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Torneios históricos: Supercopa da Libertadores

 

Por Guilherme Diniz

 

Ela era, antes de tudo, restrita a poucos. Só entrava quem já havia conquistado pelo menos uma vez a Copa Libertadores. Durou pouco, mas proporcionou duelos envolvendo os maiores titãs do continente. A Supercopa da Libertadores, também conhecida como Supercopa Sul-Americana, foi mais um dos muitos torneios realizados pela Conmebol no final da década de 1980 e início da década de 1990. Criada pelo antigo presidente Nicolás Leoz como forma de expandir o número de competições e, claro, o faturamento da entidade, o torneio reuniu grandes clubes em suas 10 edições. É hora de relembrar.

 

Só para gigantes

A Supercopa começou em 1988 com o intuito de reunir em um torneio eliminatório apenas os clubes que alguma vez haviam vencido a Copa Libertadores. Era uma forma de a Conmebol ganhar mais dinheiro e, de certa forma, dar uma oportunidade aos clubes de levantarem um troféu internacional. Naquele ano, a competição foi disputada por apenas 13 equipes: Argentinos Juniors-ARG, Boca Juniors-ARG, Cruzeiro-BRA, Estudiantes-ARG, Flamengo-BRA, Grêmio-BRA, Independiente-ARG, Nacional-URU, Olimpia-PAR, Peñarol-URU, Racing-ARG, River Plate-ARG e Santos-BRA. Como o número de participantes totalizou um número ímpar, a Conmebol sorteou qual equipe iria direto para as quartas de final e qual chaveamento das oitavas iria direto para as semis. O escolhido para avançar às quartas diretamente foi o Nacional-URU, enquanto o vencedor do duelo entre Racing x Santos iria direto para a semifinal.

O Racing, do lendário goleiro Fillol (de camisa verde) foi o primeiro campeão da Supercopa.

 

Era, claro, um método de classificação bagunçado, bem aos moldes da Conmebol, que poderia fazer uma competição em turno e returno, por exemplo. Teriam mais jogos, mas seria mais interessante e coesa. Critérios à parte, a Supercopa teve duelos eletrizantes naquele ano (os placares são os agregados após dois jogos): 

 

Argentinos Juniors 2×1 Peñarol

Cruzeiro 3×1 Independiente

Flamengo 4×1 Estudiantes

River Plate 4×2 Olimpia

Grêmio 2×1 Boca Juniors

Santos 0x2 Racing

 

Nas quartas, o Cruzeiro superou o Argentinos Juniors, o Nacional, que seria campeão da Libertadores daquele ano, desbancou categoricamente o Flamengo (vitórias por 3 a 0 e 2 a 0), e o River passou pelo Grêmio, enquanto que o Racing foi direto para as semis. Nelas, o time de Avellaneda passou pelo River Plate e, na outra chave, o Cruzeiro eliminou o Nacional. Na final, o Racing venceu o Cruzeiro no duelo de ida (2 a 1), segurou o empate em 1 a 1 na volta para ficar com o título. No ano seguinte, a Conmebol criou a Recopa Sul-Americana e fez com que o campeão da Supercopa enfrentasse o campeão da Libertadores. Tal medida dava um bônus ao campeão da Supercopa e ainda mais interesse aos envolvidos. Na Recopa de 1989, o Nacional derrotou o Racing e ficou com o título.

O Boca aumentou sua coleção de troféus internacionais com a Supercopa de 1989.

 

O Olimpia, campeão de 1990.

 

Em 1989, a Supercopa ganhou um novo participante: o Atlético Nacional-COL, campeão da Libertadores daquele ano. A competição seguiu em formato eliminatório e o Boca Juniors foi o campeão após superar o Independiente na decisão por pênaltis. Em 1990, o Olimpia foi o campeão após derrotar o Nacional com uma vitória por 3 a 0 na ida, em Montevidéu, e empate em 3 a 3 na volta. Como havia sido campeão da Libertadores de 1990 também, o Olimpia acabou vencendo de maneira automática a Recopa Sul-Americana, feito que coroou um dos maiores esquadrões do futebol sul-americano da época. 

 

Domínio brasileiro e últimos anos

O Cruzeiro de 1991: Em pé: Ademir, Nonato, Paulão, Adílson, Célio Gaúcho e Paulo César. Agachados: Mário Tilico, Boiadeiro, Charles, Luis Fernando Flores e Marquinhos.

 

Em 1991, o torneio ganhou outro representante: o Colo-Colo, campeão da Libertadores de 1991, enquanto que o Atlético Nacional acabou declinando da disputa. E o time chileno acabou eliminado logo de cara pelo Cruzeiro-BRA, que empatou os dois jogos e venceu nos pênaltis o duelo da volta por 4 a 3 em pleno estádio Monumental. O time brasileiro foi avançando, eliminou Nacional-URU e Olimpia-PAR e alcançou a final para enfrentar o River Plate-ARG. Depois de perder por 2 a 0 a ida, em Buenos Aires, o time azul venceu por 3 a 0 a partida de volta, no Mineirão, e ficou com um título histórico sob a batuta do lendário técnico Ênio Andrade. 

