Por Guilherme Diniz
Reunir grandes seleções em um só torneio que não seja a Copa do Mundo sempre foi uma missão quase impossível. E, durante anos, uma competição agrupou os campeões de cada continente na busca do troféu de “campeão dos campeões”. Com 10 edições, a Copa das Confederações até tentou, mas nunca conseguiu atrair o mesmo público que acompanha torneios como Eurocopa, UCL e Libertadores. Com as duas primeiras edições em caráter quase amistoso, a Copa das Confederações ganhou um pouco mais de prestígio quando a FIFA assumiu sua organização, em 1997. Ao longo dos anos, tivemos grandes campeões e alguns jogaços, mas o torneio nunca conseguiu cravar seu espaço por quase nunca ter as equipes com suas forças máximas – além de muitas desistências – e acabou descontinuado após a edição de 2017. É hora de relembrar.
Os primórdios
A primeira ideia de um torneio de seleções que reunisse campeões continentais surgiu na década de 1980, quando foi realizada em 1985 a Copa das Nações Europeias / Sul-Americanas, também chamada de Copa Artemio Franchi, em homenagem ao ex-presidente da UEFA falecido em um acidente de avião em 1983. As confederações da Europa e da América do Sul organizaram em conjunto o torneio e a ideia era realizar o torneio a cada quatro anos, sempre com os campeões continentais das respectivas confederações. A edição de 1985 teve a França, campeã da Eurocopa de 1984, enfrentando o Uruguai, campeão da Copa América de 1983, em jogo disputado no Parque dos Príncipes, em Paris, e vencido pelos Bleus por 2 a 0 – gols de Rocheteau e José Touré.
Em 1989, a competição já foi por água abaixo após Holanda e Uruguai não chegarem a um acordo para a partida final. Só em 1993 que o torneio voltou a ser realizado e teve a Argentina campeã após derrotar a Dinamarca por 5 a 4 nos pênaltis, após empate em 1 a 1 no tempo regulamentar, em duelo realizado em Mar del Plata (ARG). Mas, de novo, a competição seria descontinuada nos anos seguintes. No entanto, um ano antes, em 1992, o governo da Arábia Saudita decidiu organizar uma competição de seleções para promover o esporte no país e “apresentar” a Arábia ao mundo na época. Como forma de dar mais relevância a uma competição de caráter amistosa, foram convidadas apenas seleções campeãs de seus respectivos continentes.
Chamada de Copa Rei Fahd, o torneio teve a participação dos campeões da CAF (Costa do Marfim, campeã da Copa Africana de Nações de 1992), CONCACAF (EUA, campeão da Copa Ouro de 1991) e Conmebol (Argentina, campeã da Copa América de 1991), além da Arábia Saudita, por ser país-sede (A UEFA não teve representante). Embora ainda não tivesse a organização da FIFA, aquela se tornou a primeira edição da história da Copa das Confederações. O formato foi em jogos eliminatórios simples, todos em Riad. A Argentina, super favorita, derrotou a Costa do Marfim por 4 a 0 nas semifinais (dois gols de Batistuta, um de Acosta e um de Altamirano) e venceu a Arábia por 3 a 1 na decisão, com gols de Caniggia, Rodríguez e Simeone, e ficou com a taça.
Em 1995, o torneio seguiu com o nome de Copa Rei Fahd, também foi realizado na Arábia Saudita e ganhou mais peso com a entrada do campeão europeu, na época a Dinamarca, além do campeão da Ásia (Japão). Diferente da edição anterior, em 1995 as seleções foram divididas em dois grupos com três equipes cada, com os primeiros colocados de cada um se classificando para a final. Argentina e Dinamarca lideraram suas chaves e, na final, a Dinamarca conseguiu o título ao derrotar a albiceleste por 2 a 0, gols de Michael Laudrup e Rasmussen, resultado que consolidou uma era de ouro do futebol do país, iniciada lá com o título da Eurocopa de 1992.
A Era FIFA
A partir de 1997, a Copa Rei Fahd mudou de nome em definitivo para Copa das Confederações ao ser organizada pela FIFA, que viu com bons olhos a competição e uma oportunidade para novos lucros e também de uma torneio alternativo em anos sem Copa do Mundo. A competição foi mais uma vez realizada na Arábia Saudita e teve oito seleções participantes: Brasil (campeão da Copa do Mundo de 1994), Uruguai (campeão da Copa América de 1995), Arábia Saudita (país-sede e campeã da Copa da Ásia de 1996), México (campeão da Copa Ouro de 1996), África do Sul (campeã da Copa Africana de 1996), Austrália (campeã da Copa das Nações da Oceania de 1996), Emirados Árabes Unidos (vice-campeão da Copa da Ásia de 1996) e a República Tcheca, vice-campeã da Eurocopa de 1996 (a Alemanha, campeã da Euro de 1996, não quis disputar).
