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Esquadrão Imortal – Chapecoense 2016

Em pé: Danilo, Matheus Caramelo, Cléber Santana, Thiego, Neto e Josimar. Agachados: Kempes, Gil, Tiaguinho, Ananias e Dener.
Chapecoense 2016
Em pé: Danilo, Mateus Caramelo, Cléber Santana, Thiego, Neto e Josimar. Agachados: Kempes, Gil, Tiaguinho, Ananias e Dener.
 

Grandes feitos: Campeã da Copa Sul-Americana (2016) e Campeã Catarinense (2016). Conquistou o maior e mais importante título da história do clube.

Time-base: Danilo (Nivaldo / Follmann); Gimenez (Mateus Caramelo), Thiego, Neto (Rafael Lima) e Dener (Alan Ruschel); Gil, Josimar (Matheus Biteco) e Cléber Santana; Ananias (Lucas Gomes) e Tiaguinho (Hyoran / Maranhão); Bruno Rangel (Kempes). Técnicos: Guto Ferreira (até junho) e Caio Júnior.

 

“A Chape Eterna”

Por Guilherme Diniz

Quanta alegria. Que energia. O que um movimento rápido, um reflexo impressionante, são capazes de fazer. O pé de Danilo tirou o que era para ser o gol do adversário. “Fez o gol” que colocou a Chapecoense na final de um torneio continental pela primeira vez. A Arena Condá era frenesi puro. A respiração dos torcedores, ofegante. A voz atingia os mais altos níveis, os ouvidos absorviam decibels sem martelar a cabeça. Tudo e todos só tinham olhos e coração para a Chape. Ela estava na final! O adversário seria o Atlético Nacional, campeão da Libertadores, também embalado, com camisa pesada… Mas quem se importava? Aquela Chape havia derrubado os titãs argentinos Independiente e San Lorenzo. Os jogadores do time catarinense já estavam tarimbados. E prontos para qualquer coisa. No entanto, algo inesperado aconteceu. Na madrugada do dia 29 de novembro de 2016, o avião que levava o time brasileiro, sua comissão técnica e vários jornalistas para a Colômbia, padeceu sob o Cerro Gordo, em La Unión, há poucos quilômetros de seu destino final.

Das 77 pessoas, apenas seis sobreviveram. Seis. Dezenove jogadores daquela Chape faleceram. Três sobreviveram. A final da Copa Sul-Americana de 2016 ganhava o contorno de uma tragédia. Foi uma apunhalada no coração dos amantes do futebol. O Brasil acordou naquela terça-feira sem entender. As horas foram passando e o acidente, mais detalhes, mais fronteiras. O mundo ficava sabendo do ocorrido. Mas por que eles? Por que aquele avião? Por que naquele momento? O futebol ganhava mais um capítulo trágico. E o céu um time inteiro para duelar com outros que também se foram precocemente. É hora de relembrar o episódio mais triste de toda a história do futebol.

Ascensão impressionante 

Bruno Rangel comemora um de seus 31 gols na Série B de 2013.

 

 

Muito antes de transformar sua história em 2016, a Chapecoense passou por uma das maiores ascensões que o futebol já viu. Tudo começou lá em 2009, quando a equipe disputou a primeira edição do Campeonato Brasileiro da Série D e alcançou o acesso à Série C terminando entre os quatro melhores do torneio. Em 2012, o time catarinense conseguiu mais um acesso, dessa vez para a Série B, ao chegar às semifinais da terceirona. E a epopeia terminou em 2013, quando a Chape foi vice-campeã da segundona (atrás apenas do Palmeiras) após grande campanha – foi o time que menos perdeu, apenas seis derrotas em 38 jogos – e brilho do artilheiro Bruno Rangel, maior goleador da competição com 31 gols (o vice-artilheiro, Marcos Aurélio, do Sport, teve “apenas” 22 gols).

Embora muitos não acreditassem na permanência do time na elite, a Chape não só terminou na primeira divisão como ainda aplicou uma histórica goleada de 5 a 0 sobre o Internacional (3º colocado naquele ano). Em 2015, o time permaneceu outra vez na Série A e ainda disputou pela primeira vez um torneio continental: a Copa Sul-Americana, após garantir vaga por ser eliminada antes da quarta fase da Copa do Brasil (na época o regulamento era bem esquisito…). A Chape passou pela Ponte Preta-BRA na segunda fase do torneio (empate em 1 a 1 e vitória por 3 a 0) e conseguiu a classificação para as quartas de final ao eliminar o Libertad-PAR nas oitavas após dois empates em 1 a 1 e triunfo nos pênaltis por 5 a 3. 

Faltou muito pouco para a Chape eliminar o River em 2015.

 

 

No entanto, o time brasileiro sucumbiu diante do River Plate-ARG – campeão da Libertadores naquele ano e da Sul-Americana de 2014 – ao perder por 3 a 1 fora e vencer por 2 a 1 em casa, insuficiente para a classificação. Mesmo eliminada, a equipe catarinense foi elogiada por todos pela entrega e disposição e por mandar uma bola na trave aos 43’ do segundo tempo que poderia mudar o rumo da partida. Era um prenúncio do que estava por vir. Com a manutenção do elenco e algumas contratações, o ano de 2016 poderia ser ainda mais promissor para o clube de Chapecó.

 

Manutenção da base e título estadual

A diretoria da Chape manteve o elenco para a temporada de 2016 e fez algumas contratações pontuais, como o jovem lateral Gimenez e os atacantes Kempes e Lucas Gomes. Sob o comando do técnico Guto Ferreira, o alviverde fez um ótimo primeiro turno no Campeonato Catarinense e terminou na primeira colocação com sete vitórias e dois empates em nove jogos, desempenho que classificou o time à final. No segundo turno, a quarta colocação não atrapalhou os planos do Verdão do Oeste, que enfrentou o Joinville em busca de um título que não vinha desde 2011. No primeiro jogo, na casa do rival, Ananias fez o gol da vitória da Chape por 1 a 0.

Na volta, a Arena Condá recebeu mais de 15 mil pessoas que levaram um susto quando o Joinville abriu o placar no final do primeiro tempo com Diego Felipe. Precisando do empate, o Verdão empatou com o artilheiro Bruno Rangel e garantiu o título estadual de 2016, o 5º da história do clube. Com 10 gols, Rangel foi o artilheiro da competição e principal nome ofensivo do time de Chapecó. Vale destacar os três gols do atacante na goleada de 4 a 0 sobre o Avaí, na primeira fase. Kempes, com cinco, foi outro grande goleador da equipe.

Rangel fez o seu…

 

 
… E a Chape faturou o título de 2016!

