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Esquadrão Imortal – Partizan 1961-1966

Foto: Ron Kroon / Anefo
Partizan 1966
Em pé: Hasanagic, Pirmajer, Mihajlovic, Soskic, Vasovic e Rasovic. Agachados: Jusufi, Becejac, Kovacevic, Bajic e Galic. Foto: Ron Kroon / Anefo
 

Grandes feitos: Tetracampeão do campeonato iugoslavo (1960–61, 1961–62, 1962–63, 1964–65) e Vice-campeão da Liga dos Campeões da UEFA (1965-1966). Foi o primeiro clube na história a vencer três títulos iugoslavos consecutivos.

Time-base: Soskic (Curkovic); Jusufi, Rasovic e Ljubomir Mihajlovic (Damjanovic); Becejac e Vasovic (Mitic / Cebinac); Bajic (Vukelic), Kovacevic (Miladinovic / Kaloperović), Galic e Pirmajer (Vislavski); Hasanagic. Técnicos: Stjepan Bobek (1961-1963), Kiril Simonovski (1963), Marko Valok (1963-1964 e 1965), Florijan Matekalo / Aleksandar Atanackovic (1964) e Abdulah Gegic (1965-1966).

 

“The Partizan’s Babies”

Por Guilherme Diniz

Com apenas 15 anos de história, o Partizan entrou na década de 1960 disposto a acabar com a seca de títulos que vivia desde 1949, ano de seu último caneco no campeonato nacional. E foi após a mudança de identidade e até de uniforme vivida no final dos anos 1950 que o clube de Belgrado iniciou o mais emblemático período de sua história. Com um time formado majoritariamente nas categorias de base e atletas muito identificados com o clube, o Partizan se tornou o primeiro a emendar três títulos seguidos do Campeonato Iugoslavo, façanha alcançada em 1961, 1962 e 1963. Por ser uma equipe jovem e feita em casa, aquele esquadrão ficou conhecido como “partizan’s babies” (os bebês de Partizan), em alusão aos Busby Babes do Manchester United da década de 1950.

Mais do que isso, a equipe fez história na então Copa dos Campeões – atual Liga dos Campeões da UEFA – de 1965-1966 e chegou à final depois de eliminar grandes rivais, incluindo o Sparta Praga com uma virada espetacular de 5 a 0 após ter perdido por 4 a 1 o duelo de ida! O título continental não veio – o Real Madrid acabou com o troféu, pra variar… -, mas aqueles anos 1960 foram especiais para o Partizan e sua torcida, que viu o apogeu de ídolos como Milutin Šoškić, Fahrudin Jusufi, Jovan Miladinović, Milan Galić, Kovacevic, Hasanagic entre outros. É hora de relembrar.

Um novo clube

O Partizan foi fundado em 1945, bem no final da Segunda Guerra Mundial, como time do JNA (Jugoslovenska Národná Armijo), o Exército Popular Iugoslavo. Em linha direta, o termo Partizan significa “grupo organizado em um partido político”, por isso, o clube sempre teve muita participação dos soldados iugoslavos e identificação com a frente libertadora que combateu a invasão alemã naquele fim de guerra contra as forças do Eixo nos Balcãs. A ideia do Partizan era ser a maior força do país e, por isso, o clube nunca mediu esforços para ter os melhores jogadores. E matéria-prima nunca foi problema, afinal, a Iugoslávia compreendia o que hoje conhecemos como Sérvia, Croácia, Bósnia e Herzegovina, Macedônia do Norte, Montenegro e Eslovênia. Ou seja, havia muita gente boa para vestir a camisa não só da seleção, mas também do Partizan. 

Graças aos ensinamentos do técnico Illés Spitz, o clube rapidamente formou um grande time e, na temporada 1946-1947, faturou o título do Campeonato Iugoslavo com cinco pontos de vantagem sobre o Dinamo Zagreb, além de 77 gols marcados e míseros 17 gols sofridos em 26 jogos. O grande nome daquela equipe era o atacante Stjepan Bobek, autor de 26 gols na campanha do título daquele ano e que rapidamente virou ídolo da ainda pequena torcida do clube.

Em 1948-1949, o Partizan levantou o bicampeonato, mas não conseguiu manter a sina vencedora na década de 1950, época dominada pelo ótimo Hajduk Split, vencedor de três títulos; pelo Estrela Vermelha, campeão de seis canecos; e Dinamo Zagreb, vencedor dos outros dois troféus. Nesse período, o Partizan obteve conquistas na Copa da Iugoslávia (1952, 1954 e 1957) e também fora de campo, com a construção de seu estádio, o Estádio do Exército Popular Iugoslavo.

