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Esquadrão Imortal – Villarreal 2004-2006

Villarreal 2004-2006
Em pé: Arruabarrena, Viera, Peña, Quique Álvarez, Marcos Senna, Riquelme e Javi Venta. Agachados: Sorín, Forlán, José Mari e Tacchinardi.

 

 

Grandes feitos: Campeão da Copa Intertoto da UEFA (2004), Semifinalista da Liga dos Campeões da UEFA (2005-2006) e 3º Colocado do Campeonato Espanhol 2004-2005. 

Time-base: Sebastián Viera (Mariano Barbosa / Pepe Reina); Javi Venta, Gonzalo Rodríguez (Peña), Quique Álvarez e Rodolfo Arruabarrena (Armando Sá); Josico (Tacchinardi / César Arzo), Marcos Senna, Juan Román Riquelme (Santi Cazorla) e Juan Pablo Sorín (Héctor Font); José Mari (Guille Franco / Guayre) e Diego Forlán. Técnico: Manuel Pellegrini.

 

“O início da lenda do Submarino Amarelo”

 

Por Guilherme Diniz

 

Os campos de futebol da Espanha e da Europa passaram por verdadeiros terremotos entre 2004 e 2006. Foi durante esse período que um misterioso Submarino Amarelo deixou o Mar das Baleares, passou pelo Porto de Castelló de la Plana e começou a causar transtornos e romper com a normalidade, especialmente com os que visitavam o estádio El Madrigal, atualmente conhecido como Estádio de La Cerámica, na cidade de Villarreal. O tal submarino era o Villarreal CF, clube espanhol que deixou marcas profundas com campanhas memoráveis, jogos incríveis e um esquadrão que transformou para sempre um time que frequentou durante quase toda sua existência as divisões inferiores do futebol espanhol.

Em uma ascensão meteórica, o Villarreal ficou em terceiro lugar em La Liga e disputou as semifinais de dois torneios continentais: a Copa da UEFA de 2003-2004 e a Liga dos Campeões da UEFA de 2005-2006, esta de maneira espetacular pelo fato de ser a primeira disputada pelo Submarino em toda sua história! Com alma sul-americana e nomes lendários como Sorín, Forlán e Riquelme, Villarreal entrou para sempre no mapa do esporte graças à uma equipe aplicada, competitiva e que assustou muita gente. É hora de relembrar.

 

Construindo um novo clube

Fernando Roig (à esq.), no anúncio da compra do Villarreal, em 1997.

 

 

Fundado em 1923, o Villarreal só conseguiu o primeiro acesso à elite do futebol 75 anos depois, após um importante empresário local adquirir o clube por cerca de 250 mil euros (valores atuais): Fernando Roig, que fez fortuna à frente da Pamesa Cerámica e deixou bem claro no anúncio do negócio, em 15 de maio de 1997, que o Villarreal seria um clube de primeira divisão, seu estádio passaria por ampla reformulação, investimentos seriam feitos nas canteras e o clube teria como um dos focos o fortalecimento da economia regional. Responsável por mais de 95% da produção de pisos e azulejos de toda a Espanha, Villarreal e a província de Castellón são o maior polo da cerâmica do país. E, se o time da cidade fosse bem no esporte, poderia diretamente e indiretamente trazer mais reconhecimento e oportunidades de negócios a todos.

A promessa de Fernando Roig realmente começou a vingar quando o Villarreal ficou em quarto lugar na Segundona de 1997-1998 e superou o Compostela no jogo eliminatório pela última vaga, garantindo o acesso à Série A. No entanto, a alegria durou pouco: embora tenha feito um bom primeiro turno, o Submarino foi péssimo no segundo e retornou à Série B já na época 1998-1999. Mas a equipe soube fazer o caminho de volta, retornou na temporada seguinte e se manteve na elite com campanhas quase sempre no meio da tabela. Em uma delas, em 2002-2003, o clube conseguiu uma vaga na extinta Copa Intertoto da UEFA, competição que dava aos vencedores vagas na Copa da UEFA – o número de campeões variava por edição, mas normalmente eram três.

