atlético em potência do futebol mundial. Doamos o terreno para a construção do estádio, estamos cuidando de toda parte financeira dele. Tem sido muito trabalho”. – Rubens Menin, presidente do conselho da MRV Engenharia, em entrevista ao jornal O Globo, 23 de agosto de 2021.
Essa entrada dos “erres” no cotidiano do clube só foi possível graças à carta verde que eles ganharam para atuar não só na parte financeira, mas também na área política, com opiniões sobre os mais diversos assuntos e também para tirar um pouco de cena o grupo de Alexandre Kalil, ex-presidente do Atlético, e marcar a ascensão de Sérgio Coelho, presidente eleito do Atlético para o período 2021-2023. O primeiro grande nome para a temporada de 2020 foi o técnico Jorge Sampaoli, que vinha de um trabalho excepcional no Santos mesmo com um elenco limitado e cheio de problemas financeiros – ele foi vice-campeão brasileiro, com direito a uma goleada de 4 a 0 sobre o campeão Flamengo na reta final do torneio. O salário de Sampaoli, de cerca de R$ 1,2 milhão, teria a maior parte custeada pela MRV e o argentino ajudou a indicar reforços e melhorar a fama do Atlético no mercado, atraindo jogadores – segundo um dos mecenas do Galo, Rubens Menin, “ninguém queria jogar no Atlético antes da chegada de Sampaoli”.
Depois dele, o alvinegro reforçou o elenco com as chegadas do defensor paraguaio Junior Alonso, do atacante Keno, do lateral-esquerdo Guilherme Arana, do meia-atacante venezuelano Savarino, do meio-campista Hyoran, do lateral-direito Mariano e do volante Allan – além do atacante chileno Eduardo Vargas e do meia argentino Matías Zaracho, que chegaram no final de 2020. Eram reforços de muito peso que deram ao Atlético a possibilidade de montar mais de um time titular e aguentar as mais diversas maratonas de jogos.
Com apenas o Campeonato Mineiro e o Brasileiro para o restante da temporada – o Galo foi eliminado precocemente da Copa do Brasil e da Copa Sul-Americana ainda sob o comando do técnico Rafael Dudamel -, Sampaoli começou a ajustar o time e levantou o Estadual sem grandes sustos após despachar o América Mineiro na semifinal (5 a 1 no agregado) e bater o Tombense na decisão (1 a 0, gol de Jair). No Brasileirão, a equipe até começou bem, manteve-se entre os cinco primeiros em 37 das 38 rodadas, mas o jeito enervado de Sampaoli e a falta de regularidade no returno minaram as chances de título – o argentino foi advertido 15 vezes no torneio e cumpriu quatro suspensões.
A decepção no Brasileirão foi grande, mesmo em um ano atípico por conta da pandemia da COVID-19, que adiou vários jogos, prejudicou o rendimento dos times e deixou os estádios vazios. Por isso, a diretoria manteve o elenco e tratou de buscar novas peças para a temporada de 2021. A primeira delas foi o atacante Hulk, já veterano e que estava desde 2016 no futebol chinês. Com uma carreira consagrada no futebol internacional, em especial as passagens pelo Porto e pelo Zenit, o atacante ostentava o físico privilegiado que sempre lhe foi característico, mas ainda sim sofreu com uma certa resistência dos críticos, que duvidavam de seu rendimento com 35 anos e se ele seria capaz de aguentar a insana temporada brasileira, com média superior a 60 jogos, no mínimo, para clubes que disputam Libertadores e Copa do Brasil. Quem também chegou naquele começo de ano foi o argentino Nacho Fernández, um dos mais talentosos meio-campistas do futebol sul-americano e nome de destaque do River Plate campeão da América em 2018.
Além dessa dupla, o Atlético acertou a vinda de Rodrigo Caetano como diretor executivo, renomado e experiente profissional com passagens vitoriosas por Grêmio, Vasco, Fluminense e Flamengo, considerado um dos pioneiros na função de executivo de futebol no país. A função dele seria evitar que os assuntos burocráticos e financeiros de jogadores chegassem ao técnico, além de checar o mercado, buscar novos reforços e entender as necessidades do elenco e do treinador.
Só que Caetano teve já em fevereiro um problema: o técnico Sampaoli acabou deixando o Atlético para treinar o Olympique de Marselha-FRA. Correndo contra o tempo, o dirigente precisava acertar com um técnico de ponta antes do início da Copa Libertadores, uma das prioridades do clube no ano. Foi então que um antigo ídolo da torcida retornou após oito anos: Cuca, comandante do “Galo Doido” campeão da Libertadores em 2013. A saída traumática do treinador em 2013, em anúncio feito durante a disputa do Mundial de Clubes da FIFA, mexia com o torcedor e muitos foram contrários à chegada do técnico. Cuca ainda passava por um momento familiar complicado, pois sua mãe estava internada com COVID-19 – ela passaria 70 dias entubada. Mesmo com esses problemas, Cuca pegou um time pronto e teria no Campeonato Mineiro o laboratório ideal para testes e ajustes necessários para o Atlético embalar nas principais competições da temporada.
A primeira taça e o embalo
O Atlético começou o Campeonato Mineiro com cinco vitórias seguidas e largou na frente dos rivais até o tropeço diante da Caldense, na 6ª rodada, com derrota por 2 a 1 jogando em Poços de Caldas e péssima atuação de Hulk, que ainda não conseguia se firmar no time e frequentava constantemente o banco de reservas. A volta por cima veio nos 3 a 1 diante do América, seguido de vitória por 1 a 0 sobre o Pouso Alegre. Na 9ª rodada, os alvinegros perderam para o rival Cruzeiro por 1 a 0 o clássico do centenário e a torcida começou a temer pelo futuro do time (antes da partida, muitos achavam que o Galo iria até golear o rival).
Hulk não escondeu a frustração naquele início de temporada e conversou com o técnico Cuca para ter mais sequência e atuar mais vezes como titular. Embora jogasse bem menos na China e com intervalo de jogos maior, Hulk demonstrava uma dedicação notável nos treinamentos e nem aparentava os 35 anos que tinha. Cuca ouviu o badalado jogador e atendeu ao pedido do atacante, que começaria como titular a maioria das partidas dali em diante. Além disso, o técnico prometeu melhorias no time após a derrota para o Cruzeiro.