Antigo escudo do Partizan, antes das mudanças de cores.
 

Ainda nos anos 1950, o Partizan se fez conhecido na Europa ao participar da recém-criada Copa dos Campeões Europeus, cuja primeira edição foi realizada em 1955-1956. O clube iugoslavo eliminou o Benfica na primeira fase, e, na etapa seguinte, quase conseguiu “cortar pela raíz” a sintonia do Real Madrid com a competição. É que, nas quartas de final, o time iugoslavo perdeu por 4 a 0 para os merengues, em Madri, e venceu por 3 a 0 a volta, em Belgrado, em jogo com gramado coberto pela neve e no qual até Di Stéfano teve que ajudar na defesa merengue diante da força ofensiva dos iugoslavos. Só faltou um golzinho para o duelo ficar empatado no agregado. Como consolação, Milos Milutinovic, com 8 gols, foi o artilheiro da primeira UCL.

O duelo Partizan 3×0 Real Madrid de 1956 teve muita neve, -20ºC de temperatura e ainda sim mais de 40 mil pessoas no JNA Stadium!
 

Em 1957, após uma excursão pela América do Sul, o Partizan enfrentou em uma das partidas a Juventus-ITA e o presidente da equipe bianconeri na época, Umberto Agnelli, presenteou a diretoria iugoslava com dois conjuntos de uniformes da equipe italiana. Imediatamente, os membros do clube e até os jogadores adoraram a combinação de cores branco e preto e sugeriram que elas fossem a nova identidade do Partizan. Dito e feito: o clube trocou a partir de 1957 o azul e vermelho pelo branco e preto. Bobek, jogador do Partizan na época, comentou sobre essa curiosidade.

“Eu sugeri a troca de camisas em nome de todo o time, para o secretário geral do clube, Artur Takač. Tudo aconteceu enquanto estávamos em turnê pela América do Sul, após um amistoso contra a Juventus, em 1957. Ganhamos de presente dois conjuntos de camisas deles, pois eles ficaram encantados com o nosso jogo. Todos os jogadores ficaram emocionados com a qualidade e a cor dos novos uniformes, e me pediram para usá-los o tempo todo, o que aconteceu no final, e as cores do Partizan permaneceram preto e branco até hoje”. 

O primeiro caneco

Bobek, ídolo do Partizan e técnico naquele início de hegemonia.
 

Falando em Bobek, o ídolo pendurou as chuteiras em 1959 e, já em 1960, aceitou o desafio de treinar o Partizan na temporada 1960-1961. Conhecendo tudo sobre o clube e os jogadores, Bobek deu ainda mais chances para os jovens e conseguiu formar um time muito forte tanto na parte defensiva quanto na ofensiva. Milutin Šoškić, Fahrudin Jusufi, Jovan Miladinović, Velibor Vasović, Milan Galić, Ilija Mitić, Zvezdan Čebinac e Vladica Kovačević foram a primeira espinha dorsal do time. Na sequência, Lazar Radović, Velimir Sombolac, Ljubomir Mihajlović e Mustafa Hasanagić conseguiram seus espaços, até Ivan Ćurković, Josip Pirmajer, Branko Rašović e Radoslav Bečejac completarem o elenco que venceria títulos históricos na década que chegava. Vale lembrar que quatro atletas do Partizan – Jusufi, Galic, Sombolac e Soskic – estavam na seleção da Iugoslávia campeã olímpica de futebol nos Jogos de 1960, em Roma. Galic, inclusive, foi o artilheiro da competição com 7 gols.

Soskic (à dir.), goleirão do Partizan.
 
Ljubomir Mihajlovic, grande nome dos alvinegros.
 

E o fim da fila do Partizan no Campeonato Iugoslavo teve muita emoção. Do início ao fim, os alvinegros duelaram com o Estrela Vermelha e o Hajduk Split pelo topo da tabela. Por isso, a obrigação foi vencer a maior quantidade de jogos possíveis dentro de casa. E o time de Belgrado cumpriu sua missão com goleadas marcantes, em especial os 4 a 0 sobre o Hajduk e os 3 a 0 sobre o rival Estrela Vermelha. O único tropeço foi o empate em 1 a 1 contra o Dinamo Zagreb. No mais, foram 10 vitórias em casa, além de cinco triunfos fora de casa e um precioso empate sem gols contra o Hajduk, em Split. 

