Grandes feitos: Bicampeão da Copa das Cidades com Feiras (precursora da Copa da UEFA – 1955-1958 e 1958-1960), Pentacampeão da Copa do Rei (1950-1951, 1951-1952, 1952-1953, 1956-1957 e 1958-1959), Tetracampeão do Campeonato Espanhol (1951-1952, 1952-1953, 1958-1959 e 1959-1960), Bicampeão da Copa Eva Duarte (1952 e 1953), Campeão da Copa Latina (1952) e Campeão da Pequena Copa do Mundo de Clubes (1957).
Time-base: Antoni Ramallets (Juan Velasco); Brugué (Biosca / Ferran Olivella), Seguer (Foncho / Gensana) e Cheché Martín (Francesc Calvet / Gràcia); Segarra (Andreu Bosch / Jesús Garay) e Gonzalvo III (Vergès / Flotats); Basora (Eulogio Martínez / Luis Suárez Miramontes), Ladislao Kubala, César Rodríguez (Ramón Villaverde / Sándor Kocsis), Tomás Moreno (Jordi Vila / Evaristo de Macedo) e Eduardo Manchón (Justo Tejada / Zoltán Czibor). Técnicos: Ferdinand Daucik (1950-1954), Sandro Puppo (1954-1955), Franz Platko (1955-1956), Domènec Balmanya (1956-1958), Helenio Herrera (1958-1960), Ljubisa Brócic (1960-1961) e Enrique Orizaola (1961).
“O nascimento de uma instituição sagrada”
Por Guilherme Diniz
De apenas um clube para mais que um clube. De pouco mais de 20 mil sócios para quase 53 mil. Quinze troféus memoráveis. Gols em profusão. Uma legião de craques. Ídolos marcantes. Construção de uma catedral futebolística para quase 100 mil fanáticos. E a transformação de uma cidade que viraria sinônimo de futebol e berço de um clube lendário. A década de 50 ficou marcada para sempre como a que traçou o caminho vitorioso do Futbol Club Barcelona para sempre. Foi a partir daquela época que o time da Catalunha despontou para o mundo como uma das mais poderosas e artísticas equipes de futebol que já existiu – e que segue encantando plateias até hoje. Com uma leva de jogadores fantástica e enorme vocação vencedora, o Barça conseguiu brilhar mesmo em tempos de pura magia do seu maior rival, o Real Madrid, que não se cansou de colecionar títulos continentais.
Mas, enquanto o time merengue se gabava por ter Santamaría, Di Stéfano, Kopa, Luís del Sol, Gento e Puskás, o Barça também ostentava nomes como Ramallets, Calvet, Segarra, Gonzalvo III, César Rodríguez, Basora, Luis Suárez, Kocsis, Czibor e o grande ídolo blaugrana daquela era: Ladislao Kubala, um húngaro que encantou centenas de aficionados e que inspirou o clube a deixar o estádio Les Corts para construir um templo digno da grandeza que o Barça atingia dia após dia: o Camp Nou. Mais do que tudo isso, aquele Barcelona virou para sempre um motivo de orgulho para os catalães e um símbolo de protesto contra o regime franquista da época. É hora de relembrar o primeiro super Barça da história.
A reconstrução pós-guerra
Nos difíceis anos 30, o Barcelona teve que superar guerras, conflitos civis e até o assassinato de seu presidente, Josep Suñol, em 1936, para sobreviver como clube. Com a Guerra Civil Espanhola em seu auge, o clube sofreu diversas perdas, viu o bombardeio aéreo de 1938 destruir grande parte de suas propriedades e seu quadro de associados cair de pouco mais de 15 mil para menos de 3 mil. Naquela década, o clube teve ainda que mudar de nome por imposição do regime para Club de Fútbol Barcelona, a fim de ter uma identidade mais espanhola, embora a alma barcelonista fosse catalã (o clube voltaria a se chamar FC Barcelona somente nos anos 70). Foi um milagre o clube não desaparecer naquela época e, após o período turbulento, os blaugranas se reergueram na década de 40.