Nesse meio tempo, o presidente Fernando Roig fez melhorias no estádio El Madrigal com novos lances de arquibancadas, criou um ciclo em busca de talentos na Espanha, Europa e América do Sul e as obras da Cidade Desportiva, com nove campos de treinamento e alojamento para os atletas, saíram do papel – ela seria inaugurada em 2003. Pensando alto, a diretoria começou a reforçar o elenco e conseguiu trazer nomes como os argentinos Martín Palermo e Rodolfo Arruabarrena – ambos campeões da América pelo Boca Juniors em 2000 – o lateral brasileiro Juliano Belletti, o zagueiro argentino Coloccini e o atacante brasileiro Sonny Anderson. Com tais reforços, o Villarreal se dedicou à Copa Intertoto de 2003 e conseguiu o título e a vaga na Copa da UEFA de 2003-2004. Mas ainda faltava uma peça para aquele submarino engrenar de vez. E ela também seria argentina…

 

Román e a legião sul-americana

A dupla Riquelme e Forlán no Villarreal: jogos inesquecíveis.

 

 

Às vezes, o que não é bom para um pode ser bom para o outro. E foi isso o que aconteceu na janela de transferências de 2003-2004. Passando por uma grande reformulação, o Barcelona começou a temporada vendendo ou emprestando jogadores excedentes e uma estrela estava entre eles: Juan Román Riquelme. Sem pestanejar, a diretoria do Villarreal aceitou a vinda do argentino por empréstimo. A chegada de Riquelme ao Villarreal gerou muitas dúvidas na imprensa. Afinal, qual seria o Román que jogaria com a camisa amarela? O camisa 10 sensacional dos tempos de Boca ou o tímido e triste jogador do Barcelona? A resposta veio em pouco tempo. Jogando com a camisa 8 e ao lado dos compatriotas Arruabarrena, Battaglia (ex-colegas de Boca) e Coloccini, ele tinha tudo para voltar a brilhar. E, com o técnico Benito Floro, passou a jogar em sua posição predileta, como um clássico meia armador. Era tudo o que o clube precisava.

Uma formação do Villarreal em 2003-2004. Em pé: Arruabarrena, Pepe Reina, Coloccini, Riquelme, Quique Álvarez e Ballesteros. Agachados: Belletti, José Mari, Víctor, Calleja e Martí.

 

 

Logo em sua primeira temporada, Riquelme marcou oito gols e deu dez assistências nos 33 jogos que disputou no Campeonato Espanhol e ajudou o time a chegar até as semifinais da Copa da UEFA, quando perdeu para o forte Valencia. No caminho continental, Riquelme marcou dois gols na vitória por 2 a 0 sobre o Torpedo Moscou-RUS, na segunda fase, e outro na vitória por 3 a 0 sobre o Galatasaray-TUR, na terceira. Dava gosto ver o craque jogar, mostrar sua categoria e ter ao seu lado vários sul-americanos no time, entre eles o brasileiro Marcos Senna, que se naturalizou espanhol tempo depois.

Pellegrini, técnico que mudou para sempre a identidade do Villarreal.

 

 

Após uma temporada para “lavar a alma”, Riquelme cresceu ainda mais de produção com a chegada do técnico chileno Manuel Pellegrini, que tinha na bagagem títulos de destaque pelo San Lorenzo-ARG como o Campeonato Argentino e a Copa Mercosul. Além do técnico, o Villarreal trouxe mais dois grandes talentos sul-americanos: o uruguaio Diego Forlán e o argentino Juan Pablo Sorín, que jogaria de maneira mais avançada no esquema tático de Pellegrini, como meia pela esquerda, enquanto Arruabarrena ocuparia a lateral-esquerda. Para compensar as saídas de nomes como Belletti, Sonny Anderson e Coloccini, a diretoria trouxe mais reforços: o zagueiro argentino Gonzalo Rodríguez, o zagueiro boliviano Juan Manuel Peña, o lateral-direito moçambicano Armando Sá, o meio-campista espanhol Héctor Font e a promoção ao elenco principal da cria da base Santi Cazorla. 

Foto: PAUL BARKER / GettyImages.