Ao final das 22 rodadas, o Partizan foi campeão com 15 vitórias, dois empates, cinco derrotas, 53 gols marcados (melhor ataque) e 23 gols sofridos. O time somou 32 pontos, seguido pelo Estrela Vermelha (31 pontos) e Hajduk Split (30 pontos). Milan Galic, com 14 gols, foi o artilheiro dos alvinegros. Na temporada seguinte, o Partizan ganhou uma vaga na Copa dos Campeões da Europa e despachou o Sporting-POR na primeira etapa após empate em 1 a 1 na ida, em Lisboa, e vitória por 2 a 0 em casa. Nas oitavas de final, porém, os iugoslavos não conseguiram superar a Juventus, que venceu tanto o duelo da ida (2 a 1, em Belgrado), quando na volta, em Turim (5 a 0). 

A dinastia alvinegra

Em pé: Vislavski, Slišković, Šoškić, Jončić, Jusufi e Kovačević. Agachados: Rudinski, Vasović, Galić, Vukelić e Sombolac.
 

O tropeço precoce no âmbito continental deu mais tempo para o Partizan voltar suas atenções ao Campeonato Iugoslavo. E o time foi mais dominante do que na época anterior ao conquistar o título de 1961-1962 com cinco pontos a mais do que o vice-campeão, o Vojvodina. Em 22 jogos, o Partizan venceu 13, empatou cinco e perdeu quatro, com 42 gols marcados (melhor ataque) e 22 gols sofridos (2ª melhor defesa). Mais uma vez o time de Belgrado venceu os principais jogos em casa e somou preciosos pontos fora. Um dos destaques foi a vitória por 4 a 0 sobre o Hajduk Split, além dos 2 a 0 sobre o Dinamo Zagreb. Nos duelos contra o rival Estrela Vermelha, o Partizan empatou ambos (0 a 0 e 1 a 1). O goleador do time na temporada 1961-1962 foi Vladimir Kovacevic, com 15 gols, apenas um a menos do que Drazan Jerkovic, do Dinamo Zagreb.

Na temporada 1962-1963, o Partizan alcançou um histórico e inédito tricampeonato consecutivo no Campeonato Iugoslavo ao somar 40 pontos em 26 jogos, na primeira edição com 14 clubes. O Dinamo Zagreb, vice-campeão, somou 35 pontos. Os alvinegros venceram 16 jogos, empataram oito e perderam apenas dois. Foram 58 gols marcados (melhor ataque) e 22 gols sofridos (melhor defesa). Galic, com 16 gols, e Kovacevic, com 15, foram os artilheiros do Partizan.

A competição ficou marcada pela goleada de 5 a 0 que o time aplicou no Estrela Vermelha em plena casa alvirrubra! Os gols foram de Galic (3) e Vislavski (2). Aquela foi a terceira grande goleada do Partizan na história do dérbi, que se juntaram aos 6 a 1 de junho de 1951 e aos 7 a 1 de dezembro de 1953. O tri fez aquele esquadrão ficar conhecido como Parni valjak (Rolo Compressor), por ter vencido com muita autoridade seus principais rivais e, claro, pela dominância absoluta no torneio nacional. O único ponto negativo da temporada 1962-1963 foi a pífia campanha na Copa dos Campeões, na qual o Partizan foi eliminado logo na primeira fase pelo CSKA Sofia-BUL.

Mudanças e mais mudanças

Após o tricampeonato nacional, o técnico Stjepan Bobek deixou o comando dos alvinegros para dirigir o Legia Warsaw e, na sequência, o Panathinaikos. Kiril Simonovski assumiu o time em algumas partidas até a chegada de Marko Valok, ex-jogador do Partizan e grande carrasco do Estrela Vermelha. Valok comandou o Partizan até 1964, mas não conseguiu o tetracampeonato – a equipe terminou apenas na 5ª colocação e viu o Estrela Vermelha reconquistar o título. Na Copa dos Campeões de 1963-1964, o Partizan superou as duas primeiras fases, mas foi eliminado nas quartas de final para a campeã Internazionale.

As mudanças na área técnica continuaram em 1964 e Florijan Matelako, notável por seu trabalho nas categorias de base do Partizan nos anos 1950, assumiu o lugar de Valok. Acontece que, naquela temporada 1964-1965, o Partizan ainda teria mais duas mudanças técnicas, incluindo o retorno de Marko Valok em março de 1965. Isso atrapalhou o ritmo tático do time, que passou até por uma divisão no elenco, em uma história complicada que vamos contar a seguir.

O racha

Quando a temporada de 1964-65 começou, o Partizan era comandado por Aleksandar Atanacković e liderava o Campeonato Iugoslavo, mas a cada semana o conflito no conselho administrativo afetava diretamente as relações entre os jogadores. Em dezembro de 1964, antes da última partida da liga para a pausa de inverno, dois grupos opostos emergiram dentro do clube: um apoiava o secretário-geral dissidente Radojica Nenezić, era liderado por Jusufi e incluía também Milan Galić, Radoslav Bečejac, Joakim Vislavski e o treinador Atanacković. O outro apoiava o presidente Radaković, era liderado por Vasović e incluía Vladica Kovačević, Zoran Miladinović e vários jogadores jovens. 