 

 

Um mês depois, o técnico Guto Ferreira acabou deixando o comando da Chape para treinar o Bahia. Guto teve 18 vitórias, 11 empates e cinco derrotas em 2016, um ótimo aproveitamento de 63,7%. Com isso, a diretoria contratou Caio Júnior, técnico que vinha de um período de dois anos no futebol dos Emirados Árabes Unidos. Ele assumiu o time na 12ª rodada do Brasileirão e pegou a equipe na posição intermediária da tabela – a Chape era a 11ª colocada -, estreando com vitória por 3 a 2 sobre o Cruzeiro na Arena Condá.

Caio Júnior assumiu a Chape no meio do ano e manteve o time competitivo.

 

 
O goleiro Danilo, uma das referências da Chape em 2016.

 

 

O compromisso seguinte foi a terceira fase da Copa do Brasil, na qual a Chape empatou sem gols com o Athletico-PR, em Curitiba, e em 1 a 1 em Chapecó, resultados que eliminaram o time da competição pelo critério de gols marcados fora, mas que por outro lado acabou classificando a Chapecoense para a Copa Sul-Americana exatamente como na temporada passada. E, de novo, o alviverde traçou como objetivo principal o torneio continental.

 

A saga das Américas

Cléber Santana em ação. Foto: David Fernandez / EFE.

 

 

O primeiro desafio da Chapecoense na Sul-Americana de 2016 foi o Cuiabá-BRA, que derrotou os catarinenses por 1 a 0 na partida de ida, na Arena Pantanal. Na volta, em Chapecó, o Cuiabá voltou a sair na frente e obrigou a Chape a fazer três gols. Dito e feito. Bruno Rangel (duas vezes) e Lucas Gomes viraram o placar no segundo tempo e garantiram uma dramática classificação às oitavas de final. Só que o time teria pela frente o Independiente, o temido Rey de Copas, heptacampeão da Libertadores, multicampeão de vários torneios continentais e tarimbado em competições de tiro curto. Seria um desafio semelhante ao vivenciado pela Chape em 2015 diante do River, mas os rojos eram inferiores aos millonarios e a equipe brasileira sabia que um resultado positivo em solo argentino seria fundamental para a volta, em Chapecó.

Danilo defende um dos quatro pênaltis contra o Independiente. Foto: Nelson Almeida / AFP.

 

 

Jogando em Avellaneda, a Chapecoense suportou a pressão do Estádio Libertadores de América e segurou um empate sem gols que deixou o confronto totalmente aberto para a volta, na Arena Condá. Jogando com o apoio de sua torcida, a Chape sufocou os argentinos e mandou três bolas na trave do goleiro Campaña – duas com o capitão Cléber Santana e uma com Filipe Machado. O Independiente também pressionou, principalmente nos minutos finais, mas o placar não saiu do zero outra vez e a decisão foi para os pênaltis. E, na marca da cal, o goleiro Danilo se transformou no grande nome do jogo. O camisa 1 defendeu nada mais nada menos do que quatro cobranças: Benítez, Rigoni, Sánchez Miño e Tagliafico, esta última a decisiva, com o goleiro “cantando” para o cobrador aonde iria pular e fazendo com que o argentino caísse em sua armadilha. A torcida foi ao delírio ao ver seu time pela segunda vez seguida em uma fase de quartas de final de Sul-Americana.

 

O prenúncio que ninguém notou

A delegação da Chape esperando pelo embarque na ida, contra o Junior Barranquilla.

 

 

Para enfrentar o Junior Barranquilla-COL, seu adversário nas quartas de final, a Chapecoense passou por sérios problemas de atrasos que foram uma espécie de prenúncio do que aconteceria um mês e dez dias depois. O que mais aflige e chega a revoltar, hoje, é que ninguém na época notou. Após enfrentar o Cruzeiro em Belo Horizonte, pelo Brasileiro, o time catarinense tinha que ir de avião até Corumbá (MS) para de lá seguir viagem até Barranquilla. No entanto, o voo atrasou seis horas (!). Após o atraso e a chegada à cidade sul-mato-grossense, a Chape foi de ônibus até Puerto Suárez, na Bolívia, para só de lá embarcar no avião da LaMia (empresa contratada pelos catarinenses) que levaria o time até a Colômbia. 

Para piorar, entre as baldeações em solo boliviano, jogadores e comissão técnica tiveram que percorrer alguns quilômetros em vans sem portas nem janelas! Isso mesmo que você leu! A cena pitoresca é vista inclusive no documentário “A Lenda Condá”, produzido pelo canal SporTV. Uma várzea! Aliás, nem na várzea algo daquele nível era visto. Poxa, por que não ir em um voo comercial? Por que não procurar uma empresa mais estruturada? Já imaginou fretar um voo com transfer em vans sem portas nem janelas? Supimpa, hein! Olha que chique… Me poupe!

Sem a preparação adequada, a Chape perdeu o duelo de ida por 1 a 0. Foto: Luis Acosta / AFP.

 

 

Pois bem. Toda essa bagunça causou 22 horas de atraso na chegada da Chape. E o time ainda foi reconhecer o gramado do jogo na noite do próprio desembarque, um dia antes da partida. Como não poderia deixar de ser, o time brasileiro perdeu: 1 a 0, com os jogadores estressados, cansados e sem condições de disputar com o mínimo de concentração uma partida eliminatória de competição internacional.

Felizmente, na volta, tudo voltou ao normal. Com mais uma vez a Arena Condá lotada, a torcida empurrou o time com muito grito e paixão que nem a chuva torrencial que caiu em Chapecó naquela noite do dia 26 de outubro impediu de acontecer. Com um gol de Ananias, aos 35’ do primeiro tempo, a Chape abriu o placar. Aos 43’, Gil ampliou. E, aos 31’ da segunda etapa, Gil pegou rebote do escanteio e cruzou para Thiego escorar e definir os 3 a 0 que colocaram a Chapecoense em uma histórica semifinal! Faltavam apenas quatro jogos para um incrível título continental! Já imaginou um clube que até alguns anos estava na Série D ser campeão da América?

 

Danilo épico!

Ananias comemora seu gol em Buenos Aires. Foto: David Fernandez / EFE.

 

 

O adversário da Chape nas semis seria mais um desafio gigantesco para os comandados do técnico Caio Júnior: o San Lorenzo-ARG, campeão da Libertadores de 2014 e comandado pelo técnico Diego Aguirre. Assim como nas etapas anteriores, o time de Chapecó iria decidir em casa. E, jogando no hostil Nuevo Gasómetro, a Chape foi valente. Jogou de igual para igual com os argentinos, venceu várias disputas no meio de campo e apresentou um futebol típico para se ir longe em um torneio sul-americano. Os jogadores estavam em sintonia profunda. Nem o gol dos argentinos no primeiro tempo abalou o espírito guerreiro da Chape. E, aos 11’, Dener tabelou com Tiaguinho e cruzou para Ananias, de novo ele, bater rasteiro e fazer o gol de empate: 1 a 1. O jogo seguiu aberto, com chances para ambas as equipes, mas sem alterações no placar.  Após o jogo, Ananias comentou sobre o grande empate conquistado em Buenos Aires ao globoesporte.com na época.