 

 

Com esses novos nomes, o Villarreal conseguiu ficar ainda mais forte para a temporada 2004-2005, época que começou muito bem com mais um título da Copa Intertoto após superar Odense-DIN, Spartak Moscou-RUS, Hamburgo-ALE e Atlético de Madrid-ESP na final, desempenho que garantiu o clube na Copa da UEFA. Nela, o Submarino passou em segundo lugar no Grupo E com duas vitórias e dois empates e superou a primeira etapa eliminatória com vitória sobre o Dynamo de Kiev por 2 a 0 em casa após empate sem gols na Ucrânia. Nas oitavas de final, a força do El Madrigal foi mais uma vez fundamental para o triunfo sobre o Steaua Bucareste-ROM por 2 a 0, resultado que classificou os amarelos para as quartas de final. No entanto, a equipe caiu diante do AZ-HOL após derrota por 2 a 1 em casa e empate em 1 a 1 na Holanda. Só que o desapontamento seria superado rapidamente com o grande momento daquele esquadrão justamente no torneio mais complicado: o Campeonato Espanhol.

 

O bombardeio do Submarino

Forlán comemora: craque uruguaio marcou 25 gols na temporada 2004-2005.

 

 

Embora não tivesse uma zaga tão segura, o Villarreal de Pellegrini iria se destacar pelo enorme poder ofensivo naquela temporada. Com Riquelme e Sorín na armação de jogadas e Forlán e José Mari na frente, além da proteção no meio de campo de Marcos Senna, o time se transformou em um dos mais temidos da Espanha. E fez valer a fama em La Liga. Após um começo ruim, com três empates e duas derrotas, a equipe se recuperou a partir da 6ª rodada com o triunfo por 2 a 0 sobre o Real Zaragoza e viveu o melhor momento da 14ª até a 22ª rodada, quando não perdeu nenhum jogo, venceu sete e empatou dois.

Sorín comandava as ações do Villarreal pela esquerda do meio de campo.

 

 

Nessa sequência, destaque para a vitória de 3 a 0 sobre o poderoso Barcelona de Ronaldinho e Eto’o no El Madrigal em pura ebulição com 22 mil pessoas, com dois gols de Forlán e um de Rodríguez, em uma das mais lembradas apresentações do Submarino em La Liga – e uma “vingança” pessoal de Riquelme, que jogou absurdamente demais. E não pense que o Barça jogou com time misto ou algo do tipo. Os catalães foram com Valdés; Damiá (Iniesta), Oleguer, Puyol e Sylvinho; Rafael Márquez, Xavi e Deco; Giuly, Eto’o e Ronaldinho. Já o Villarreal entrou em campo com Pepe Reina; Javi Venta, Gonzalo Rodríguez, Juan Peña e Armando Sá; Josico, Marcos Senna, Héctor Font e Riquelme (Arzo); Forlán e Guayre (José Mari). 

 

Veja os gols:

 

O Villarreal ainda venceu o Valencia por 3 a 1, aplicou outras quatro goleadas e empatou em 3 a 3 com o Barcelona no Camp Nou com três gols de Forlán. Aliás, o uruguaio fez uma parceria memorável com Riquelme que gerou aplausos e mais aplausos nos campos espanhóis. Ao término do Campeonato, a dupla foi a principal responsável por colocar o Villarreal na terceira colocação, atrás de Barcelona e Real Madrid. Em 38 jogos, foram 18 vitórias, 11 empates, nove derrotas, 69 gols marcados (3º melhor ataque, só 4 a menos do que o campeão Barcelona e 2 a menos do que o vice, Real Madrid) e 37 gols sofridos. Em casa, o desempenho do Villarreal foi ainda mais impressionante – em 19 jogos, o Submarino venceu 14 partidas, empatou quatro e só perdeu uma, com 41 gols marcados e 10 sofridos.

Riquelme pede, a torcida retribui: “Riqueeeelme, Riqueeeeeelme”, Riqueeeeeelme”.

 

 
Forlán com a Chuteira de Ouro de 2005.