Graças aos gols de César Rodríguez e o comando de Josep Samitier no banco de reservas, a equipe reconquistou o título do Campeonato Espanhol na temporada 1944-1945, taça que não ia para a Catalunha desde 1929. A prova de que os anos negros estavam no fim veio em 1949, quando o clube celebrou seu 50º aniversário vencendo seu primeiro título internacional: a Copa Latina, disputada contra clubes da França, Portugal, Itália e Espanha e vencida após vitória por 2 a 1 sobre o Sporting-POR na final. Com mais de 24 mil associados e os problemas deixados de lado, o Barcelona havia renascido. E pronto para uma nova e promissora década.
A chegada da estrela
Em 1950, o Barcelona contratou aquele que seria seu primeiro craque “arrasa multidões” e que serviria como exemplo para seus sucessores posteriores (tais como Johan Cruyff, Ronaldinho e Messi): Ladislao Kubala, um genial húngaro que havia gastado a bola em partidas na Espanha com o Hungária, clube que ele organizou junto com amigos para fazer excursões pelo continente e ganhar algum dinheiro após conflitos do atleta com a Federação Húngara de Futebol. Habilidoso, driblador e enorme artilheiro, Kubala assinou contrato com o Barça juntamente com seu cunhado, Ferdinand Daucik, que assumiu o comando técnico do clube. Após uma punição da FIFA, Kubala pôde estrear em 1951 e rapidamente chamou a atenção do público com seu futebol incisivo, inteligente e artístico. O estádio de Les Corts vivia lotado nas vezes em que Kubala jogava, algo que começava a chamar a atenção do visionário presidente Agustí Montal i Galobart, que mais tarde compraria um terreno para que o clube construísse um estádio maior que comportasse a quantidade de fãs que o Barça atraía.
Na temporada 1950-1951, o clube abriu o caminho dos títulos com a conquista da Copa do Rei (na época chamada de Copa del Generalíssimo) após bater Sevilla (5 a 1 no agregado), Tetuán (7 a 2 no agregado), Athletic Bilbao (2 a 1 no agregado) e a Real Sociedad na final, no estádio Chamartín, em Madrid, quando os mais de 70 mil torcedores viram a vitória blaugrana por 3 a 0, com dois gols de César e um de Gonzalvo III. Era a 10ª copa nacional do Barça. E apenas a primeira de uma década de ouro.
El Barça de las cinco Copas
A primeira grande temporada do Barça de Daucik e Kubala foi a de 1951-1952, lembrada até hoje pelos aficionados catalães como uma das melhores e mais emblemáticas do clube em todos os tempos. Com um time forte em todos os setores do campo e um ataque fulminante que tinha Basora, César, Moreno, Manchón e Kubala, o clube azul e grená venceu absolutamente todos os títulos que disputou naquele período. O Campeonato Espanhol foi a principal taça da temporada e foi vencido com 19 vitórias, cinco empates, seis derrotas, 92 gols marcados (melhor ataque) e 43 gols sofridos (melhor defesa) em 30 jogos disputados. A liderança foi alcançada justamente na reta final (23ª rodada) e não foi largada mais. Kubala foi o artilheiro do time com 26 gols em apenas 19 jogos, seguido de César, com 21. Durante a campanha, o húngaro fez incríveis sete gols na goleada de 9 a 0 sobre o Sporting de Gijón (recorde até hoje no torneio e compartilhado apenas com Agustín Sauto Arana, do Athletic Bilbao), cinco nos 6 a 1 contra o Celta de Vigo e dois hat-tricks contra Sevilla e Racing Santander.
Na Copa del Generalíssimo, o clube superou Atlético de Madrid (9 a 3 no agregado), Málaga (13 a 1 no agregado) e Real Valladolid (6 a 3 no agregado) até despachar o Valencia na decisão por 4 a 2, com gols de Basora, Vila, Kubala e César. Com o doblete, o time azul e grená venceu automaticamente a Copa Eva Duarte (disputada entre os vencedores da Liga e da Copa nacional, uma espécie de supercopa espanhola da época), e ainda faturou a Copa Latina ao vencer a Juventus-ITA (4 a 2) e o Nice-FRA, na final, com vitória por 1 a 0 (gol de César).
Após o título da Copa Martini Rossi (vitória por 2 a 0 sobre o Nice-FRA), a equipe acumulou incríveis cinco títulos em uma só temporada, o que deu ao clube o apelido de “El Barça de las cinco copas”. Com uma vocação ofensiva notável e um sistema defensivo bastante eficiente, o esquadrão do técnico Daucik já era um dos principais times da Espanha e também da Europa, que ainda não tinha um grande esquadrão após os brilhos do Sporting e do Torino nos anos 40. Jogando bem em qualquer território, os blaugranas estavam focados em ter esse protagonismo.
