Por Guilherme Diniz
Maior fotógrafo da história do Brasil e um dos mais renomados do mundo, Sebastião Salgado faleceu nesta sexta-feira, 23 de maio de 2025, aos 81 anos, em Paris (FRA), por complicações de um distúrbio sanguíneo causado por malária, contraída pelo fotógrafo durante uma viagem à Indonésia no começo dos anos 1990. Ao longo de sua icônica carreira, Salgado registrou momentos únicos dos seres humanos e da natureza em preto e branco, sua marca registrada e “seu mundo”, como ele gostava de dizer. Além da paixão pelas lentes, o fotógrafo nascido em Aimorés (MG) no ano de 1944 também era amante do futebol e torcia pelo América Mineiro na infância, mas passou a nutrir amor pelo Fluminense já na vida adulta. E foi o futebol, mais precisamente a figura de Pelé, que salvou a vida de Salgado em um momento tenso no ano de 1994.
A Guerra de Ruanda
Entre 07 de abril e 15 de julho de 1994, aconteceu o momento mais devastador da Guerra de Ruanda: o Genocídio em Ruanda, quando cerca de 800 mil pessoas – alguns dizem passar de um milhão – dos grupos étnicos tútsis, tuás e de hútus moderados foram mortas pela elite política principal dos hútus, muitos presentes em cargos mais altos do governo nacional. O genocídio foi planejado após o assassinado do presidente Juvénal Habyarimana, em 6 de abril de 1994, em um vácuo no poder do país.
Trabalhando na África na época, Sebastião Salgado estava indo da Tanzânia até a fronteira com Ruanda de barco, acompanhado por um intérprete, a fim de registrar imagens daquele conflito entre hútus e tútsis. Era um risco calculado pelo brasileiro, mas nada que ele já não tivesse vivido anteriormente em suas centenas de viagens pelo mundo. No entanto, aquela seria uma viagem diferente. Em determinado momento, o brasileiro foi interceptado por um grupo de tútsis que confundiram o fotógrafo com um francês – país que apoiava os hútus na época.
“Depois de muito andar, chegamos a um rio por onde os tutsis estavam fugindo para a Tanzânia – onde o fotógrafo já havia feito algumas imagens. Havia uma quantidade de mortos descendo do rio. Tinha uma queda d’água acima e eu contei, em meia hora, 29 corpos caindo. O barquinho que trazia os fugitivos voltava vazio e eu fui perguntar ao pessoal se podia ir nele até Ruanda. De repente, tinha umas dez pessoas com facões em volta de mim. Olho para o meu intérprete e ele estava pálido”, disse Sebastião Salgado, certa vez, em entrevista reproduzida no jornal O Globo.
Sou da terra do Pelé!
O intérprete disse a Salgado que ele seria morto pelos tútsis por eles acharem que ele era francês. Buscando alguma alternativa ou explicação para evitar aquele fim iminente, Salgado tirou a mão do rosto, pegou o passaporte que estava em seu bolso e disse:
“Eu sou brasileiro, da terra do Pelé”!.
Quando Salgado disse o nome “Pelé”, uma descontração total aconteceu. Os tútsis reconheceram o nome do Rei do Futebol e liberaram a passagem do fotógrafo, que nunca conheceu o Rei pessoalmente. “Foi o Pelé que me salvou a vida”, disse Salgado, anos depois. “Mas no dia em que eu o encontrar, quero dar um abraço e agradecer, porque ele salvou a minha vida”.
Esse encontro, enfim, irá acontecer. O maior fotógrafo brasileiro de todos os tempos poderá agradecer, em algum lugar, o maior jogador brasileiro de todos os tempos.
Obrigado por sua genialidade, Sebastião Salgado.