As oito equipes foram divididas em dois grupos com quatro, com os dois primeiros colocados se classificando para as semifinais. Favorito, o Brasil venceu sem complicações os árabes por 3 a 0, na estreia, com dois gols de Romário e um de César Sampaio. Na sequência, a equipe empatou sem gols com a Austrália e venceu o México (adversário constante e complicado do Brasil na época) por 3 a 2, gols de Romário, Denílson e Júnior Baiano. Na semifinal, a equipe enfrentou a República Tcheca de Pavel Nedved, Poborsky e Smicer, derrotada por 2 a 0, com os gols anotados pela dupla Romário e Ronaldo.
Na grande final, o Brasil reencontrou a Austrália, que tinha conseguido segurar o ímpeto brasileiro lá na primeira fase. Bem, na hora da verdade, tudo ficou bem claro: o Brasil era muito superior. Ronaldo abriu o placar logo aos 15’, após assistência de Denílson. O mesmo Ronaldo fez 2 a 0 e Romário, após cruzamento de Cafu, ampliou. No segundo tempo, Romário fez o quarto. Ronaldo, imparável, anotou o quinto. E Romário fechou a conta em uma das mais perfeitas finais da história da seleção: Brasil 6×0 Austrália. Virou três, acabou seis. Ronaldo fez três gols. Romário também. Em cinco jogos, o Brasil venceu quatro, empatou um, marcou 14 gols e sofreu dois. Aquele foi o primeiro título da seleção na história do torneio. Denílson foi eleito o melhor jogador e Romário terminou como artilheiro com sete gols. Ronaldo, com quatro tentos, foi um dos destaques e terminou a temporada como bicampeão do prêmio de Melhor Jogador do Mundo pela FIFA e também vencedor do Ballon d’Or da France Football de 1997.
Dois anos depois, a Copa das Confederações foi realizada no México e, embora estivesse planejada para o início do ano, só foi iniciada no início da temporada europeia, o que causou a desistência da França, campeã mundial de 1998, que deu lugar ao Brasil, vice-campeão mundial. Como a equipe também era campeã da Copa América de 1997, a Bolívia, vice-campeã continental, ganhou uma vaga. Quem também participou foi a Alemanha, campeã europeia de 1996 e que queria ser bem vista pela FIFA para seguir com pretensões de sediar a Copa do Mundo de 2006.
Com nomes como Evanílson, Serginho, Alex, Vampeta, Beto, Ronaldinho Gaúcho como titular, Christian e Warley, o Brasil estreou bem em seu grupo ao golear a Alemanha por 4 a 0. Na sequência, a equipe bateu os EUA (1 a 0) e a Nova Zelândia (2 a 0), garantindo uma vaga nas semifinais, quando massacrou a Arábia Saudita por 8 a 2. Na decisão, porém, os brasileiros foram derrotados pelo anfitrião México em um jogaço que terminou 4 a 3, resultado que deu à seleção mexicana seu primeiro grande título da FIFA.
Soberania francesa
A partir de 2001, a FIFA decidiu utilizar a Copa das Confederações como evento-teste para a Copa do Mundo. Com isso, a competição entre os campeões continentais seria sempre realizada um ano antes no país-sede do Mundial. Dessa maneira, Japão e Coreia do Sul, sedes da Copa do Mundo de 2002, receberam a Copa das Confederações de 2001 e, enfim, nenhuma seleção deixou de participar, embora Brasil e França, campeões da América do Sul e da Europa, respectivamente, tenham enviado equipes totalmente alternativas. Todos os campeões continentais estavam presentes, além da Coreia do Sul (país-sede) e Japão (país-sede e campeão da Copa da Ásia de 2000).
Os franceses, mesmo com um “time C”, não tiveram dificuldades na caminhada rumo ao título. Na primeira fase, goleada de 5 a 0 na Coreia do Sul, outra de 4 a 0 no México e apenas uma derrota – 1 a 0 para a Austrália. Nas semis, a equipe manteve a hegemonia diante do Brasil e venceu por 2 a 1, gols de Pirès e Desailly. Na decisão, Patrick Vieira marcou o gol da vitória por 1 a 0 sobre o Japão, em pleno Estádio de Yokohama, e garantiu o inédito título aos franceses.
