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Craque Imortal – Ben Barek

 

Nascimento: 16 de junho de 1914 (algumas fontes citam que ele nasceu em 1917), em Casablanca, Marrocos. Faleceu em 16 de setembro de 1992, em Casablanca, Marrocos.

Posições: Meia-Atacante e Atacante

Clubes: Wydad AC-MAR (1930-1934), US Marocaine-MAR (1934-1938 e 1939-1945), Olympique de Marselha-FRA (1938-1939 e 1953-1955), Stade Français-FRA (1945-1948) e Atlético de Madrid-ESP (1948-1953), USM Bel-Abbès-ALG (1955-1956) e FUS de Rabat-MAR (1956-1958).

Principais títulos por clubes: 6 Campeonatos Marroquinos (1935, 1938, 1940, 1941, 1942 e 1943), 8 Supercopas do Marrocos (1934, 1935, 1936, 1938, 1939, 1941, 1942 e 1943) 2 Copas do Marrocos (1936 e 1941), 2 Copas dos Campeões da África do Norte (1934 e 1942) e 2 Supercopas da África do Norte (1934 e 1942) pelo US Marocaine.

2 Campeonatos Espanhóis (1949-1950 e 1950-1951) e 1 Copa Eva Duarte (1951) pelo Atlético de Madrid.

Principais títulos individuais:

Melhor Jogador da África do Norte: 1934 e 1942

Ordem ao Mérito da FIFA: 1998

Eleito para a Seleção dos Sonhos do Marrocos do Século XX pela IFFHS: 2002

 

“Pérola Negra”

 

Por Guilherme Diniz

 

Ele quebrou paradigmas, cruzou fronteiras e se consagrou como um dos maiores jogadores africanos de todos os tempos. Seu nome pode não ser muito conhecido, mas experimente mencioná-lo na França, no Marrocos ou na Espanha que muitos irão identificá-lo. Haj Abdelkader Larbi Ben M’barek, também conhecido como Larbi Benbarek ou Larbi Ben Barek, possui uma importância inegável para a história do futebol. Atleta extraordinário, considerado por muitos o maior jogador marroquino de todos os tempos, tinha uma habilidade em campo impressionante e ajudou a pavimentar o caminho para outros jogadores marroquinos que vieram depois dele. Ben Barek foi um dos primeiros jogadores do futebol árabe a se destacar no cenário internacional, o primeiro africano a brilhar em solo espanhol e jogou não só por seu país, mas também pela seleção da França. Ben Barek foi tão enorme que Pelé, certa vez, disse: “Se eu sou o rei do futebol, Ben Barek é o deus”. Uma pena que não tenha ocorrido Copa do Mundo nos anos 1940, pois o craque certamente seria um dos principais nomes do torneio. É hora de relembrar a carreira do Pérola Negra.

 

De Casablanca a Marselha

Ben Barek nasceu em Agadir N’tissent, um pequeno vilarejo na província de Tata, no sul do Anti-Atlas. Jovem órfão, cresceu com o pai, operário especializado em conserto de barcos, no bairro cubano de Casablanca e jogava futebol na rua com as crianças de seu bairro. A partir dos 14 anos exerceu o ofício do pai, carpinteiro. Porém, o jovem sempre foi apaixonado pelo futebol. Aos 17 anos, ele se juntou ao time local, o Idéal CM, da segunda divisão. Rapidamente, ganhou destaque por sua velocidade, visão de jogo e dribles desconcertantes. O jovem ainda demonstrava muita personalidade ao crescer em jogos grandes, como em um duelo contra o US Marocaine de Casablanca, um dos principais times do país na época, contra o qual anotou dois gols. Em 1935, ajudou sua equipe a alcançar a final da Copa do Marrocos, mas foram derrotados pelo RC Marocain. Em seu início de carreira, Ben Barek disputou alguns jogos pelo Marrocos, mas como o país estava sob protetorado francês e espanhol – que durou de 1912 até 1956 -, não podia disputar jogos oficiais, apenas amistosos. 

Ben Barek pelo OM. AFP PHOTO / STAFF

 

Tempos depois, o US Marocaine recrutou o jovem, que inicialmente conciliou os treinamentos com o trabalho de frentista em um posto de gasolina para depois assumir de vez a titularidade da equipe e faturar vários títulos nacionais pelo clube, que também revelaria anos depois outro craque imortal: Just Fontaine. Não demorou muito para o craque chamar a atenção dos grandes clubes franceses da época, que garimpavam talentos no norte da África e levavam ao Velho Continente. Depois de várias negativas, o Olympique de Marselha conseguiu convencer o Marocaine a vender sua joia, que acabou se transferindo ao OM em 1938 por cerca de 44 mil francos.

A chegada de Ben Barek em Marselha causou um grande impacto. Ele era um jogador diferente de tudo que os torcedores franceses haviam visto antes. Sua habilidade com a bola era impressionante, sua visão de jogo era incrível e sua capacidade de driblar os adversários deixava todos boquiabertos. Ele jogava como meio-campista ofensivo, mas também podia atuar como ponta ou centroavante. Ele foi um pioneiro no futebol moderno, introduzindo técnicas como o “drible de corpo” e o “drible de cintura”. Por isso, rapidamente ganhou o apelido de “mágico” e de “pérola negra” pelo imenso talento com a bola nos pés. 