 

 

Juntos, Forlán e Riquelme marcaram 40 dos 69 gols do Villarreal, uma soma impressionante. De quebra, Román deu 17 assistências, marcou 15 gols e foi um dos principais destaques da competição, ganhando o prêmio Don Balón de Melhor Jogador e o de Jogador mais Artístico do Campeonato Espanhol pelo jornal Marca (ESP), um reconhecimento pelos shows que ele deu naquela temporada. Diego Forlán terminou com artilheiro de La Liga com 25 gols em 38 jogos e ganhou o Prêmio Pichichi e a Chuteira de Ouro da Europa. Aquela colocação histórica confirmou o Villarreal na Liga dos Campeões da UEFA de 2005-2006, algo inédito na história do clube. E, com a manutenção do elenco, a torcida podia, sim, sonhar com algo grandioso na principal competição de clubes do planeta.

 

A prova da força

Festa amarela na Champions: campanha histórica do Submarino. Foto: PACO SERINELLI / GettyImages.

 

 

A Liga dos Campeões da UEFA não costuma ser tarefa fácil para estreantes. Principalmente nos anos 2000, quando as vagas eram mais limitadas. Por isso, poucos acreditavam que o Villarreal, mesmo com a manutenção de boa parte do elenco e algumas contratações, pudesse ir longe no torneio. Só que o Submarino contrariou todos os prognósticos. Embora tenha perdido na janela de transferências o goleiro Reina, o lateral Armando Sá, entre outros jogadores, a equipe trouxe o meio-campista italiano Alessio Tacchinardi e o goleiro uruguaio Sebastián Viera para reforçar o plantel em uma temporada tão carregada como aquela. Com mais experiência, o time espanhol teria ainda mais força defensiva com Marcos Senna mais recuado e cada vez mais impecável na marcação, nos desarmes e ganhando o apoio de Tacchinardi, Sorín solto pela esquerda e Riquelme ainda mais exuberante.

Marcos Senna durante partida contra o Manchester United. Foto: Jamie McDonald / Getty Images.

 

 

A saga europeia do Villarreal começou na etapa preliminar, quando o Submarino despachou o tradicional Everton-ING com uma vitória por 2 a 1 em plena Inglaterra e outro triunfo pelo mesmo placar no jogo da volta, na Espanha. Na fase de grupos, a equipe provou sua força com a primeira colocação após duas vitórias e quatro empates em seis jogos, ficando à frente de Benfica-POR, Lille-FRA e Manchester United-ING, que acabou na lanterna (!). Chamou a atenção naquela etapa a força defensiva do time tanto em casa quanto fora, pois os espanhóis levaram apenas um gol nas seis partidas que disputaram. Embora não tenha marcado muitos gols – apenas quatro – o time era muito competitivo e não se intimidava com nenhum adversário.

Uma das formações do Villarreal em 2005-2006: meio de campo e ataque eram os pontos fortes de um time que se impunha em casa e fora dela.

 

 
Foto: UEFA / Getty Images.

 

 

Nas oitavas de final, o Submarino encarou o Rangers-ESC e arrancou um empate em 2 a 2 jogando o primeiro duelo no Ibrox tomado por mais de 49 mil pessoas – os gols foram de Riquelme e Forlán. Em tempos de gol qualificado, o Villarreal jogou com o regulamento embaixo do braço na partida de volta e empatou em 1 a 1 na Espanha (gol de Arruabarrena), resultado que garantiu os espanhóis na semifinal. Só que o próximo adversário não seria nada fácil: a Internazionale-ITA, com Adriano no auge.

 

Submarino imperial!