Esse time maravilhoso tem lutado, fomos corajosos, contra tudo e contra todos. Sei que o Brasil está torcendo para a gente. Jogamos no ano passado contra o River, a gente está acostumado, a gente está sabendo jogar essa competição”, disse o atacante. 

Para a volta, a Chapecoense poderia até empatar sem gols que a vaga na final era dela. Tudo seria definido na Arena Condá, que se transformaria no epicentro do épico alviverde. Com quase 20 mil pessoas, o estádio da Chape era um caldeirão ainda maior do que nos jogos contra Independiente e Junior Barranquilla. Ainda mais fumaça. Ainda mais cantoria.

Duelo da volta foi tenso! Foto: Paulo Whitaker / Reuters.

 

 

Quando a bola rolou, o que se viu foi muita correria e tensão. O San Lorenzo levava perigo, mas a Chape conseguia se defender e responder com ataques pontuais. Thiego até abriu o placar, mas o gol foi anulado pela arbitragem por impedimento bastante duvidoso. A partida seguiu lá e cá, com Danilo fazendo grandes defesas e também contando com a trave em alguns momentos. Mas quem agredia mais era o San Lorenzo.

Uma das escalações da Chape em 2016: time era muito bom no contra-ataque e se protegia bem na defesa. Copeiro e em profunda sintonia!

 

 

Até que, aos 49’ da segunda etapa, o time argentino teve uma bola para alçar na área brasileira. Era a chance derradeira. O time inteiro foi para a área. O zagueiro Neto confessou tempo depois que até começou a chorar temendo pelo pior. A bola viajou até a área alviverde. Nenhum zagueiro tirou. E a redonda caiu nos pés de Blandi. O jogador do Ciclón chutou e Danilo, à queima roupa e com os pés, defendeu de maneira impressionante. O estádio quase veio abaixo. Foi como um gol. Segundos se passaram e o árbitro apitou o final da partida.

O lance derradeiro…

 

 
… E a festa do goleiro!

 

 

A Chapecoense estava na final da Copa Sul-Americana. A emoção tomou conta dos jogadores e torcedores. Danilo, claro, foi o mais festejado e elevado às alturas como herói do jogo e dono de uma das defesas mais importantes de toda a história do clube. Ele comentou sobre o lance.

“Era o último lance do jogo, tudo poderia acontecer. Foi um lance muito rápido. No momento, achei que ia tomar o gol, porque estava muito próximo. A minha felicidade é que ele não chutou muito forte. Não foi uma defesa com grau altíssimo (de dificuldade). Mas foi uma defesa importante, uma das defesas mais importantes da minha carreira. […] Só tenho que agradecer a Deus, porque veio próximo de mim, no meu raio de ação. Senão, eu não ia conseguir fazer a defesa e injustamente, na minha opinião, nosso time não ia classificar para a final. Nos dois jogos, nosso time foi muito bem e merecíamos a classificação”.Danilo, goleiro da Chape, em entrevista ao Seleção SporTV, 24 de novembro de 2016.

 

A façanha da equipe ganhou as manchetes do continente. E de todo Brasil. Era a confirmação de uma das mais meteóricas ascensões da história do futebol brasileiro e até mundial, algo que não víamos desde o São Caetano de 2000-2002, em história já relembrada aqui no Imortais. Da quarta divisão à elite do futebol nacional e à uma final continental em apenas seis anos era algo inacreditável. E, no Campeonato Brasileiro daquele ano, a Chape ainda fazia sua melhor campanha da história após atingir 52 pontos ao término da 36ª rodada depois de engatar a terceira vitória seguida vencendo o São Paulo por 2 a 0, em casa. Curiosamente, foi contra o tricolor que a Chape fez o jogo com maior público daquele campeonato: 54.996 pessoas foram ao Morumbi ver o empate em 2 a 2 entre paulistas e catarinenses.

O Verdão do Oeste realmente fazia uma temporada impressionante, jogando sem medo em qualquer lugar e com um time muito entrosado, que podia atuar com três atacantes ou com Bruno Rangel isolado na frente. Mesmo com o artilheiro longe da boa fase do início do ano – embora ele tenha sido um dos três jogadores que marcaram três gols em um só jogo naquele Brasileirão, nos 4 a 3 sobre o Coritiba – , o time não dependia apenas dele e contava com vários talismãs como Ananias, Lucas Gomes, Kempes, o habilidoso lateral Dener, além de Cléber Santana e Gil, soberanos no meio de campo.

A Chape ia bem não só na Sul-Americana, mas também no Brasileiro. Foto: Cleberson Silva / Divulgação Chapecoense.

 

 

Após a classificação sobre o San Lorenzo, a Chape não teve descanso e já entrou em campo novamente no domingo, dia 27 de novembro, contra o Palmeiras, que tinha a chance de ser campeão por antecipação caso vencesse ou empatasse com os catarinenses. Já visando o primeiro duelo da final da Sul-Americana, Caio Júnior levou a campo um time misto que acabou perdendo por 1 a 0 para o Verdão, resultado que deu o título ao time paulista. Diante da festa verde no Allianz Parque, a Chapecoense já vislumbrava uma sua dali alguns dias em Curitiba, no Couto Pereira, estádio da finalíssima da Sul-Americana, pelo fato de a Arena Condá não comportar o número mínimo de 40 mil torcedores exigido pela Conmebol em finais continentais.

Antes, no entanto, a equipe teria que encarar o desafio da ida: o Atlético Nacional-COL, campeão da Copa Libertadores daquele ano e buscando as duas principais taças continentais da temporada para sua galeria. Outra vez a Chape teria uma longa viagem até a Colômbia. Será que a diretoria do clube iria contratar outra empresa de fretamento? Será que eles iriam em um voo comercial tradicional? Não. O mesmo roteiro de um mês antes foi traçado. A mesma LaMia. O mesmo avião. Um erro que seria fatal.

 

A tragédia

O fatídico avião…

 

 

A delegação da Chapecoense iria fazer um voo direto de Guarulhos até Medellín, no dia 28 de novembro, mas este foi vetado pela ANAC com base no Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Chicago, pelo fato de apenas uma companhia aérea brasileira ou colombiana poder realizar a viagem – a LaMia era boliviana. Com isso, a equipe brasileira teve que fazer a viagem em duas etapas. A primeira foi em voo comercial de Guarulhos até Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. E, de lá, eles pegaram o avião da LaMia em direção a Medellín. E foi lá que começaram as displicências e as falhas que iriam causar uma das maiores tragédias da história do esporte. 

