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Jogos Eternos – Napoli 2×3 Milan 1988

 

Data: 1º de maio de 1988

O que estava em jogo: a vitória, claro, e a um passo adiante em busca do título italiano para as duas equipes na 28ª rodada do Campeonato Italiano de 1987-1988.

Local: Estádio San Paolo (atual Estádio Diego Armando Maradona), Nápoles, Itália..

Juiz: Rosario Lo Bello (ITA)

Público: 82.824 pessoas

Os Times:

SSC Napoli: Garella; Renica; Bruscolotti (Carnevale, aos 27’ do 2º T), Bigliardi e Ferrara; Bagni (Giordano, aos 11’ do 2º T), De Napoli, Romano e Francini; Careca e Maradona. Técnico: Ottavio Bianchi.

AC Milan: G. Galli; Tassotti, F. Galli, Baresi e Maldini; Ancelotti, Colombo, Donadoni (Van Basten, intervalo) e Evani; Virdis (Massaro, aos 37’ do 2º T) e Gullit. Técnico: Arrigo Sacchi.

Placar: Napoli 2×3 Milan. Gols: Virdis-MIL, aos 36’, Maradona-NAP, aos 45’ do 1ºT; Virdis-MIL, aos 23’, Van Basten-MIL, aos 31’, e Careca-NAP, aos 33’ do 2º T.

 

“Choque de Imortais”

Por Guilherme Diniz

 

O status que a Premier League possui há algum tempo no futebol mundial é o mesmo que o Campeonato Italiano nutriu na década de 1980. Qualquer jogador na época gostaria de disputar o Calcio, vestir as camisas de Juventus, Inter de Milão, Udinese, Roma, Lazio e, claro, Napoli e Milan. Atletas de vários países desfilaram pelos gramados da bota e os torneios reuniam o que de melhor o futebol poderia oferecer, inclusive grandes jogadores brasileiros como Falcão, Zico, Sócrates, Júnior, Toninho Cerezo, Edinho e Careca. Mas, entre 1987 e 1989, dois clubes protagonizaram alguns dos embates mais eletrizantes e inesquecíveis de toda a história do Campeonato Italiano: Napoli e Milan. Quando essa dupla duelava, seja em Nápoles, seja em Milão, não só a Itália parava, mas o mundo também. Afinal, ver em campo Baresi, Maldini, Ferrara, De Napoli, Careca, Ancelotti, Maradona, Gullit e Van Basten era um privilégio, um deleite para os amantes do futebol. E o que se viu naquela tarde ensolarada de 1º de maio de 1988 foi exatamente isso. Um embate de dois timaços lendários, que marcaram época, moldaram eras, construíram fãs e mitologias. A vitória do Milan sobre o Napoli em pleno San Paolo foi um passo definitivo em busca de um título que o rossonero não via há quase uma década. E o primeiro dos muitos que Arrigo Sacchi acumularia até 1991. Foi naquela época que a rivalidade entre os clubes cresceu e se consolidou como uma das mais tradicionais da Itália e traz nostalgia sempre que entram em campo. É hora de relembrar.

 

Pré-jogo

Maradona e Baresi: capitães e símbolos de uma era de ouro do futebol italiano.

 

Campeão italiano e da Copa da Itália de 1986-1987, o Napoli era o mais badalado time italiano naquela época. Com um esquadrão entrosado, forte da zaga ao ataque e com Diego Maradona em seu esplendor e recém campeão do mundo com a Argentina, o clube azul lutava pelo bicampeonato consecutivo naquela temporada de 1987-1988 e estava ainda mais forte com a consolidação do atacante brasileiro Careca no setor ofensivo. Ele e Maradona eram demolidores e ajudaram o Napoli a permanecer no topo da tabela durante o outono e inverno, com apenas uma derrota nos primeiros 20 jogos. Só que uma equipe vinha em ascensão e queria destronar os napolitanos: o Milan, que colou na segunda posição na 13ª rodada e não saiu mais, principalmente pelo fato de o clube rossonero iniciar uma série invicta na 12ª rodada, na vitória por 1 a 0 sobre a rival Inter, e permanecer sem qualquer revés até o fim da competição.

O time de Silvio Berlusconi investia pesado em contratações e trouxe naquela temporada a dupla holandesa Gullit e Van Basten, os meio-campistas Ancelotti e Colombo e o zagueiro Costacurta, nomes que se uniram aos craques Baresi, Maldini, Tassotti e Donadoni e formaram a espinha dorsal de um dos maiores esquadrões de todos os tempos, comandado com maestria pelo técnico Arrigo Sacchi. E a grande mostra de que aquele time era mesmo especial aconteceu no primeiro turno do Campeonato Italiano daquela temporada, quando o Milan enfrentou o Napoli em San Siro e, mesmo após levar 1 a 0, enfiou 4 a 1 nos Partenopei, gols de Colombo, Virdis, Donadoni e Gullit, que havia acabado de vencer o Ballon d’Or e comandou o show.