Toldo, Zanetti, Córdoba, Samuel, Materazzi, Mihajlovic, Cambiasso, Verón, Stankovic, Recoba, Figo e Adriano. Todos esses grandes jogadores estavam na Inter de Milão que o Villarreal iria enfrentar nas quartas de final da UCL de 2005-2006. A nerazzurri era um timaço, campeã da Copa da Itália e com uma base que anos depois seria campeã da Europa e do Mundo. E o grande perigo era o brasileiro Adriano, vivendo fase espetacular e decisivo não só na Inter, mas também pelo Brasil, em especial após o show protagonizado pelo craque na Copa das Confederações de 2005

Só que o Villarreal não se intimidou e, com menos de um minuto de jogo no San Siro, Forlán fez 1 a 0 após jogadaça de Riquelme e participação de José Mari, que chutou a bola que originou o rebote para Forlán fazer o tento. Minutos depois, a Inter empatou com Adriano e virou no segundo tempo com Martins, mas o resultado de 2 a 1 deixava tudo aberto para a volta – vale lembrar que o Villarreal só não saiu da Itália com um empate porque um chute de Riquelme explodiu na trave do goleiro Toldo -, pois uma simples vitória por 1 a 0 daria ao Submarino a vaga na semifinal.

Arruabarrena celebra o gol da classificação.

 

 
Riquelme deu show no duelo da volta. Foto: Alamy.

 

 

E foi isso mesmo que aconteceu. Adivinhe quem foi o grande protagonista? O maestro Riquelme, claro. Em estado de puro esplendor, o argentino flutuou por El Madrigal. Deu passes sublimes, inverteu o jogo de trivela, deu chapéu, viu o jogo como ninguém viu, enfim, foi o camisa 10 disfarçado sob o número 8. Precisando de apenas uma vitória simples para se classificar, o Villarreal encontrou o tento da classificação com participação de Riquelme. Logo aos oito minutos do segundo tempo, após desfilar na primeira etapa, ele cobrou uma falta ensaiada na cabeça do compatriota Arruabarrena, que testou firme para fazer 1 a 0 e colocar o Submarino Amarelo em uma histórica semifinal. Com Román tinindo, tudo era possível para o Villarreal. Mas eles teriam pela frente o grande Arsenal-ING de Henry, Campbell, Ljungberg, Lehmann e companhia

 

A tragédia do Madrigal

O time que encarou o Arsenal, na volta da semifinal. Em pé: Arruabarrena, Mariano Barbosa, Peña, Quique Álvarez, Marcos Senna, Riquelme e Javi Venta. Agachados: Sorín, Forlán, Josico e Guille Franco. Foto: Alex Livesey / GettyImages.

 

 

Na semifinal, o Villarreal viajou até Londres para o duelo contra o Arsenal e perdeu por 1 a 0, num jogo em que o time espanhol teve muitas dificuldades para furar a quase intransponível defesa inglesa. Riquelme teve as melhores chances em chutes de longa distância, mas insuficientes para marcar. Na volta, no El Madrigal, o Villarreal foi inteiro para o ataque, mas a boa zaga londrina e o goleiro Lehmann inspirado prejudicavam as chances espanholas. Até que, aos 45’ do segundo tempo, esteve nos pés de Riquelme a chance de igualar o placar agregado. Em uma cobrança de pênalti, o camisa 8 foi vencido pelo goleiro Lehmann, que defendeu a cobrança do argentino. Justamente num lance de sua especialidade, o craque sucumbiu.

Riquelme_Lehmann2006

O empate sem gols colocou o time inglês na decisão e eliminou o Villarreal, levando o presidente Fernando Roig, presente no estádio, aos prantos, assim como os milhares de torcedores do Submarino. Era o fim do sonho amarelo. Cabisbaixo, Riquelme foi frio ao comentar sobre o lance após o jogo: “eu não matei ninguém. Só perdi um pênalti”. A partir daquele fatídico dia, começaria o início do fim da trajetória do argentino com a camisa amarela e da espinha dorsal do esquadrão amarelo.

 

À espera da Liga Europa

Fernando Roig ergue a taça da Liga Europa de 2020-2021: trabalho de longo prazo rende frutos.

 

 

Após ser eliminado da Liga dos Campeões, o Villarreal se dedicou ao Campeonato Espanhol e terminou na 7ª posição, com Riquelme sendo o destaque ao anotar 12 gols e dez assistências. Na temporada 2006-2007, o Villarreal sofreu com as lesões de vários de seus jogadores e com a marcha de Riquelme, triste por causa da distância da família e em atritos constantes com a diretoria. O estopim aconteceu após uma discussão com o presidente do clube que escancarou de vez sua situação por lá. Após uma derrota por 4 a 1 para o Osasuna, em casa, pelo Campeonato Espanhol, o mandatário Fernando Roig entrou no vestiário dizendo que o time havia “recuado demais”. Riquelme contestou o mandatário pela petulância e minou de vez o clima. Não houve briga com o técnico, ao contrário do que muitos jornais noticiaram à época.