Novo doblete e mudanças
Na temporada 1952-1953, o Barça voltou a conquistar o Campeonato Espanhol com 19 vitórias, quatro empates, sete derrotas, 82 gols marcados (segundo melhor ataque) e 43 gols sofridos em 30 partidas. Por causa de uma tuberculose, Kubala perdeu grande parte dos jogos e o protagonismo no ataque ficou com Tomás Moreno, que anotou 22 gols e foi vice-artilheiro do torneio. Sem seu principal astro, o time pareceu que não teria forças para levantar a taça, mas a remontada aconteceu justamente quando o astro voltou a campo, em meados de fevereiro de 1953. Com isso, Valencia e Espanyol, que praticamente monopolizaram a liderança até a 26ª rodada, foram superados pelo Barça nas quatro últimas rodadas e viram a Liga escapar de suas mãos por muito pouco.
Com fome de títulos, a equipe ainda caminhou a passos largos rumo ao tricampeonato consecutivo da Copa del Generalíssimo. Nas oitavas, vitória por 5 a 0 e empate em 1 a 1 contra o Valencia, derrota por 1 a 0 e vitória por 3 a 0 sobre o Real Santander, nas quartas, e passeio por 8 a 1 e derrota por 2 a 1 para o Atlético de Madrid, nas semis. Na decisão, os catalães tiveram uma prova de fogo contra o forte Athletic Bilbao e sua formidável linha de frente conhecida como “la segunda delantera histórica” e composta por Panizo, Gaínza, Iriondo, Venancio e o estupendo Telmo Zarra. Mas a zaga barcelonista formada por Seguer, Biosca e Segarra conseguiu neutralizar os efeitos dos bascos e o Barça venceu por 2 a 1, com gols de Kubala e Manchón. Era mais um doblete para a coleção. E mais e mais adeptos ao quadro associativo do clube catalão.
Depois de anos de brilho, o clube passou por uma temporada complicada em 1953-1954. A Liga acabou ficando com o Real Madrid (que levou de 5 a 1 do Barça em Les Corts, mas deu o troco em Madrid, com um 5 a 0) e a Copa nacional foi perdida para o Valencia, que venceu os comandados de Daucik por 3 a 0 na decisão. Kubala sofreu uma grave lesão naquela temporada que o tirou de combate por vários meses e César Rodríguez começou a cair de produção. Para o lugar dele, o clube trouxe Luis Suárez, prodígio que havia se destacado no La Coruña, e o uruguaio Villaverde. Além deles, os blaugranas planejavam a contratação de Alfredo Di Stéfano após tratar da negociação com o River Plate-ARG. No entanto, como o jogador estava atuando pelo Millonarios-COL sem permissão da FIFA, o Real Madrid entrou na jogada e negociou o jogador com o clube colombiano. A Federação Espanhola teve que intervir e propôs que Di Stéfano jogasse um ano em cada clube, solução negada pelo Barça e que beneficiou unicamente o Real, que ganhou exclusivamente para si um dos maiores jogadores de todos os tempos – e que mudaria a própria história do clube merengue nos anos seguintes.
Em 1954, o clube passou por eleições após a renúncia do presidente Enric Martí e Francesc Miró-Sans foi eleito o presidente com 311 votos de vantagem. Uma das primeiras atitudes do novo mandatário foi substituir o técnico Ferdinand Daucik, que havia tido algumas desavenças com o elenco, por Sandro Puppo, que não conseguiu levar o Barça a novos títulos. Em compensação, foi em 1954 que o clube começou a construção de seu novo estádio: o Camp Nou, que recebeu sua “primeira pedra” em março daquele ano. O novo estádio era uma promessa de campanha de Miró-Sans e algo extremamente necessário na época pelo fato de o clube aumentar em mais de 100% seu número de associados ao longo dos anos, que passou de 26.300 para 52.791, e pela quantidade de adeptos que sempre lotavam o Les Corts, que comportava 60 mil torcedores e mesmo assim era tido como “acanhado”.
