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Técnico Imortal – Herbert Chapman

Nascimento: 19 de Janeiro de 1878, em Kiveton Park, Inglaterra. Faleceu em 06 de Janeiro de 1934, em Hendon, Inglaterra.

Times que treinou: Northampton Town-ING (1907-1912), Leeds City-ING (1912-1918), Huddersfield Town-ING (1921-1925) e Arsenal-ING (1925-1934).

Principais títulos por clubes: 1 Liga Sul (1908-1909) pelo Northampton Town.

1 Copa da Inglaterra (1921-1922), 1 Supercopa da Inglaterra (1922) e 2 Campeonatos Ingleses (1923-1924 e 1924-1925) pelo Huddersfield Town.

1 Copa da Inglaterra (1929-1930) e 2 Campeonatos Ingleses (1930-1931 e 1932-1933) pelo Arsenal.

 

“O Inglês Visionário”

Por Equipe Trivela

“O Arsenal Football Club está desde hoje aberto a receber propostas para a posição de treinador principal. Exige-se experiência e altas qualificações para o lugar, requerendo-se, em ambas, astúcia e grande personalidade.”

Esse anúncio, publicado no jornal Athletic News, em 11 de maio de 1925, chamaria a atenção de um já reconhecidamente vitorioso treinador do futebol inglês e mudaria para sempre a história do Arsenal e do esporte em sua formação tática.

No clube londrino, mais do que títulos e glórias, Herbert Chapman revolucionaria o mundo do futebol com um inovador conceito tático (WM), além de novas formas de treinamento e gerenciamento de equipes, formando um esquadrão com uma feroz política de contratações. Chapman seria um marco na história do futebol mundial, inspirador de dezenas de treinadores e um mito encontrado em toda e qualquer publicação digna que fale sobre futebol. Um ser à frente de seu tempo e que deixou marcas profundas no esporte. É hora de relembrar.

 

Entre minas e campos

Nascido em Kiveton Park, no condado de Yorkshire, em 1878, oito anos antes da fundação do Arsenal e filho de um mineiro, Herbert Chapman iniciou sua vida profissional na mesma carreira do pai, após concluir o curso de engenharia de minas. Em uma família com forte espírito esportivo, onde dois de seus irmãos também atuaram profissionalmente, ele rapidamente tomou o caminho dos gramados, primeiro como amador, em times menores da Liga de Lancashire, ascendendo para campeonatos mais disputados até assinar seu primeiro contrato profissional, aos 23 anos, com o Northampton Town.

Em sua primeira temporada, foi artilheiro anotando 14 gols em 22 partidas e acabou assinando com o Sheffield United após uma excelente exibição contra a equipe pela Copa da Inglaterra. Depois de passagens por Notts County e Tottenham (pelo qual marcou 16 gols em 42 partidas), retornou ao Northampton, em 1907, para atuar como jogador e técnico.

 

Descobrindo uma vocação

Chapman (primeiro, acima), no corpo diretivo do Leeds, em 1912.

 

Logo em sua primeira experiência como treinador, Chapman levou “os sapateiros” a conquista da Liga Sul em 1909, depois de fracas campanhas em anos anteriores. Somou um recorde de 25 vitórias em 40 partidas (55 pontos) e 90 gols marcados. Dando mostras de seu conhecimento e percepção tática, começou a notar que os times à época pouco se organizavam taticamente. Como ele mesmo diria anos mais tarde, “nenhuma tentativa era feita para organizar a vitória. O máximo de que me recordo eram ocasionais conversas entre, por exemplo, dois jogadores que iriam atuar na mesma ala.”

Percebendo essa defasagem, após uma derrota de sua equipe para o Norwich City, a despeito de ter dominado o duelo, começou a pensar numa maneira de manter seus atletas atacando por um tempo maior. Recuando os meias, ele conseguiu atrair os defensores para fora da área, possibilitando uma das primeiras formas de contra-ataques táticos. Embora simples, era pouco usual a utilização de um modelo como esse naquela época. Para permitir ao time alcançar sua plenitude, iniciou também uma prática que o acompanharia ao longo de sua carreira: incentivar (e por vezes forçar) os dirigentes a agirem de maneira agressiva no mercado, com contratações caras, mas de nome e capacidade para suprir seus grupos.

Com o sucesso fora dos gramados (incluindo um vice-campeonato na mesma Liga Sul em 1911), encerrou a carreira de atleta, aos 31 anos. Ansioso por levar seu clube para a disputa da Football League, e notando o ainda confuso sistema de promoção e despromoção, chegou a propor um novo formato, recusado pela Liga. Em 1912, recebeu uma oferta para treinar o Leeds City, na Football League. Com o apoio do Northampton, rumou para um novo desafio.

