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Craque Imortal – Lilian Thuram

Lilian Thuram

 

Nascimento: 1º de janeiro de 1972, em Pointe-à-Pitre, Guadalupe.

Posições: Lateral-Direito e Zagueiro

Clubes: Monaco-MO (1991-1996), Parma-ITA (1996-2001), Juventus-ITA (2001-2006) e Barcelona-ESP (2006-2008).

Principais títulos por clubes: 1 Copa da França (1990-1991) pelo Monaco.

1 Copa da UEFA (1998-1999), 1 Copa da Itália (1998-1999) e 1 Supercopa da Itália (1999) pelo Parma.

2 Campeonatos Italianos (2001-2002 e 2002-2003) pela Juventus.

1 Supercopa da Espanha (2006) pelo Barcelona.

Principais títulos por seleção: 1 Copa do Mundo da FIFA (1998), 1 Eurocopa (2000) e 1 Copa das Confederações (2003) pela França.

Principais títulos individuais:

Futebolista Francês do Ano: 1997

Guerín d’Oro: 1997

Bola de Bronze da Copa do Mundo da FIFA: 1998

Eleito para o All-Star Team da Copa do Mundo da FIFA: 1998 e 2006

Eleito para o Time do Ano da ESM: 1998-1999 e 2002-2003

Eleito para o All-Star Team da Eurocopa: 2000

FIFA 100: 2004

FIFPro World XI: 2006

Trophée d’honneur UNFP: 2009

2º Jogador que mais vestiu a camisa da França na história: 142 jogos

Eleito para a Seleção dos Sonhos da França do Imortais: 2020

 

 

“La légende de la défense”

 

Por Guilherme Diniz

 

Nos anos 1990 e parte dos anos 2000, quando alguém pensava em defensor francês, um nome sempre vinha à mente. Era um homem incontestável, desejado por qualquer clube no mundo e respeitado por todo torcedor. Ele sempre levava a melhor nas divididas e impunha respeito ao chegar junto dos atacantes e pontas, mas com lealdade. Com um físico privilegiado, era um profundo leitor do jogo, antevendo o que os atacantes iriam fazer, além de ter um senso de colocação impressionante. Simplesmente uma lenda da zaga, Ruddy Lilian Thuram-Ulien, ou Lilian Thuram, escreveu seu nome na história não só do futebol francês, mas mundial, como um dos mais brilhantes defensores de todos os tempos. Após jogar por seis anos no Monaco, ganhou ainda mais fama vestindo a camisa do Parma, pelo qual venceu a Copa da UEFA (atual Liga Europa) de 1999 e também na Juventus, onde conquistou os campeonatos italianos de 2002 e 2003. Na Copa de 1998, foi titular absoluto do time campeão do mundo e levantou ainda a Eurocopa de 2000 e a Copa das Confederações de 2003, além do vice-campeonato na Copa do Mundo de 2006. É hora de relembrar.

 

De Guadalupe ao Principado

 

Nascido em Pointe-à-Pitre, segunda maior cidade de Guadalupe, arquipélago francês na região do Caribe, Thuram cresceu em uma família humilde ao lado de quatro irmãos. Aos nove anos, mudou-se para a França, pois sua mãe já morava em Paris há um ano, onde trabalhava como empregada doméstica. Foi na França que Thuram conheceu o preconceito contra os negros e passou a admirar Nelson Mandela, lendário ex-presidente sul-africano, e Martin Luther King, ativista dos direitos civis dos negros nos EUA. Muito inteligente, sempre gostou de ler e adquirir conhecimento. Com educação católica, o jovem pensava naquele momento em se tornar padre (!), ideia que foi deixada de lado tempo depois ao começar a jogar futebol. 

Lilian Thuram

Depois de passar pelas categorias de base de equipes pequenas como Racing Club du Pays de Fontainebleau e Melun, foi no Monaco onde ele encontrou o ambiente certo para prosperar, ainda mais com o técnico Arsène Wenger no comando da equipe. Em 1991, aos 19 anos, começou na equipe profissional até se consolidar no time titular no final de 1992, atuando como lateral-direito. Porém, como tinha um excelente preparo físico e enorme visão de jogo, podia atuar também no miolo de zaga e até como volante. A partir de 1992-1993, Thuram conseguiu mais regularidade na equipe e passou a ser chamado, também, para a seleção francesa, que buscava juntar os cacos após a vexatória eliminação na repescagem para a Copa do Mundo de 1994, quando perdeu para a Bulgária e ficou de fora do Mundial dos EUA.