“A derrota é horrível, fica, mas iremos tirar lições disso. Temos coisas importantes. O Mineiro é importante, mas o Brasileiro, a Libertadores são importantíssimos. Se tiver esse tipo de atitude que tivemos hoje, a comando meu, e o erro é meu, não iremos ganhar nada. A partir de um jogo igual esse, irei dirigir meu trabalho em termos de cobrança, determinação. A culpa é minha e o culpado irá trabalhar ainda mais forte. […] Podem me cobrar daqui 10 dias, que é o tempo da chegada na Libertadores”. – Cuca, em entrevista publicada no UOL Esporte, 12 de abril de 2021.
No jogo seguinte pelo torneio estadual, o Galo venceu o Boa Esporte (2 a 1), venceu o Athletic (1 a 0) e se garantiu na semifinal com a melhor campanha (nove vitórias e duas derrotas em 11 jogos). O rival foi o Tombense, que levou de 3 a 0 no primeiro duelo, com gols de Hulk, Hyoran e Guga. Na partida seguinte, o empate em 1 a 1 garantiu o Atlético na decisão. E, jogando com a vantagem de dois empates por ter melhor campanha, o Galo empatou os dois jogos com o América em 0 a 0 e garantiu o 46º título mineiro para sua coleção. Em paralelo com a disputa da reta final do Estadual e da conquista, o Atlético iniciou sua caminhada na Copa Libertadores e mostrou muita força em um grupo complicado com os tradicionais América de Cali-COL e Cerro Porteño-PAR e ainda o Deportivo La Guaira-VEN.
Após empatar com os venezuelanos o primeiro jogo, fora de casa, o Atlético emendou cinco vitórias seguidas: 2 a 1 no América (em casa, com dois gols de Hulk), 4 a 0 no Cerro Porteño (em casa, com dois gols de Hulk, um de Savarino e outro de Vargas), 3 a 1 no América (fora, com gols de Guilherme Arana, Hulk e Vargas), 1 a 0 no Cerro (fora, gol de Keno), e 4 a 0 no Deportivo (em casa, gols de Hulk, Savarino, Marrony e Nathan), resultados que garantiram a melhor campanha da fase de grupos aos comandados de Cuca, que somaram 16 pontos em seis jogos. Foi o melhor desempenho do Atlético nessa fase da Libertadores em toda a história, superando inclusive a trajetória de 2013, ano do título, em um ponto. Só que o sorteio do mata-mata trouxe um adversário bem indigesto ao clube mineiro logo nas oitavas de final: o Boca Juniors.
Demolidor de argentinos
Com a pandemia da COVID-19 ainda tornando inviável o público nos estádios, o Atlético encarou o Boca Juniors com arquibancadas vazias tanto no duelo de ida, em La Bombonera, quanto na volta, no Mineirão. Isso foi de certa forma benéfico ao clube alvinegro, pois evitou um encontro nada amigável com a torcida xeneize. Por outro lado, o Boca também não sentiria o peso da massa atleticana no Mineirão, por isso, ambos os jogos foram totalmente abertos. Na ida, Cuca não teve Guilherme Arana, convocado para a seleção olímpica, nem Eduardo Vargas (com COVID), e improvisou Junior Alonso na lateral-esquerda, colocou Savarino e Zaracho abertos pelas pontas, Nacho centralizado e Tchê Tchê e Allan como guardiões do meio de campo. Tal formação garantiu o empate sem gols, embora o Boca tenha reclamado bastante por causa de um gol anulado pelo VAR.
Na volta, o duelo foi cheio de polêmicas por causa de outro gol anulado do Boca pelo VAR, e o Galo não conseguiu encaixar seu jogo rápido por causa da ferrenha marcação dos argentinos, em especial no atacante Hulk e no meia Nacho – velho conhecido dos xeneizes. Com um novo empate, a decisão foi para os pênaltis e o goleiro Éverson foi o grande salvador do Galo ao defender duas cobranças e marcar seu gol na vitória por 3 a 1. Após o jogo, mais confusão envolvendo jogadores e diretoria do Boca, com quebra-quebra, agressões e vandalismo. Os integrantes da comitiva argentina ficaram cerca de 12 horas na delegacia prestando depoimentos aos oficiais.
Como numa prova de força daquele time, o Atlético encarou nas quartas de final mais uma pedreira: o River Plate, ainda forte e competitivo com o técnico Gallardo e clube mais difícil de se enfrentar na América do Sul desde pelo menos 2018, ano de seu quarto título continental. No primeiro jogo, no Monumental ainda sem público, o Galo venceu por 1 a 0 com direito a “lei do ex”, em gol de Nacho Fernández. Mas foi na volta que o time mineiro deu show. Mesmo sem Nacho (expulso no duelo da ida) e com a volta parcial de sua torcida – cerca de 17 mil pessoas – o Atlético deu um presente inesquecível a cada atleticano ali presente e a todos espalhados pelo Brasil: vitória inapelável por 3 a 0, com dois golaços históricos.
O primeiro foi de Zaracho, que recebeu de Hulk e emendou um voleio / bicicleta plástico, lindo, espetacular. Pouco tempo depois, Éverson iniciou um contra-ataque mortal lançando Savarino, que tocou para Hulk e este avançou ao ataque. Diante de Armani, o atacante deu um toque sutil por cobertura que desmantelou completamente o River. O alvinegro ainda teve várias chances, mas parou ora em Armani, ora na pontaria ruim. No segundo tempo, Zaracho fez mais um, de peixinho, e selou a vitória.
Mais do que a vaga na semifinal, o Atlético se tornou apenas o segundo clube na história da Copa Libertadores a eliminar em uma só edição do torneio os titãs Boca e River – o primeiro foi o Independiente Del Valle, em 2016 – além de ser o primeiro brasileiro a conseguir tal façanha. Na coletiva, Cuca destacou a vitória, mas sem perder o foco nos jogos seguintes.