 

Pré-Guerra

O Leeds de 1914-1915. Chapman é o penúltimo em pé, de cartola. Fonte: WSC

 

Assumindo um time que havia terminado a temporada anterior em uma vexatória 19ª posição na Segunda Divisão, Chapman revigorou o clube com sua política de contratações para formar uma equipe ofensiva. Do Bradford City, da Primeira Divisão, trouxe o goleador escocês Jimmy Speirs e o time, no primeiro ano sob seu comando, terminou na sexta colocação, com o segundo melhor ataque. Fortalecendo seu setor defensivo com novas aquisições, na temporada seguinte os Citizens alcançaram o quarto lugar, a dois pontos da promoção. Com a cidade empolgada com o fortalecimento do clube, tudo indicava que a vaga na elite estava perto. Mas a perda de jogadores do Leeds para as forças militares da I Guerra Mundial prejudicou o desempenho do clube, que terminou o torneio de 1914-1915 apenas na 15ª colocação.

Com os campeonatos paralisados pela Guerra, o Leeds ainda manteve-se na disputa de competições regionais, vencendo a Divisão Norte, mas Chapman resolveu ajudar no esforço de guerra assumindo um cargo gerencial numa fábrica de munições. Em 1918, ele voltaria ao comando do clube, mas supostas irregularidades financeiras, incluindo o desrespeito do clube à proibição de pagamento aos atletas durante a Guerra, levaram à dissolução do Leeds City, em 1919, com a suspensão de seus dirigentes em alto cargo, incluindo Chapman.

 

Conquistas nacionais

O Huddersfield Town de 1922.

 

Enfrentando uma proibição de atuar no futebol pelos escândalos com o Leeds, Chapman recebeu uma oferta do Huddersfield Town para assumir como assistente do treinador Ambrose Langley. Com a ajuda de recurso protocolado na FA, assinou com a equipe em fevereiro de 1921. Em menos de um mês assumiu o cargo de treinador. No comando de um time mediano e até então pouco vencedor no cenário inglês, deixou claro aos dirigentes do clube que o elenco era talentoso, mas jovem, e que eles precisariam de um “general” para comandá-los em campo. Mais do que isso, disse que sabia quem era esse homem e que poderiam trazê-lo. Pouco tempo depois, assinou com Clem Stephenson, estrela do Aston Villa. Fazendo uso de uma boa rede de olheiros, assistia inúmeras partidas de jovens jogadores antes de fechar com os mesmos. Dessa forma, em 1921, assinou com um jovem mineiro de 17 anos que se destacava atuando como atacante amador: George Brown.

Em sua primeira temporada completa, Chapman levou um time que terminara o campeonato em 17º lugar a dois títulos nacionais. Os dois primeiros de sua história: a Copa da Inglaterra (FA Cup) sobre o Preston North End e a Supercopa Inglesa (FA Charity Shield) sobre o campeão nacional Liverpool, ambas finais vencidas com um placar de 1 a 0. Entretanto, sua preocupação maior foi com o fraco desempenho no campeonato, com os Terriers terminando a competição em 14º lugar. Controlando todos os assuntos relacionados ao futebol no clube, e já com o grupo adaptado ao seu estilo de jogo baseado em uma defesa forte com um contra-ataque eficiente e de toques rápidos, Chapman espalhou uma ampla rede de olheiros ao redor do país para encontrar as peças certas para seu esquema, entre elas o goleiro Ted Taylor, da seleção inglesa, o atacante Charlie Wilson, vice-campeão pelos Spurs, e o promissor George Cook.

As alterações surtiram efeito e o time alcançou o terceiro lugar em 1923. Na temporada seguinte, contudo, não teve jeito. Com um estilo ousado, um elenco fortalecido e preparado e um técnico com conhecimento insuperável, o Huddersfield chegou a tão sonhada conquista do campeonato nacional, dividindo a ponta com o Cardiff City (ambos com 57 pontos), mas tendo vantagem na média de gols (1.818 contra 1.794).

Para a temporada seguinte, Chapman manteve seu elenco, mas não sem reforçá-lo com Joey Williams. Durante o torneio, sofreu com a lesão de Taylor, mas a chegada de Billy Mercer como reposição para o gol elevou novamente o nível do clube, que reassumiu a liderança com uma goleada por 5×0 contra o Arsenal e levou o bicampeonato.

 

Transformando o Arsenal

O WM que transformaria o Arsenal.