O início da Copa de Feiras e a inauguração do Camp Nou
Em 1955, o Barcelona começou a disputar uma nova competição continental: a Copa das Cidades com Feiras, torneio organizado por executivos da FIFA, da Football Association e da Federação Italiana de futebol que teria a participação de equipes que representassem as cidades europeias que abrigavam feiras de comércio: Barcelona, Basileia, Birmingham, Copenhague, Frankfurt, Lausana, Leipzig, Londres, Milão e Zagreb. O torneio, criado pouco antes da Liga dos Campeões da UEFA, seria o embrião do que viria a ser a Copa da UEFA (atual Liga Europa). A competição teve início em 1955 e seria finalizada apenas em 1958 por causa da dificuldade em encontrar datas disponíveis para os jogos. O Barcelona iria representar sua cidade como ele mesmo, ao contrário de outras equipes que iriam fazer combinados com um misto de vários jogadores de determinados clubes – como o Londres XI, que teve atletas de Arsenal, Chelsea, Tottenham entre outros. As equipes que participaram daquela competição foram: Barcelona, Copenhague XI-DIN, Birmingham City-ING, Internazionale-ITA, Zagreb XI-CRO, Lausanne Sports-SUI, Leipzig XI-ALE, Londres XI-ING, Frankfurt XI-ALE e Basileia XI-SUI.
A estreia do Barça no torneio foi em dezembro de 1955, com vitória por 6 a 2 sobre os dinamarqueses do Copenhague XI. No jogo de volta, o empate em 1 a 1 classificou o Barça para a semifinal, na qual o time encarou o Birmingham City e perdeu o primeiro jogo por 4 a 3. Na volta, vitória por 1 a 0 e novo triunfo, por 2 a 1, na partida desempate. A vaga para a final foi carimbada e o adversário seria o Londres XI, forte equipe com nomes como Blanchflower, Jimmy Greaves, Bobby Smith, Johnny Haynes e Terry Medwin.
Antes de decidir a Copa de Feiras (as finais seriam apenas em 1958), o Barça passou por mudanças de treinadores (Puppo deu lugar a Franz Platko, em 1955, que foi substituído por Domènec Balmanya, em 1956), venceu a Pequena Copa do Mundo de clubes em julho de 1957, quando passou por Nacional-URU (4 a 0 e 3 a 2), Botafogo-BRA (3 a 0 e 2 a 2) e Sevilla-ESP (3 a 2 e 2 a 2), voltou a celebrar um título da Copa del Generalíssimo na temporada 1956-1957, após superar seus rivais com goleadas marcantes: 5 a 2 e 8 a 1 no Atlético de Madrid, 6 a 1 no Real Madrid (com quatro gols de Martínez) e duplo 5 a 1 na Real Sociedad.
Na final, Sampedro fez o gol do título contra o Espanyol e garantiu a festa em um ano especial para o clube, afinal, em setembro de 1957 foi inaugurado o Camp Nou, com o primeiro gol do estádio marcado pelo artilheiro Eulogio Martínez. Com capacidade inaugural para 93.053 pessoas, a catedral barcelonista seria ampliada tempo depois para 98.772 espectadores. Além de sua nova casa, o clube ainda reforçou o elenco com a vinda do brasileiro Evaristo de Macedo e de um novo e vitorioso técnico: Helenio Herrera. Era hora de voltar a reinar na Espanha. E brigar pelo protagonismo na Europa.
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Pioneirismo e rivalidade nas alturas
Na primeira final da Copa de Feiras, o Barcelona suportou a pressão das mais de 40 mil pessoas do Stamford Bridge, contra o Londres XI, e segurou um empate em 2 a 2. Na volta, no novíssimo Camp Nou e já com Helenio Herrera no comando, os catalães massacraram os ingleses por 6 a 0, com dois gols de Evaristo, dois de Suárez, um de Martínez e outro de Vergés. Era o reflexo direto do “mago” Herrera no banco, que dava ao time muito mais força ofensiva e liberdade para Suárez esbanjar sua categoria. A vitória deu ao clube blaugrana o título do torneio continental, que inspirou a equipe a vencer na temporada 1958-1959 mais um doblete. Na Copa del Generalíssimo, o time catalão passou pelo Murcia (3 a 2 no agregado), Gijón (6 a 0 no agregado), Real Betis Balompié (10 a 3 no agregado) e pelo rival Real Madrid na semifinal, com vitória blaugrana por 4 a 2 em pleno Santiago Bernabéu na ida e vitória por 3 a 1 na volta, com direito a shows de Luis Suárez, que marcou dois gols em cada jogo. Na decisão, Martínez, Kocsis (2) e Tejada fizeram os gols da goleada por 4 a 1 sobre o Granada.