Os atletas Milutin Šoškić, Ivan Ćurković, Josip Pirmajer e Branko Rašović permaneceram neutros. O grupo dissidente chegou até a iniciar um motim, recusando-se a viajar para Skopje para a última partida da primeira metade da temporada contra o FK Vardar. Vendo que estava sem metade da equipe, junto com o treinador Atanacković, o presidente Radaković entregou o time a Mile Kos para aquela partida. Em circunstâncias difíceis, Kos conseguiu reunir onze jogadores, e o Partizan manteve a liderança da liga quando a pausa de inverno começou. 

No dia seguinte ao fiasco em Skopje, o treinador Atanacković foi demitido, e as duas facções se prepararam para o confronto final na assembleia geral do clube, marcada para janeiro de 1965, na Faculdade de Direito da Universidade de Belgrado. Na assembleia, os dois grupos de jogadores se reconciliaram. Mesmo assim, o caso chegou aos mais altos escalões de poder na Iugoslávia, pois o general Ivan Gošnjak, que reportava diretamente ao marechal Tito, tomou conhecimento dos problemas causados pelos generais da JNA dentro da administração do Partizan. Quando Tito soube disso, ele agiu rapidamente, ordenando medidas contra cada oficial envolvido no conflito, transferindo-os para outros locais. O general Radaković foi transferido para a Eslovênia, enquanto o general Radojica Nenezić foi designado para Skopje. Vladimir Dujić, um civil, tornou-se o novo presidente do clube. E as funções de treinador do time principal foram entregues novamente a Marko Valok.

Meses depois, o Partizan jogou um amistoso contra o Milan-ITA e a partida ficou famosa após o defensor Vasović entrar em uma briga feia com o peruano Víctor Benítez, do Milan, o que provocou uma briga generalizada entre os jogadores dos dois times. Embora desagradável, essa confusão ajudou a solidificar o espírito de equipe do “recém-unificado” Partizan. Esse fato ajudou os jogadores a tomarem para si a responsabilidade e o grupo fez questão de brigar até o fim pelo título nacional e não deixar a concorrência aproveitar aquela instabilidade política e diretiva dos alvinegros.

Enfim, campeões!

Hasanagic começou a se transformar em uma máquina de gols a partir de 1965.
 

A campanha do Partizan na temporada 1964-1965 mostrou um time extremamente ofensivo e que envolvia os adversários em seu próprio campo. Por isso, os alvinegros conquistaram mais um título iugoslavo com uma enorme vantagem para o vice-campeão: 8 pontos. Em 28 jogos, o Partizan venceu 19, empatou cinco, perdeu quatro, marcou 62 gols (melhor ataque, disparado) e sofreu 34. Galic (15 gols), Kovacevic (14 gols) e Hasanagic (13 gols) dominaram a artilharia do time naquela temporada. O Partizan só ficou dois jogos sem marcar gols e ainda goleou vários rivais tanto em casa quanto fora. Nos duelos diretos, o time perdeu em casa para o vice-campeão Sarajevo (1 a 0), mas venceu na casa do adversário por 5 a 4, empatou fora e perdeu em casa para o Estrela Vermelha e venceu em casa e perdeu fora para o Rijeka (4º colocado).

Foco total na Europa

Partizan 1961-1966
Em pé: Popescu (Preparador), Ćurković, Mihajlović, Rasović, Šoškić, Pirmajer, Vasović, Hasanagić e Gegić (Técnico). Agachados: Bajić, Kovačević, Jusufi, Galić e Bečejac.
 

Após mais um título nacional, o Partizan traçou como meta principal uma boa campanha na Copa dos Campeões. Com um elenco já experiente e competitivo, era hora de o time ir mais longe e, quem sabe, brigar pelo troféu. Na temporada 1965-1966, outra mudança de comando ocorreu e Abdulah Gegić, ex-membro da comissão técnica da seleção da Iugoslávia, assumiu o Partizan com o objetivo de conduzir o time na trajetória europeia e no Campeonato Iugoslavo, que teria naquele ano 30 clubes. Em solo nacional, porém, o Partizan não foi bem e terminou apenas na 11ª colocação. A competição acabou manchada por um esquema de manipulação de resultados envolvendo três clubes, punidos com a perda de cinco pontos. 

