Por Guilherme Diniz
Ela é um verdadeiro “choque de titãs”. Coloca frente a frente o campeão da Copa Libertadores e o campeão da Copa Sul-Americana. Mas, no passado, já foi diferente. A Recopa Sul-Americana, também conhecida como Conmebol Recopa, possui algumas similaridades com a Supercopa da UEFA, mas nunca foi constante como a irmã do Velho Continente. Iniciada apenas em 1989, ficou um tempo sem ser realizada até ressurgir e permanecer firme no calendário até hoje. Conheça a seguir a história dessa competição.
Sumário
Tira-teima de campeões
No final dos anos 1980, a Conmebol buscava maneiras de ganhar mais dinheiro e se equiparar com a UEFA em número de competições. Por isso, a entidade sul-americana passou a criar torneios que gerassem interesse do público e receita para a entidade. A Supercopa da Libertadores e a Copa Conmebol foram exemplos de competições criadas com o intuito de preencher lacunas no calendário e atrair patrocinadores. E, em 1989, os cartolas criaram a Recopa Sul-Americana, que na época iria reunir o campeão da Copa Libertadores contra o campeão da Supercopa da Libertadores, as duas principais competições da entidade naqueles tempos.
A exemplo do que acontecia na Europa, o torneio seria decidido em dois jogos: um na casa do campeão da Supercopa e outro na casa do campeão da Libertadores. A primeira edição reuniu o Nacional-URU, campeão da Libertadores de 1988, e o Racing-ARG, campeão da Supercopa de 1988, rivais que se enfrentaram no final de janeiro e início de fevereiro de 1989. No primeiro jogo, em Montevidéu, o Nacional, em êxtase pelo título mundial conquistado recentemente diante do PSV-HOL, venceu os argentinos por 1 a 0 (gol de Daniel Fonseca). Na volta, o time tricolor segurou o empate sem gols que garantiu a edição inaugural ao esquadrão de Jorge Seré, Hugo de León, Revelez, Santiago Ostolaza e William Castro.
Em 1990, o Boca Juniors, campeão da Supercopa de 1989, encarou o Atlético Nacional-COL, campeão da América de 1989, em jogo único disputado em Miami (EUA). Os xeneizes venceram por 1 a 0 (gol de Latorre) e celebraram o título. Em 1991, pela primeira vez, o torneio não precisou ser realizado por “culpa” do Olimpia-PAR, que venceu a Libertadores de 1990 e a Supercopa do mesmo ano e, com isso, ganhou a taça automaticamente. O curioso é que o Olimpia disputou a final da Supercopa sabendo que poderia levar um troféu extra, pois as decisões aconteceram entre dezembro de 1990 e janeiro de 1991, após o título do decano na Liberta. Com um timaço lendário, os paraguaios venceram a ida por 3 a 0 e empataram a volta em 3 a 3 com o Nacional-URU para levar a Supercopa e a Recopa.
Em cinco das seis edições seguintes, a Recopa foi decidida em jogo único, mas em um palco curioso: o Japão, terra onde era disputado na época o Mundial Interclubes. Com uma boa relação com a federação japonesa e bons retornos financeiros, a Conmebol faturou alto com o torneio por lá, embora fosse complicado para os clubes viajarem para disputar um torneio não tão importante perto de outros da época. Em 1992, em Kobe (JAP), o Colo-Colo-CHI, campeão da América de 1991, venceu a Recopa após derrotar o Cruzeiro-BRA (campeão da Supercopa) por 5 a 4 nos pênaltis, após empate sem gols no tempo normal. Em 1993, foi a vez do São Paulo de Telê, campeão da América, vencer o Cruzeiro, bicampeão da Supercopa, após dois empates sem gols e vitória tricolor nos pênaltis por 4 a 2 em pleno Mineirão.
Em 1994, o tricolor deveria faturar o bicampeonato da Recopa automaticamente por ter vencido a Libertadores de 1993 e a Supercopa de 1993, porém, a Conmebol, querendo grana, realizou o torneio mesmo assim. Ela chamou o Botafogo, campeão da Copa Conmebol, para decidir o troféu no Japão. Mas o São Paulo não tomou conhecimento do alvinegro e venceu por 3 a 1, levantando a taça que lhe era de direito. Em 1995, o Independiente quebrou a hegemonia recente dos campeões da América ao vencer a Recopa como campeão da Supercopa. Os Diablos bateram o Vélez Sarsfield-ARG por 1 a 0 no Japão. Em 1996, querendo o bicampeonato, o time de Avellaneda encarou o Grêmio-BRA, campeão da América de 1995, mas levou uma goleada de 4 a 1 dos brasileiros – gols de Jardel, Carlos Miguel, Adílson e Paulo Nunes.
Em 1997, último ano da Recopa no Japão, o Vélez, campeão da Supercopa, derrotou o River Plate-ARG, campeão da América, por 4 a 2 nos pênaltis após empate em 1 a 1 no tempo regulamentar. Em 1998 (na verdade, a competição só foi disputada em 1999…), os millonarios voltaram a disputar a Recopa, dessa vez como campeões da Supercopa, mas foram derrotados pelo Cruzeiro-BRA, campeão da América, tanto em Minas (2 a 0) quanto na Argentina (3 a 0). Na comemoração, os atletas do Cruzeiro não puderam celebrar o título em campo pelo fato de o River apagar as luzes do Monumental e ligar o sistema de irrigação do gramado (!). A taça só foi entregue nos vestiários…
Hiato e volta definitiva
Entre 1999 e 2002, a Recopa deixou de ser disputada por conta da indefinição da Conmebol para com suas competições secundárias. Como a Supercopa acabou em 1997 e a Copa Conmebol em 1999, não havia um torneio regular que oferecesse ao campeão da Libertadores um oponente. A Copa Mercosul vigorava naquela virada de milênio, mas ainda não era algo que poderia continuar. Só em 2002 que a Conmebol, enfim, parou de invenções e oficializou a criação da Copa Sul-Americana como segundo torneio mais importante do continente e, aí sim, pôde organizar novamente a Recopa entre os campeões da Libertadores e da Sula.