Já o Campeonato Espanhol foi vencido com absoluta dominância: 24 vitórias, três empates, três derrotas, 96 gols marcados (melhor ataque) e 26 gols sofridos (melhor defesa). Evaristo, com 21 gols, e Tejada, com 18, foram os artilheiros do Barça no torneio e ajudaram a equipe a golear o Real Madrid em um dos jogos da competição por 4 a 0, com três gols do brasileiro e um do espanhol. Para coroar uma temporada brilhante, o time ainda venceu todos os seus compromissos pela Copa de Feiras, ao bater o Basel XI-SUI (2 a 1, fora, e 5 a 2, em casa), e a Internazionale-ITA, por 4 a 0, em casa, e 4 a 2, fora. As conquistas do Barça e seu notável brilho em solo europeu iam de frente com o igual sucesso do Real Madrid de Di Stéfano e Puskás, que colecionava taças na Liga dos Campeões da UEFA, mas não conseguia repetir o feito em casa justamente por causa do Barcelona.
Na temporada 1959-1960, os merengues tiveram a sonhada chance de dar o troco nos rivais quando a dupla se encontrou na semifinal da Liga dos Campeões, a primeira disputada pelo Barça na história. Calejado no torneio e buscando o pentacampeonato seguido, o time de Madrid venceu os dos jogos: 3 a 1, na ida, e 3 a 1, na volta, resultados que embalaram os merengues até a final. O revés doeu demais no orgulho catalão, afinal, aquele era o único torneio que o Barça jamais havia vencido na época. Mas, para compensar, o time faturou o bicampeonato espanhol em uma disputa acirrada com os madrilenos. Empatados em pontos, o título ficou com o Barça graças ao goal average. Durante a campanha, o equilíbrio ficou claro entre os rivais, com uma vitória para cada mandante nos confrontos diretos (2 a 0 para o Real, em Madrid, e 3 a 1 para o Barça, em Barcelona).
Sai Herrera, mas fica o título
O revés para o Real na Liga dos Campeões e as desavenças com Kubala fizeram com que Herrera deixasse o comando do Barcelona em 1960. Mas o argentino deixou o clube com a vaga na final da Copa de Feiras após continuar a boa campanha iniciada em 1958 e vencer o Belgrad XI-IUG, na semifinal, por 4 a 2 no placar agregado. Em março de 1960, o argentino comandou o Barça no primeiro jogo da final contra o Birmingham City-ING e segurou um empate sem gols. Na volta, o Barça não tinha mais Herrera, mas a essência manteve-se intacta: vitória por 4 a 1, com dois gols de Czibor, um de Martínez e outro de Coll. Era o bicampeonato do Barça na Copa de Feiras e a hegemonia na competição. Além disso, vários foram os elogios ao esquadrão blaugrana, que esbanjava talento e técnica em campo com craques que esbanjavam juventude, experiência, ousadia e competitividade.
Alegria e decepção na Liga
Como bicampeão espanhol, o Barcelona voltou a disputar a Liga dos Campeões da UEFA na temporada 1960-1961 e, após despachar o Lierse-BEL com um 5 a 0 no placar agregado, a equipe reencontrou o Real Madrid, então pentacampeão europeu e que jamais havia sido eliminado no torneio. Mas, como tudo sempre tem a primeira vez, os merengues não resistiram e perderam o duelo de volta, no Camp Nou, por 2 a 1 (gols de Evaristo e Vergés), após empate em 2 a 2 na partida de ida (dois gols de Suárez). O triunfo encerrou de vez a hegemonia dos madrilenos no torneio e fez a torcida catalã acreditar que era hora de seu clube vencer a velhinha orelhuda. Na sequência, o Barça passou pelo Spartak Hradec Krávolé-TCH (5 a 1 no agregado) e Hamburgo-ALE, após empate em 2 a 2 no agregado e classificação catalã por causa do saldo de gols.