Já na Copa dos Campeões, o clube alvinegro foi totalmente outro. Na primeira fase, os iugoslavos enfrentaram o Nantes-FRA e venceram o primeiro jogo, em casa, por 2 a 0 – gols de Galic e Hasanagic. Na volta, o Nantes abriu o placar, mas Kovacevic, de pênalti, empatou. No começo do segundo tempo, Galic virou e Blanchet empatou, mas o placar de 2 a 2 classificou o Partizan para as oitavas de final.

Milan Galic, um dos principais nomes ofensivos do time.
 

O rival seguinte foi o Werder Bremen-ALE, que não resistiu à força do Partizan em sua casa: 3 a 0, gols de Jusufi, Hasanagic e Pirmajer. Na volta, a derrota por 1 a 0 não atrapalhou a caminhada dos iugoslavos, que tiveram pela frente o Sparta Praga-TCH. No primeiro jogo, em Praga, o Partizan até saiu na frente do placar com um gol de Hasanagic, aos 16’, mas os tchecoslovacos empataram quatro minutos depois e viraram o jogo para 4 a 1 no segundo tempo. O placar foi um desastre. E só não foi pior por causa do gol de honra de Hasanagic, que ainda dava a possibilidade ao Partizan de vencer por 3 a 0, já que na época valia o gol qualificado.

A virada histórica e o encontro com o Manchester United

A torcida do Partizan abraçou o time para a virada e mais de 50 mil pessoas lotaram o JNA Stadium no dia 09 de março de 1966, em um dos maiores públicos do estádio na época. E os presentes viram simplesmente um show do Partizan e uma das maiores viradas da história da Copa dos Campeões! O primeiro gol saiu aos 4’, em tabela na área concluída por Kovacevic. Aos 23’, Vasovic, em sobra na pequena área, fez 2 a 0. Kovacevic fez o terceiro gol seis minutos depois e, aos 35’, Hasanagic fez o quarto, em lindo toque por cobertura. 

O atacante ainda marcou o quinto gol, aos 71’, e fez o sexto gol tempo depois, de voleio, após tabela de três toques de cabeça dentro da área dos tchecoslovacos, mas infelizmente este foi anulado pelo árbitro… Mas tudo bem, o massacre já estava consolidado: 5 a 0. Foi um show histórico, que fez com que os atletas do Partizan fossem carregados por torcedores em puro delírio após o apito do árbitro, como se o time tivesse sido campeão. Era a primeira vez que os alvinegros alcançavam uma etapa semifinal de Copa dos Campeões. Mas eles queriam mais. 

Partizan x Manchester United, no primeiro duelo, em Belgrado. Foto: Getty Images / Acervo The Telegraph
 
Uma das formações do Partizan: time alternava 4-2-4 com o 3-2-4-1 em determinados jogos.
 

O último desafio antes da final foi o Manchester United-ING, que disputava a Copa dos Campeões pela primeira vez desde 1958, ano do fatídico acidente aéreo com os Busby Babes. E, curiosamente, o rival dos Red Devils antes do acidente havia sido um clube iugoslavo, na ocasião o Estrela Vermelha. A primeira partida foi na casa do Partizan, que também foi palco do duelo dos Busby Babes contra o Estrela Vermelha lá em 1958. O jogo teve uma carga emocional muito grande para os ingleses, que apostavam no talento de Foulkes, Stiles, Bobby Charlton e Denis Law para superar os 60 mil torcedores iugoslavos. Só que, em casa, o Partizan era muito, muito forte. Atacava demais, sufocava os rivais. E não levava gols.

Com a bola rolando, Hasanagic, logo no primeiro minuto do segundo tempo, fez 1 a 0. E Becejac, aos 58’, fez 2 a 0. Foi o suficiente para os iugoslavos irem até Old Trafford com a vantagem do empate e de até perder por um gol. Na volta, o United abriu o placar só aos 72’, com Stiles, mas o Partizan se segurou – o defensor Rasovic fez uma partidaça! – e garantiu uma histórica vaga na decisão continental! O problema era o adversário que eles teriam pela frente: o Real Madrid, pentacampeão europeu nos anos 1950 e sem levantar o troféu desde 1960…

Doloroso vice e o fim

A final de 1966 foi disputada em Heysel, na cidade de Bruxelas (BEL). O Partizan foi a campo com seus principais jogadores e disposto a levantar pela primeira vez um torneio continental. Só que o rival dos iugoslavos era o Real Madrid, que tinha um elenco que mesclava experiência e juventude e via nos craques Francisco Gento, Amancio Amaro, Manuel Sanchís, Ignacio Zoco e Pirri os expoentes para acabar com a seca de troféus em sua competição preferida – os merengues vinham de raras duas derrotas em finais europeias, em 1962 (Benfica) e 1964 (Internazionale).  