O famigerado avião da LaMia teria que fazer um pouso em Cobija, abastecer e seguir para Medellín, totalizando 2826 km. Mas o piloto preferiu ir direto, num trajeto de 3006 km para economizar combustível, indo no limite da aeronave. Ele dizia que aterrissar no aeroporto de Cobija de noite era arriscado pelo fato de o local não ter iluminação. Ele também poderia pousar em Bogotá (trajeto de pouco mais de 2700 km), mas não o fez. Aquela manobra absurda foi aprovada por alguém que viu o plano de voo e fez vista grossa.

Era apenas mais um despreparo de uma empresa que há tempos ignorava protocolos de segurança básica da aviação conforme um relatório da Aeronáutica Civil da Colômbia revelado em abril de 2018. A empresa corria riscos de ficar desabastecida em pleno ar por causa das economias de combustível e despreparo de seus comissários e pilotos. A LaMia pulava escalas e alterava destinos para ganhar tempo e poupar combustível. Leia mais em matéria do jornal Zero Hora clicando aqui.

E, na noite do dia 28 de novembro de 2016 – madrugada do dia 29 de novembro, no horário de Brasília – toda aquela quantidade de erros e displicência causaram o que há muito tempo era previsto: um acidente. Quarenta minutos (isso mesmo, 40 minutos) antes da hora fatal, luzes vermelhas se acenderam no avião e alertas sonoros foram emitidos na cabine. A tripulação, ao invés de checar o ocorrido e descobrir a causa daquilo, nada fez. A falta de combustível era iminente. O peso mínimo de combustível que o avião deveria ter decolado era 11.603 quilos. A aeronave da LaMia decolou com 9.300 quilos… O piloto só iniciou o contato com a torre quando a situação já estava fora de controle. Pedindo urgência para aterrissagem, a controladora informou que outros aviões estavam na frente dele e que seria necessário um deslocamento para a direita. Veja o diálogo, extraído após divulgação da gravação:

 

Miguel Quiroga, piloto do avião da Chapecoense: “O voo LaMia CP2933 em aproximação. Solicitamos prioridade para a aproximação, pois enfrentamos um problema de combustível”.

Yaneth Molina, controladora de tráfego: “Entendo. Solicita prioridade para sua aterrissagem por problema de combustível. Correto?”

Piloto: “Afirmativo”.

Controladora: “Ok. De acordo. Lhe darei instruções para efetuar a aproximação. Em aproximadamente sete minutos iniciarei a confirmação”.

Controladora: “Tenho uma aeronave abaixo de você, efetuando a aproximação, além de sermos afetados por uma revisão de pista. Quanto tempo tem para permanecer em sua aproximação, LaMia?”

Piloto: “Com emergência de combustível, senhorita. Por isso lhe peço de uma vez um trajeto final”.

Controladora, para outro avião: “Avianca 9356… Inicie a aproximação agora”.

Outro avião: “Iniciando a aproximação agora”.

Piloto: “Solicito descida imediata”.

Controladora: “LaMia 2933, você pode efetuar um desvio à direita para iniciar uma descida? Há tráfego 1 milha abaixo de você”.

Piloto: “Solicitamos nos incorporar de uma vez a outro vetor”.

Controladora: “Tem trânsito a sua frente, a 18.000 pés”.

Controladora: “Atentos, LaMia 2933. Continue a aproximação. Pista úmida. Precisa de alguma assistência na pista?”.

Piloto: “Lhe confirmaremos a assistência em pista”.

Piloto: “Senhorita, LaMia 2933 está em falha total, sem combustível”.

Controladora: “Está livre e esperando chuva sobre… Bombeiros estão alertas”.

Piloto: “Vetores, senhora! Vetores!”.

Controladora: “O sinal do radar se perdeu. Não tenho você. Notifique o rumo agora”.

Piloto: “Rumo 3,6,0. Rumo 3,6,0”.

Controladora: “Você está a 8,2 milhas da pista”.

Piloto: “Jesus!”.

Controladora: “Você disse o que agora?”.

(Vozes masculinas na torre de controle): “Não responde”. “Não”. “Já caiu. Já caiu”.

Controladora: “Qual sua altitude agora?”

Fim do contato.

 

 

Infografia: Estado de Minas.

 

 

Às 21h58 (hora da Colômbia, 2h58, hora de Brasília), o avião que levava 77 pessoas, sendo 22 jogadores, 14 pessoas da comissão técnica, 9 dirigentes, 21 jornalistas, 2 convidados e 9 tripulantes caiu no Cerro Gordo, em La Unión. A Força Aérea Colombiana dispôs rapidamente de helicópteros para localizar a aeronave, mas o resgate inicial foi prejudicado por causa da visibilidade precária causada pela chuva que caiu na região naquela noite, além de ser difícil o acesso por ser um local montanhoso. Já no local, as equipes de resgate perceberam o tamanho da tragédia. Mas luzes de esperança começaram a surgir. Na verdade, seis. Eram as seis pessoas que sobreviveram. A comissária Ximena Suárez, os jogadores Alan Ruschel, Neto e Jakson Follmann, o jornalista Rafael Henzel e o técnico de voo Erwin Tumiri.

Os destroços do avião. Foto: Luis Benavides / AP.

 

 

As horas foram passando e a tragédia repercutiu em todo o mundo. A comoção foi geral. Há décadas que um acidente daquelas proporções não acontecia no meio esportivo. E, da maneira como aconteceu, chocou a todos. Um time de jovens, em franca ascensão, prestes a conquistar um título épico e histórico, teve seu fim abrupto por conta de erros e falhas que poderiam ser evitadas. Uma lástima, uma tristeza que despedaçou o coração de milhões de pessoas, que mobilizou os governos da Colômbia e do Brasil no resgate dos corpos, e elevou a solidariedade a níveis extremos. Todos os tocados e comovidos prestaram homenagens, seja na América do Sul, seja na Europa, na África, Ásia, Oceania. O mundo do futebol abraçou a Chapecoense. O “Força Chape” e “Vamos Chape” viraram mantras.

Funerárias de Medellín ajudaram na preparação dos corpos para o envio ao Brasil e demais países. Foto: Jaime Saldarriaga / Reuters.

 

 

Quatro funerárias de Medellín prepararam os corpos durante quase dois dias para que eles pudessem ser levados devidamente aos seus respectivos países. Aviões da Força Aérea Brasileira e outros particulares trouxeram os corpos para o Brasil, em trajeto iniciado no dia 02 de dezembro. No dia 03 de dezembro, em um dia de chuva, com céu cinza e uma tristeza sem igual, a Arena Condá recebeu 50 das 71 vítimas da tragédia em um velório coletivo. Nas arquibancadas, familiares, torcedores, amigos, dirigentes e até o presidente da FIFA estiveram presentes para o último adeus às pessoas que tanto lhe fizeram bem e tanta alegria levaram. O mais impressionante é que durante toda a cerimônia a chuva não cessou. Parecia uma resposta dos céus àquele fim tão repentino, tão brusco. Foi um dos momentos mais emocionantes e tristes de toda a história do futebol. Cenas que jamais sairão da memória de quem acompanhou toda aquela trajetória da equipe de Chapecó. 