“Classifico essa como uma grande vitória. Vale a gente ressaltar aqui que não temos um time que joga três, quatro anos juntos, tampouco estou aqui há tanto tempo. As coisas vão evoluindo. Quando se fica numa fase boa, a gente tem que alargar essa fase ao máximo possível, pés no chão”.
Para aumentar ainda mais a maré de sonhos do torcedor, o Atlético ainda anunciou naquele mês de agosto a contratação de Diego Costa, experiente atacante com passagem de destaque pelo Atlético de Madrid. O sonho da decisão estava muito perto. Mas o alvinegro teria outro titã: o Palmeiras.
Já vi esse filme antes…
Enfrentar o Palmeiras nunca foi tarefa fácil para o Atlético, a começar pelo retrospecto em duelos continentais. O primeiro encontro foi em 2000, pela semifinal da Copa Mercosul, com duas vitórias do Verdão: 4 a 1 (em casa) e 2 a 0 (fora). Anos depois, em 2010, as equipes duelaram pelas quartas de final da Copa Sul-Americana e novamente o Palmeiras avançou: empate em 1 a 1 em MG e vitória alviverde por 2 a 0 no Pacaembu. Além disso, o alviverde era o atual campeão e tinha o estrategista técnico Abel Ferreira como triunfo, pois o português sempre dificultava as coisas para times que jogam de maneira mais ofensiva por não aliviar na marcação e no sistema defensivo.
E, quando a bola rolou no Allianz Parque, foi exatamente isso: o Palmeiras reduziu os espaços, fez uma marcação especial em Hulk e consequentemente deu poucas chances para o Atlético. A melhor chance esteve nos pés de Hulk, em cobrança de pênalti, mas o atacante chutou na trave do goleiro Weverton. O placar ficou 0 a 0 e o Galo foi para o Mineirão precisando da vitória. Empate sem gols levava a decisão para os pênaltis, e empate com gols era do Palmeiras. Outra vez o Galo teve dificuldades para criar suas jogadas, Hulk foi bem marcado e o goleiro alviverde fez grandes defesas. Mas, no começo do segundo tempo, Vargas conseguiu abrir o placar em cabeçada certeira. Minutos depois, ele quase ampliou, mas chutou para fora em lance cara a cara com Weverton.
O revés obrigou o Palmeiras a ir para cima e, após um chutão da defesa, Nathan Silva se atrapalhou, Gabriel Veron, que havia acabado de entrar, ganhou a disputa de bola e cruzou para Dudu aparecer como um foguete e colocar a bola no fundo do gol: 1 a 1. A partir dos 28’, a torcida atleticana evocou os gritos de “eu acredito”, tão presentes na era de ouro do time entre 2013 e 2014, mas não deu e o Palmeiras ficou com a vaga pelo critério do gol marcado fora… Em um filme que o torcedor já havia experimentado, o Atlético foi eliminado de maneira invicta, assim como no Brasileiro de 1977, quando foi vice-campeão invicto após perder a final nos pênaltis para o São Paulo. Mas não havia tempo para lamentações. O clube ainda tinha pela frente o Campeonato Brasileiro e a Copa do Brasil.
Pelo fim do jejum
Com um elenco de pelo menos 16 “titulares”, óbvio que o Atlético entrou no Brasileirão como um dos favoritos. No entanto, o início do clube alvinegro na competição foi bem capenga. A estreia aconteceu em 30 de maio, no Mineirão ainda sem público, e teve derrota de 2 a 1 para o Fortaleza. A recuperação veio nas três rodadas seguintes com vitórias por 1 a 0 sobre Sport (fora), São Paulo (em casa) e Internacional (fora). Nos três jogos da sequência, empate contra a Chapecoense (1 a 1, em casa), e derrotas para Ceará (2 a 1, fora) e Santos (2 a 0, fora). O time de Cuca só deslanchou de vez a partir da 8ª rodada, na goleada de 4 a 1 sobre o Atlético-GO, em casa, com dois gols de Zaracho e dois de Nacho, além de várias chances de gols criadas e interceptadas pelo goleiro do Dragão, Fernando Miguel.
Na rodada seguinte, o Galo venceu o Cuiabá por 1 a 0 (fora), gol de Nacho, e foi para a 10ª rodada encarar o rival de sempre, o Flamengo. Era o famoso “duelo de seis pontos” pelo fato de o rubro-negro também ser candidato ao título e o bicampeão do torneio. Jogando em casa, o Atlético superou seu primeiro grande adversário com uma vitória por 2 a 1 (dois gols relâmpagos de Savarino no início do segundo tempo) que embalou o alvinegro para o clássico contra o América, vencido por 1 a 0. A quinta vitória seguida veio contra o Corinthians por 2 a 1, em Itaquera e de virada, com dois gols de Hulk, que tirou a zica de dez jogos sem marcar em grande estilo, principalmente pelo golaço de falta que empatou o duelo. Em seguida, Hulk seguiu em alta e marcou duas vezes na vitória por 3 a 0 sobre o Bahia.
Após vencer o Athletico-PR por 2 a 0, em casa, o Galo assumiu pela primeira vez a liderança isolada do torneio ao derrotar o Juventude, fora de casa, por 2 a 1, em outra virada comandada por Hulk e Nathan Silva, autor do gol salvador aos 47’ do segundo tempo. Com dois pontos de vantagem para o Palmeiras, o Galo enfrentou exatamente o Verdão na 16ª rodada, no Mineirão. As equipes ainda não haviam se enfrentado na Libertadores e o Galo liquidou o rival com uma vitória por 2 a 0, em grande atuação de Guilherme Arana e Savarino, autor dos dois gols do jogo. O lado ruim dessa vitória – a 9ª seguida! – foi que Abel Ferreira certamente viu os estilos e variantes do Atlético e usou isso para neutralizar a equipe um mês depois, na fatídica semifinal da Libertadores.