Na decisão, os blaugranas tiveram pela frente o fortíssimo Benfica-POR de Coluna, José Águas e o técnico Béla Guttmann, em confronto disputado em Berna, na Suíça. O jogo foi tenso, cheio de grandes jogadas, mas o equilíbrio do time português falou mais alto. Os encarnados venceram por 3 a 2 e a Liga ficou com o Benfica. Mesmo com sua famosa linha de frente formada por Kubala, Kocsis, Evaristo, Suárez e Czibor, o Barça não conseguiu vencer os lusitanos. A equipe só encerraria o jejum de taças na principal competição europeia no longínquo ano de 1992.
Legado para a história
Após tantos títulos, grandes jogos e inesquecíveis acontecimentos, o Barcelona perdeu parte de sua força competitiva e viu os títulos diminuírem consideravelmente nos anos 60. A equipe só voltaria a brilhar a partir dos anos 70, com uma nova revolução protagonizada por Rinus Michels e Johan Cruyff. O que se viu dali para frente foi a consolidação do clube no cenário futebolístico mundial e dezenas e mais dezenas de títulos conquistados por uma legião de feras de todos os cantos do mundo. O Barcelona se tornou uma potência aclamada por todos e respeitada até mesmo pelos rivais, mas a torcida faz questão de lembrar, dia após dia, que tudo o que se vê no museu do clube e nos livros só foi possível graças aos títulos e aos trabalhos realizados pelos personagens que superaram problemas, um rival monstruoso e uma ditadura feroz para celebrar conquistas que valem por mil. Um esquadrão imortal.
Os personagens:
Antoni Ramallets: um mito no Barça, o goleiro chegou ao clube em 1946 e só saiu de lá aposentado, em 1962. Foram mais de 250 jogos com a camisa azul e grená, cinco troféus Zamora de melhor goleiro da Espanha e defesas que encantaram os torcedores. Seu único e pior momento na carreira foi justamente na final da Liga dos Campeões de 1961, quando marcou um gol contra que foi crucial para a derrota de seu time contra o Benfica. Triste, decidiu abandonar a carreira no ano seguinte. Mesmo assim, virou ídolo dos torcedores.
Juan Velasco: era o titular absoluto do time até a chegada de Ramallets. Foi um dos grandes goleiros do clube no final dos anos 40 e jogou de 1942 até 1956 no Barça.
Seguer: defensor de muito talento e com esporádicas presenças ofensivas, foi um dos pilares do Barça de las cinco copas que ganhou tudo o que disputou no começo dos anos 50. Jogou de 1943 até 1957 no clube catalão.
Francesc Calvet: ótimo defensor barcelonista dos anos 50, Calvet tinha personalidade e polivalência para atuar tanto na defesa quanto no meio de campo. Chegou ao clube após os tempos difíceis da guerra civil e escreveu seu nome com grandes atuações, ótimos desarmes e muita paixão pelo clube. jogou de 1939 até 1952, e deixou a equipe justo no início dos tempos de ouro, mas não antes de vencer o campeonato e a copa nacionais de 1951-1952.
Foncho: chegou ao Barça em 1960 e ficou até 1967. Era bom na jogada aérea e no desarme. Chegou a vestir a camisa da Espanha nas Eliminatórias para a Copa de 1962.
Biosca: com um físico privilegiado e muita classe, Gustau Biosca foi um dos principais defensores do Barça naquele começo de anos 50. Venceu 13 títulos com o clube azul e grená e fez fama também fora de campo, ao se tornar um dos primeiros futebolistas “midiáticos” da Espanha e conquistar várias fãs pelo país.
Gensana: jogou durante uma década no Barça, de 1956 até 1966, e cravou seu espaço com muita eficiência no setor defensivo e ótimos desarmes. Foi um dos principais astros do time nas conquistas do final da década de 50.
Ferran Olivella: com excelente senso de posicionamento e grande visão de jogo, Olivella foi outro ídolo do Barça e soberano tanto na lateral quanto no miolo de zaga. Foi o capitão da Seleção Espanhola campeã da Eurocopa de 1964 e se tornou um dos principais jogadores espanhóis da época.
Segarra: ídolo e considerado por muitos como o melhor defensor da história do clube, Joan Segarra foi o “grande capitão” e peça insubstituível do esquadrão blaugrana por mais de 10 anos. É um dos jogadores com maior número de jogos pelo clube (528 partidas) e fez carreira atuando em quase todas as posições da defesa e também no meio de campo. Marcador implacável, líder e com técnica apuradíssima, foi um craque marcante e jogou de 1949 até 1964 no Barça.