Thuram na cola de Papin, (à dir.) do Olympique.

 

A primeira convocação do defensor aconteceu exatamente em 1994, e outras cinco vieram em 1995. Em 1996, foram 13 jogos pelos Bleus e a certeza de que ele seria presença certa naquele ciclo que visava uma boa participação dos anfitriões na Copa de 1998. Pelo Monaco, Thuram não conseguiu levantar títulos como titular – a Copa da França de 1991 veio com ele na reserva -, mas jogou 193 jogos e marcou 11 gols entre 1991 e 1996, período em que virou um dos mais elogiados defensores do futebol francês pela personalidade, grandes atuações, excelência na marcação e no apoio ao ataque. 

 

Tempos de ouro no Parma

Em 1996, Thuram foi vendido ao Parma por 10,5 milhões de liras e foi um dos principais reforços do endinheirado clube da Parmalat, que já havia levantado títulos importantes entre 1991 e 1995 e queria manter a boa fase. Nos gialloblù, Thuram teve a companhia do goleiro Buffon e dos zagueiros Fabio Cannavaro e Roberto Sensini para compor uma lendária linha defensiva que ajudou o esquadrão a vencer a Copa da UEFA de 1998-1999, a Copa da Itália na mesma temporada e a Supercopa da Itália de 1999. Além de uma grande zaga, o Parma daquela época tinha nomes como Dino Baggio, Verón, Crespo e Chiesa, e conseguiu dar muito trabalho aos outros esquadrões da Itália na época como Milan, Juventus, Lazio, Roma, Fiorentina e Inter. 

Thuram, Chiesa e Crespo (ao fundo): bicampeões da UEFA.

 

Mesmo com um timaço, o Parma não conseguiu ir longe no Campeonato Italiano. A equipe terminou na quarta colocação com 15 vitórias, 10 empates e nove derrotas em 34 jogos, marcando 55 gols e sofrendo 36 (terceira melhor defesa). No entanto, a equipe teve momentos mágicos e jogos com uma enxurrada de gols, como o 5 a 3 pra cima do Empoli e o 6 a 3 no Piacenza, ambos fora de casa. Contra os grandes times da época, o Parma mostrou autoridade dentro de casa e derrotou Inter (1 a 0), Juventus (1 a 0), Fiorentina (2 a 0) e Milan (campeão daquela temporada) com inesquecíveis 4 a 0, gols de Crespo (2), Chiesa e Boghossian. Fora de casa, o time também deu show contra Inter (3 a 1) e Juventus (4 a 2). Foi uma pena aquele esquadrão não ter ficado com a taça, culpa das derrotas e empates inesperados dentro de casa com equipes como Bologna, Cagliari, Piacenza, Venezia e Vicenza.

 

Estrela em uma constelação inesquecível

Thuram supera Maldini: embate tenso nas quartas de final da Copa de 1998.

 

Jogando muito e eleito Futebolista do Ano da França em 1997, Lilian Thuram foi titular absoluto da seleção francesa na Copa do Mundo de 1998. Atuando na lateral-direita, enquanto Blanc e Desailly ocupavam o miolo central, Thuram foi um dos principais artífices do time na caminhada rumo ao título. Disputando sua primeira Copa na carreira, Thuram demonstrou personalidade diante dos mais hostis rivais, entre eles Paraguai, Itália e Croácia, despachados pelos Bleus antes da final contra o Brasil.