A volta da massa
Depois de perder alguns pontos nos empates contra Fluminense (1 a 1, fora) e RB Bragantino (1 a 1, fora, com um golaço de Diego Costa), o Atlético voltou a vencer na 20ª rodada, quando bateu o hostil Fortaleza em pleno Castelão por 2 a 0, gols de Zaracho e Junior Alonso. De volta ao Mineirão, o alvinegro venceu facilmente o Sport por 3 a 0 (gols de Diego Costa, Hulk e Vargas), empatou sem gols com o São Paulo, fora, e reencontrou sua torcida no jogo contra o Internacional, em 02 de outubro. Mesmo sem carga máxima – foram pouco mais de 7 mil torcedores -, foi um jogo simbólico pelo fato de ser o primeiro após a amarga eliminação na Libertadores.
Com o emocional abalado, o time conseguiu dar uma resposta rápida ao seu torcedor de que aquele Campeonato Brasileiro seria levado muito a sério e que o Atlético sabia da força de seu elenco. Com um gol de Keno no segundo tempo, o Galo venceu por 1 a 0 e manteve a liderança folgada na competição. O técnico Cuca destacou na coletiva de imprensa que trabalhou bastante o psicológico dos jogadores para o time não perder o pique após uma eliminação tão dura como a vivida dias antes do duelo.
“A gente tinha a melhor campanha da Libertadores, invencibilidade, e fomos eliminados dentro dos critérios da competição, e somos colocados em xeque quatro dias depois. É lógico que o emocional não vai estar tranquilo. Não só o emocional do jogador, mas do torcedor também. O jogo começou com a torcida pedindo raça, que é uma música conhecida. E, geralmente, isso acontece quando ela não está plenamente satisfeita. Veja como são as coisas. São números expressivos que temos, e tudo é colocado em xeque. O time ficou nervoso, o torcedor também. Uma vitória que tira um peso das costas”.
Após empatar com a Chapecoense no jogo seguinte em 2 a 2 (fora), curiosamente o único adversário que o Atlético não venceu no campeonato, o Galo usou a força de sua casa para vencer mais dois jogos: 3 a 1 no Ceará (dois gols de Hulk e um de Diego Costa) e 3 a 1 no Santos, de virada, com dois gols de Nacho e um de Nathan Silva. O triunfo sobre o Peixe aumentou para 18 jogos a sequência invicta do Atlético na competição e deixou o alvinegro 11 pontos à frente do vice-líder, o Flamengo. Jogando muito, com aplicação tática, jogadores em ótimas fases e sempre em busca de gols, o Atlético se apresentava como legítimo campeão.
Só que a torcida ficou temerosa no final de outubro com dois tropeços: a derrota por 2 a 1 para o Atlético-GO, que encerrou a série invicta, e o revés de 1 a 0 para o Flamengo, no Maracanã. Entre essas duas derrotas, a vitória por 2 a 1 em casa e de virada sobre o Cuiabá ajudou a manter a folga na liderança. Em novembro, a torcida encheu o Mineirão – mais de 56 mil pessoas! – para empurrar o Galo diante do desesperado Grêmio. Logo aos 12’, Zaracho fez 1 a 0. No segundo tempo, o tricolor empatou, mas a “lei do ex” voltou a aparecer e Vargas, que jogou no Grêmio, marcou, de pênalti, o gol da vitória.
O Atlético teve mais dois jogos em casa e em ambos a torcida deu show. Contra o América, 60.142 pessoas viram a vitória por 1 a 0, gol de Guilherme Arana. E, contra o Corinthians, 58.714 torcedores vibraram com o show atleticano nos 3 a 0 do Galo, gols de Diego Costa, Keno e Hulk. A taça estava cada vez mais perto. Não havia qualquer chance de aquele troféu tão esperado, tão aguardado, escapar. O Atlético sobrava, jogava bem, se impunha tanto em casa quanto fora e era temido. Quando saía na frente, não perdia. E, quando levava o primeiro gol, buscava a virada a qualquer custo.
Da contagem regressiva ao épico em Salvador
Após o triunfo sobre o Timão, o Atlético venceu o Athletico-PR em Curitiba por 1 a 0 (gol de Zaracho), e bateu o Juventude, em casa e diante de 61.476 pessoas, por 2 a 0, com novo show de Hulk, autor de dois gols – um deles um golaço, em chute colocado. No dia 23 de novembro, a equipe foi até SP e empatou em 2 a 2 com o Palmeiras após ficar duas vezes atrás do placar, e encarou o Fluminense na 36ª rodada. O adversário era um velho conhecido lá da briga pela liderança do Brasileirão de 2012 e uma vitória sobre o tricolor teria sabor especial. E teve. Os cariocas abriram o placar aos 14’, mas Hulk, de pênalti, empatou ainda no primeiro tempo. Na segunda etapa, falta na entrada da área. Hulk ajeitou, bateu com perfeição e marcou mais um golaço para sua coleção.
Outra virada do Galo! E catarse pura no Mineirão, que teve naquele dia uma emocionante visita do ídolo Reinaldo. Na comemoração do segundo gol, inclusive, Hulk imitou o clássico gesto do Rei erguendo o braço com o punho cerrado e levou o ex-atacante às lágrimas. Foi um momento muito especial, que emocionou gerações de torcedores com aquele passado e presente se misturando.
“O Atlético quase, quase bicampeão. É inesquecível. Eu já gritei “é campeão”, já! Mas ainda não ecoou (risos)” – Reinaldo, ídolo do Atlético, em entrevista publicada no globoesporte.com no dia do jogo contra o Flu, 30 de novembro de 2021.
O triunfo poderia dar o título ao Galo caso o Flamengo perdesse no meio da semana, mas o rubro-negro venceu e adiou a festa. Mas, no dia 02 de dezembro, o Atlético protagonizou mais um daqueles jogos épicos, que torcedores irão contar e relembrar por anos e anos. O alvinegro enfrentou o Bahia, na Arena Fonte Nova, e seria campeão com duas rodadas de antecedência se vencesse a partida. Os tricolores jogaram por três pontos preciosos na luta contra o rebaixamento, por isso, o jogo foi tenso e muito disputado. Após um primeiro tempo sem gols, o Bahia fez 2 a 0 em um intervalo de cinco minutos e parecia que o título atleticano teria que esperar mais alguns dias. Só que o Galo estava ansioso. Não queria esperar mais. Já eram 50 anos de espera!