Como não poderia deixar de ser, a final da Copa Sul-Americana foi cancelada. E, num gesto de profunda solidariedade, o Atlético Nacional enviou um comunicado à Conmebol para que ela entregasse o troféu de campeão à Chapecoense. Veja a nota:

Por estarmos muito preocupados com a parte humana, pensamos no aspecto competitivo e queremos publicar este comunicado onde o Atlético Nacional pede à CONMEBOL que o título da Copa Sul-Americana seja entregue ao Chapecoense como homenagem à sua grande perda e em homenagem póstuma às vítimas do acidente fatal que deixou o esporte em luto. De nossa parte, e para sempre, Chapecoense: Campeão da Copa Sul-Americana de 2016”

A vigília no estádio do Nacional foi algo impressionante e reuniu mais de 100 mil pessoas, que se dividiram do lado de dentro do estádio e também nas ruas em volta do local. Foto: Luis Acosta / AFP.

 

 

O pedido foi atendido prontamente pela entidade, que oficializou a Chapecoense como campeã da Copa Sul-Americana de 2016. Mais do que isso, o clube colombiano lotou seu estádio no dia 30 de novembro em uma homenagem simplesmente estonteante, algo impressionante e comovente, em uma gigantesca vigília exatamente no dia em que a primeira partida da final deveria acontecer. Outro gesto muito bonito foi realizado pelo canal Fox Sports, que permaneceu em silêncio no horário em que seria transmitida a partida com uma tela preta durante os 90 minutos e a hashtag #90minutosdesilencio.

No dia 07 de dezembro, data em que seria disputada a segunda partida, milhares de torcedores do Athletico-PR, do Coritiba, do Paraná e de outros clubes lotaram o Couto Pereira e fizeram outra homenagem marcante à Chape e aos jogadores. Na mesma noite, aconteceu a segunda partida da final da Copa do Brasil entre Atlético-MG e Grêmio, em Porto Alegre. E um minuto de silêncio foi respeitado em homenagem à equipe catarinense. A sincronia entre aquelas pessoas em Curitiba e em Porto Alegre foi algo único. E foi provavelmente a única vez em toda a história que um minuto de silêncio foi realmente respeitado por uma multidão em um estádio. Não existem palavras para dizer o que foi tudo aquilo. Só vendo e sentindo.

Torcidas unidas no Couto Pereira. Foto: GERALDO BUBNIAK/AGB/ESTADÃO CONTEÚDO.

 

 
Foto: Daniel Isaia / Agência Brasil.

 

 
Militares carregam os caixões no velório realizado na Arena Condá. Foto: AFP.

 

 

Toda a rodada final do Campeonato Brasileiro foi adiada por causa do acidente. Personalidades do mundo esportivo prestaram homenagens, clubes vestiram uniformes personalizados, minutos e mais minutos de silêncio foram realizados e monumentos iluminados com a cor verde no Brasil e em várias cidades do mundo. Medellín e Chapecó assinaram um decreto em que se transformaram em cidades-irmãs, o Cerro Gordo passou a ser chamado Cerro Chapecoense e partidas amistosas foram realizadas em homenagem ao clube. Nunca o futebol havia sido tomado por tantos gestos, tanta solidariedade de uma vez só como naqueles dias de novembro e dezembro de 2016. Momentos e imagens que reforçam o quanto a união é sempre mais importante e fundamental do que a intolerância, o separatismo e o individualismo.

 

A reconstrução

Presidente da Chapecoense recebe o troféu da Copa Sul-Americana. Foto: Jorge Adorno / REUTERS.

 

 

Em 2017, a Chapecoense teve que recomeçar sua história. Diante da tragédia, cogitou-se até a dar ao clube imunidade quanto a um possível rebaixamento no Campeonato Brasileiro, mas isso foi negado pelo presidente do clube, Plínio David De Nes Filho, que queria construir uma nova Chape com as próprias forças do clube. Várias equipes ofereceram jogadores para essa reconstrução, mas tais ajudas ficaram mais na falação do que na ação propriamente dita. A equipe contratou 15 reforços, alguns vindos por empréstimo, além do técnico Vagner Mancini.

Chape disputou amistoso com o Palmeiras, seu último adversário antes do acidente, em janeiro de 2017.

 

 

O time disputou a Copa Libertadores e fez uma boa fase de grupos, mas um erro na escalação de um jogador irregular causou a perda de pontos e eliminação do time. No Campeonato Catarinense, a Chape foi bicampeã, e ainda disputou o tradicional Troféu Joan Gamper, contra o Barcelona, que marcou a volta de Alan Ruschel aos gramados. O Verdão do Oeste disputou também a Copa Suruga (derrota por 1 a 0 para o Urawa Red Diamonds-JAP) e a Recopa Sul-Americana, esta contra o Atlético Nacional. Na ida, a Chape venceu por 2 a 1, em jogo repleto de homenagens. Na volta, no estádio Atanasio Girardot, o mesmo que deveria ter recebido o time lá em 2016, mais homenagens e vitória dos colombianos por 4 a 1, resultado que deu o título ao alviverde de Medellín.

Follmann, Neto e Ruschel, sobreviventes do voo, são homenageados antes do amistoso contra o Barcelona, em 2017.

 

 
Acima, o trio com a taça da Sul-Americana.

 

 
O manto da Chape em 2017, com estrela acima do escudo e emblema de campeã da Sul-Americana.

 

 

Mas o grande feito da equipe catarinense em 2017 foi mesmo no Campeonato Brasileiro. Mesmo com 38 longas rodadas, adversários complicados e sem o benefício da imunidade, a Chape não só permaneceu na Série A como garantiu uma vaga na Copa Libertadores de 2018 ao terminar na 8ª colocação. Foi a melhor posição do clube na história do torneio nacional e um desfecho mais do que positivo para um ano marcado pelo luto, pelas incertezas e pela solidariedade.

Foto: Rafael Bressan / Divulgação Chapecoense.

 

 

Desde então, a Chapecoense segue em busca de um novo time para conseguir alcançar as façanhas que o esquadrão de 2016 conseguiu. O caminho é árduo, mas a esperança é verde, segue viva e intacta como os feitos dos jogadores que elevaram a Chape a um patamar único no futebol. E que brilham nos céus em uma nova constelação de luz verde que há três anos ilumina as noites de Chapecó e Medellín.

 

 

Os personagens:

Danilo: será para sempre lembrado pelo torcedor como o herói da classificação à final da Sul-Americana, pegando quatro pênaltis contra o Independiente, nas quartas de final, e também pela defesa no último minuto da partida contra o San Lorenzo, na semi. Com bom posicionamento e reflexos apurados, vivia a melhor fase da carreira. Chegou à Chapecoense em 2013 e não saiu mais da meta alviverde. Foram 152 jogos oficiais em três anos. Danilo foi eleito o melhor goleiro do Campeonato Catarinense e da Copa Sul-Americana de 2016. Tinha 31 anos.