Thuram (à esq.) fica pensando, mas a ficha não havia caído ainda…

 

Aliás, na semifinal, Thuram fez provavelmente o jogo da vida com a camisa da França. O defensor falhou no comecinho do segundo tempo e a Croácia abriu o placar. Mas ele mesmo empatou o jogo um minuto depois e mais adiante virou para 2 a 1. Como praticamente nunca marcava gols, na comemoração, ele ajoelhou e ficou pensando “o que raios está acontecendo comigo?”, em uma das mais engraçadas e icônicas cenas das Copas. Foram os primeiros e únicos gols (!) de Thuram vestindo a camisa da França na carreira. Justamente os que colocaram o país na final, vencida sobre o Brasil por 3 a 0. O craque ganhou a Bola de Bronze como um dos melhores daquele Mundial e foi eleito para o All-Star Team da Copa, profundo reconhecimento ao seu futebol majestoso, limpo e impecável na campanha francesa – e que ajudou o time a sofrer apenas dois gols em sete jogos! O craque comentou sobre aquele Mundial em sua passagem pelo Brasil durante a Copa do Mundo de 2014.

 

“De modo geral, as melhores partidas são as que ficam na memória. Eu tive a sorte de fazer dois gols contra a Croácia na semifinal. Mas, se tivéssemos perdido a final, isso não serviria para nada. Então, a lembrança mais bonita que eu tenho é da final contra o Brasil, em que nos tornamos campeões do mundo”.

 

Dois anos depois, em 2000, Thuram integrou o time francês campeão da Eurocopa, um esquadrão que era ainda melhor por conta das entradas de Henry e Trezeguet de maneira mais constante no time. Depois de passar pela primeira fase, os Bleus superaram a Espanha nas quartas de final (2 a 1) e eliminaram Portugal na semifinal com vitória por 2 a 1 na prorrogação, em Gol de Ouro anotado por Zidane, de pênalti. Na final, a França encarou a forte Itália de Del Piero, Maldini, Totti e companhia e perdia por 1 a 0 até os 48’ do segundo tempo, quando Wiltord empatou e forçou a prorrogação.

Em pé: Zidane, Blanc, Vieira, Desailly, Dugarry e Thuram. Agachados: Henry, Djorkaeff, Deschamps, Barthez e Lizarazu. Timaço campeão da Euro de 2000.

 

Nela, a equipe francesa aproveitou a fragilidade emocional dos italianos – que viram a taça escapar dos dedos por segundos – e Trezeguet fez o Gol de Ouro que garantiu o título europeu dos Bleus. Mais uma vez, Thuram foi um dos destaques do torneio e foi eleito para o All-Star Team daquela Euro. Em 2003, a França venceu a Copa das Confederações e completou a “Tríplice Coroa” das grandes competições da época.

 

Bons momentos em bianconeri

Com a visibilidade nas alturas e reconhecido mundialmente, Thuram passou a ser cobiçado por todos os principais clubes da Europa após 2000. E quem ganhou a disputa foi a Juventus, que levou o francês para Turim por mais de 34 milhões de euros. Além dele, a Velha Senhora comprou também do Parma o goleiro Buffon e, depois, o zagueiro Cannavaro (já na Inter, em 2004), tomando para si a “melhor defesa do mundo”. E, como não poderia deixar de ser, a Juve monopolizou o Campeonato Italiano e faturou os títulos de 2001-2002 e 2002-2003. Na primeira conquista, a Juventus terminou o campeonato com 71 pontos, 20 vitórias, 11 empates, três derrotas, 64 gols marcados (melhor ataque) e 23 gols sofridos (melhor defesa). No segundo, o esquadrão bianconeri somou 72 pontos em 34 jogos, com 21 vitórias, nove empates, quatro derrotas, 64 gols marcados (melhor ataque) e 29 gols sofridos (melhor defesa). 

Além desses títulos, a equipe ainda brigou pela Liga dos Campeões da UEFA e chegou à final de 2002-2003, mas o título escapou nos pênaltis para o rival Milan após empate sem gols no tempo regulamentar. Naquela decisão, Thuram compôs o quarteto de zaga ao lado de Ferrara, Tudor e Paolo Montero. Após 2004, o craque se juntou ao defensor Cannavaro e formou uma dupla de zaga fantástica e que ajudou a equipe a vencer mais dois títulos nacionais. Porém, as conquistas de 2004-2005 e 2005-2006 foram suspensas por causa do escândalo de manipulação de resultados conhecido como Calciopoli, que, além de suspender os títulos da Juve, causou o rebaixamento do clube para a Série B, campeonato no qual ela começou com -9 pontos. Com essa polêmica, Thuram decidiu deixar o clube em 2006 e foi para o Barcelona-ESP. Mas, pelo caminho, tinha mais uma Copa do Mundo no radar.