Aos 28’, Hulk, de pênalti, descontou. O atacante pegou a bola e foi correndo ao meio de campo querendo mais. O Bahia mal deu a saída e Keno empatou após receber lançamento pela esquerda e mandar um lindo chute no ângulo do goleiro. O Galo havia ligado o modo “doido”. E, mais alguns minutos depois, contra-ataque mortal do Atlético, a bola fica com Keno na entrada da área, ele chuta e decreta a virada: 3 a 2. Em apenas cinco minutos, o Atlético virou. E o Galo ganhou! Depois de 50 anos, o Clube Atlético Mineiro era campeão brasileiro. Um dos maiores campeões do torneio no século. Incontestável. Irrepreensível. Inesquecível. Após o jogo, Hulk, comentou sobre aquele título em entrevista publicada no UOL Esporte.
“Esse troféu tem tudo a ver com a gente. São 50 anos de Brasileiro, 50 anos que a gente não comemorava o título. A gente passou por momentos difíceis, mas temos que trabalhar, manter os pés no chão e manter a humildade. Só tenho que agradecer. Esse grupo merece demais, é maravilhoso. Me sinto privilegiado. Voltei a ser um moleque da base, querendo cada vez mais nos treinos e nos jogos. Esse grupo merece demais!”
A festa em Belo Horizonte foi gigantesca e tomou as ruas da cidade e da sede social do clube, além das redondezas do futuro estádio. Em um carnaval sem fim, o Atlético comemorou com a massa no fim de semana, dia 05 de dezembro, no Mineirão tomado por 61.573 pessoas – superando o jogo contra o Juventude -, que viu mais uma virada do Galo: 4 a 3 sobre o RB Bragantino, com gols de Keno, Zaracho, Savarino e Hulk, claro. Na entrega da taça, a lenda Dadá Maravilha levou o troféu até o gramado e provocou muita emoção em todos os torcedores, em outro momento que misturou o passado e o presente. Aliás, o Atlético sempre exaltou os campeões de 1971 desde o início das comemorações, pois, sem eles, não haveria o bicampeonato.
Com um time reserva, o Atlético completou a campanha no Sul e perdeu para o rebaixado Grêmio por 4 a 3, mas o resultado em nada diminuiu a campanha irretocável do time que assumiu a ponta na 15ª rodada e não largou mais: 38 jogos, 26 vitórias, seis empates, seis derrotas, 67 gols marcados (2º melhor ataque) e 34 gols sofridos (melhor defesa). Foram 84 pontos, 13 a mais que o Flamengo. O Atlético ainda teve:
- a maior série de vitórias seguidas: 9 triunfos;
- a maior série invicta: 18 jogos sem perder;
- a maior série de vitórias em casa: 16 vitórias;
- e foi o time com mais viradas do Brasileirão: 7 viradas.
Na eleição da Bola de Prata Placar, o Galo teve 7 atletas no time da competição, viu Hulk vencer a Bola de Ouro e a Chuteira de Ouro como artilheiro (19 gols), Cuca vencer o prêmio de Melhor Técnico e Zaracho ganhar o troféu de Revelação. Mas acha que acabou? Que nada…
Copa do Brasil – Galo Modo: Avassalador
Ao contrário de outras edições, a Copa do Brasil de 2021 teve uma fase extra para os clubes que disputavam a Libertadores, por isso, o Galo iniciou a disputa antes das oitavas de final, contra o Remo, lá no mês de junho. Jogando fora de casa, o Atlético se impôs e venceu por 2 a 0 (gols de Hyoran e Nacho) e venceu também a volta por 2 a 1 (gols de Réver e Hulk). Em julho, ainda com portões fechados, o Atlético encarou o Bahia e venceu a partida de ida, em casa, por 2 a 0 (gols de Zaracho e Hulk), e perdeu a volta por 2 a 1 (seria a única derrota do time no torneio). Nas quartas, o rival foi o Fluminense e o Galo não deu brecha alguma: vitória no Rio por 2 a 1 (gols de Nino, contra, e Hulk) e 1 a 0, em Minas, gol de Hulk.
Mas foi na semifinal que o alvinegro demonstrou o poder de seu elenco. Jogando no Mineirão com pouco mais de 18 mil pessoas, ainda no início da retomada do público, o Atlético goleou o Fortaleza por 4 a 0 de maneira incontestável – foi 3 a 0 só no primeiro tempo! -, com gols de Guilherme Arana, Réver, Hulk e Zaracho. Na volta, no Ceará, o Atlético voltou a vencer – 2 a 1, gols de Diego Costa e Hulk – e carimbou a vaga na final. Era a chance de vencer a Tríplice Coroa. Sim, ela. A almejada. A sonhada. Aquela que era motivo de orgulho máximo do rival Cruzeiro, único a ostentar a façanha no Brasil. E, com os azuis na Segundona, vencer a Copa do Brasil e completar a Coroa teria um sabor muito, mas muito especial.
O maior dos campeões!
A decisão da Copa do Brasil começou no dia 12 de dezembro, logo após o encerramento do Brasileirão. O adversário do Galo foi o Athletico-PR, campeão da Copa Sul-Americana de 2021 e que, assim como os mineiros, buscava o bicampeonato após vencer o torneio nacional em 2019. Jogando em casa, o Atlético sabia que um bom resultado deixaria tudo mais fácil para a volta, em Curitiba. E o “Galo doido” ligou o modo “Galo Avassalador”. Sufocando o rival desde o início, o Atlético abriu o placar aos 24’, com Hulk, de pênalti. Minutos depois, Keno, de novo ele, fez o segundo. Na segunda etapa, o chileno Vargas apresentou suas cartas e fez dois gols, decretando a goleada de 4 a 0 e a larga vantagem para a partida de volta. De quebra, foi a maior goleada em um jogo de final de Copa do Brasil na história!
