Por Leandro Stein
O futebol merecia um dicionário só para si. Não são poucos os elementos que acontecem dentro de campo e que precisaram ser batizados do nada, com palavras completamente novas. Algumas delas são descritivas, como, por exemplo, a ‘bicicleta’ ou o ‘elástico’. E outras homenageiam antigos personagens do esporte que muitas vezes sequer são lembrados, embora seus nomes sejam repetidos diariamente. E os mais notáveis provavelmente são Gandulla e Pichichi.
Se o gandula está acostumado a buscar as bolas à beira do campo, sua alcunha lembra o voluntarismo de um argentino. Revelado pelo Ferro Carril Oeste, Bernardo Gandulla foi contratado pelo Vasco em 1939. Chegou a São Januário com status de estrela. Atacante habilidoso e com faro de gol, era uma resposta e tanto para o Flamengo de Leônidas da Silva. Mas não pôde jogar. Sua transferência para o clube cruzmaltino não foi ratificada pelos cartolas e, com problemas para ter uma sequência de jogos, Gandulla ficava limitado à beira do campo. Para ajudar de alguma forma, se dedicava a buscar as bolas que saíam, até mesmo as que eram de posse dos adversários. “Nascia” ali o primeiro gandula – embora um registro do Diário da Noite tenha identificado o termo desde 1933, como você ver nesta matéria.
Gandulla voltou à Argentina logo no ano seguinte, contratado pelo Boca Juniors. Fez história com a camisa xeneize, duas vezes campeão nacional. O sucesso o levou até mesmo à seleção argentina, pela qual disputou um jogo. E, depois de se aposentar, Gandulla continuou prestando serviços ao Boca: passou a trabalhar nas categorias de base, ajudando a revelar grandes promessas como Antonio Rattín, Alberto Tarantini e Ricardo Gareca. “Minha vocação foi jogar futebol. Com o passar dos anos, a base foi minha grande paixão. Minha vida, sem dúvidas”, resumiu o argentino, pouco antes de falecer, em 1999.
Enquanto Gandulla não é lembrado no Brasil propriamente por seu talento, na Argentina ele dá nome ao prêmio de melhor jogador do ano. Uma honraria comparável à de Pichichi. O nome do basco é sinônimo de artilheiro na Espanha, já que batiza o prêmio oferecido ao maior goleador da temporada de La Liga. E a história do atacante faz jus à importância, uma das maiores lendas do Athletic Bilbao. Rafael Moreno Aranzadi nasceu em 1892 e recebeu o apelido de Pichichi, o ‘pequeno pato’, dos meninos com quem jogava bola na infância. Aos 19 anos, já vestia a camisa dos leones e não demoraria a se tornar protagonista do time.
Em 1913, Pichichi anotou o primeiro gol do recém-inaugurado Estádio de San Mamés. E, sempre balançando as redes aos montes pelo Athletic, ajudou o clube a conquistar a Copa do Rei quatro vezes, o que o fez ser considerado por muitos o melhor jogador da Espanha na década de 1910. Também fez parte da seleção espanhola que conquistou a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de 1920, na Antuérpia (BEL). Mas aquele já era o declínio daquele extremo tão prolífico – foram 83 gols em 89 jogos pelo Athletic na carreira. Criticado pela torcida, pendurou as chuteiras aos 29 anos, para se tornar árbitro. Um ano antes de sua morte. No dia 1º de março de 1922, Pichichi faleceu por conta de uma febre tifoide.
A partir de 1926, Pichichi foi homenageado na entrada de San Mamés com um busto de bronze. O que também iniciou uma tradição em Bilbao: sempre que um time ia jogar pela primeira vez no estádio, o capitão era convidado a oferecer flores à estátua. E, em 1952-1953, o jornal espanhol Marca passou a premiar o artilheiro do Campeonato Espanhol com o Troféu Pichichi. Logo naquele ano, para ficar em boas mãos: venceu Telmo Zarra, jogador que por muito tempo foi o recordista em artilharias de La Liga (6 vezes, até ser superado por Lionel Messi em 2020) e maior ídolo da história do Athletic Bilbao.
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Outro que deu nome para o futebol foi o Carlos Volante.
Muito bem lembrado! 😀