 

Na temporada seguinte, enquanto realizava a montagem do elenco para buscar o tri, o Arsenal, time londrino de porte médio que até então tinha como maior conquista um título da Segunda Divisão cerca de 20 anos antes, procurava um treinador após a saída de Leslie Knighton, na esteira de duas temporadas fracas com o time flertando com o rebaixamento. O anúncio colocado no jornal por Sir Henry Norris, presidente do clube, chamou a atenção de Chapman, tentado a retornar à capital inglesa e tendo em vista o salário de 2.000 libras (o dobro do que recebia em Huddersfield), a despeito do pouco capital para investimento em aquisições previsto nos Gunners.

Herbert Chapman, ao centro, conversa com Bob John (à esq.), e Alex James (à dir.), em Wembley, antes da final da Copa da Inglaterra de 1932. Foto: Daily Mail/Rex Features.

 

No mesmo ano, as leis do jogo sofreram algumas importantes alterações, atingindo principalmente a lei do impedimento, que diminuía o número de jogadores adversários de três para dois (incluindo goleiro) necessários para configurar lance irregular. Seguindo sugestão do veterano atacante Charlie Buchan, de 34 anos, que havia tornado capitão de seu time, Chapman recuou seu meia central para o centro de sua defesa, além de recuar os dois atacante próximos ao centroavante para o meio de campo, alterando a usual 2-3-5 para um 3-2-5 (ou 3-2-2-3), chamado de “WM”.

Único time utilizando a inovadora formação, os Gunners sofreram nas primeiras temporadas até adaptar-se ao novo padrão. A despeito de um vice-campeonato logo na primeira temporada, quando seu ex-time alcançou o inédito tricampeonato nacional, sucederam-se fracos desempenhos, com o clube mantendo-se no meio da tabela. Em um período de cinco anos, Chapman foi em busca de jogadores aptos à nova formação, mantendo poucos nomes de seu antecessor, como Bob John, Alf Baker e Jimmy Brain, e contratando outros como o ponta Joe Hulme, os atacante Jack Lambert, Cliff Bastin, Alex James, David Jack e o lateral Tom Parker. Com maiores poderes gerenciais, fortaleceu o setor defensivo do Arsenal com Eddie Hapgood e Herbie Roberts. Pronto. Era hora de buscar as glórias.

 

Entrando para a história

O Arsenal campeão de 1930. Foto: Arsenal.com

 

Os primeiros frutos de seu planejamento de quinquenal começaram a ser colhidos justamente em 1930, com a conquista da FA Cup (sobre seu ex-time, o Huddersfield Town) e da FA Charity Shield. No ano seguinte, finalmente o Arsenal de Chapman encantaria o futebol inglês, e, com uma tática agressiva, aperfeiçoada por um contra-ataque imbatível, conquistaria seu primeiro campeonato inglês. Mesmo com o vice em 1931-32, os Gunners iniciariam ali uma hegemonia que perduraria durante toda a década de 1930, com uma tática inovadora e vencedora. Em 1932-1933, Chapman conquistou o seu segundo título pelo Arsenal, mas, convencido do envelhecimento de seus atletas, principalmente após o vexame da eliminação pelo Walsall, da Terceira Divisão, na FA Cup, começou a preparar a renovação do time, com nomes como Ray Bowden, Pat Beasley e Jimmy Dunne, a base de um time que manteria seu legado.

O Arsenal de 1930: note o esquema WM em sua plenitude.

 

Infelizmente, Chapman não teria a oportunidade de ver sua renovação alcançar o sucesso já em 1933-1934, com o bicampeonato da Liga. Logo após o Natal de 1933, atacado por uma forte pneumonia, não resistiu e faleceu em 6 de janeiro do ano seguinte. No comando dos Gunners, foram 403 partidas, 201 vitórias, 97 empates e 105 derrotas, com 864 gol marcados e 598 sofridos. Entre os treinadores no comando do Arsenal em mais de 200 partidas, Chapman só tem aproveitamento inferior ao de Wenger.

 

Um técnico inovador

Uma prova do sucesso de sua filosofia de jogo baseada em um forte esquema defensivo foi que o bicampeonato conquistado pelo Huddersfield, em 1925, foi o primeiro no qual o campeão não sofreu mais do que dois gols em nenhum jogo do campeonato. Acusado de defensivo, seu revolucionário esquema tático provou-se efetivo quando bem guarnecido na defesa, tanto que suas equipes campeãs quebraram recordes de gols (com o Arsenal, alcançando 118 tentos em 1932-1933 e inacreditáveis 127 em 1930-1931).