A próxima edição da Copa das Confederações deveria ser, na prática, em 2005. No entanto, a FIFA ainda manteve a periodicidade bianual e decidiu organizar o torneio na França pelo fato de o país ter sido a sede da Copa do Mundo de 1998 e a edição da Copa das Confederações de 1997 não ter sido realizada lá. Isso acabou criando um problemão à entidade pelo fato de a França ser a campeã europeia da época, o país-sede e também a campeã da edição anterior. Ou seja, eles tinham “três vagas” e abriram uma extra, que deveria ser preenchida por algum país da UEFA.
A FIFA tentou a Alemanha, vice-campeã mundial em 2002, mas os germânicos declinaram. Em seguida, foi a vez da Itália (vice-campeã europeia em 2000). E a Azzurra também não aceitou. A FIFA decidiu usar seu famigerado ranking e convidou a Espanha, então segunda melhor seleção europeia na lista da entidade. E a Fúria também não quis participar. Só na quarta tentativa que a FIFA conseguiu preencher o espaço: a Turquia (terceira colocada na Copa de 2002) aceitou e decidiu mandar um time à França.
Com a bola rolando, a França cumpriu as expectativas e venceu os três jogos da fase de grupos: 1 a 0 na Colômbia, 2 a 1 no Japão e 5 a 0 na Nova Zelândia. Nas semis, os Bleus derrotaram a Turquia por 3 a 2 e avançaram à final, quando enfrentaram a seleção de Camarões, com um ótimo time na época, mas que entrou em campo abalada pela tragédia ocorrida na semifinal, contra a Colômbia.
No segundo tempo daquele jogo, aos 72’, Marc-Vivien Foé caminhava no meio de campo quando desabou subitamente. Atônitos, os atletas perceberam que o jogador não estava bem e chamaram a equipe médica. Ele sofreu várias tentativas de reanimação em campo, mas foram todas em vão. O jogador foi encaminhado ao hospital, mas sua morte, aos 28 anos, acabou confirmada minutos após o camaronês chegar ao centro médico de Lyon. Só depois que veio a constatação de que Foé sofria de cardiomiopatia hipertrófica – uma rara condição hereditária, que afeta menos de 0,2% da população mundial.
O caso chocou o mundo e, mesmo com a classificação camaronesa para a final diante da França, muitos pediram para a FIFA suspender a partida e também o torneio. Porém, o jogo acabou acontecendo, com os atletas camaroneses visivelmente emocionados e sem condições de jogo. A partida foi repleta de homenagens e muito melancólica. O jogo terminou 0 a 0 no tempo regulamentar e só foi decidido na prorrogação, no Gol de Ouro anotado por Thierry Henry para a França, que venceu por 1 a 0 e ficou com a taça.
Na premiação, uma enorme foto de Marc-Vivien Foé foi exibida pelos camaroneses. O jogador recebeu inúmeras homenagens póstumas naquele ano, incluindo camisas aposentadas por clubes que passou (o número 23 do Manchester City-ING e o número 17 do Lens-FRA), tributos no estádio do Manchester City – seu clube na época – e uma placa entre o Museu Louvre-Lens e o Stade Bollaert, em Lens.
Tempos brasileiros
A partir de 2005, a Copa das Confederações ganhou a regularidade sonhada pela FIFA e foi sempre realizada um ano antes da Copa do Mundo, no país-sede do Mundial. Com seleções como Brasil, Argentina e Alemanha, o torneio foi um sucesso e teve jogos memoráveis. A caminhada brasileira começou no Grupo B, com vitória por 3 a 0 sobre a então campeã europeia Grécia. Na segunda partida, derrota por 1 a 0 para o México, seguida de um empate em 2 a 2 com o Japão. Ainda sem convencer, o Brasil pegou no tranco nas semifinais, ao derrotar a anfitriã Alemanha por 3 a 2, com dois gols de Adriano e um de Ronaldinho, com Ballack e Podolski descontando para os alemães.
Do outro lado, a Argentina passou sem grandes sustos pela fase de grupos ao vencer a Tunísia por 2 a 1, golear a Austrália por 4 a 2 e empatar em 2 a 2 com a Alemanha. Nas semis, a alviceleste empatou em 1 a 1 com o México e só venceu nos pênaltis, por 6 a 5. Com isso, a decisão entre vizinhos estava garantida. O Brasil queria o bicampeonato (o primeiro título havia sido em 1997), assim como a Argentina, campeã da primeira edição do torneio, em 1992. E, na final, o Brasil deu show e goleou os hermanos por 4 a 1, com dois gols de Adriano, um de Kaká e outro de Ronaldinho, em um jogo eterno que você pode ler mais sobre clicando aqui!