Antes do jogo no Mineirão, o treinador conseguiu um gandula chileno para trabalhar bem próximo do banco de reservas do time argentino e transmitir sorrateiramente durante o jogo as informações que o treinador Daniel Passarella passava aos seus comandados. Quando o argentino falava algo no banco ou para um jogador específico, o maroto chileno se mandava correndo até o banco cruzeirense para contar tudo a Ênio Andrade. Munido das informações do inimigo, ficou fácil para o “raposo” anular os rivais taticamente e dar o título ao Cruzeiro, que venceu o duelo por 3 a 0, com dois gols de Mário Tilico e um de Ademir.

Em 1992, com a inclusão do São Paulo-BRA, campeão da Libertadores daquele ano, a Supercopa foi disputada pela primeira vez com o formato eliminatório completo, sem equipes avançando de maneira independente. E o Cruzeiro levantou o bicampeonato após superar pelo caminho Atlético Nacional-COL (com direito a uma vitória por 8 a 0 no Mineirão), River Plate-ARG e Olimpia-PAR antes de encarar o Racing-ARG, em uma revanche de 1988. E a Raposa conseguiu a desforra ao golear os argentinos por 4 a 0 no Mineirão e perder por apenas 1 a 0 em Avellaneda. O time mineiro foi o primeiro bicampeão do torneio.

Cruzeiro foi o primeiro bicampeão. Foto: Divulgação / Conmebol.

 

Renato Gaúcho, do Cruzeiro, marcou 5 gols em um só jogo em 1992.

 

Em 1993, a Supercopa teve uma final eletrizante entre São Paulo e Flamengo. No primeiro jogo, no Maracanã, empate em 2 a 2. Na volta, no Morumbi, novo empate em 2 a 2, com gols de Renato Gaúcho e Marquinhos, para o Fla, e Leonardo e Juninho Paulista, para o São Paulo. A disputa do troféu foi para os pênaltis e Marcelinho Carioca carimbou a trave do goleiro Zetti logo no segundo chute rubro-negro. Os tricolores Dinho, Leonardo, Cafu, André Luiz e Müller fizeram seus gols e o placar de 5 a 3 deu mais um troféu internacional ao time paulista. Tal conquista dava ao São Paulo o direito de levantar a Recopa Sul-Americana, pois o tricolor também venceu a Libertadores de 1993. No entanto, a Recopa foi realizada mesmo assim (a Conmebol queria grana…) e o São Paulo encarou o Botafogo, campeão da Copa Conmebol. O time paulista venceu o alvinegro e ficou com a taça que lhe era de direito.

O São Paulo campeão de 1993. Em pé: Zetti, Ronaldão, Dinho, Cafu e Toninho Cerezo. Agachados: Müller, Palhinha, Doriva, Válber, André Luiz e Leonardo.

 

Em 1994, com os mesmos 16 clubes do ano anterior, o Independiente-ARG venceu seu primeiro título e conseguiu a revanche diante do Boca, seu algoz em 1989. Os rojos empataram em 1 a 1 o primeiro jogo, em La Bombonera, e venceram a partida da volta, em Avellaneda, por 1 a 0. Em 1995, o diablo ficou com o bi após derrotar o Flamengo na decisão com triunfo por 2 a 0 na ida e derrota por apenas 1 a 0 no Maracanã. 

Independiente faturou seu primeiro título em 1994.

 

E, em 1995, o clube argentino conseguiu segurar o Flamengo de Sávio (foto) e Romário na final. Foto: Arquivo / O Globo.

 

Em 1996, a Conmebol decidiu mudar o modelo de classificação diante do inchaço do torneio – eram 17 clubes naquele ano para 16 vagas. Com isso, a Conmebol sorteou três clubes que se enfrentaram em um triangular ida e volta, todos contra todos, no qual o vencedor iria direto para as quartas de final, enquanto 14 times fariam uma etapa de oitavas de final “manca”. No triangular, o Boca Juniors acabou classificado, deixando para trás Racing e Argentinos Juniors.

Vélez, de Chilavert (de amarelo), foi o campeão de 1996.

 

Nas quartas de final, agora sim com oito clubes, Vélez, Santos, Colo-Colo e Cruzeiro superaram seus rivais e foram às semifinais. Nela, o Vélez eliminou o Santos e o Cruzeiro despachou o Colo-Colo. Na final, o Vélez Sarsfield derrotou o Cruzeiro – 1 a 0, em Minas, e 2 a 0, na Argentina, e foi campeão, fechando uma era de ouro do esquadrão de Liniers. Em 1997, o critério mudou de novo: a fim de reduzir o número de participantes, a Conmebol instituiu um “rebaixamento”. Seria assim: os participantes seriam divididos em quatro grupos com quatro equipes cada, em duelos todos contra todos, ida e volta. Os melhores de cada grupo iriam para as semifinais enquanto que os piores colocados de cada grupo não iriam disputar o torneio de 1998. 