A partida foi muito equilibrada e, após um primeiro tempo sem gols, o líbero Vasovic marcou o primeiro gol do jogo, aos 55’. Era emblemático o jogador ser o autor do tento por conta da recente saia-justa pela qual ele havia passado no clube. É que em 1963, Vasovic trocou o Partizan pelo Estrela Vermelha, algo que enfureceu a torcida alvinegra e lhe rendeu até ameaças de morte (!). O defensor acabou ficando apenas seis meses no Estrela e foi recontratado pelo Partizan, a contragosto do Estrela. Sua chegada ao Partizan, inclusive, teve alguns dissabores com atletas do elenco alvinegro, que acusaram Vasovic de chantagem só para ganhar mais dinheiro, um clima hostil que só foi amenizado após o já citado amistoso contra o Milan.

Vasovic, autor do gol na final.
 

A vitória por 1 a 0 deixava o Partizan muito próximo do título europeu e, a cada minuto, a chance de fazer história somada a tudo o que eles haviam passado na temporada anterior parecia consumir os pensamentos dos atletas. Só que eles se esqueceram que do outro lado estava o Real Madrid, clube que em finais europeias é apelação modo hard. Amancio, aos 70’, empatou. E, seis minutos depois, Serena virou o jogo para 2 a 1. O placar permaneceu até o fim e o Real levantou sua sexta UCL.

A derrota acabou marcando o fim daquela geração do Partizan, pois vários jogadores começaram a deixar o clube e jogar em outros países. O técnico Gegic também deixou o clube alvinegro e as aparições em competições europeias do clube minguaram, principalmente após a dissolução da Iugoslávia e a queda brusca do futebol do leste europeu como um todo. Desde então, o Partizan só consegue títulos nacionais e vive das memórias de um esquadrão lendário, que conseguiu enfrentar grandes clubes e encantar seus torcedores com jogos magníficos, golaços e ótimo futebol.

Os personagens:

Soskic: ídolo da torcida e um dos melhores goleiros dos anos 1950 e 1960, Soskic começou sua carreira no Partizan em 1955, onde rapidamente se destacou e ganhou a vaga de titular. Ele permaneceu no clube até 1966 e foi um símbolo de estabilidade e segurança na defesa. Com o Partizan, conquistou quatro títulos da liga iugoslava e foi peça fundamental na campanha do clube na Liga dos Campeões da UEFA na temporada 1965-66. Ele era conhecido por sua agilidade, reflexos rápidos e habilidade em interceptar cruzamentos. Disputou mais de 400 jogos pelo Partizan e 50 jogos pela seleção da Iugoslávia, com a qual venceu a Medalha de Ouro nos Jogos Olímpicos de Roma, em 1960.

Curkovic: o goleiro iugoslavo não teve grandes chances em seu início no Partizan, mas conseguiu se destacar após a saída de Soskic, em 1966, e virou titular do time. Com grandes defesas e regularidade, manteve a qualidade no setor. Brilhou tempo depois no Saint-Étienne multicampeão francês nos anos 1970.

Jusufi: lateral muito forte fisicamente e que apoiava bem o ataque, foi titular em praticamente todos os grandes jogos do time entre 1957 e 1966. Esteve no elenco da Iugoslávia campeã olímpica em 1960 e foi um dos mais prestigiados defensores de seu tempo. Foi eleito para o time dos sonhos (World XI) da revista World Soccer em 1962, 1963 e 1968. 

Rasovic: iniciou sua carreira no Partizan em 1963 e permaneceu até 1971. Era conhecido por sua força física, habilidade defensiva e leitura de jogo, características que fizeram dele uma peça essencial no sistema defensivo da equipe. Sua atuação no duelo de volta contra o Manchester United, pela UCL de 1965-1966, é lembrada até hoje como um dos grandes desempenhos individuais da época, o que deu a ele o apelido de “Gigante de Old Trafford”. Rasović foi fundamental na campanha histórica que levou o clube até a decisão continental.

Ljubomir Mihajlovic: outra lenda do Partizan, pelo qual disputou 512 jogos na carreira entre 1961 e 1970, Mihajlovic era conhecido por sua forte presença física e capacidade de marcação. O defensor tinha um excelente senso de posicionamento, o que lhe permitia cortar jogadas perigosas e organizar a defesa. Embora não fosse um dos jogadores mais chamativos ou com mais fama internacional, era respeitado por sua consistência e habilidade dentro de campo.