 

Quase bi e últimos anos

Thuram disputa a bola com Cristiano Ronaldo na semifinal da Copa de 2006.

 

Após a decepção na Copa de 2002 – a França foi eliminada na fase de grupos – Thuram disputou a Copa de 2006 como um dos remanescentes da geração de ouro de 1998, ao lado de Barthez, Vieira, Zidane, Henry e Trezeguet. A França tinha um timaço e, orquestrada por Zidane, foi avançando rumo a mais uma final. Thuram fez uma Copa monumental atuando como zagueiro ao lado de Gallas e foi uma das principais peças defensivas do time. Na semifinal, contra a sensação Portugal, Thuram jogou tanto que foi eleito o Man of the Match pela FIFA. Na final, contra a Itália, Thuram foi bem, mas o time bleu perdeu nos pênaltis por 5 a 3 e viu o sonho do bicampeonato ruir. Mesmo sem o título, Thuram mais uma vez foi eleito para o All-Star Team de uma Copa e cravou de vez seu nome entre os maiores defensores da história dos Mundiais – ele está, inclusive, em nosso especial os 10 Maiores Laterais-Direitos das Copas. 

Pelo Barça, Thuram, já com 34 anos, não teve muitas chances na equipe blaugrana e deu azar por chegar em um período de transição, entre o fim da Era Ronaldinho e antes da Era Guardiola, que simbolizou um pequeno ostracismo do clube catalão. Com isso, em 2008, quando pensava em uma transferência para o PSG, Thuram descobriu um problema cardíaco que o fez repensar a carreira e anunciar sua aposentadoria do futebol. No mesmo ano, se despediu da seleção como jogador com maior número de jogos da história da França – 142 partidas – recorde que só seria superado por Hugo Lloris mais de uma década depois. 

A aposentadoria foi pensada de maneira sensata e com o apoio da família. Alguns anos antes, um irmão do craque faleceu quando jogava basquete devido a um problema no coração. “Nas discussões que tive com minha mãe, entendi que era hora de parar. Gostaria de assinar com o Paris Saint-Germain, mas muitas coisas estão em jogo, e a família entra nisto acima de tudo. Ela desejava que eu parasse. Não seria inteligente da minha parte fazer sofrer aqueles de quem gosto tanto”, disse Thuram em 2008. 

 

Politizado e imortal

Após se aposentar, Thuram se dedica ao combate ao racismo e sempre expõe suas opiniões sobre o assunto, além de ter escrito o livro “Minhas estrelas negras: de Lucy a Barack Obama”, onde conta histórias de sua vida, suas inspirações e o preconceito que sofreu ao longo da carreira, principalmente na Itália, onde passou mais de 10 anos. Thuram segue ativo em prol do esporte, da inclusão e da educação. O craque ainda cuida da Lilian Thuram Foundation, que dissemina educação anti-racismo através de eventos, esportes e escolas, e trabalha na Organização Internacional de Anemia Falciforme, além de ser conselheiro da Alta Comissão de Integração dos Imigrantes. Com um inegável legado como jogador, Thuram só aumenta seu respeito e papel no mundo esportivo como um símbolo único, fazendo jus ao imortal do futebol que é e sempre será.

 

Marcus Thuram (à esq.) segue os passos do pai e é jogador profissional. Ele atua como atacante e integrou, inclusive, o elenco da França vice-campeã da Copa do Mundo de 2022.

 

Números de destaque:

 

Disputou 193 jogos e marcou 11 gols pelo Monaco.

Disputou 228 jogos e marcou 1 gol pelo Parma.

Disputou 204 jogos e marcou 1 gol pela Juventus.

Disputou 58 jogos pelo Barcelona. Não marcou gols.

Disputou 142 jogos e marcou 2 gols pela seleção da França.

Disputou 825 jogos e marcou 16 gols na carreira.

 

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