Cheché Martín: brilhou na zaga do Barça de las cinco copas e teve seu espaço com bons passes e grande senso de colocação. Jogou no clube de 1949 até 1953, até se transferir para o Atlético de Madrid.
Brugué: com boa estatura e envergadura, se destacava no miolo de zaga por sua qualidade no jogo aéreo e também nas saídas de bola. Joaquim Brugué Jogava de cabeça erguida e foi um dos pilares dos setor defensivo do time durante a década de 50. Venceu mais de uma dezena de títulos pelo clube.
Gràcia: soberano do setor esquerdo do Barça no final dos anos 50, Sigfrid Gràcia deixava a alma em campo com sua bravura e regularidade. Era muito elogiado pelos companheiros pelo profissionalismo e compensava a falta de técnica com muita raça.
Gonzalvo III: com uma visão de jogo fantástica e exímio controle de bola, Gonzalvo III era o dono do meio de campo daquele grande Barça dos anos 50. A bola sempre passava pelos seus pés e muitos gols foram originados graças a ele e também por ele. Jogou de 1942 até 1955 no Barça e virou um ídolo para muitas e muitas gerações.
Vergès: outro futebolista de muito talento, Martí Vergès passou uma década no Barça e venceu oito títulos pelo clube. suas maiores contribuições foram nas taças das Copas de Feiras de 1958 e 1960 e ainda no bicampeonato espanhol de 1959 e 1960. Atuava no meio de campo e costumava aparecer como elemento surpresa no ataque.
Flotats: não foi titular absoluto, mas atuou em várias partidas do Barça entre 1953 e 1960 como meio-campista. Ficou famoso por sempre sufocar Di Stéfano com sua marcação cerrada nos clássicos contra o Real Madrid.
Andreu Bosch: meio-campista com boa presença no ataque, jogou no Barça por quase uma década e disputou mais de 200 partidas com a camisa blaugrana. Costumava se mandar ao ataque para marcar gols (fez mais de 30). Só não foi titular absoluto por causa da concorrência com Segarra, Gonzalvo III e Vergès.
Jesús Garay: zagueiro e volante, o atleta chegou ao Barça em 1960, após uma década de serviços prestados ao Athletic Bilbao, onde foi ídolo. Em Barcelona, Garay já não tinha a qualidade e o vigor de antes, mas contribuiu para a boa campanha do time na Liga dos Campeões de 1960-1961.
Basora: é considerado um dos principais pontas da história do futebol espanhol e também do Barcelona. Jogou de 1946 até 1958 no clube e entortou diversos marcadores com sua habilidade e imensa velocidade para fugir dos rivais. Marcou 89 gols no Campeonato Espanhol enquanto jogou no Barça e fez uma parceria memorável com César Rodríguez.
Eulogio Martínez: com uma capacidade incrível de finalização ao gol e muita habilidade, o paraguaio foi um dos principais artilheiros do clube naquele final de anos 50 e fez a alegria da torcida catalã. É dele o recorde de sete gols marcados em um só jogo por um jogador do Barça na história da Copa do Rei, quando ele contribuiu para a goleada de 8 a 1 sobre o Atlético de Madrid na temporada 1956-1957. Martínez marcou 168 gols em 225 jogos pelo Barça entre 1956 e 1962.
Luís Suárez Miramontes: simplesmente uma lenda no Barcelona, Luisito foi o primeiro (e único) jogador espanhol a vencer a Bola de Ouro de melhor jogador da Europa e marcou época com gols, grandes atuações e muitos títulos pelo clube. Leia mais sobre ele clicando aqui.
Ladislao Kubala: patrimônio do Barcelona a ponto de receber uma estátua no Camp Nou, Kubala teve uma das carreiras mais impressionantes do futebol mundial. É claro que o Imortais já contou essa história. Leia mais clicando aqui.
César Rodríguez: legítimo centroavante fazedor de gols, César ostentou por muitos anos o recorde de gols na história do Barcelona até surgir um tal de Messi. Com cabeçadas fulminantes e notável presença de área, César foi um terror para os adversários nos anos 40 e 50. O arisco atacante marcou 232 gols em 351 jogos oficiais pelo Barça, façanha que o coloca na vice-liderança no ranking geral do clube em todos os tempos, sendo 192 gols no Campeonato Espanhol.