Damjanovic: foi um dos maiores laterais-esquerdos da história do clube, além de poder atuar também como zagueiro. Não tinha muita força física nem muita velocidade, mas era um defensor extremamente inteligente, com a capacidade de desarmar até os adversários mais habilidosos. Seus carrinhos eram um pesadelo para os atacantes. Ele também se juntava ao ataque, mas, devido à sua falta de velocidade, não fazia arrancadas clássicas. Ambidestro, possuía boas habilidades de controle de bola e conseguia superar o adversário com a bola nos pés. Jogou no Partizan de 1962 até 1971.

Becejac: incansável meio-campista, capaz de cobrir várias posições e igualmente bom tanto no ataque quanto na defesa de seu gol, Becejac jogou de 1963 até 1967 no Partizan e marcou 17 gols em 88 jogos pelo clube. Era um jogador tecnicamente talentoso, com boas habilidades de passe, e também conseguia marcar alguns gols importantes. Além disso, era um bom defensor, que, embora não fosse forte, era persistente em recuperar a bola do adversário. Ele era leve (uma manchete famosa da época dizia: “65 kg, 65 milhões”, referindo-se à sua transferência para o Olimpija após deixar o Partizan), mas era um jogador que nunca desistia.

Vasovic: um dos mais talentosos defensores de seu tempo, Vasovic teve uma laureada carreira no futebol iugoslavo e, embora tenha manchado um pouco sua história no Partizan por conta da polêmica transferência para o Estrela Vermelha, foi sem dúvida um dos principais e mais técnicos jogadores do time. Era conhecido por sua liderança, versatilidade e inteligência tática, além de ser um dos melhores zagueiros e capitães de sua geração. Seu gol na final europeia de 1966 poderia ter sido histórico, mas a derrota significou o fim de uma era para ele e vários outros atletas no Partizan. Vasovic foi jogar no Ajax logo em seguida e virou uma referência no lendário time de Rinus Michels. Em 1969, ele estava no Ajax que perdeu a final da UCL para o Milan, mas, em 1971, Vasovic “acabou com a zica” e foi campeão europeu com o mesmo Ajax, tendo a honra de erguer o troféu como capitão alvirrubro após a vitória por 2 a 0 sobre o Panathinaikos-GRE em Wembley.

Mitic: o meio-campista começou a carreira no Partizan, em 1958, e permaneceu até 1963. Não foi titular absoluto, mas contribuiu nas campanhas do tricampeonato iugoslavo no período. Nos anos 1970, foi jogar na MLS e se naturalizou estadunidense, chegando a vestir a camisa da seleção dos EUA em 1973.

Cebinac: começou sua carreira no Partizan e rapidamente se destacou como um jogador criativo e habilidoso. Durante sua passagem pelo clube, ajudou a equipe a conquistar o tricampeonato nacional com muita habilidade no meio-campo e participando de jogadas ofensivas. Na temporada 1963-1964, foi um dos artilheiros do time com 7 gols.

Bajic: ponta-direita habilidoso e oportunista, era muito rápido, com habilidades de drible razoáveis, incansável e frequentemente ajudava na defesa, especialmente cobrindo Jusufi quando este avançava. Bajic conseguia fazer inúmeros cruzamentos durante o jogo, mas esses cruzamentos nem sempre eram tão úteis. Jogou de 1962 até 1970 no clube alvinegro.

Vukelic: após uma passagem pelo Vojvodina, chegou ao Partizan em 1958 e encerrou a carreira com o manto alvinegro em 1969. Era um jogador versátil, que fez parte regular da equipe titular nas três temporadas de títulos e no período após a final continental de 1966. Jogava como atacante ou ponta.

Kovacevic: com 319 gols em 487 jogos – ele é o 5º maior artilheiro da história do Partizan -, Kovacevic é outra lenda incontestável dos alvinegros e um craque que marcou época em dois períodos – 1959-1966 e 1967-1970. Vladica, quando jovem, era um driblador imprevisível, mas à medida que amadureceu, seu jogo se tornou mais racional. Tornou-se um verdadeiro armador, com excelente visão de jogo e passes, além de desenvolver um grande entendimento do jogo e de seus companheiros de equipe. Mesmo com baixa estatura – tinha 1,69m -, era excelente no jogo aéreo e marcou uma boa quantidade de gols de cabeça. Na temporada 1963-64, foi artilheiro da Copa dos Campeões junto com Puskás e Sandro Mazzola, com 7 gols. Em 1962, fez parte da seleção iugoslava que chegou às semifinais da Copa do Mundo.