Para o sucesso de seu esquema, Chapman sabia que o condicionamento físico era algo crucial. Por isso, contava com massagistas e fisioterapeutas em suas equipes. Tinha em vista também a necessidade de jogadores adequados para cada posição, algo bem suprido pelas contratações e pela excelente rede de olheiros por ele composta nos clubes que dirigiu. Até por esse motivo, fica fácil entender porque o sucesso para Chapman chegava quando tinha liberdade para gerir todos os aspectos do futebol em seus clubes, formando a base dos “managers” atuais, que tanto sucesso fazem no futebol da terra da rainha.

Agradava seus atletas por trazê-los para as discussões táticas como parte do treinamento, pregando sempre que os jogadores deveriam ser mais do que comandados, além de defender que os atletas deveriam ter atividades relaxantes, instituindo a prática de golfe uma vez por semana entre os jogadores. Mas com os mesmos jogadores por vezes tomava atitudes definitivas com quem falhava em seu time. Como quando, após o vexame da eliminação da FA Cup, em 1933, não teimou em dispensar do time londrino após uma única partida o jovem Tommy Black, responsável por um pênalti que deu origem a um dos gols do adversário. Ou quando decidiu vender Ernie Islip, após o atacante envolver-se em confusão contra o goleiro do Notts County.

Adepto de excursões continentais, em uma época em que a maior parte de seus colegas treinadores britânicos eram contrários a amistosos contra times de outros países, já na década de 1900 organizou as primeiras viagens para duelos contra equipes estrangeiras com o Northampton. Também foi um dos primeiros técnicos a acertar a contratação de jogadores negros e incentivar a chegada de estrangeiros para atuarem no futebol inglês.

Visionário, foi um dos primeiros treinadores a defender a utilização de bolas brancas e camisas numeradas, bem como a utilização de holofotes para jogos noturnos. Tanto que foi um dos participantes mais ativos na remodelação do Highbury, incentivando a construção do famoso relógio do estádio e desenhando o projeto das catracas e do placar. No Arsenal, instituiu mudanças nas meias de seus jogadores para facilitar o reconhecimento entre os mesmo durante os jogos sem a necessidade de olhar para a camisa. Notando o ainda confuso sistema de rebaixamento e promoção das ligas inglesas, chegou a propor à Football Association (FA) regras que definissem claramente o processo, as quais a associação só voltaria sua atenção anos mais tarde.

Astuto, quando da contratação do atacante David Jack, pelo qual o Bolton pedia a exorbitante quantia de 13.000 libras, subornou o garçom do local do encontro com os dirigentes dos Whites, deixando-os embriagados e fechando o negócio pelo valor de 10.900 libras (!).

 

O melhor em terras britânicas

A estátua de Chapman do lado de fora do Emirates Stadium: devoção do Arsenal ao seu grande mestre.

 

Vale ressaltar que Chapman não cogitava ser treinador após encerrar sua carreira. Ao deixar os Spurs, em 1907, planejava exercer sua profissão de engenheiro de minas. Mas o cargo de técnico-atleta oferecido o deixou tentado a prolongar por mais um tempo sua estadia no gramados. Considerado patrimônio inglês, o lendário treinador possui um busto em sua homenagem tanto em Huddersfield como em Londres, uma homenagem dos dois clubes que dominaram as décadas de 1920 e 1930 graças às equipes por ele formadas.

Como bem resumiu Jonathan Wilson, em seu livro “A Inversão da Pirâmide”: “O que foi importante foi não apenas que Chapman tinha uma concepção clara de como o futebol deve ser jogado, mas que ele estava em posição para implementar essa visão. Ele foi – pelo menos na Grã-Bretanha – o primeiro treinador moderno (manager), o primeiro homem a ter o controle completo sobre o funcionamento de um clube de futebol”.

Já Frank Cole, articulista do Daily Telegraph, escreveu: “Se você se sentasse perto dele em um grande jogo você percebia o intenso fervor do homem. Seu rosto ficava pálido, ele vivia cada momento do jogo. E quando as coisas estavam indo contra seus homens, ele parecia estar sofrendo agonia mental. Eu nunca vi essa concentração”. Uma concentração e dedicação responsáveis por torná-lo o melhor treinador que os inventores do futebol já tiveram, inspirador de tantos técnicos – entre eles Hugo Meisl (leia mais clicando aqui) – e um patrimônio do futebol. Um técnico imortal.

 

Este texto foi publicado pelo magnífico site Trivela, lá em 18 de julho de 2011, e cedido ao Imortais. Se você gosta de textos bem escritos e é apaixonado por futebol, ler o Trivela é quase uma obrigação. Acesse o site http://trivela.uol.com.br/ e siga o portal no Facebook (https://www.facebook.com/sitetrivela/) e no Twitter (https://twitter.com/trivela)

 

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