O Vasco, de Edmundo (à dir.) disputou a competição de 1997 no lugar do Argentinos Juniors.

 

Além disso, aconteceu uma fase preliminar envolvendo três equipes: Peñarol, Nacional e Vasco, que entrou na competição no lugar do Argentinos Juniors, que não pôde participar por se encontrar na segunda divisão argentina na época (novo critério que a Conmebol adotou para filtrar os participantes). O time cruzmaltino conseguiu a vaga graças a um trabalho de sua diretoria que usou o título Sul-Americano de 1948 conquistado pelo Expresso da Vitória como argumento para pleitear uma vaga, afinal, o torneio era continental e foi um dos precursores da Libertadores. A Conmebol acatou o lobby vascaíno e o time carioca conseguiu a vaga na fase de grupos juntamente com o Peñarol – o Nacional acabou eliminado.

Na etapa de grupos, os classificados para as semis foram Colo-Colo, São Paulo, River Plate e Atlético Nacional. O River superou o Atlético Nacional (3 a 2 no agregado) e o tricolor passou pelos chilenos (4 a 1 no agregado). Na decisão, os millonarios, em fase esplendorosa, campeão da América no ano anterior e com nomes como Burgos, Sorín, Astrada, Berti, Gallardo, Francescoli e Salas, segurou o empate no Morumbi (0 a 0) e venceu por 2 a 1 no Monumental lotado (mais de 81 mil pessoas), dando à Argentina o sexto título em dez edições. 

O super River de 1997. Em pé: Sorín, Astrada, Berizzo, Ayala, Díaz e Burgos. Agachados: Monserrat, Francescoli, Gallardo, Berti e Salas. Foto: Acervo / Futebol Portenho.

 

 

Porém, em 1999, a Conmebol decidiu encerrar a Supercopa para dar prioridade à Copa Mercosul e à Copa Merconorte. Anos depois, essas duas competições, além da Copa Conmebol, foram extintas e a Copa Sul-Americana foi criada para absorver todas elas. Em 2020, o presidente da Conmebol, Alejandro Domínguez, até cogitou o retorno da Supercopa, mas logo a ideia foi descartada por conta do inchaço do calendário e o excesso de clubes que ela teria nos dias de hoje – pelo menos 25 equipes -, algo que iria complicar bastante o formato de disputa. Seria bem interessante um torneio desse nível, mas é quase impossível encaixá-lo no cotidiano das equipes. Com isso, ficam as memórias e tempos nos quais os titãs se enfrentavam sem concorrentes.

Os campeões:

Curiosidades:

 

  • Cruzeiro e Independiente foram os únicos bicampeões da Supercopa. E ambos de maneira consecutiva. O time brasileiro ainda se tornou o clube com melhor retrospecto na competição, pois ficou também com dois vices (1988 e 1996);
  • A Argentina foi o país mais vitorioso na história da Supercopa: foram 6 títulos. O Brasil ficou com 3 títulos e o Paraguai com 1 título;
  • O brasileiro Ronaldo Fenômeno, ainda um garoto no Cruzeiro de 1993, foi o maior artilheiro de uma só Supercopa na história: 8 gols marcados. Anos depois, em 1997, o chileno Ivo Basay, do Colo-Colo, repetiu os 8 gols do brasileiro. Depois deles, Raúl Amarilla (Olimpia, 1990) e Enzo Francescoli (River Plate, 1995), anotaram 7 gols cada nas edições mencionadas.
  • As maiores goleadas da história foram: Cruzeiro 8×0 Atlético Nacional (1992), Olimpia 6×0 Peñarol (1990) e Cruzeiro 6×1 Colo-Colo (1993);
  • Renato Gaúcho, do Cruzeiro de 1992, anotou 5 gols na goleada de 8 a 0 sobre o Atlético Nacional em 1992 e foi o jogador que marcou mais gols em um só jogo na história da competição. Ele anotou 6 gols no total e foi o artilheiro da Supercopa;
  • Racing (1988), Boca Juniors (1989) e Vélez Sarsfield (1996) foram os únicos campeões invictos da Supercopa;
  • A maior goleada em uma final foi Cruzeiro 4×0 Racing, 1992;
  • Duas finais foram decididas nos pênaltis: Boca 5×3 Independiente, em 1989, e São Paulo 5×3 Flamengo, em 1993. 

 

 

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Comentários encerrados

Um Comentário

  1. Mais uma vez parabens guilherme eu assisti todas de 92 ate acabar.vou sempre lembrar de tres finais que marcaram:o cruzeiro de 92 com roberto e renato gaucho jogando muito,o sao paulo e flamengo de 93 que pra mim foi a melhor final com dois grandes jogos e por fim o independiente de 95 bi campeao dentro do maracana ferrando o centenario do flamengo que tinha savio e romario voando na epoca.realmente a supercopa marcou minha adolescencia com grandes times e muito bons jogos.

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