Ramón Villaverde: o uruguaio chegou na metade dos anos 50 após brilhar no futebol colombiano e foi uma das armas de ataque do Barça para as glórias daquela era de ouro. Com chutes poderosos, boa visão de jogo e habilidade, foi ótimo como meia ou ponta. Jogou quase uma década no Barça e foi ídolo da torcida.
Sándor Kocsis: chegou ao Barça após se consagrar como uma estrela mundial vestindo a camisa da Hungria na Copa do Mundo de 1954. Embora tenha jogado por pouco tempo no clube, encantou os catalães com suas notáveis cabeçadas e grande presença de área. Leia mais sobre ele clicando aqui.
Tomás Moreno: outro atacante habilidoso e veloz, Moreno fez parte do timaço blaugrana do começo dos anos 50 e marcou vários gols ao lado de César, Kubala, Manchón e Cia. Jogou de 1951 até 1955 no Barça.
Jordi Vila: esquecido por vários historiadores, Vila teve muita importância para o “Barça de las cinco copas” principalmente por ter sido titular no lugar de Moreno em vários jogos da temporada que deu ao clube as famosas cinco taças. Na Copa do Rei, Vila marcou gols em todos os jogos da campanha do título (nove gols em sete jogos) e anotou 31 gols em 45 jogos com a camisa do clube entre 1950 e 1954.
Evaristo de Macedo: um dos principais atacantes brasileiros dos anos 50, Evaristo vinha de grandes temporadas no Flamengo quando chegou ao Barcelona. Na Catalunha, continuou a marcar gols em profusão com sua velocidade e grandes dribles e fez uma dupla memorável com Eulogio Martínez. Jogou no Barça de 1957 até 1962 e marcou 181 gols em 237 jogos.
Eduardo Manchón: pela esquerda, criava várias chances de gols e dava vários para os companheiros naquele começo de anos 50. Habilidoso, o baixinho marcou 81 gols em 201 jogos pelo Barça entre 1950 e 1957.
Justo Tejada: rápido, técnico e com faro goleador, foi mais um atacante de pura qualidade no Barcelona entre 1953 e 1961. Mesmo com a concorrência no setor, teve destaque com seus gols decisivos e brilhantes atuações nos títulos das Copas das Feiras e dos campeonatos nacionais de 1959 e 1960.
Zoltán Czibor: outra estrela húngara, Zoltán Czibor foi um dos maiores jogadores de seu tempo e uma das estrelas da Hungria na Copa de 1954. Tinha extrema habilidade, exímio controle de bola, chutes poderosos e muita velocidade pela ponta-esquerda. Jogou pouco tempo no Barça, de 1958 até 1961, mas o suficiente para encantar as plateias no Camp Nou.
Ferdinand Daucik, Sandro Puppo, Franz Platko, Domènec Balmanya, Helenio Herrera, Ljubisa Brócic e Enrique Orizaola (Técnicos): com Daucik o Barcelona começou a mostrar a vocação ofensiva que o faria vencedor durante a década de 50 e foi graças a ele que Kubala jogou tudo o que sabia naquela primeira metade da década. Após sua saída, o clube perdeu um pouco o foco, voltou a vencer com Balmanya, mas a retomada em grande estilo veio com Helenio Herrera, que fez do clube conhecido na Europa inteira após o bicampeonato da Copa de Feiras. Com o argentino, o Barcelona cresceu não só em qualidade tática, mas também em competitividade e na arte de atazanar o rival Real Madrid em vários embates históricos. Os outros comandantes do período tiveram sua importância, claro, mas passaram longe do brilho de Daucik e Herrera, os grandes expoentes daquele Barça imortal.
Leia mais sobre a carreira de Helenio Herrera clicando aqui.
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Esse Barcelona é melhor que o de 1988-1992??
Na minha opinião, sim, Cleiton.
História linda desse time. 3º melhor time da década de 50(só atrás de Hondved e Real Madrid). Mas os clássicos com o Real Madrid eram pura nostalgia. O ápice do El Clássico, melhor que atualmente com CR7 vs Messi. A partir de 1955, o Barça era o único que conseguia vencer e fazer frente com o Madrid Franquista.
E pensar que o Corinthians enfrentou este time por duas vezes, em 1953. E venceu ambas!
E tem gente q diz que o Barcelona era prejudicado nos campos por causa do Franco.Chegava até a vencer aquele maravilhoso Real.
Muito bom esse esquadrao,ta cada vez melhor esse blog.