Ben Barek jogou apenas uma temporada no OM, marcando 10 gols em 30 jogos, mas o suficiente para ser convocado para a seleção da França – que se beneficiava dos atletas nascidos no Marrocos por conta do já citado protetorado da época – e disputar um amistoso em dezembro de 1938 pelos Bleus aos 20 anos, na derrota por 1 a 0 para a então bicampeã mundial Itália. Em janeiro de 1939, participou de três dos quatro gols da goleada francesa sobre a Polônia por 4 a 0, em Paris, e na capital francesa conseguiu um reconhecimento ainda maior de seu futebol e, claro, o desejo de outros clubes. Porém, justo quando a carreira do craque poderia decolar, Ben Barek teve que se refugiar no Marrocos por causa da eclosão da Segunda Guerra Mundial, fazendo com que ele  voltasse a jogar pelo Marocaine até 1945. Nesse período sem grandes disputas, o craque até jogou basquete pelo Wydad AC, demonstrando ser um esportista fora de série.

 

A sequência no pós-Guerra e estrela na Espanha

Após 1945, Ben Barek foi contratado pelo Stade Français por um valor recorde na época – cerca de um milhão de francos – e jogou ao lado de outros grandes jogadores como Roger Courtois e Raoul Diagne. Foi no Stade Français que Ben Barek enfrentou discriminação racial em um momento em que o futebol era predominantemente dominado por jogadores brancos. Em uma entrevista anos depois, ele revelou que os insultos racistas eram comuns durante sua carreira, mas que ele preferia ignorá-los e se concentrar em jogar futebol. Seu companheiro de clube, Diagne, nascido na Guiana Francesa e de origem senegalesa, também sofreu bastante com o racismo na época. 

Com 17 gols em 25 jogos, Ben Barek foi ótimo em sua primeira temporada e seguiu convocado para a seleção da França. Porém, como naquela década não houve Copa do Mundo, o craque acabou não tendo a oportunidade de brilhar no maior palco do futebol mundial, assim como vários outros craques daquela época espalhados pela fabulosa seleção da Argentina, dos portugueses do Sporting e do Grande Torino, da Itália. Ben Barek acumulou 17 jogos pela França e marcou três gols. 

 

No final da década, em 1948, Ben Barek desembarcou na Espanha para integrar um dos principais times do país na época: o Atlético de Madrid, comandado por Helenio Herrera. O técnico, inclusive, foi essencial para que Ben Barek se consagrasse no país. O argentino disse na época que “Ben Barek melhorou assim que chegou porque percebeu que o nível era mais elevado do que aquele ao que estava habituado. E ele nunca iria permitir ser ultrapassado em talento por outros”.

 

Com muito treino, que transformou os jogadores do clube da capital em verdadeiras máquinas de jogar futebol e de correr, o Atlético conquistou dois Campeonatos Espanhóis consecutivos nas temporadas 1948-1949 e 1949-1950 com um desempenho fantástico jogando em casa e um ótimo poder ofensivo de seu ataque, que marcou 71 gols em 26 jogos no primeiro título nacional e 87 gols em 30 partidas no segundo. Os grandes craques daquele esquadrão eram Adrián Escudero (artilheiro do time na temporada 1949-1950 com 20 gols), José Juncosa, Henry Carlsson, também vindo do Stade Français, Pérez-Paya e Larbi Ben Barek, claro, todos integrantes da “Delantera de Cristal”. O “Pérola Negra” anotou 56 gols em 113 jogos por La Liga e virou ídolo dos torcedores colchoneros. Foi na Espanha que Ben Barek ganhou outro apelido: Pés de Deus, pela ginga, dribles, chutes e estilo impetuoso de jogo. 

 

Retorno à França e aposentadoria

Em 1953, já com 40 anos, Ben Barek retornou ao Olympique de Marselha em busca de um título com a camisa dos Phocéens, mas outra vez não conseguiu levantar um troféu. Ele até chegou perto na temporada 1953-1954, quando disputou a final da Copa da França, mas o OM acabou derrotado por 2 a 1 para o Nice. Após mais 32 jogos e 13 gols, Ben Barek ainda passou pelo futebol argelino e retornou ao seu país até pendurar as chuteiras em meados de 1958. Após se aposentar do futebol, Ben Barek voltou para Casablanca, onde se tornou treinador. Ele liderou a seleção marroquina em várias ocasiões e treinou clubes locais, incluindo o Raja Casablanca, mas acabou esquecido com o passar do tempo e não teve o reconhecimento que merecia ao longo dos anos. Porém, em 1976, o craque se encontrou com o Rei Pelé, que visitou Casablanca naquele ano e encontrou o marroquino, ocasião na qual proferiu a já citada frase “Se eu sou o rei do futebol, Ben Barek é o deus”, provavelmente o maior reconhecimento a tudo o que Ben Barek fez ao futebol. Além disso, em Casablanca, o Stade Philip foi rebatizado como Stade Larbi Ben Barek pelo Wydad em homenagem ao craque. 

Pelé e Ben Barek, em 1976: encontro de imortais.

 

O Pérola Negra faleceu em 16 de setembro de 1992, mas seu legado continua vivo. Ele foi um dos primeiros jogadores negros a ter sucesso na Europa e abriu caminho para outros jogadores africanos seguirem seus passos. Sua habilidade, técnica refinada e sua coragem em enfrentar o racismo o tornaram uma lenda do futebol, não só na França, mas em todo o mundo. Como a maioria dos jogadores de sua época, as estatísticas de sua carreira não são totalmente precisas ou confiáveis. Alguns relatos indicam que ele marcou mais de 300 gols, enquanto outros relatam números menores. No geral, é difícil determinar exatamente quantos gols Ben Barek marcou, mas é inegável que o Pérola Negra foi um jogador excepcionalmente talentoso e influente. Um craque imortal.

 

 

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