Miladinovic: extremamente talentoso, com grande técnica, força física, velocidade e, acima de tudo, uma incrível capacidade de cabeceio e impulsão. Era um jogador combativo e excelente nos desarmes, entrando em cada duelo com força total – às vezes de maneira exagerada. Polivalente, podia jogar como volante ou zagueiro central. Fora de campo, levava uma vida boêmia e odiava treinar. Ficou famoso pelo apelido “Zoran”, sendo chamado assim com tanta frequência que a maioria das pessoas nem sabia seu nome verdadeiro. Disputou 271 jogos e marcou 64 gols pelo Partizan entre 1956 e 1966.

Kaloperovic: meio-campista, jogou de 1955 até 1961 no Partizan e foi o capitão da equipe na conquista do primeiro título do tricampeonato, em 1961, que foi também sua temporada de despedida do clube. Além de ajudar na marcação, contribuía no ataque e anotava importantes gols – foram 7 gols na campanha do título.

Galic: outro medalhista olímpico em 1960, Milan Galic foi um dos melhores jogadores da Iugoslávia de todos os tempos e um dos atacantes mais completos do país. Lenda do Partizan, tinha um conjunto completo de habilidades: era um jogador muito difícil de marcar, chutava a bola com força e precisão, organizava o jogo, se movimentava bastante e era incrivelmente rápido para a sua época. Além disso, se destacava no jogo aéreo. Decisivo, Galic marcava gols importantes e foi a grande referência ofensiva do time depois da aposentadoria de Bobek. Uma pena que ele não estava na melhor forma na final europeia de 1966, pois perdeu quase toda a temporada devido ao serviço militar. Entre 1958 e 1966, Galic disputou 162 jogos e marcou 81 gols.

Pirmajer: foi um dos poucos jogadores que fizeram parte do maior time do Partizan em todos os tempos que não veio das categorias de base do clube. Inicialmente um ponta jogando pelo Novi Sad, Pirmajer foi mudando seu estilo de jogo e virou um meio-campista ofensivo quando chegou ao Partizan, em 1964. Com 1,84m de altura, se impunha no jogo aéreo, mas não tinha tanta velocidade. Seus movimentos eram lentos, mas elegantes, e era considerado por muitos como o melhor jogador com a bola nos pés de toda a equipe. Usava suas habilidades para driblar os defensores e, em seguida, fazer cruzamentos precisos. Também era conhecido por seu chute forte e a maioria de seus gols vinha de fora da área. Participava ativamente na organização do ataque, ao contrário de muitos pontas que só precisavam de espaço para correr. 

Vislavski: foi um ponta que passou a maior parte de sua carreira no Partizan – de 1960 até 1967. Podia atuar em ambos os lados do campo, era um bom driblador e nunca hesitava em tentar um cruzamento. Ajudava regularmente a defesa e era um jogador rápido, especialmente em sprints. Vislavski tinha um chute potente e era capaz de cobrar faltas muito difíceis para os goleiros defenderem. Conquistou os quatro títulos iugoslavos daquela era e esteve sempre entre os principais artilheiros, com uma média de 7 gols por temporada.

Hasanagic: um dos maiores atacantes da história do Partizan e o único jogador na história do clube com uma média de gols superior a 1 por jogo, Hasanagic é o 3º maior artilheiro da história do Partizan com 355 gols em 337 jogos disputados entre 1962 e 1969. Famoso por seus voleios e gols acrobáticos (uma pena que o seu melhor, contra o Sparta, foi anulado pelo árbitro), Hasanagic era bom em movimentação ofensiva e frequentemente participava na organização do ataque, contribuindo com seus passes de primeira precisos. Ele tinha um chute forte e era mortal no jogo aéreo. Fora dos campos, era um bom cantor e até gravou algumas músicas que foram bastante populares na época (!). Infelizmente, seu auge foi interrompido por uma perna quebrada após 1968, lesão após a qual ele nunca se recuperou completamente.

Stjepan Bobek, Kiril Simonovski, Marko Valok, Florijan Matekalo, Aleksandar Atanackovic e Abdulah Gegic (Técnicos): mesmo com vários treinadores naquele período, o Partizan teve uma identidade de jogo bem definida e conseguiu conquistar títulos históricos com ataques prolíficos, ótimo sistema defensivo e força absoluta jogando em casa. Não há dúvida de que Stjepan Bobek foi o mais importante pelo fato de ter comandado a equipe durante o tricampeonato e por ter forjado a mentalidade competitiva do elenco. Quem também merece destaque é Florijan Matekalo, o responsável por trabalhar os jovens das categorias de base lá nos anos 1950, quando era técnico dos juniores. Marko Valok e Aleksandar Atanackovic foram os menos impactantes naquela era, principalmente pelos problemas extracampo. Já Abdulah Gegic conseguiu o que nenhum outro havia conseguido ao levar o Partizan à final europeia de 1966, embora o feito tenha custado uma campanha melhor no Campeonato Iugoslavo.

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