Gullit e Van Basten: singelos reforços do Milan na época…

 

Enquanto o Milan seguia em busca do título, imbatível e mais estável, o Napoli caiu de produção a partir da derrota por 2 a 1 para a Roma, na 21ª rodada, e só venceu dois dos seis jogos que disputou até a antepenúltima rodada, deixando os Partenopei com apenas um ponto à frente do Milan, em tempos nos quais as vitórias valiam apenas dois pontos. Com isso, o duelo do dia 1º de maio de 1988 era uma verdadeira final. E tal clima foi levado ao San Paolo, que lotou com mais de 80 mil pessoas em um espetáculo cênico marcante com fumaça, fogos de artifício, papel picado e cânticos entusiasmados.

Antes da partida, o técnico napolitano Ottavio Bianchi admitiu que um empate estava de bom tamanho, enquanto Maradona apimentou o duelo dizendo que não queria ver nenhuma bandeira ou camisa rossonera nas arquibancadas naquela “final de Mundial”. Do lado milanista, Sacchi disse que sua equipe sabia muito bem o que tinha que fazer. O treinador escalou Virdis, em grande fase, ao lado de Gullit no ataque e tinha o luxo de deixar Van Basten no banco. Já o Napoli ia com força máxima, embora com a tática declarada de fechar os espaços e esperar o adversário.

 

Primeiro tempo – Quebrando o ferrolho

Quando a bola rolou, a tática napolitana ficou clara: marcação em bloco, time fechando os espaços em seu campo e Maradona e Careca pressionando a saída de bola do Milan, que tinha dificuldades para furar aquele paredão azul. Em uma dessas pressões, uma roubada de bola no campo de defesa do Milan e um escanteio cobrado na medida para Giovanni Francini levaram susto aos milanistas. Careca, em jogadas individuais, também dava trabalho à zaga rossonera. O Milan tentava com chutes de fora da área, mas faltava pontaria. Já na metade da primeira etapa, o goleiro Garella e o líbero Renica contribuíram para o 0 a 0 com chutões para frente e bolas rifadas. Foi então que, aos 36’, uma bola parada começou a mudar aquele cenário. Em cobrança de falta, Evani chutou, a bola bateu na barreira e sobrou para Virdis, oportunista, chutar para o gol e fazer 1 a 0.

Virdis comemora: carrasco marcou quatro gols em três jogos seguidos contra o Napoli entre 1987 e 1988. Foto: Imago

 

Os times em campo: o Milan variava bastante seu meio de campo por causa da movimentação de Ancelotti e Donadoni. Na frente, Gullit voltava para municiar Virdis e participava ativamente das ações ofensivas.

 

Maradona marcou um golaço!

 

O gol emudeceu a torcida napolitana, que temia pelo pior. O Milan ainda seguiu no ataque e arriscou em um chute de fora da área minutos depois, mas o goleiro Garella evitou o rebote para Gullit. Precisando de um gol para ficar no jogo, o Napoli viu seu maior astro aparecer: Maradona. O camisa 10 conseguiu uma falta na entrada da área e, na cobrança, mandou a redonda no ângulo do goleiro Galli, um golaço, explodindo o San Paolo e empatando o jogo: 1 a 1. Em ebulição, a torcida voltou a cantar e a empurrar seu time, que ganhava um gás extra para o segundo tempo. Ainda era possível virar. Só que Arrigo Sacchi tinha uma carta na manga…

Segundo tempo – Aplausos aos imortais

Van Basten entrou e deixou o seu. Foto: Imago.

 

O empate era péssimo para o Milan faltando duas rodadas para o fim e com as vitórias valendo apenas dois pontos. Se o rossonero quisesse acabar com o jejum de nove anos sem o Scudetto, tinha que vencer ali dentro do San Paolo de qualquer jeito e a qualquer custo. E Arrigo Sacchi tirou Donadoni, importante elo entre o meio de campo e o ataque em suas linhas de quatro, para colocar Marco van Basten. Era uma escolha ousada partindo de Sacchi, mas necessária diante das circunstâncias da partida. E, desde o início da etapa complementar, o Milan conseguiu encaixar seu jogo com uma marcação especial em Maradona, que recebia dois, às vezes três milanistas em sua cola. Gullit passou a jogar mais recuado, distribuindo o jogo e se movimentando.

Com mais posse de bola, o Milan agredia o Napoli, que decidiu mudar com a entrada de Giordano no lugar de Bagni. Com o trio Ma-Gi-Ca, a torcida acreditava na virada, mas ela não veio. Aos 23’, Gullit, na ponta direita, chamou o marcador para dançar, driblou e cruzou na cabeça de Virdis, carrasco dos napolitanos, que deixou mais um e fez 2 a 1, na principal jogada milanista do jogo, que sempre nascia na bola tocada por Ancelotti para Gullit, no avanço do holandês e no cruzamento para a área.