 

“Nunca aconteceu nada com Pellegrini, nunca discuti. Minha briga foi com o presidente Fernando Roig. Pellegrini serviu para fazer o que queria o presidente (suspender Riquelme do time após o ocorrido)”. Riquelme, em entrevista ao diário AS (ESP), 13 de março de 2017.

 

Pellegrini também comentou na época dizendo que “Riquelme figura entre os cinco melhores jogadores do mundo em sua posição, mas não está comprometido com o clube. Se as individualidades se põem a serviço da equipe, ótimo. Mas, se querem estar acima da equipe, sobram. Román renunciou ao Villarreal, como antes havia renunciado à seleção. E o primeiro que lamenta sou eu, pois é um jogador extraordinário”. O fato é que Riquelme, àquela altura, não admitia intervenções. Ele já era um craque, não precisava provar nada e não escondia que era genioso, temperamental e difícil de lidar. Colecionava amigos e inimigos na mesma proporção. E, com seu jeito, muitas vezes rachava os vestiários.

Remodelado, o Estádio de la Cerámica ostenta em sua fachada nomes de algumas empresas locais, prova da união da cidade com o clube. Foto: Manuel Queimadelos Alonso / Getty Images.

 

 

O Villarreal ainda seria vice-campeão de La Liga em 2007-2008, mas o time se desfez, o técnico Pellegrini foi treinar o Real Madrid em 2009 e o Submarino Amarelo só voltaria aos bons tempos em 2020-2021, quando venceu seu primeiro grande título: a Liga Europa da UEFA – de maneira invicta! -, além de chegar em mais uma semifinal de UCL na temporada 2021-2022. Já com uma fama consolidada no continente, o Villarreal deve seu status atual ao time lá de 2004-2006, que moldou a aura do clube com um time lendário e relembrado por qualquer amante do esporte que acompanhou a saga do Submarino Amarelo pela Espanha e pelo continente. Um esquadrão imortal.

 

Os personagens:

 

Sebastián Viera: o uruguaio chegou na temporada 2005-2006 para suprir a ausência de Pepe Reina, negociado ao Liverpool. Com muita segurança e boa colocação, virou titular e permaneceu até 2009. Em 2007, chegou a quebrar o recorde de Pepe Reina e ficar 392 minutos sem levar gols pelo Villarreal, um recorde na história do clube à época.

Mariano Barbosa: assumiu a meta do time em alguns jogos da UCL de 2005-2006, incluindo as partidas semifinais contra o Arsenal, além de alguns jogos do Campeonato Espanhol. Por causa da concorrência com Viera, deixou o clube em 2008 e retornou em 2015, onde permaneceu até 2020.

Pepe Reina: ídolo da torcida, o espanhol começou no Barcelona, mas foi no Villarreal onde despontou para o futebol com grandes atuações, vários jogos sem levar gols e defesas marcantes entre 2002 e 2005, quando acabou se transferindo para o Liverpool. Convocado constantemente para a seleção da Espanha, foi reserva de Casillas nas conquistas da Eurocopa de 2008 e da Copa do Mundo de 2010

Javi Venta: com mais de 12 anos de Villarreal somando suas duas passagens pelo clube, Venta foi outro ídolo da torcida do Submarino e marcou época com sua eficiência no setor direito da defesa. Não atacava com muita frequência, porém, defendia bem e era firme na marcação. Chegou a estar na lista dos pré-convocados para a Copa do Mundo de 2006 pela Espanha, mas acabou de fora do grupo que foi ao Mundial. Venta é o 10º jogador com mais jogos pelo Villarreal na história: 253 partidas.