Três dias depois, na Arena da Baixada, o Furacão jogou pela honra e por um milagre, mas logo aos 25’, o Atlético mostrou que aquela noite não estava para devaneios. Em um contra-ataque mortal partindo do meio de campo, o Galo foi com três pra cima do rival. Vargas – que cresceu demais naquele fim de temporada – levou a bola até perto da grande área, tocou na direita para Zaracho, este conduziu pela direita, tocou no meio e Keno chutou para fazer 1 a 0. Minutos depois, o Galo quase ampliou em novo contra-ataque, mas o toque sutil de Hulk pela direita passou caprichosamente rente ao gol de Santos.
O Athletico seguiu valente em busca do gol, mas impedimentos e a falta de pontaria prejudicaram o sucesso do time da casa. No segundo tempo, aos 29’, Savarino recebeu no meio e viu a passagem de Hulk no campo de ataque. O venezuelano deu um passe sensacional para o matador, que invadiu a área e tocou por cima de Santos para fazer 2 a 0. Já estava 6 a 0 no agregado! E tinha que ser do matador o último gol do Galo no ano! O Furacão ainda descontou, aos 41’, mas a vitória foi do Atlético: 2 a 1. Ao apito do árbitro, o sonho alvinegro estava realizado. A Tríplice Coroa era do Galo! Ou melhor, o “Triplete Alvinegro”, para se desvencilhar do rival.
Campeão Mineiro. Campeão Brasileiro. Campeão da Copa do Brasil. E mais: campeão da Copa do Brasil com a melhor campanha da história do torneio: 10 jogos, 9 vitórias, uma derrota, 22 gols marcados, seis sofridos, aproveitamento de 90%, o maior de um time campeão desde o início do torneio lá em 1989 – antes do título do Galo, os melhores aproveitamentos eram do Grêmio 1989 (86,7%) e Corinthians 1995 (86,7%).
Hulk, com 8 gols, foi o artilheiro e fez a dobradinha Brasileiro/Copa do Brasil, além de chegar à marca de 36 gols em 68 jogos na temporada. O técnico Cuca também entrou para a história como um dos poucos a ter no currículo Brasileiro e Copa do Brasil (os outros são Vanderlei Luxemburgo, Luiz Felipe Scolari, Tite, Marcelo Oliveira e Antônio Lopes). Na temporada, o Atlético registrou os seguintes números:
- 75 jogos
- 52 vitórias
- 14 empates
- 9 derrotas
- 136 gols marcados
- 52 gols sofridos
- Aproveitamento: 69,3%
Em casa, o time disputou 38 jogos, venceu 32, empatou cinco e perdeu apenas um, impressionantes 88,5% de aproveitamento. Hulk foi o artilheiro com 36 gols, seguido de Zaracho e Vargas, com 13 gols cada, Keno, com 9 gols, e Savarino, com 7 gols. Hulk ainda liderou o quadro de assistências com 12 passes, seguido de Nacho, com 11 passes, e Savarino, com 9 passes.
O melhor da história? Deixa pra a torcida…
Ao fim da temporada de 2021, muitos começaram a fazer a seguinte pergunta: seria o Atlético 2021 o maior da história do clube? Maior que o esquadrão campeão do Gelo? Que o campeão nacional de 1971? Que o timaço de 1978-1983? Que os campeões da Conmebol dos anos 1990? Que o campeão da América e da Copa do Brasil em 2013-2014? Bem, isso não vamos responder, mas vencer um Triplete como venceu o Atlético em 2021 já está marcado para sempre no futebol brasileiro neste século XXI. Foram 18 anos até que algum time conseguisse o feito. Nem mesmo os vencedores da Libertadores e dos Mundiais da FIFA no período conseguiram. E da maneira como venceu, sobrando, dando show e reduzindo os rivais a meros coadjuvantes – até mesmo o Palmeiras campeão da Libertadores ficou de lado perto desse Galo – já dá a exata dimensão dos feitos do Atlético. “O Galo ganhou” virou mantra. Foi a síntese de uma temporada inesquecível. E de um esquadrão imortal.
Os personagens:
Éverson: com boas passagens pelo Ceará e pelo Santos, o goleiro chegou em 2020 ao Atlético a pedido de Jorge Sampaoli, que havia trabalhado com ele no Peixe durante a campanha do vice-campeonato brasileiro de 2019. E, jogo após jogo, Éverson se consolidou na meta alvinegra com grandes atuações, alguns milagres e regularidade principalmente no segundo semestre. Na Libertadores, foi o grande nome da classificação sobre o Boca Juniors e, contra o River Plate, no Monumental, fez um punhado de defesas que garantiram a vitória por 1 a 0 na casa dos argentinos. No Brasileirão, ajudou o Galo a alcançar a melhor defesa da competição com atuações memoráveis e manteve a boa fase na Copa do Brasil. Foi eleito o melhor goleiro do Brasileirão e também da Copa do Brasil. Ao lado de Hulk, Éverson foi o jogador que mais jogou pelo Galo em 2021: 68 partidas.
Mariano: com 35 anos e experiente, o lateral celebrou seu segundo Brasileirão na carreira – o primeiro foi em 2010, pelo Fluminense – com novas atuações de gala e muita personalidade na lateral-direita. Vivendo grande fase, deixou Guga no banco e esteve presente nos principais jogos do time em 2021, principalmente no segundo semestre.
Guga: chegou em 2019 e foi titular em boa parte dos jogos do time naquele ano e também em 2020. Com a contratação de Mariano, perdeu espaço em 2021, mas quando jogou, não comprometeu e foi uma peça importante no elo com o ataque por conta da velocidade e passes precisos.
Nathan Silva: cria do Galo, o zagueiro subiu para os profissionais em 2018, mas acabou emprestado a outros clubes até retornar em 2021 e fazer uma boa dupla de zaga ao lado de Junior Alonso. Veloz e com boa impulsão, costumava aparecer nas jogadas aéreas do time e contribuiu com três gols e uma assistência ao longo da temporada.