Em 2003, o tira-teima voltou em Los Angeles (EUA), com o Olimpia, campeão da América de 2002, encarando o San Lorenzo-ARG, primeiro campeão da Sula. Copeiros ao extremo, os paraguaios venceram por 2 a 0 e ficaram com mais um troféu continental para sua galeria. Em 2004, o surpreendente Cienciano-PER, campeão da Sula de 2003, venceu o Boca Juniors-ARG na decisão de Fort Lauderdale (EUA) após empate em 1 a 1 e vitória nos pênaltis por 4 a 2. A partir de 2005, a Recopa passaria a ser disputada em jogos de ida e volta em definitivo, com a ida na casa do campeão da Copa Sul-Americana e a volta na casa do campeão da Libertadores.
Com essa nova regra, os campeões da Glória Eterna passaram a ter mais vantagem e ficaram com a maioria das disputas. No início, o Boca Juniors evitou a festa dos campeões da América ao ficar com o bicampeonato em 2005 e 2006, ambos como campeão da Sul-Americana, ao derrotar respectivamente Once Caldas-COL e São Paulo-BRA. Em 2007, o Internacional-BRA ficou com a Recopa ao derrotar o Pachuca-MEX, campeão da Sula de 2006. Daquele ano até 2014, exceto pela temporada de 2010, os campeões da Recopa foram os campeões da Libertadores:
- 2008: Boca Juniors (campeão da Libertadores)
- 2009: LDU (campeão da Libertadores)
- 2010: LDU (campeão da Copa Sul-Americana)
- 2011: Internacional (campeão da Libertadores)
- 2012: Santos (campeão da Libertadores)
- 2013: Corinthians (campeão da Libertadores)
- 2014: Atlético Mineiro (campeão da Libertadores)
Só em 2015 que o River Plate, como campeão da Copa Sul-Americana, derrotou um campeão da Liberta na final da Recopa (o San Lorenzo), vencendo os dois jogos por 1 a 0. Os millonarios venceram também a edição de 2016, mas aí como campeões da Libertadores. Entre 2017 e 2020, os campeões da Liberta voltaram a reinar e não deram chances para os campeões da Sula, em especial o River Plate em 2019 – fez 3 a 0 no Athletico na partida de volta – e o Flamengo em 2020 – aplicou 3 a 0 no Independiente Del Valle no Maracanã.
Em 2021, o Defensa y Justicia-ARG quebrou a sina ao derrotar o Palmeiras-BRA nos pênaltis. Em 2022, o Verdão conseguiu sua primeira Recopa ao bater o Athletico Paranaense (campeão da Sula de 2021) e, em 2023, o Independiente Del Valle se vingou do Flamengo-BRA pela perda do título da Recopa de 2020 e venceu o rubro-negro na condição de campeão da Sula de 2022. Já estabelecida no calendário e chance de somar mais um título internacional na galeria, a Recopa possui um valor muito maior atualmente do que no passado e oferece grandes jogos e disputadas ferrenhas entre os titãs da América. Que continue assim por muito tempo.
Os campeões
Curiosidades e estatísticas:
- O maior campeão da Recopa é o Boca Juniors-ARG, com 4 troféus. O River Plate-ARG vem logo em seguida como 3 conquistas. São Paulo, Internacional, Olimpia, LDU e Grêmio possuem 2 títulos cada;
- O Boca é também o único clube que disputou três finais seguidas de Recopa: 2004 (como campeão da Libertadores), 2005 e 2006 (ambas como campeão da Sul-Americana). Ele venceu em 2005 e 2006 e perdeu em 2004;
- O Brasil é o país com mais títulos da Recopa: 13 troféus em 30 edições, além de 11 vices, contra 10 títulos da Argentina, que possui 13 vices. O Equador vem em seguida com 3 títulos;
- A hegemonia dos campeões da Recopa que vieram da Libertadores é gritante: são 21 títulos contra apenas 7 títulos dos campeões da Sul-Americana e 3 títulos dos campeões da Supercopa da Libertadores;
- Rodrigo Palacio, do Boca Juniors de 2006, e Leandro Damião, do Internacional de 2011, são os maiores artilheiros em uma só edição de Recopa com 3 gols cada. Palacio ainda é o maior artilheiro da história do torneio com 5 gols anotados em duas edições – 2006 e 2008.
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Mandou bem, Imortais! A Recopa Sul-Americana está mais interessante e tem sua importância no calendário sul-americano.
Imortais, estou achando legal esses textos sobre Torneios Históricos. Inclusive, eu tenho uma sugestão: faz da Copa das Cidades com Feiras, aquela precursora da Copa da UEFA, atual Liga Europa. Abraço!
Obrigado! Ótima sugestão! Farei, sim! Abraço!