Sacchi mudou o time e conseguiu uma vitória histórica. Foto: Imago.

 

Feroz, o Milan demonstrava muita superioridade, queria a vitória e mais um gol para ter tranquilidade no jogo. Líder momentâneo do campeonato, o rossonero respirava a jogava a partida mais importante da temporada e uma das mais importantes de sua história. E, oito minutos depois, o time de Sacchi chegou ao terceiro gol de maneira espetacular e com a sua principal arma: o contra-ataque. Após uma jogada de ataque que terminou com um sem-pulo de Maradona defendido por Galli, o camisa 1 arremessou a bola rapidamente à esquerda do campo, para Maldini, que disparou e tocou para Gullit. O craque holandês avançou com uma velocidade impressionante, facilitada por suas passadas largas, chegou à grande área, despachou o marcador com um corte, esperou a chegada do goleiro e tocou no meio para Van Basten, livre, só empurrar para o gol: 3 a 1.

Que golaço! Que espetáculo! Um gol de antologia, daqueles para ver, rever e ver de novo. Mas o Napoli ainda teve tempo para descontar, dois minutos depois, após uma bola cruzada na área ir ao encontro de Careca, que aproveitou o descuido da marcação rossonera e testou firme para fazer o segundo gol napolitano. Embora a torcida tenha se inflado e empurrado o time em busca do empate que colocaria o Napoli de novo no topo da tabela, o time de Bianchi não conseguiu encontrar forças para ameaçar o Milan, muito organizado e que seguiu perigoso nas investidas comandadas por Gullit, senhor do jogo no segundo tempo por sua leitura impecável no meio, seus passes precisos e jogadas sensacionais. Os Partenopei erraram ao apostar exclusivamente em algum lance de Maradona e não tentaram outras alternativas.

Gullit, craque do jogo. Foto: Imago.

 

Ao apito do árbitro, o Milan celebrou o triunfo como um título em seu 17º jogo sem perder. Nas arquibancadas do San Paolo, palmas em reconhecimento ao grande jogo e a um adversário que foi superior e demonstrou muita qualidade técnica e tática. Líder com 43 pontos, o Milan só dependia de si para levantar o Scudetto. E conseguiu. Mas o ponto alto foi mesmo aquela vitória histórica no sol de Nápoles, contra o Napoli, Maradona, Careca e sua apaixonada torcida. Um triunfo de um esquadrão que nascia campeão e que iria se consagrar nos anos seguintes como um dos maiores de todos os tempos e ganharia o singelo apelido de The Immortals, alcunha moldada naquele eterno 1º de maio de 1988.

Virdis, Gullit, Colombo e Maldini: Milan era pura festa naquele final de anos 1980.

 

Pós-jogo: o que aconteceu depois?

 

Napoli: a derrota em casa devastou o clube azul, que não conseguiu reverter a desvantagem do rival e acabou com o vice-campeonato. Na rodada seguinte, sem Maradona, o Napoli perdeu para a Fiorentina, fora de casa, por 3 a 2, e encerrou sua participação na Série A com revés em casa para a Sampdoria (2 a 1). Os napolitanos, porém, conseguiram a desforra contra o Milan meses depois, de novo pelo Campeonato Italiano e de novo em San Paolo: vitória por 4 a 1, com dois gols de Careca, um de Maradona e um de Francini, outro jogo eterno que você pode ler mais clicando aqui.

Milan: mesmo com dois empates nas rodadas seguintes (0 a 0 com a Juventus e 1 a 1 diante do Como), o Milan levantou o Scudetto graças aos tropeços do rival e, claro, a vitória em San Paolo. A equipe rossonera terminou com três pontos de vantagem (45) sobre os azuis (42), com 17 vitórias, 11 empates, duas derrotas, 43 gols marcados e apenas 14 gols sofridos em 30 jogos, acumulando 19 jogos seguidos sem perder. O título deu ao Milan a vaga na Liga dos Campeões da UEFA da temporada seguinte e o clube iniciou sua dinastia com os títulos de 1989 e 1990, além dos títulos Mundiais dos mesmos anos, das Supercopas da UEFA de 1989 e 1990 e da Supercopa da Itália de 1988. Leia mais clicando aqui!

O fantástico Milan de Sacchi na final da Liga de 1988-1989. Em pé: Paolo Maldini, Marco van Basten, Ruud Gullit, Carlo Ancelotti, Frank Rijkaard e G. Galli. Agachados: Franco Baresi, Roberto Donadoni, Alessandro Costacurta, Angelo Colombo e Mauro Tassotti.

 

 

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