Nivaldo: o experiente goleiro jogou dez anos pela Chapecoense e foi titular em alguns jogos na temporada de 2016. Foram 299 partidas pelo Verdão do Oeste. Acabou de fora da viagem à Colômbia por questões logísticas. Após a tragédia, anunciou a aposentadoria e virou gerente de futebol do clube.

Follmann: era goleiro reserva e foi um dos sobreviventes do acidente. Perdeu parte da perna direita, que foi amputada, impedindo-o de prosseguir com a carreira, encerrada precocemente aos 24 anos de idade. Follmann virou embaixador da Chapecoense e comentarista esportivo.

Gimenez: um dos jogadores mais jovens do elenco da Chapecoense, Gimenez ainda estava no início da carreira, mas já tinha bastante moral com o técnico Caio Júnior e era bastante aproveitado. O lateral-direito disputou 51 partidas com a camisa da Chape em 2016. Versátil, atuava como lateral-direito e volante. Tinha apenas 21 anos.

Mateus Caramelo: o lateral-direito estava emprestado ao clube catarinense e não teve uma grande sequência de jogos por causa da boa fase de Gimenez. Mesmo assim, a Chape estudava prorrogar seu vínculo. Tinha 22 anos.

Thiego: experiente, o zagueiro Willian Thiego era um dos pilares defensivos da Chapecoense, mas também teve seu brilho no ataque. Virou o zagueiro-artilheiro do time graças as suas aparições na grande área, principalmente em jogadas de escanteio e bola parada. Desde 2015 no clube, marcou nove gols em 84 jogos disputados com a camisa do Verdão do Oeste, sendo oito somente em 2016. Tinha 30 anos.

Neto: o zagueiro de 1,97m de altura chegou em 2015 ao clube e assumiu a titularidade graças a sua regularidade e presença de área. Formou uma grande dupla ao lado de Thiego tanto na campanha do Brasileirão quanto na Sul-Americana de 2016. Foi um dos sobreviventes do voo mesmo após sofrer um traumatismo cranioencefálico, lesões na quinta vértebra lombar e no joelho direito e uma pneumonia. Ele não teve danos neurológicos e deixou o hospital após 24 dias. O jogador ainda passou por várias cirurgias e espera retornar ao esporte para pelo menos encerrar a carreira jogando, embora seja difícil por conta das lesões que sofreu.

Rafael Lima: zagueiro com mais de 200 jogos pela Chape, jogou de 2012 até 2016 na equipe e foi um dos principais nomes do setor defensivo do time principalmente nas campanhas de 2015 e no título catarinense de 2016. Após a taça estadual, não renovou contrato com o clube e foi jogar no América-MG.

Dener: o habilidoso lateral-esquerdo começou como uma promessa do Grêmio. Nascido em Bagé, no interior do Rio Grande do Sul, chegou ao tricolor gaúcho em 2009 e teve poucas oportunidades para mostrar seu futebol. Acabou emprestado ao Guarany de Bagé e depois Veranópolis, Vitória e Caxias, onde acabou comprado em 2012. Novamente sem espaço, assinou com o Ituano em 2014. Com o clube paulista, conquistou o histórico Campeonato Paulista de 2014 com o time titular. A visibilidade foi tanta que acertou com o Coritiba para o segundo semestre. Na temporada seguinte, viajou para Santa Catarina para defender a Chapecoense, onde foi campeão do Campeonato Catarinense em 2016 e vinha de grandes jogos no Brasileirão e na Sul-Americana. Tinha 25 anos.

Alan Ruschel: o lateral-esquerdo não teve muitas chances no time titular por causa da concorrência com Dener e ocupava mais o banco de reservas da equipe catarinense. Foi um dos sobreviventes do voo e ficou na Chape até 2019, quando deixou a equipe para jogar no Goiás, por empréstimo.

Gil: nascido em Santo Antônio (RN), era um dos principais nomes do meio de campo da Chape. Baixinho e com habilidade no pé direito, construía jogadas e também auxiliava na marcação. Disputou quase 100 jogos pela Chape entre 2015 e 2016. Tinha 29 anos

Josimar: o volante era um dos nomes mais experientes do elenco e também um dos líderes. Revelado pelo Internacional, passou pelo Brasil de Pelotas, Fortaleza e Al-Watani, da Arábia Saudita, retornando ao Inter em 2010 para conquistar os Campeonatos Gaúchos de 2012 e 2013. Chegou à Chape em 2016 e foi titular em boa parte dos jogos da temporada, demonstrando muita disposição, boa presença de ataque e força na marcação. Tinha 30 anos.

Matheus Biteco: um dos caçulas do elenco, o volante Matheus Biteco ainda buscava seu espaço, mas vinha em uma boa sequência de jogos na Chape. Assim como os irmãos, Guilherme e Gabriel, começou a carreira na base gremista. Foi promovido ao time profissional em 2013 e ficou lá até 2015, com uma passagem pelo Barra-SC no meio do caminho. Foi contratado por empréstimo pela Chape em 2016. Tinha 21 anos. 

Cléber Santana: um dos jogadores mais vitoriosos e experientes do grupo. Cléber Santana Loureiro começou a carreira no Sport, ainda na base, em 1999. Nascido na cidade de Abreu e Lima, em Pernambuco, ganhou uma oportunidade no time principal e conquistou um bicampeonato pernambucano (2000 e 2003), a Copa do Nordeste em 2000 e a Copa Pernambuco em 2003. De lá, viajou para Salvador e defendeu o Vitória, onde conquistou o Campeonato Baiano de 2004. Mais tarde, faturou o bicampeonato paulista com o Santos em 2006 e 2007. Com um currículo invejável, o meia assinou com o Atlético de Madrid, pelo qual conquistou a Liga Europa de 2009-2010, embora não tenha sido titular. Depois de passar por vários clubes em sua volta ao Brasil, assinou com a Chapecoense em 2015 e rapidamente virou titular do time, assumindo a braçadeira de capitão. Foi campeão catarinense de 2016 e um dos destaques das campanhas no Brasileiro e da Sul-Americana do mesmo ano. Tinha 35 anos.

Ananias: maranhense, o atacante ganhou destaque com a camisa do Sport e, por causa da habilidade, ganhou o apelido de ‘Ananiesta’, em alusão ao eterno craque do Barcelona, Iniesta. Ananias marcou também o primeiro gol da história do Allianz Parque, no dia 19 de novembro de 2014, quando defendia o Sport. Pela Chapecoense, o meia e atacante foi um dos principais nomes do setor ofensivo e cresceu ainda mais de produção com o técnico Caio Júnior. Na Sul-Americana, marcou o gol do empate em 1 a 1 com o San Lorenzo, na semifinal. Foi também campeão Catarinense em 2016. Tinha 27 anos.