Igor Rabello: após uma excelente passagem pelo Botafogo, o zagueirão chegou no começo de 2019 ao Galo e se firmou no time titular. Em 2021, alternou momentos na reserva com outros entre o time principal e foi uma importante peça defensiva, em especial nas jogadas aéreas e na saída de bola. Se destacou na trajetória da Copa do Brasil, atuando nos duelos contra Fluminense, Fortaleza e nas finais diante do Athletico-PR.
Réver: o “capitão América” de 2013 já é um dos grandes ídolos recentes do Atlético e símbolo do sucesso do time nos últimos tempos. Após anos mágicos entre 2010 e 2013, acabou sofrendo uma grave contusão em 2014 que o tirou de grande parte da temporada. Réver deixou o clube no ano seguinte, retornou em 2019 e, aos poucos, recuperou o bom futebol para mais uma vez ser titular em algumas partidas do time e ajudar o Atlético a realizar uma temporada inesquecível em 2021. Foram 41 jogos e dois gols.
Junior Alonso: sem dúvida alguma o principal zagueiro do Galo desde 2020, o paraguaio ganhou o prêmio de melhor defensor do Brasileirão em duas temporadas seguidas (2020 e 2021) e foi um dos responsáveis pelo grande desempenho defensivo do Atlético no segundo semestre pela força na marcação, na cobertura e na saída de bola, com preciosos passes para os laterais e também os meio-campistas do time. Sempre se destacou também pela seriedade como um autêntico xerife. Entre 2020 e 2021, foram 89 jogos pelo Galo.
Guilherme Arana: revelado pelo Corinthians, Arana desde cedo mostrou talento e tino vencedor. Com apenas 19 anos, foi campeão brasileiro pelo Timão e repetiu a dose em 2017, já como titular absoluto do time de Carille. Após ser vendido ao futebol espanhol, retornou ao Brasil para jogar no Galo e parece mesmo que o defensor nasceu para vestir mantos alvinegros. Com velocidade, dribles, eficiência nos passes e cruzamentos e preciso nas jogadas ofensivas, Arana foi um dos principais nomes do Atlético em 2020 e vencedor da Bola de Prata do Brasileirão.
Mas foi em 2021 que o jogador deu show com uma regularidade impressionante, jogos sensacionais e convocações para a seleção, com destaque para os Jogos Olímpicos de Tóquio, quando foi titular do Brasil e participou de todos os jogos da campanha que rendeu ao país a medalha de Ouro. Sob o comando de Cuca, o lateral cresceu demais de produção e foi peça imprescindível nas campanhas que renderam o Triplete. Foram 49 jogos disputados em 2021 e cinco gols marcados – um deles um golaço, contra o Fortaleza, no primeiro jogo da semifinal da Copa do Brasil. Arana tem jogado tanto que já foi eleito o lateral-esquerdo titular do Time dos Sonhos do Atlético-MG aqui do Imortais!
Dodô: capaz de atuar na lateral-esquerda e também um pouco mais avançado pelo meio, Dodô disputou 34 partidas na temporada e foi uma importante peça do técnico Cuca na maratona de jogos do Galo. Chegou ao clube em fevereiro de 2021.
Jair: feroz na marcação, com ampla visão de jogo e técnica para efetuar passes precisos, Jair foi um dos principais nomes do Galo e se consolidou como um dos mais regulares volantes do clube nos últimos anos. Depois de disputar alguns jogos em 2019, passou a figurar mais no time titular em 2020 até ser peça-chave no time multicampeão de 2021 mesmo com a ferrenha concorrência no meio de campo. Jair venceu a Bola de Prata como melhor volante do Brasileirão de 2021.
Tchê Tchê: chegou por empréstimo ao Galo e se entrosou muito bem no time alvinegro pela polivalência e capacidade de atuar como lateral, volante, meia e ponta. Além disso, pesou o fato de o jogador ter trabalhado com Cuca no Palmeiras, em 2016, ano em que ele foi um dos principais nomes do time campeão brasileiro. Por conta da ótima fase de Zaracho e das várias alternativas de Cuca para o meio, não foi titular absoluto, mas ainda sim disputou 57 jogos na temporada e substituiu com perfeição Jair ou Allan nas vezes em que algum deles não pôde jogar.
Allan: com 61 jogos na temporada, foi um dos recordistas em participações do elenco e o principal companheiro de Jair na contenção do meio de campo e nos desarmes, além de ajudar na liberação dos laterais durante as muitas investidas ofensivas do time. Com ele e Jair, o Galo fez partidas espetaculares e dificilmente sofreu defensivamente. Tem a expectativa de uma carreira de muito sucesso pela frente.
Hyoran: fez grandes jogos na temporada 2020, mas acabou perdendo espaço em 2021 por conta das contratações do Galo no meio de campo. Disputou 33 jogos e marcou três gols.
Zaracho: a revelação do Brasileiro de 2021 foi também um dos mais intensos jogadores do Galo. Rápido, incansável, oportunista, com visão de jogo plena, sempre ligado no 220V, autor de golaços – e do mais bonito do clube no ano, aquele contra o River Plate -, vice-artilheiro do time com 13 gols e garçom de outros seis tentos, o argentino foi uma contratação certeira da diretoria e um dos mais importantes atletas do técnico Cuca. Zaracho não só jogava avançado como também recuava para ajudar na marcação e roubar preciosas bolas para iniciar contra-ataques mortais. Ídolo da torcida, Zaracho jogou demais e já entrou na história do Atlético. Foram 58 jogos em 2021.
Eduardo Sasha: outro coringa do técnico Cuca, Sasha atuou em 50 jogos na temporada e atuou como elo de ligação entre o meio e o ataque. Marcou três gols e deu três assistências.
Nacho Fernández: foram 52 jogos, 10 gols, 11 assistências e um futebol primoroso. O Atlético não jogou baseado em Nacho como ele atuou em seus tempos de River, mas Nacho jogou para o Atlético e cumpriu de maneira plena a função. Com uma visão de jogo privilegiada, muita habilidade e eficaz nas investidas ao ataque, virou ídolo instantâneo da torcida e referência do Galo nas conquistas de 2021. Nacho venceu a Bola de Prata e aumentou sua galeria de prêmios individuais.