Quatro anos depois, em 2009, o torneio foi realizado na África do Sul, país-sede da Copa do Mundo de 2010, e o Brasil mais uma vez ficou com a taça após superar Egito (4 a 3), EUA (3 a 0) e Itália (3 a 0) na fase de grupos, vencer a anfitriã África do Sul na semifinal (1 a 0) e derrotar os EUA na decisão por 3 a 2 em uma final angustiante, na qual o time canarinho perdia por 2 a 0 e só conseguiu a virada no segundo tempo. Em 2013, jogando em casa, o Brasil conquistou o tricampeonato consecutivo ao vencer a Espanha por 3 a 0 na final e iludir muita gente como candidato ao título mundial no ano seguinte. Porém, a seleção levou o 7 a 1 e mostrou que ser campeão da Copa das Confederações, de fato, não significava nada – nenhum campeão do torneio venceu uma Copa do Mundo na sequência.
Última edição e o fim
Em 2015, o secretário-geral da FIFA na época, Jérôme Valcke, anunciou que a edição de 2021 da Copa das Confederações não seria realizada no Catar por conta das condições climáticas extremas. Isso já dava indícios de que o torneio estava perdendo relevância no calendário e precisava ser substituído por outro mais atrativo. Em 2017, o torneio foi realizado na Rússia e, pela primeira vez desde 1997, não teve a participação do Brasil, eliminado nas quartas de final da Copa América de 2015. Mesmo com um time alternativo, a Alemanha, campeã mundial em 2014, não teve qualquer dificuldade para superar seus rivais na fase de grupos e se garantir na decisão. A equipe derrotou a Austrália (3 a 2), empatou com o Chile (1 a 1) e venceu Camarões (3 a 1). Nas semis, a Nationalelf goleou o México (4 a 1) e, na final, venceu o Chile por 1 a 0 e faturou o título inédito.
Em 2019, foi oficializado que a Copa das Confederações seria substituída pela Copa do Mundo de Clubes da FIFA a partir de 2025, quando o torneio será realizado nos EUA, um dos países-sede da Copa do Mundo de 2026. Tal iniciativa se mostrou certeira e muito mais relevante, pois será uma competição com 32 clubes de diferentes confederações, vários craques e com um apelo muito maior do que apenas algumas seleções. Quem voltou ao calendário foi a citada Copa Artemio Franchi, agora chamada Finalíssima e que reúne os campeões da Copa América e da Eurocopa, em jogo único, algo mais fácil de organizar e que não traz danos aos clubes. O fato é que a Copa das Confederações não conseguiu se manter relevante em um mundo com tantas competições e um calendário tão complicado e sufocante.
Os campeões
Recordes individuais
ANO | MELHOR JOGADOR |
1992 | Fernando Redondo (Argentina) |
1995 | Brian Laudrup (Dinamarca) |
1997 | Denílson (Brasil) |
1999 | Ronaldinho (Brasil) |
2001 | Robert Pires (França) |
2003 | Thierry Henry (França) |
2005 | Adriano (Brasil) |
2009 | Kaká (Brasil) |
2013 | Neymar (Brasil) |
2017 | Julian Draxler (Alemanha) |
ANO | ARTILHEIRO | GOLS |
1992 | Batistuta (ARG) e Murray (EUA) | 2 gols |
1995 | Luis García (México) | 3 gols |
1997 | Romário (Brasil) | 7 gols |
1999 | Ronaldinho (Brasil) | 6 gols |
2001 | Robert Pires (França) | 2 gols |
2003 | Thierry Henry (França) | 4 gols |
2005 | Adriano (Brasil) | 5 gols |
2009 | Luís Fabiano (Brasil) | 5 gols |
2013 | Fernando Torres (Espanha) | 5 gols |
2017 | Timo Werner (Alemanha) | 3 gols |
Recordes e curiosidades
- O Brasil foi o maior campeão da Copa das Confederações com 4 conquistas. A França, com 2 troféus, vem logo na sequência;
- O país sul-americano, aliás, dominou praticamente todos os recordes da competição, com mais pontos, mais títulos em sequência, mais jogadores entre os Bola de Ouro entre outros;
- A Argentina foi o país com mais vices: dois, em 1995 e 2005;
- Espanha 10×0 Taiti e Uruguai 8×0 Taiti, ambas na edição de 2013, foram as maiores goleadas da história da Copa das Confederações;
- Romário (BRA), com 7 gols na edição de 1997, foi o maior artilheiro em uma só Copa das Confederações na história;
- Blanco (México) e Ronaldinho (Brasil) são os maiores artilheiros da história da Copa das Confederações. Ambos marcaram 9 gols;
- Apenas 3 países conseguiram levantar o título da Copa das Confederações como anfitriões: México (1999), França (2003) e Brasil (2013).
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