Lucas Gomes: começou a carreira no Bragantino-PA, time de sua cidade, e passou por diversos clubes até chegar à Chapecoense no início de 2016. Foi uma opção ofensiva importante para o time. Em 55 jogos, marcou oito gols. Tinha 26 anos.

Tiaguinho: outro nome entre os mais jovens do elenco, o atacante foi contratado pela Chapecoense em 2016 após fazer um bom Campeonato Catarinense pelo Metropolitano. Não foi titular absoluto, mas quando entrou, desempenhou bem seu papel no esquema tático do técnico Caio Júnior. Tinha 22 anos.

Hyoran: o jovem chegou à Chapecoense em 2013 e foi um dos destaques na temporada de 2016 atuando em 23 jogos e marcando dois gols. Por causa de lesões, acabou de fora de muitas partidas e foi vendido ao Palmeiras antes do acidente. 

Maranhão: atuava como meia e também atacante e teve participação na campanha do título catarinense de 2016. Deixou o clube logo após o torneio para jogar no Fluminense.

Bruno Rangel: o atacante é até hoje o maior artilheiro da história da Chapecoense com 81 gols marcados em 169 jogos. Com 1,81m e muita velocidade, Foi jogador da Chapecoense pela primeira vez em 2013, quando sagrou-se artilheiro da Série B com incríveis 31 gols. Defendeu o Al-Arabi do Catar por uma temporada, mas logo voltou para Chapecó em 2014, onde foi campeão e artilheiro do Catarinense de 2016 com 10 gols. Muito querido pela torcida, era conhecido como “Power Rangel”. Tinha 34 anos.

Kempes: o atacante já era experiente e com passagens por vários clubes, mas vivia um dos melhores momentos da carreira, com boas atuações e 16 gols marcados na temporada. Era, sem dúvida, peça fundamental da equipe de Caio Júnior, onde se revezava na equipe titular com Bruno Rangel. Estava no elenco do Verdão na conquista do Catarinense. Tinha 34 anos.

Guto Ferreira e Caio Júnior (Técnicos): Guto teve papel fundamental na montagem do time que iria surpreender o futebol em 2016. Com ele, a Chape quase eliminou o River Plate da Sul-Americana de 2015 e foi campeã catarinense de 2016. Ele acabou deixando o clube no meio do ano, mas a chegada de Caio Júnior não atrapalhou em nada o rumo da equipe. Luiz Carlos Saroli nasceu no dia 8 de março de 1965. Em 2016, vivia uma das melhores fases de sua carreira. Como treinador, teve passagens pelo Paraná Clube, Bahia, Flamengo, Grêmio, Criciúma, Vitória e Goiás. No exterior, passou por Vissel Kobe, do Japão, Al Jazira, dos Emirados Árabes, e Al-Gharafa, do Catar. O treinador assumiu o time da Chapecoense em junho de 2016 e teve o grupo na mão, extraindo ao máximo o que de melhor os jogadores tinham, além de sempre buscar o resultado tanto em casa quanto fora. Caio Júnior tinha 51 anos. 

Parte das informações sobre os jogadores foram concedidas e pesquisadas por André Bernardo. Obrigado, André! 🙂

Leia abaixo um emocionante texto do jornalista Fábio de Amorim e publicado no Blog do Juca Kfouri sobre como seriam os dois jogos da final entre Chapecoense e Atlético Nacional. Original neste link.

 

POR FÁBIO DE AMORIM, jornalista

Começou assim. 

Girardot lotado e gritando verdemente pelo Nacional. Meia dúzia de brasileiros torcia humildemente. Apito. E pernas corriam, pés tabelavam, bola passeava feliz de pé em pé, coxa, peito, cabeça. Danilo sorriu ao ver a bola piscar para o travessão aos três minutos de jogo. Não havia tempo para jogo brusco. Nem faltas pesadas ou violência gratuita (muito menos aquela à prazo). Só havia tempo para a bola e seus voos sem asa, seus pombos-mensageiros. Danilo fez três defesas milagrosas em dez minutos. Borja, duas vezes: uma de cabeça, no canto baixo (Danilo tirou com a unha que ele esqueceu de cortar no dia anterior), outra num chute de fora da área que tinha endereço no famoso ninho da coruja, agradecida ao goleiro da Chape por não perder sua casa.

O terceiro lance foi de coragem. Danilo saiu impetuosamente pra tirar a bola dos pés de Berrío, depois de uma enfiada magistral de Torres. O meia colombiano ainda bateu uma falta aos 30 minutos que abraçou a trave esquerda, depois de resvalar na perna do zagueiro Marcelo. Caio Júnior estava preocupado. O time tinha de avançar as linhas. Então mandou Cléber Santana puxar o coro. Aí, aos 32, Gimenez avançou em contra-ataque. Lançou Tiaguinho, que não alcançou a bola e enganou, mas enganou sem querer, o zagueiro Bocanegra.

Na sequência, Bruno Rangel apareceu sozinho e chutou pro gol. Inapelável. 1×0 Chapecoense. A meia dúzia de brasileiros foi ouvida. O jogo ficou mais intenso, mais honesto e bonito. Cinco finalizações certas do Atlético Nacional. Duas da Chape. Respirar era para os fracos. Via-se o Deva, da cabine de imprensa, sorrir sem parar. Mário Sérgio comentava a loucura ofensiva dos dois times, Victorino contava, ali do gramado, que os treinadores pararam de dar orientações e apenas curtiam, à Klopp, o jogo.

Os dois goleiros impediam mais gols. O Nacional era mais forte e perigoso. A Chape era guerreira e veloz. No último minuto, a sorte. Ou falta dela. Alan escorregou na parte do gramado que estava mais úmida por causa da chuva de horas antes. Torres se aproveitou e passou. Invadiu a área e tocou por cima de Danilo. 1×1. Intervalo.

Segundo tempo. Biteco fazia partida monumental e tinha roubado a milésima bola. Sérgio Manoel, tático e técnico, olhava para frente. Santana lançava Tiaguinho, que virava para o Gimenez. O lateral cruzou, Bocanegra cortou mais uma. Na sobra, Tiaguinho lembrou que seria pai e seus pés sorriram de emoção. O chute saiu curvo, bateu no travessão, desalojou a coruja verde colombiana: 1×2 Chape.

Durante os 25 minutos restantes os torcedores (que não paravam de animar) viram entrega, lances incríveis, linhas avançadas, transições, inversões de jogo, trocas de posições, defesas, chutes errados, perdas de bola na defesa. Viram futebol. Viram arte. Vida em ação. Aos 38, Borja recebeu de Uribe. Devolveu para Torres. O meia olhou pra um lado e tocou no outro de novo para Borja. 2×2 Atlético Nacional. O jogo seguiu efervescente até o final. Danilo ainda viu a trave paquerar a bola mais duas vezes. Em outro lance, aos 48, ele salvou sem querer, numa cabeçada de Ibargüen, que tinha entrado 10 minutos antes. Fim de jogo. 2×2.