Nathan: outro jogador capaz de atuar em várias posições do meio de campo, Nathan disputou 39 jogos na temporada e marcou três gols. Por causa da concorrência no setor, não foi titular absoluto e entrou mais no decorrer das partidas.
Vargas: o chileno viveu alguns momentos complicados no começo do ano e enfrentou certa resistência da torcida, mas se encontrou no segundo semestre e foi um dos grandes nomes do ataque atleticano nas conquistas do Brasileirão e da Copa do Brasil – ele marcou dois gols no primeiro jogo da final contra o Athletico-PR. Oportunista, habilidoso e sempre se movimentando, Vargas podia jogar centralizado e também aberto pelas pontas. Gostava de jogar, por isso, quando era substituído, não escondia a cara de poucos amigos. Disputou 43 jogos, marcou 13 gols (vice-artilheiro do time ao lado de Zaracho) e deu quatro assistências.
Keno: se o Atlético foi bicampeão brasileiro naquela noite de Salvador, isso se deve a Keno, ou melhor, ao Kenômeno. O atacante viveu meses iluminados pelo Galo e se encaixou perfeitamente no esquema de Cuca atuando pela esquerda, em velocidade, abrindo espaços e também finalizando. Keno deu sete passes para gols e marcou nove tentos em 44 partidas, todos fundamentais para os canecos do Galo. Além dos dois gols no jogaço contra o Bahia, ele deixou sua marca nas duas partidas finais contra o Athletico-PR pela Copa do Brasil.
Savarino: terceiro maior garçom do time na temporada com 9 assistências e autor de sete gols em 40 jogos, o venezuelano é um xodó da torcida desde 2020 e manteve a boa fase mesmo sem ser titular absoluto. Com visão de jogo notável, preciso nos passes e nos arremates, Savarino atuou como um escudeiro de Hulk e Nacho na parte ofensiva do Galo. Foi dele o passe sensacional para o gol da vitória sobre o Furacão no último jogo da final da Copa do Brasil.
Diego Costa: experiente e consagrado, o atacante foi outra contratação bombástica do Atlético em 2021 e conseguiu fazer alguns jogos marcantes, mas pesou um pouco para o jogador sua condição física. Diego Costa atuou em apenas 19 jogos, marcando cinco gols.
Hulk: com uma longa carreira internacional, Hulk chegou ao Galo em 2021 e teve um efeito arrebatador tanto no clube quanto na torcida. Jogando muita bola e lembrando seus grandes tempos de Porto e Zenit, o atacante se transformou no principal nome do esquema ofensivo do Atlético e a estrela do time na temporada. Com sua habitual força, chutes poderosos, dribles, cobranças de falta espetaculares e muita categoria na finalização, Hulk virou ídolo instantâneo e ajudou o Galo a assumir a liderança do Brasileirão e não largar mais. Após a decepção na Libertadores, Hulk tratou de superar aquele revés com golaços e grandes atuações nas campanhas do time no Brasileiro e até a final da Copa do Brasil.
Ele foi sem dúvida o líder de um time que acabou com fantasmas e entrou para a história. Hulk foi o artilheiro do Brasileirão, da Copa do Brasil e o jogador do ano no país. Em 68 jogos, foram 36 gols e 12 assistências, a maior marca da carreira do atacante e alcançada uma década depois (isso mesmo!) de sua melhor marca, pelo Porto, com 35 gols em 2011. Diziam que o Hulk do Porto, com 25 anos, foi o melhor. O que dizer do Hulk do Galo, com 35 anos? Pois é… O fato é que o atacante já está no rol de ídolos imortais do Atlético ao lado de Reinaldo, Dadá e Éder. E, claro, está no Time dos Sonhos do Atlético do Imortais.
Cuca (Técnico): a saída do técnico anunciada durante o Mundial de Clubes de 2013 ainda pesava na mente do torcedor do Atlético quando Cuca foi anunciado como novo treinador do clube em 2021. Mas, jogo após jogo, o técnico encontrou a melhor maneira possível de se desculpar montando um dos maiores esquadrões da história do clube. Utilizando muito bem o elenco, alternando peças, explorando as qualidades de cada um e nunca deixando de lado o estilo ofensivo que imperava na mentalidade dos principais jogadores, Cuca fez do Atlético o time do ano no Brasil.
Vencer os três títulos que ele venceu com a autoridade demonstrada e o futebol apresentado foi simplesmente incontestável. Com vários trabalhos de sucesso na carreira, Cuca provou no Atlético que é, sim, um dos mais vitoriosos e brilhantes treinadores deste século XXI. Só pelo Galo ele acumula os principais troféus que um treinador pode almejar: Libertadores (2013), Campeonato Brasileiro (2021) e Copa do Brasil (2021).
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texto muito bom , parabens poderia fazer um do corinthians 1977 da queda do jejum por favor
Maravilha! Foi um ano maravilhoso pra torcida. Um time que começou a ser montado em 2020 e que já poderia ter sido campeão com Sampaoli. Pero o destino reservava um feito ainda maior, a “tripleta”. E respondendo a pergunta: ainda acho o time de 1978-1983 ou mesmo o de 2013-2014 maiores, mas é gosto pessoal, pois é uma comparação difícil. Que 2022 traga novos títulos!!!!
Parabens pelo texto desde já. Acho q o Palmeiras merece um texto porque a libertadores foi mais uma conquista somada a tantas outras nos anos anteriores, tal como o Atlético deste ano. Vamos esperar para que não só o Galo, mas tbm Palmeiras, Flamengo e outros consigam mais titulos nos próximos anos.
Parabéns Cuca, Hulk e a todo Galo.
E ao imortais pelos textos incríveis.
Texto Sublime. Esperamos que o Clube Atletico Mineiro permaneça com o apetite vencedor no próximo ano. 2022 promete fortes emoções no futebol. Guilherme, será que se der, por favor faça um texto na categoria craque imortal para o Arjen Robben. Ele se despediu do futebol nesse ano.
Obrigado! O Robben estará no Imortais em 2022. 🙂