Gonzalo Rodríguez: sabia sair jogando e tinha boa técnica com a bola nos pés. Cria das bases do San Lorenzo, foi campeão da Copa Sul-Americana de 2002 pelo clube de Almagro e ganhou a confiança do técnico Manuel Pellegrini, que formou exatamente aquele time e conhecia o defensor. Fez grandes jogos na temporada 2004-2005 e ainda marcou quatro gols. Sofreu com as lesões na época seguinte e acabou perdendo a vaga no time titular para o boliviano Peña.

Peña: não era tão técnico quanto Rodríguez, mas se impunha no jogo aéreo e na marcação. Jogou de 2004 até 2007 no Villarreal e foi constantemente convocado para a seleção da Bolívia.

Quique Álvarez: capitão do Submarino e líder-nato, o zagueiro foi absoluto no sistema defensivo do técnico Pellegrini e realizou grandes jogos tanto no Espanhol quanto na saga europeia do Villarreal. Entre 2000 e 2007, Álvarez disputou mais de 200 jogos pelo Submarino e foi um dos símbolos da ascensão do clube.

Rodolfo Arruabarrena: com 270 jogos disputados entre 2000 e 2007, o lateral se tornou o 7º jogador com mais partidas na história do Villarreal e continuou com o bom futebol demonstrado nos tempos de Boca Juniors, pelo qual venceu a Libertadores de 2000 – com direito a dois gols no primeiro jogo da final contra o Palmeiras. Perito em municiar o ataque com bons cruzamentos e aparecer na frente para marcar gols, o lateral jogou mais recuado no time de Pellegrini para liberar mais o compatriota Sorín. Mesmo assim, Arruabarrena ainda marcou gols importantes, como o que selou a classificação diante da Inter de Milão nas quartas de final da UCL de 2005-2006.

Armando Sá: nascido em Moçambique, o defensor foi um importante jogador para o esquema tático do técnico Pellegrini por ser apto a jogar em ambas as laterais. Fez uma boa temporada em 2004-2005, ajudando o clube a alcançar o incrível 3º lugar em La Liga. Deixou o Submarino já na temporada seguinte para vestir a camisa do Espanyol.

Josico: o volante jogou de 2002 até 2008 no Villarreal e era muito bom no desarme e na marcação, o típico “carregador de piano”. Muito dedicado e raçudo, virou ídolo da torcida no período e foi capitão em várias ocasiões.

Tacchinardi: com mais de 400 jogos pela Juventus entre 1994 e 2005, o meio-campista se transferiu para o Villarreal em 2005 e se destacava pela presença física, pelos chutes de longa distância e pelo bom passe. Deu qualidade ao meio de campo do time tanto nos jogos do Campeonato Espanhol quanto na trajetória da Liga dos Campeões da UEFA.

César Arzo: cria do Villarreal, o defensor começou a jogar no time profissional em 2003 e fez alguns jogos marcantes em La Liga de 2004-2005 e na caminhada da Copa Intertoto de 2004. Acabou sendo emprestado em 2006 ao Recreativo e, em seguida, ao Murcia.

Marcos Senna: o brasileiro naturalizado espanhol foi um dos mais eficientes meio-campistas do final dos anos 1990 e em boa parte dos anos 2000 e virou ídolo do Villarreal, onde se tornou o 4º jogador com mais jogos na história do clube – 356 partidas. Com um notável senso de colocação, passes perfeitos, boa visão de jogo e muito bom na organização, Senna foi titular absoluto do time de Pellegrini e uma referência na parte tática. Quando se naturalizou, vestiu a camisa da Espanha na Copa do Mundo de 2006 e na Eurocopa de 2008, sendo campeão nesta última. Senna jogou no Villarreal de 2002 até 2013.

Juan Román Riquelme: 6º maior artilheiro da história do Villarreal com 45 gols em 144 jogos, rei dos passes para gols em La Liga de 2004-2005 (17 assistências), encantador de plateias, craque raro. Riquelme foi tudo isso e muito mais no período em que vestiu o manto amarelo do Villarreal, único clube da Europa que teve o privilégio de contar com o melhor do argentino em campos do Velho Continente. Riquelme pilotou com maestria o Submarino Amarelo e fez nascer uma legião de fãs por seu futebol na Espanha. Quem ainda não conhecia o meia, acabou conhecendo. Mesmo com a perda do fatídico pênalti na semifinal da UCL de 2005-2006, o legado de Riquelme pelo Villarreal foi enorme e impagável. Leia mais sobre essa lenda do futebol clicando aqui!