A volta, no Paraná, seguiu o mesmo roteiro dramático, mas com menos bola e mais tensão. 1×1. Gols de Arias e Tiaguinho. Um em cada tempo. A decisão foi para os pênaltis. As quatro primeiras cobranças foram perfeitas dos dois lados. Na última, Alan bateu e perdeu. Bonilla acertou o canto. Alan chorou. A torcida gritou o nome dele. Danilo gritou do outro lado:

– Eu vou pegar, Alan, eu vou pegar, irmão! 

Borja, decisivo, ajeitou a cobrança. Silêncio no estádio. Danilo fechou os olhos e respirou profundamente. Abriu os olhos e viu Borja correr pro chute. O atacante colombiano chutou e… Danilo ia para o canto direito. A bola foi pro meio. Danilo conseguiu levantar a perna e tocar na bola, que bateu no travessão e não entrou. Êxtase. Nesse instante, no entanto, quando todos estavam felizes ou incrédulos, quando tudo era sorrisos, a luz apagou. O estádio ficou no breu. Segundos depois, as luzes voltaram. Os jogadores da Chapecoense se abraçaram em tom de despedida. Neto olhou para Gil e lhe deu um abraço. Ananias se despediu de Alan. Follmann e Danilo caminharam juntos, com o primeiro chorando.

As milhares de pessoas no estádio aplaudiam e cantavam o nome de todos. A torcida colombiana aplaudiu também e chorava junto. Alan, Follmann e Neto ficaram, ao lado do jornalista Henzel. Eles viram seus companheiros de bola e de imprensa indo em direção ao vestiário, que tinha uma luz incomum, verde-claro. Os jornalistas esperavam o time ali, microfones prontos para as entrevistas que ninguém ouviria. Todos foram embora pegar um voo. Eles precisavam ir.

O jogo terminou. Todos os jogadores do Atlético Nacional aplaudiam os rivais que foram e os que ficaram. A luz do vestiário apagou após a passagem do último jogador: Danilo, que olhou para a torcida, para os três companheiros que ficaram e disse: 

– Agarrei nosso sonho, Alan, eu te falei. Defendi. E agora? Não sei. Ninguém sabe. 

E esta foi a epopeia da Chapecoense. 

 

As vítimas do voo:

Jogadores: Ailton Cesar Junior Alves da Silva (Canela), Ananias Elói Castro Monteiro, Arthur Brasiliano Maia, Bruno Rangel, Cléber Santana, Danilo Padilha, Dener Assunção Braz, Everton Kempes dos Santos Gonçalves, Filipe José Machado, Guilherme Gimenez de Souza, José Gildeixon Clemente de Paiva (Gil), Josimar Rosado da Silva Tavares, Lucas Gomes da Silva, Marcelo Augusto Mathias da Silva, Mateus Lucena dos Santos (Mateus Caramelo), Matheus Bitencourt da Silva (Matheus Biteco), Sergio Manoel Barbosa Santos, Tiago da Rocha (Tiaguinho), Willian Thiego de Jesus. 

Comissão técnica: Adriano Bitencourt, Anderson Donizette Lucas, Anderson Martins, Anderson Paixão, Cleberson Fernando da Silva, Eduardo de Castro Filho, Eduardo Preuss, Gilberto Thomaz, Luiz Carlos Saroli (Caio Júnior), Luiz Cunha, Luiz Felipe Grohs (Pipe Grohs), Marcio Koury, Rafael Gobbato, Sérgio de Jesus.

Dirigentes e convidados: Daví Barela Dávi, Decio Filho, Delfim de Pádua Peixoto Filho, Edir De Marco, Emersson Domenico, Jandir Bordignon, Mauro Bello, Mauro Stumpf, Nilson Folle Jr., Ricardo Porto, Sandro Pallaoro.

Profissionais de imprensa: André Podiacki (repórter, jornal Diário Catarinense), Ari de Araújo Jr. (repórter cinematográfico, Rede Globo), Bruno Mauri da Silva (técnico, RBS TV), Devair Paschoalon (Deva Pascovicci) (narrador, Fox Sports), Djalma Araújo Neto (cinegrafista, RBS TV), Douglas Dorneles (repórter esportivo, Rádio Chapecó), Edson Ebeliny (repórter esportivo, Rádio Super Condá), Fernando Doesse Schardong (narrador, Rádio Chapecó), Gelson Galiotto (narrador, Rádio Super Condá), Giovane Klein Victória (repórter, RBS TV), Guilherme Marques (repórter, Rede Globo), Guilherme van der Laars (produtor, Rede Globo), Jacir Biavatti (comentarista, RICTV, Rádio Vang FM e Rádio Momento FM), Laion Espíndola (repórter, Rede Globo), Lilacio Pereira Jr. (coordenador de transmissões externas, Fox Sports), Mário Sérgio Pontes de Paiva (comentarista, Fox Sports), Paulo Júlio Clement (jornalista, Fox Sports), Renan Agnolin (repórter, RICTV e rádio Oeste Capital), Rodrigo Santana Gonçalves (repórter cinematográfico, Fox Sports), Victorino Chermont (repórter, Fox Sports).

Tripulação: Alex Quispe, Angel Lugo, Gustavo Encina, Miguel Quiroga (piloto da aeronave), Ovar Goytia, Romel Vacaflores (assistente de voo), Sisy Arias.

😢

 

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Comentários encerrados

8 Comentários

  1. Parabéns de novo pelo trabalho, Imortais. Lindo pela história e horrível pela imprudência que poderia ter sido evitada. Não foi a primeira tragédia da história do futebol e duvido que seja a última.

    Também quero fazer citação ao Atlético Nacional. O time colombiano fez uma homenagem emocionante lá no Estádio Atanasio Girardot. Por falar nisso, o mesmo Atlético Nacional, além de receber honras e vários agradecimentos, ganhou a Libertadores naquele ano. Acho que podia virar outro Esquadrão Imortal. Que tal, Imortais

  2. Texto simplesmente sensacional. E se completou recentemente três anos desse acidente.

    Aliás, acidente coisa nenhuma. Detalhes neste texto e num vídeo do Aviões e Música, do Lito Sousa, mostram que o aconteceu não foi um acidente, nem uma fatalidade. Foi um crime.

  3. Chorei novamente lendo esse texto. Impossível não se emocionar com esse momento tão doloroso pra história do futebol. A Chape já era um time admirado, simpático, querido, desde quando estreiou na Série A, aprontou contra os gigantes e foi permanecendo. Um trabalho exemplar. Talvez eles fossem tão bons que Deus resolveu convocá-los para algo superior. Difícil de entender…

Time dos Sonhos do Internacional

Esquadrão Imortal – Newell´s Old Boys 1987-1992