Santi Cazorla: outra cria das bases, o meia não teve muitas oportunidades na época por conta da pouca idade e da concorrência no setor, mas demonstrou habilidade e bom futebol quando exigido. Deixou o Villarreal em 2006 e retornou entre 2007 e 2011 e entre 2018 e 2020. Vestiu a camisa da Espanha em 81 jogos e foi campeão das Eurocopas em 2008 e 2012.

Juan Pablo Sorín: lateral-esquerdo de origem, o argentino foi “transformado” em meia-esquerda pelo técnico Pellegrini e foi um dos mais importantes jogadores do esquema tático do Submarino na época. Com habilidade, visão de jogo, fôlego privilegiado, velocidade e poder de marcação, Sorín não só ajudava o ataque como também protegia a defesa e o meio de campo pelo setor esquerdo. Após a queda na UCL, Sorín deixou o Villarreal para jogar no futebol alemão. Entre 2004 e 2006, o argentino disputou 60 jogos e marcou oito gols.

Héctor Font: mais uma cria das canteras do clube, Font começou no Villarreal em 2002, foi emprestado para ganhar experiência e retornou entre 2004 e 2006 para realizar 54 jogos e marcar três gols. Podia atuar como meia e também pelas pontas, contribuindo na construção de jogadas.

José Mari: atacante revelado pelo Sevilla, integrou a seleção olímpica da Espanha que ficou com a Prata nos Jogos de Sydney, em 2000, e chegou ao Villarreal em 2003. Não era um goleador nato, mas se destacava nas jogadas aéreas e na parte tática, com boa movimentação. Sua melhor temporada foi a de 2003-2004, quando anotou 10 gols em 46 jogos.

Guayre: atacante que jogava mais pelas pontas, não teve uma grande sequência na carreira por causa das lesões, mas fez uma boa média de jogos pelo Villarreal de 2001 até 2006. Sua melhor temporada foi em 2004-2005, quando disputou 33 jogos e marcou oito gols na grande campanha do time no Campeonato Espanhol.

Guille Franco: o argentino naturalizado mexicano chegou em 2005-2006 ao Villarreal e fez dupla com Forlán em alguns jogos. Disputou 104 jogos e marcou 20 gols pelo clube entre 2005 e 2009.

Diego Forlán: um dos maiores craques do futebol uruguaio deste século, Forlán viveu uma das melhores fases da carreira com a camisa do Villarreal. Seus 25 gols na temporada 2004-2005 de La Liga foram um estrondo e colocaram o atacante no topo do continente. Com oportunismo, velocidade, sempre bem colocado e técnico, Forlán encantou a torcida e anotou golaços históricos e decisivos pelo Submarino. Ele é até hoje o 3º maior artilheiro da história do Villarreal com 59 gols em 128 jogos entre 2004 e 2007. Após seu período no Villarreal, o atacante foi jogar no Atlético de Madrid, onde também fez história e levantou títulos, além de vencer sua segunda Chuteira de Ouro na carreira em 2008-2009.

Manuel Pellegrini (Técnico): o talentoso técnico chileno armou um dos maiores esquadrões do futebol espanhol entre 2004 e 2006 com muito conhecimento e explorando ao máximo o talento individual de seus atletas, em especial Riquelme, Sorín e Forlán. Entre 2004 e 2009, Pellegrini moldou o Villarreal à sua maneira e manteve o time competitivo durante todo esse tempo, levando o Submarino Amarelo ao vice-campeonato espanhol em 2007-2008. Após treinar os amarelos, Pellegrini comandou Real Madrid, Málaga, Manchester City (ele foi campeão inglês e faturou duas Copas da Liga Inglesa com os Citizens) entre outros clubes. Atualmente, Pellegrini treina o Real Betis e faturou na temporada 2021-2022 o título da Copa do Rei, provando que ainda tem estrela.

 

 

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